A minha vida é o palco de um teatro. O tempo todo represento para o mundo o papel que esperam que eu tenha. Nem mesmo no sono deixo de usar minha máscara. Consigo enganar a todos. E até a mim.
Sempre que sinto os olhos arderem, sussurro para mim que preciso ser forte. Que preciso enfrentar qualquer que seja o problema sem me deixar abater. Mesmo assim, as lágrimas esacapam com estranha facilidade para o esforço que faço a fim de esquecê-las.
Então juro que ninguém me verá fraquejar. E me posiciono de tal maneira que certamente alguém irá perceber os olhos brilhantes pela tristeza. E quando as lágrimas secam, ponho no rosto o sorriso mais estupidamente falso, deixando que a voz rouca acentue o aspecto de pobre menina.
Refletindo dessa maneira, percebo que sou tão vazia quanto aqueles a quem sempre critico. Sou tão vazia e tão falsa quanto qualquer pedra de zircônio vendida por diamante. As pessoas dizem que sou como um livro aberto, um tampo de vidro. E não percebem que escondo através das páginas rasgadas e da clareza do cristal a capacidade de distorcer a realidade, de fazer-me de vítima e assim manipular todas as atenções para mim.
Quem eu sou afinal? Quem é essa que olha para mim do espelho com os olhos assustados, que se reflete nas palavras, nessas palavras que tantas vezes despejo nestas linhas, que se confessa com a voz ora sussurrante, ora estridente, que se confunde comigo mesma, com as próprias ações, medos e paixões?
Quem é Lily? Quem é ela? Quem eu sou de verdade, sem máscaras ou falsos moralismos, sem nada a esconder a face, a mente, o coração?
Quem?
Lily dobrou o pergaminho, pousando a pena sobre o criado mudo ao lado da cama, para em seguida se recostar nas almofadas que a enfermeira afofara quando fora vê-la. Fechou os olhos, pousando os dedos sobre os lábios.
Se alguém lhe perguntasse o que acontecera na noite anterior, ela não teria pudor algum para dizer que não se lembrava. Ela simplesmente ergueria a cabeça arrogantemente - como tantas vezes acusara outras pessoas de fazer - e responderia que estava fora de si por causa da febre.
Tinha que confessar pelo menos a si mesma que era uma solução patética para seus problemas. Mas o que poderia fazer? Era orgulhosa demais para admitir que estivera errada por tano tempo. Orgulhosa demais para deixar alguém penetrar em seu escudo defensivo. Orgulhosa demais para permitir que James Potter se aproximasse novamente dela.
Quando finalmente se viu livre da enfermaria, e aos poucos voltou ao seu cotidiano normal, mergulhou completamente nos estudos. Não tinha mais tempo para nada. Além das aulas normais, estava matriculada em todos os cursos extra-classe que a escola oferecia para o sétimo ano.
Não queria ter tempo para pensar. Sequer para respirar. Pois se ficasse suficientemente cansada, não pensaria em nada. Nem mesmo nos olhos castanhos de James, que insistiam em persegui-la por todos os cantos.
Mas mesmo com todos os seus músculos doendo e com sua cabeça cheia de responsabilidades de escola... Mesmo assim... Não podia se impedir de pensar nele. Não podia se impedir de perguntar porque ele não a convidava mais insistentemente para sair. Pois, embora os olhos dele a seguissem aonde quer que ela fosse... desde a noite do baile, James não a procurava.
Logo a verdade ficou clara para ela. O "Potter" desistira. Finalmente, ele dera o braço a torcer, finalmente ele a tinha esquecido. E se seus olhos se cruzavam de vez em quando, é porque ele tinha curiosidade em saber como ela estava reagindo.
Deveria se alegrar com aquilo. Afinal, implorara a todos os deuses que a livrassem dele. Que permitissem que ela não caísse em tentação. Uma tentação doce demais...
E agora que ele a deixara em paz, ela sentia que enlouquecia um pouco mais dia após dia. Sobrecarregava-se de trabalho, quase não dormia com medo dos sonhos que poderia ter. Se não a salvassem de si própria, logo sucumbiria.
Tristeza não tem fim.
Felicidade sim...
É, eu sei que não ia continuar essa fic... Mas senti necessidade de fazer esse segundo capítulo... Os versos que aparecem no final são da música "A felicidade" de Tom Jobim e Vinícius de Morais.
Não esperem que eu continue, essa segunda parte foi um surto extremamente surtado... hehehehe... Agora eu tenho que ir. Aula. Se tudo der certo, sexta feira chega novo capítulo de CdA. Enquanto isso, esperamos os resultados do fic awards... Será que a Silver ganha? Huahuahuahuahuahua...
Beijos,
Silverghost.
