O mundo aqui silencia
"Que outra maneira tem para chegar ao Inferno, Aurus?" perguntou Aurion, ansioso.
"Se você está pensando em ir ao Yomutsu Hira, esquece, pois aquele buraco leva a um dos piores lugares do Inferno. Nunca sairíamos de lá." atalhou Lunion.
"Existe uma passagem na Terra, para o Submundo. Eu vi durante as minhas meditações."
"Onde fica?"
"É uma caverna... Nas ruínas de um templo abandonado." Aurus contou cada detalhe de do que vira, descrevendo o local com precisão.
"E o que nós estamos esperando? Vamos!"
"Será que você nunca pensa antes de fazer nada?"disse Allas bruscamente. "Não dá para irmos todos e largar o Santuário abandonado!"
"Não acredito que eu vou dizer isso, mas ele tem razão." admitiu Ardol.
"'Não acredito que vou dizer isso'?" Allas repetiu meio ofendido, mas ninguém deu atenção.
"Não podemos deixar tudo só nas mãos dos cavaleiros de Ouro."
"Eu sei. Eu pedi que Sukhi falasse com outros aprendizes e cavaleiros que estivessem à altura do trabalho, antes de subir pra cá." respondeu Lunion.
"E nós? Quantos vão e quantos ficam?"
"A questão é: quem vai e quem fica?"
Todos os olhares se voltaram instantaneamente para Shion.
"O que?" ele perguntou.
"Isso é decisão do Grande Mestre. Quem vai e quem fica?"
"Certo. Acho que cinco de nós são o bastante para proteger o Santuário junto com os aprendizes. Allas, Darius, Aurus, Ardol e Aurion; vocês ficam. Lunion, Yoros, Osirus, Lidius e Dohko vêm comigo."
"Não!" protestou Aurion. "Shion, eu não vou ficar aqui! Eu deixei Athena ir embora eu vou lá protegê-la!"
"Aurion," Shion disse com toda a calma. "você está nervoso com toda essa situação, se for até lá, pode acabar agindo sem pensar... Fazer alguma loucura..."
"Eu vou fazer uma loucura se tiver que ficar aqui!"
"Você não vai mudar de idéia não é?"
"Não."
Shion deu um pesado suspiro. Sabia que Athena significava algo mais para Aurion. E Shion não pôde deixar de sentir pena dele por isso. Ele sabia bem que não havia nada pior do que amar em tempos de luta. Do que poder perder quem se amava. Eram todos cavaleiros de Athena, mas o que Aurion sentia por ela era diferente do que o que qualquer um deles sentia. Era... amor. Um amor que leva as pessoas a fazerem coisas arriscadas, impensadas... E por isso temia levar Aurion com eles. Mas, pelo visto, não teria escolha. E Sagitário merecia poder ajudar.
"Muito bem. Se é assim, você vem com a gente."
Ouviram de Aurus explicações mais detalhadas da passagem antes de partirem na velocidade da luz.
Os quatro restantes no Santuário dirigiram-se para a Casa de Áries onde aguardariam os aprendizes.
"Lyra? Lyra?"
"Quem está aí?" veio a resposta desconfiada de dentro da casa da amazona de prata.
"Sukhi."
Ao ouvir o nome da aprendiz de Câncer, Lyra abriu a porta e saiu da casa.
"Já começou a guerra, Sukhi? Os cosmos deles estavam bem agitados há alguns minutos."
"Parece que somos nós que vamos começar tudo. Athena e um dos cavaleiros de ouro já foram para o Inferno."
"E nós?"
"Lunion me pediu para recrutar quem estivesse à altura de ajudar a guardar as doze Casas, por enquanto."
"E você acha que eu estou à altura? Que honra." ela disse meio irônica, depois acrescentou em tom sério: "Será que nós precisamos disso tudo? Athena está no submundo. Por que Hades se daria ao trabalho de atacar aqui?"
"Eu não sei. Mas você também pode sentir. Esse cosmo se fechando à nossa volta. Algo vai acontecer aqui. Isso eu sei."
Estavam em meio a uma floresta densa e escura, à volta só as ruínas do que um dia teria sido um templo. A entrada da caverna emanava uma energia assustadora. Apesar do medo de que qualquer coisa desse errado, o grupo de cavaleiros de ouro não hesitou. Estavam ali para isso.
Adentraram a caverna. Seguiram em frente pelo chão irregular que os levava cada vez mais para baixo. A cada passo que davam, aumentava a impressão de que nunca mais voltariam. Nada além do esperado.
O caminho ficava cada vez mais íngreme a tal ponto que se tornava quase vertical. E o lugar ia se tornando cada vez mais escuro. Lunion se sentia estranha: sufocada pelas trevas e com um pressentimento cada vez pior. Desequilibrou-se, perdendo momentaneamente os sentidos e sendo prontamente amparada por Osirus.
"Tudo bem?"
"A partir desse ponto, a escuridão é absoluta. Impossível saber o que vem pela frente." disse Dohko.
Lidius deu de ombros.
"Viemos até aqui e vamos até o fim, independente das condições."
Lunion abriu os olhos de repente.
"Tive uma visão. Não sigam adiante."
"O quê?"
"Hades não nos deixaria entrar em seus domínios assim, sem mais nem menos. Chegaremos lá mortos se não atingirmos o oitavo sentido. Continuem andando. Mas concentrem todas as forças em queimar o cosmo ao infinito. Ignorem todo o resto. E não se preocupem se algum de nós não vai conseguir. Nós vamos. Todos."
Os outros concordaram com a cabeça. Dito isto, Lunion seguiu em frente, engolida pelas trevas, sendo logo seguida pelos outros seis.
Lyra olhou para trás observando o grupo que ela e Sukhi haviam reunido. Talvez não se comparassem aos cavaleiros de ouro, mas... Eram muito fortes.
Lyra usava uma armadura cinza por cima do collant e da meia calça branca, no pescoço carregava o crucifixo símbolo de sua constelação guardiã, o Cruzeiro do Sul. Os cabelos castanhos avermelhados balançavam à brisa fria da noite e seus olhos da mesma cor tinham uma expressão obstinada, escondida pela máscara.
Sukhi a seguia lado a lado, os lisos cabelos negros emoldurando um rosto de grandes olhos castanhos e um semblante carregado. Como ainda não possuía o traje de Câncer, usava simplesmente uma armadura de treinamento. Podia se garantir mesmo sem a armadura.
Atrás dela, andavam um garoto de cabelos muito loiros que cobriam um dos penetrantes olhos escarlate. Yuki trajava a armadura de Andrômeda. Ao lado do garoto, e sem conseguir tirar os olhos de Sukhi, seguia o único daquele grupo, além de Lyra, que a aprendiz de Câncer realmente conhecia. Jin tinha cabelos revoltados castanhos escuros e olhos de uma cor que variava entre cinza, verde e azul. Assim como Sukhi, o aprendiz de Capricórnio usava uma simples armadura de treinamento, e tinha um olhar preocupado, mas confiante.
Fechando o grupo, vinham duas garotas. A amazona de prata do Órion, Shiro, tinha cabelos longos tão negros quanto os de Sukhi, presos numa trança. Usava um collant cinza que destacava seus olhos azul gelo. Ao seu lado, seguia uma amazona com cabelos de um tom entre louro e castanho, meio arruivados. Seus olhos de cor cinza tinham uma expressão insegura. Apesar de ser a mais nova do grupo, Maya de Pomba era determinada e possuía um grande poder, mas não tinha a mesma coragem dos outros de enfrentar uma missão suicida sem sequer se preocupar.
Andando lentamente, chegavam à Casa de Áries onde já eram aguardados pelos cavaleiros de ouro. Observando mais uma vez o grupo, Lyra pôde sentir a decisão firme de cada um deles. Estavam prontos para morrer. Não conseguiu evitar a pergunta que fez a Sukhi:
"Você acha que nós vamos morrer?"
"Provavelmente." disse sem vacilar. "É para isso que estamos preparados desde sempre. A batalha começa agora. E é pra valer." Sukhi sabia que Lyra sentia, mas não com a mesma nitidez dela, os diversos cosmos negros que, em instantes, adentrariam o Santuário.
Trevas.
Atrás deles. À sua volta, por todo o caminho adiante, por todo o caminho que deixavam para trás. Yoros de Virgem se perguntava se algum dia sairiam dali, ou voltariam a ver luz novamente. Tentando ignorar a escuridão, apenas se concentrava em aumentar sua energia. Aos poucos, os cavaleiros de ouro sentiam os corpos cansados, pesando cada vez mais. Cada passo era um tormento, manter o cosmo aceso era quase um sacrifício. O caminho parecia cada vez mais íngreme, era quase uma queda livre.
Yoros deu outro passo e não sentiu mais o solo de pedra sob seus pés, percebendo que havia agora cruzado a fronteira entre o mundo dos humanos e o Submundo, sentiu o corpo caindo num abismo onde não se via nada.
Pelo vazio na caverna, ecoou o grito da amazona e seu corpo despencando na escuridão, seguido pelos gritos dos outros seis que a acompanhavam, caindo pelo mesmo escuro abismo.
Arios e Athena já se encontravam no meio da travessia do Lago dos Mortos. De momento em momento, as almas se agarravam às laterais do barco de Caronte e tentavam virá-lo, percebendo que o barqueiro não estava ali.
Athena poderia tê-los afastado com seu Cosmo, mas preferiu ocultar sua energia para não alertar Hades de sua presença tão cedo.
Arios remava o barco como podia, naquela água infestada de mortos, ao mesmo tempo em que tentava impedir que a embarcação virasse. Perdido em pensamentos, não trocou uma palavra com a Deusa, apenas cumpriu mecanicamente sua tarefa.
Deu-se conta de que haviam chegado à margem oposta. Desceu do barco e estendeu a mão para ajudar Athena.
"Obrigada." ela disse recebendo em resposta um sorriso.
Arios contemplou o lago por alguns segundos. Era tão grande e vasto... Em alguns pontos ao longe, onde os mortos não se agitavam, a superfície era lisa e prateada; parecia um espelho. Chegava a ser bonita. O geminiano sentiu pena daquelas almas... Se afogando em seu próprio desespero... Assim como ele.
Não havia mais tempo de olhar para trás. Seguiu junto com Athena para a primeira prisão do Inferno.
"A Julgada dos Mortos."
"Parece tão... Vazia."
"A maior regra daqui é o silêncio. Por isso parece tão deserta." respondeu Athena.
Deram mais alguns passos, que ecoaram pelas trevas, em direção à porta da imponente mansão branca que era o tribunal dos mortos. Arios sentiu um aperto no peito, como se ele estivesse mesmo prestes a ser julgado ali. Tudo à volta era silêncio, um silêncio intenso que lhe trazia lembranças. Lembranças que haviam vindo à tona, desde que ele ouvira as palavras da Hárpia. Lembranças que deveriam ser esquecidas. E foram, momentaneamente, quando Gêmeos e Athena se depararam com um cavaleiro magro de revoltos cabelos negros, que bloqueava a porta da Julgada.
"Não dêem nem mais um passo." ele disse, prepotente.
"E você é..."
"O espectro da estrela maligna das trevas."
Arios olhou-o dando a entender que aquilo significava pouco mais que nada.
"Certo." disse indiferente. "Agora, você pode nos deixar passar ou eu posso te matar."
"Adoraria ver você tentar" ele disse, ainda no mesmo tom de superioridade.
Mas o espectro não teve tempo de ver muita coisa antes de cair no chão, os olhos vidrados, fatalmente atingido pela explosão galáctica de Arios.
"Eu avisei."
"Arios, tem alguma coisa errada aqui."
"Eu sei. E agora que devem ter sentido minha energia estamos meio expostos. Sinto muito. Não tem nenhum atalho por aqui para não termos que caminhar prisão por prisão, matando esses idiotas?"
"O Rio dos Mortos deságua em Cocyte." A lembrança veio de repente.
"Resumindo, vamos ter que fazer todo o caminho de volta para pegar o barco na margem do Aqueronte?"
"Sim."
Arios olhou como se não gostasse muito da idéia, especialmente por significar que tinham ido até ali à toa.
"Pelo menos eu pude ter o prazer de matar um idiota desses." disse por fim.
Athena lançou um olhar de reprovação ao cavaleiro de Gêmeos enquanto ambos seguiam em direção às margens do Aqueronte. Logo, já navegavam pelo Rio dos Mortos em direção às demais prisões do Inferno.
Quando Shion de Áries voltou a si se deparou com um par de olhos vidrados, vazios... Mortos. Olhou melhor para o corpo; a julgar pela armadura e pelo lugar onde se encontravam, era um espectro: Caronte.
"Arios..." Shion ouviu a voz carregada de amargura de Lunion de Câncer atrás de si. "Essas marcas só podem ter sido obra do meu irmão."
"Pelo menos, isso significa que passaram vivos por aqui." disse Yoros.
"Não que isso signifique muita coisa. Existem muitos outros perigos pelo caminho." Osirus atalhou secamente.
"Como vamos passar pelo Rio?" perguntou Lidius, de repente, voltando-se para problemas mais práticos. "O barco dele não está aqui. Athena e Arios devem tê-lo levado."
"Provavelmente. Mas imagino que ele tenha outro. Afinal é de se esperar que o barco vá se deteriorando aos poucos sendo constantemente arranhado e puxado pelos mortos." sugeriu Dohko.
"Vou dar uma olhada." ofereceu-se Aurion. Pelo seu tom de voz, continuava abatido, mas as palavras de Shion haviam surtido efeito nele. Não iria fazer nada estúpido, nem ser um peso morto. Iria fazer o que estivesse ao seu alcance para ter Athena de volta.
O cavaleiro de Sagitário percorreu toda a enorme extensão da margem do Aqueronte num piscar de olhos. Voltou com um, fraco, mas vitorioso sorriso.
"Certo como sempre, Dohko. Na outra ponta tem um barco."
"Parece que vamos ter que atravessar por conta própria." Osirus disse lançando um olhar para o corpo sem vida do barqueiro.
"É uma pena." comentou Lidius jogando uma moeda dourada para cima e para baixo. "Achei que iríamos precisar disso." disse por fim, deixando a moeda cair no chão, ao lado de Caronte.
Subiram os sete no barco, surpreendentemente espaçoso o bastante para todos. Dohko agarrou o remo e seguiram, cada vez mais silenciosos e apreensivos, rumo à primeira prisão.
CONTINUA...
N/A: agora sim a fic começa! nem sei oq dizer... Desculpem a demora pra atualizar (pior eh q eu não tenho nenhuma desculpa alem da minha propria preguiça XD) maaaaas o importante eh q eu continuo aqui!
Ah! E muito obrigada a TODOS que acompanharam esse fic ateh aqui, revisaram e me disseram pra naum desistir... sem vcs eu naum taria aqui, podem ter certeza!
Lyra
