Novo agente...
Autora - Kiki-chan
Revisão - Naru L
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Qual seria a melhor reação que poderia ter ao ler aquelas palavras? Sinceramente, não sei. Fiquei parado, olhando para o fax barulhento enquanto as duas palavras saltavam do papel, tão mais chamativas do que se tivessem escritas em vermelho berrante.
Dei uma olhadela por cima dos ombros. 'Ótimo! Ninguém por perto.' Peguei o documento e o li mais detalhadamente. Cobra era o novo agente. Nunca tinha ouvido falar... Em nosso meio era comum saber codinomes de outros mais famosos, porém entre a elite, não havia alguém cujo nome era daquele réptil tão simpático.
Sentei-me na cadeira de Saori e suspirei. O que podia fazer? Ficar indignado e gritar pelos corredores que era um absurdo contratarem um novo agente, ainda mais com a suspeita de traição? Não sou nenhum especialista em estratégia, porém sei que isso só acontece ao menos que...
Ao menos que os superiores queiram nos investigar também.
Pouco a pouco, a indignação tomava conta de cada pedaço do meu corpo. Minha vontade era xingar todos os bastardos medíocres com todo meu vocabulário colorido. Uma das coisas que mais odeio no mundo é quanto não acreditam em mim. Cerrei os punhos e minha cabeça pendeu para o lado. O que iria fazer? Estava cansado demais... Não que estivesse pouco acostumado a rotinas turbulentas, todavia precisava repousar um pouco.
E provavelmente esse desejo não se realizaria em breve, em vista que estávamos atolados até o pescoço em problemas.
'Oh maravilha...'
Aqueles idiotas da Fundação eram rápidos demais... Talvez precipitados também.
A dor começou leve e fina, simplesmente um incômodo quase insignificante na nuca. Depois se apossou da cabeça toda. Devia estar me avisando que passara muito tempo sem dormir.
Realmente, dormir seria algo muito bem vindo. Um pequeno sorriso moldou meus lábios ao imaginar uma cama... E os travesseiros, lençóis...
Até o fax apitar de novo.
Quase pulei da cadeira e olhei assustado para o aparelho. Continha o selo da Fundação no topo do papel que era impresso. Deveria ser a parte dois do relatório. Mordi o lábio inferior e me esgueirei até a porta. Nem sinal de Saori. Franzi o cenho. Dede quando ela deixava o escritório destrancado e vazio por tanto tempo?
Tentei controlar minha ânsia de ler o outro documento. Era errado, antiético, mas quem ligava para isso? Era excessivamente curioso, ou enxerido, porém, aquilo tinha mais força que meu decadente autocontrole. Caminhei até a mesa de madeira polida onde ficava o telefone-fax. Apanhei a folha com meus dedos formigando. Meus olhos voaram sobre as letras até conseguir entender do que se tratava. E parece que minhas suspeitas haviam se confirmado perfeitamente.
Era a parte dois.
E tinha... o sexo do novo agente.
'Uma... mulher!' Estreitei os olhos.
Como assim, uma mulher! Esse era um trabalho perigoso e um maldito espécime feminino só atrapalharia tudo! Onde estavam com a cabeça? Uma mulher estúpida para substituir Shiryu...
Um calafrio percorreu minha espinha. A reação de todos não iria ser exatamente a melhor. Exatamente como estava sendo a minha. A vontade era de rasgar aquela folha em pedacinhos e jogar todos pela janela, fazendo-os parecerem neve em pleno clima quente e abafado. Tocante, não? Mesmo que eu sempre entrasse em conflito com meu companheiro, sabia que ninguém poderia substituí-lo. Nenhum ser da face da terra teria o mesmo cuidado em fazer o serviço, ao mesmo tempo em que se divertia.
Suspirei de novo. Saori teria mais problemas... Como se já não houvesse o suficiente. Quase senti pena, se não estivesse com tanta raiva, poderia até considerar ir atrás dela e "confortá-la" um pouco.
Pelo menos, quando visse o fax, poderia ter uma boa lembrança.
Outra vez, o som daquele apito chegou aos meus ouvidos. Irritante como sempre. Grunhi e andei em passos duros até lá. Era uma foto da nova agente. Deveria ser uma daquelas mulheres masculinizadas que tomavam remédio para cavalo e...
Então, congelei.
Congelar mesmo. Meu rosto foi perdendo a cor e todo o calor humano. Logo minhas mãos pareciam blocos de gelo e poderia jurar que minhas unhas estavam ficando roxas. Tremia, de frio ou surpresa, não fazia a mínima idéia. O simples ato de respirar se tornava penoso.
Nunca fui de invocar a Deus ou qualquer tipo de entidade. Talvez pelo fato de ter passado mais anos do que gostaria no próprio inferno e chamá-lo não me ajudara muito. Com certeza não faria diferença agora. Mas se pudesse, juro que faria mais preces do que qualquer um.
Esfreguei meus olhos para me certificar que aquilo tudo estava acontecendo e não era uma miragem. Não que tivesse fantasias de qualquer tipo com aquele rosto da figura. Na verdade, já havia esquecido-o há muito, muito tempo. Contudo, o destino é peculiar e nos faz encarar coisas desagradáveis. Minha mão correu meu rosto de expressão descrente. Não, não poderia estar acontecendo comigo...
– Parece que Saori não será a única com problemas daqui para frente... – Deixei escapar em voz alta.
Com certeza não, talvez eu estivesse até mais tramado que a poderosa-chefona.
A história clichê da garota que volta para se vingar do cara que quebrou seu coração. Sorri irônico, às vezes os clichês dos livros podem se tornar realidade.
Por outro lado, ela poderia já ter esquecido todo o... Ocorrido. Poderíamos até ser amigos. Uma relação calma e cordial, sem intimidade, mas também sem problemas. Perfeito.
Perfeito demais para ser a MINHA realidade, contudo.
Ao menos que Shina tivesse passado por uma completa e total metamorfose, feito um transplante de cérebro, passado por alguma experiência cientifica que modificava o comportamento ou perdido a memória, estaria do mesmo jeito. Ela se vingou da garota, que deixara o canário de estimação que tanto gostava, sete anos depois jogando pombas mortas no quintal da outra e soltando o cachorrinho da menina no meio da floresta. Digamos que Shina não era exatamente a mais amável das pessoas.
E então, eu comecei a ficar com medo. Pombas mortas e roubar o cachorro por algo tão leviano. Imagine o que ela faria comigo... Esquartejar talvez?
Enfiei a parte dois e três do relatório no bolso de minha calça, deixando para Saori só a primeira folha. Era desonesto, porém mais seguro por enquanto. Observei o fax por algum tempo, me certificando de que não tinha mais nenhuma mensagem para ser lida.
Corri até a saída e fechei a porta com cuidado. Enquanto encostava-a, ouvi o barulho de saltos contra o piso de pedra e quase me desesperei. Rápido, procurei algum lugar em que pudesse me esconder e fui para a escada de emergência. Alguns segundos depois, Atena virava o corredor. A segui com o olhar pela fresta da porta até ela sumir dentro de sua sala. Após aguardar dois minutos, sai de meu esconderijo atordoado.
A famosa lei de Murphy que persegue os pobres humanos. É batido, mas sempre acontece.
Apertei o botão do elevador e entrei na caixa metálica. Apoiei-me na parede e mirava a luz acendendo nos números por cada andar que passava como se fosse a coisa mais interessante no mundo. Quando cheguei no andar térreo, sai em passos desleixados, fingindo que nada acontecera.
Quando passava pelas portas de vidro da frente, uma figura esbarrou em mim de forma um tanto rude, no entanto, não parou um segundo sequer. Virei-me para ver o tão "educado" sujeito e reconheci a cabeleira loira de Hyoga. Parecia um tanto alterado. Fui até ele cauteloso, aquela cara de poucos amigos era tudo menos um convite.
– E ai, Hyoga?
Sinceramente, me arrependo de ter iniciado o diálogo. Os olhos azuis pareciam querer me cortar ao meio.
– Não estou com humor para conversas, Seiya. Tenho assuntos importantes agora.
– Acho que a chefona não vai estar de bom humor...
Ele deu uma risada sarcástica e me fitou mais intensamente.
– E eu estou com um ÓTIMO humor, não? Aquela pirralha vai ter que me ouvir hoje. –E então, entrou no elevador onde eu tinha estado poucos instantes antes.
Meus problemas só tendem a aumentar. Girei os olhos e chamei o outro elevador.
Desejo sinceramente que Shina tenha feito um transplante de cérebro, do contrário, provavelmente não vou estar vivo para ver os fogos no litoral. Sorri fracamente. Isso se não morresse antes...
Mas minha morte antecipada poderia ser chamada de regalia, se comparado ao que presumia que teria que enfrentar.
As portas cinza se fecharam quando apertei o botão para o último andar.
