Disclaimer: Sim, sim, os boatos são verdadeiros! Eu não sou dona dos corpitchos pecaminosos dos cavaleiros de Saint Seiya! Eles pertencem ao tio Kuramada. Esta fic não tem fins lucrativos, porém o chapéu da pedinte aqui recebe reviews, só se forem dadas de coração!


INCENSO E VELA

CAPÍTULO SEIS

Odisséia

– Milo, precisa impedir que Camus saia de Aquário hoje. Prenda-o na cama, ataque-o com seu ferrão, mas não deixe ele sair.

– Por que, Mu?

– Ares quer que ele lute com Shaka pela armadura de ouro de Virgem...

– Mas como assim?

– Para testar a força de Shaka, Ares o quer lutando contra um verdadeiro cavaleiro de ouro.

– Mas isso é ridículo, nunca houve esse tipo de teste para as armaduras de ouro. Elas praticamente escolhem sozinhas quem elas querem que as vistam!

– Isso é óbvio, mas Ares quer ver sangue no Santuário. Ele quer uma disputa.

Os olhos de Milo brilhavam nas órbitas de raiva.

– E no que isso seria bom para ele?

– Para exibir o poder dos cavaleiros de ouro para todos no santuário. Não percebe de que poder absoluto ele se cercou? Os cavaleiros de ouro são fiéis a ele, e todos os aprendizes estão sob sua guarda, exceto alguns cavaleiros de bronze espalhados pelo globo... quer que seus cavaleiros de ouro façam rinhas de galo para mostrar para todos o poder que nós temos e que ele detém, em última instância. Ele pouco se importa conosco, ele conta com os poderes das armaduras, sabe o poder que elas têm, ele sabe que elas podem compensar mesmo o pouco talento de um cavaleiro... a ele interessam as armaduras vestidas por homens fiéis e nada mais. Se você morresse, ele ia substituí-lo em meses!

– Mas Mu... – Milo já estava desconcertado. – Camus não pode ser derrotado. Você sabe. Ele é o mago do gelo... nenhum, de nós poderia... talvez Aioros... mas...

Mu deu uma risada irônica e nervosa.

– Acredita mesmo nisso que está dizendo, Milo?

– Acha que Shaka pode matar Camus?

– Milo, não existe homem invencível. Era o que eu pensava de Shion: Shion não pode ser derrotado! E onde ele está agora? Está morto! Sou eu que visto a sua armadura, eu! Eu, que sequer posso imitar seus golpes!

– Mu, por favor...

– Você pensa que eu não sei o que vocês dizem? Pensa? Que sou surdo e não escuto o que cochicham pelas minhas costas? E todos que me chamam de fraco porque apanho de Afrodite, porque estou em Jamiel? Acha que não sei? Eu aturo as piadinhas de vocês porque eu não me importo com o que dizem, nunca me importei! Eu perdôo vocês porque nenhum de vocês tem idéia do que seja ser forte! Eu sou forte, mais do que todos vocês imaginam!

– Mu, não me assute. Eu nunca te vi assim!

– Não, nunca! Nunca me viu chorar assim, nem gritar assim! Eu estou farto de ouvir tolices e nunca responder! Eu sou forte! Eu, sozinho, tirei, peça por peça, parte por parte, a armadura de Áries do corpo de Shion, ele, o invencível, o mestre, o mais poderoso de nós! E estava morto, Milo, eu garanto a você, estava bem morto! O corpo dele já estava duro, o sangue secou e agarrou na pele dele... e não saía! A pele de Shion... que era um veludo... uma pétala de flor! Ela agarrava nas partes da armadura! Eu tirava os pedaços... ele ia ficando em carne viva! E por Zeus, Milo, eu juro! Preferia mil vezes que fosse a MINHA pele descolando! E Dohko fugiu! Dohko não agüentou olhar, ele se escondeu para chorar a sua dor e me deixou, sozinho! Eu era uma criança, Milo! Mas eu tirei! Eu tirei, porque eu sabia, sabia que era a vontade de Shion! Ele não ia me perdoar nunca se a armadura de Áries tivesse caído nas mãos de outro, e é isso que Ares não perdoa em mim: eu peguei a armadura e eu sobrevivi! Eu a tirei do corpo dele, Milo! Eu saí de lá correndo, abandonei o corpo do meu mestre largado entre tantos e corri, estava calor...

– Mas Mu...

– Não me interrompe! Estava calor! Eu suava, suava... o chão nojento, pegajoso de sangue! Tanto sangue! Tantos mortos! Então eu soube... que eu não ia longe correndo com os pedaços da armadura! Eu tinha que vestir ela... minha telecinese estava afetada pelo meu... pânico... não ia transportar a armadura... ela tinha que estar vestida em mim... eu vesti... tinha pele de Shion nos pedaços da armadura e ela era tão pesada!... eu vi um grupo enorme de cavaleiros negros do Hades atrás de mim... me teletransportei... não consegui chegar em Jamiel... estava nervoso... sem querer fui parar em Star Hill! Sorte não ter ninguém vivo lá também... apanhei o baú de Shion e a caixa da armadura...consegui, não sei como, fazer o teletransporte para o Tibet, enfim... como eu quis, Milo! Como eu pedi aos deuses que dormisse e acordasse com tudo no seu lugar! Eu pedi tanto, tão ardentemente, nunca pedi nada com tanta fé... pedi para acordar em Libra, entre Dohko e Shion... e comer com eles do mesmo prato... mas não adiantou... nada ia voltar ao que era. Nunca.

– Mu, por que não diz isso aos outros?

– Para que? Shion estava me preparando, não para ser cavaleiro, não para ser mestre, não para ser ferreiro: ele me preparou a vida toda para aquela única noite maldita! Para que eu, e mais ninguém, pudesse ter a coragem e o sangue frio de fazer o que tinha que ser feito! Para isso ele me treinou. E por ele eu fiz aquilo! Por ele!

– Mu... – Milo atirou-se nos braços do amigo. O corpinho de menino de Mu tremia violentamente. – Me desculpe... me desculpe...

– Eu não quero ser mestre, Milo... nunca quis. Faça por Camus o que eu não pude fazer por Shion...

– Eu vou tentar... juro que vou tentar...

-x-

– Você não pode lutar com Shaka.

– Por que, Milo?

– Porque é absurdo que você concorde que uma armadura de ouro, que é uma coisa sagrada, seja disputada, dada à alguém nesse tipo de circunstância!

– Não concordo, mas o que quer que eu faça? Vá até Ares e diga que estou com medinho de bater em um cego?

– Não é isso, Camus, deixa de ser cabeça dura!

– Filho...

– Não me chama de filho, mas que parto para entender!

– Eu já entendi, fi...

– Ai, chega! Você não vai! Eu te furo com a minha agulha escarlate e digo pro Mestre que você se afogou no sanitário!

– Milo...

– Camus, por favor, por ZEUS, por tudo! Não vá lutar com Shaka e se passar por tão pouco na frente desses carniceiros...

– Milo, se não for eu, será outro.

– Que seja! Mas não você... não você...

– Estou começando a achar que você pensa que Shaka pode me matar facilmente...

– Não. Eu achava você invencível até o Mu...

– O Mu? Mu, Milo? Filho, você anda ouvindo as coisas que Mu diz?

– PÁRAAAAAAAA!

– Desculpe!

– Camus, o que aconteceu que Mu disse que não sabe dar os golpes de Shion?

– Essa estória é velha. Não sabe?

– Não.

– Foi Aioria que me contou.

– Então me conta.

– Mu não consegue fazer bem o Extinção Estelar.

– Zeus, mas não é esse o melhor dos golpes de Áries?

– Sim, para você ver.

– Me conte isso direito, Camyu...

– Pergunte a Aioria. Ele adora repetir isso, agora que Shion morreu e foi posta abaixo a 'lei da mordaça'.

– Mas Camus...

– Eu juro que vou falar com o Mestre, Milo... mas se ele estiver irredutível e assim mesmo quiser a batalha, eu lutarei, você gostando ou não...

Milo correu para a Arena. Teria tempo hábil entre a conversa – que ele já imaginava inútil – entre Camus e o mestre para falar com Mu e com Aioria. Ele não ia permitir que o estranho Shaka encostasse um único dedo em seu francesinho gelado.

-x-

– Aioria!

– O quê, Milo?

– Preciso que me conte uma coisa: é questão de vida ou morte, seja sincero, por Zeus.

– Milo, fica calmo, você está azul. O que é que é tão importante?

– É verdade que Mu não sabe dar o Extinção Estelar?

Aioria ficou sério. Saiu da arena e puxou Milo para um canto entre as pilastras semi-demolidas da área de treinamento.

– Por que quer saber?

– Só posso dizer que preciso. Camus disse que você sabia e que me contaria se eu perguntasse.

– A questão não é que Mu não sabia aplicar o golpe. Ele não consegue é parar.

– Como é possível?

– Ele devia ter uns 12 anos, no máximo. O Shion tomava conta do treinamento do Mu pessoalmente, às vezes o Dohko estava junto. Eu sei o Mestre era muito, muito poderoso e exigia de Mu demonstrações de poder sobre-humanas. Nesse dia ele resolveu, não sei porque, acelerar o treinamento... disse que Mu já estava grandinho para aplicar o extinction do jeito que ele Shion fazia...

– Que coisa bizarra!

– Eu sei que Dohko disse que não era uma boa idéia, porque o Mu tinha andado meio doente, gripado, coisa de criança, mas ele estava fraquinho e também porque Mu ficava sempre muito nervoso com os chiliques do Shion, os dois tinham essa mania de serem todos perfeitinhos o tempo todo...

– Sim, mas o que houve?

– A arena encheu, todo mundo queria ver Mu e o 'famoso' golpe. Não deu outra... Shion tanto fez que o cosmo do Mu explodiu de uma vez só, o golpe saiu com uma força absurda, derrubou tudo que tinha pela frente... só que...

– Só que o quê, desembucha, criatura!

– Só que ele não parou! Ele não conseguiu parar! O cosmo ficou fervendo, queimando, o golpe em progressão, Shion ficou com medo de segurar o Mu porque, ele estava fora de controle, foi um desespero... você sabe: se o cosmo não para de queimar...

– Ele queima até sugar a sua força toda... até morrer...

– Foi isso que Shion começou a gritar, mas ninguém sabia o que fazer, àquela altura só uma meia dúzia de muito corajosos ainda estava l�, e Dohko surgiu do nada com um porrete do tamanho de um homem e deu três pancadas na cabeça do Mu para ver se desacordado ele conseguia parar o golpe!

C'est terrible!

– O Mu caiu, mas nem assim o cosmo dele parou de queimar... eu nunca me esqueço, foi uma cena de cinema, uma coisa horrível, ele tremia, sabe? Como se estivesse tendo uma convulsão, aquela luz dourada do cosmo vibrando, chegava a fazer barulho. Shion se teletransportou para Star Hill, junto com Mu e Dohko e sumiu. Eu, como era muito amigo do Mu, conseguia circular por lá sem maiores problemas, mesmo o Shion tendo proibido que a gente se aproximasse. Eu sei que Mu ficou dois dias inteiros desacordado, e só no finzinho do primeiro dia o cosmo dele parou de queimar mesmo, de vez. Eu espiava pelas frestas das paredes... o Mu peladinho em cima do tampão de mármore onde o Shion consertava armaduras... o Shion chorando, o Shion colocando o Dohko pra fora, dizendo que nunca ia perdoar ele se o Mu morresse, por causa das pancadas... eu nunca tinha visto Shion levantar a voz, Milo!

– Eu não conheci ele, Aioria...

– Ele era um Mestre como nunca mais vamos ter igual... ela falava baixinho, nunca levantou a voz. Mas ele tinha um poder nos olhos, uma força, as pessoas se borravam de medo dele... eu e as outras crianças, pelo menos... no dia em que Dohko saiu de l�, expulso por Shion, ficamos todos em pânico, morrendo de medo.

– Meu Zeus...

– Quando o Mu abriu os olhos, Shion saiu da sala do Mestre, com aqueles olhos saindo faísca, e gritou, Milo, você não tem idéia do horror que nós sentimos quando Shion, Shion que falava pra dentro, GRITOU com a gente! Ele disse "NÃO SERÁ PERMITIDO QUE NINGUÉM, EM HIPÓTESE ALGUMA, MENCIONE QUALQUER COISA SOBRE O ACIDENTE, ENTENDIDO? A PUNIÇÃO É A EXPULSÃO IRREVOGÁVEL E IMEDIATA DO SANTUÁRIO PARA SEMPRE SOB A ACUSAÇÃO DE TRAIÇÃO. ISSO VALE PARA TODOS, FUI CLARO?"

Mon Dieu... Shion era direto... e fascista.

– O que mais se podia fazer? Foi isso. Shion proibiu Mu de tentar o golpe e se concentrou em ensinar o ofício de mestre ferreiro pra ele. E ninguém tocou no assunto... até Shion morrer.

– Então Mu nem tentou depois disso?

– Ele ainda tem a marca da fenda que ficou na cabeça da pancada que Dohko deu nele. Acho que ele não ia tentar sozinho...

– Mas os outros golpes...

– Ele sabe todos. E sabe o extinction também... para mim, foi a paranóia do Shion que deixava o Mu sempre tenso nos treinamentos. Acho que ele ia conseguir agora, sem Shion por perto para servir de comparação... ter por comparação o grande mestre é no mínimo... estressante.

– Aioria... o Shion era isso tudo mesmo que dizem que ele era?

– Nunca houve nem vai haver cavaleiro como ele, Milo. Ele era invencível e só foi derrotado porque confiava nas pessoas que o mataram. Ele foi traído. – Aioria olhou para Milo, coçando os braços em ansiedade. – O que houve, Milo?

– O mestre pediu que Camus lutasse com Shaka pela armadura de ouro de virgem.

– Mas por que ele ia querer isso?

– Não sei. Só sei que não vou deixar meu Camyu se bater com aquele homem esquisito por causa de uma armadura que nem pertence a ele.

– Mu sabe?

– Foi ele que me avisou.

– Onde eles estão?

– O combate será na arena central superior.

– Então vamos procurar a confusão onde ela está.

-x-

– Shaka, você sabe o que está fazendo?

– Acho que já discutimos isso, Mu. – Shaka arrumava os panos da sua túnica branca. Apesar de nunca Mu ter reparado nenhum sinal de aparente vaidade em Shaka, ele parecia estar sempre impecavelmente penteado, as sobrancelhas bem desenhadas muito alinhadas, o terceiro olho reluzindo, na mão direita as contas de madeira maciça avermelhada do juzu, o rosário budista que carregava consigo sempre.

– Não me olha nos olhos por que?

– Não faz diferença, meus olhos estão fechados.

– Mas você vê. E não quer me olhar nos olhos.

Shaka escolheu seu tom de voz mais delicado, doce e suave:

– É para que você não pense nem por um segundo que sou como a gente imunda com a qual você anda tão satisfeito, Mu...

O cinismo premeditado de Shaka era mais dolorido do que as palavras que ele escolhera e do exagerado reforço de imunda e satisfeito.

– Eu não compreendo.

– Compreende sim. Lascivo e imoral você pode até ser, mas jamais o teria na conta de pouco inteligente.

Mu estava mais branco do que de costume.

– Continuo sem compreender.

– Ora, Mu, nunca pensei que fosse tão obtuso a ponto de ter de inform�-lo que me dá asco seus relacionamentos 'corpóreos' com esses rapazes afeminados do Santuário, que de santo nada tem senão o nome. É vergonhoso que, à serviço de Athena, esteja gente capaz de baixeza tal. A pureza e a honradez deviam ser virtudes a priori de qualquer cavaleiro, não lhe parece?

– Sim, me parece. – Mu engoliu as lágrimas. Podia ouvir a voz infantil e estridente de Shina "ele não é como nós!". Junto dela, a voz suave, quase sussurrada de Shion retumbava "não chore ou soluce. Para cada gemido de dor que soltar, lhe darei mais cinco lambadas de vara. Estou educando seu caráter para a vida... ninguém terá piedade de você no mundo, meu filho." Shion, mestre! Como o senhor tinha razão! Não têm piedade as pessoas do mundo, não têm!

– Então?

– Parece-me que é uma incoerência muito grande a sua alta conduta moral em relação ao sexo, mas a sua pouca resistência em destrinchar um homem pelos caprichos do nosso atual comandante.

– Parece? Não vejo a incoerência. Se de todos vocês, eu sou o único que sou capaz de alcançar o oitavo sentido, nada mais justo que eu esteja de posse de uma armadura e nada mais justo ainda que eu a obtenha, não importa de que maneira. Você sabe o que dizem, os fins justificam os meios.

"O oitavo sentido..." Mu pensou nervosamente para si. "Shion alcançava o décimo segundo sentido... e eu só cheguei ao sétimo... mas poderia ter chegado a ser como Shion... ah! Eu poderia!"

– Shaka, não é justo que sangue de um inocente como Camus seja derramado por tão pouco.

– Não existe homem inocente, Mu. Admira-me que ainda pense assim.

– Minha armadura de Áries não vale a vida de um homem.

– É por isso que o chamam de "menina chorona".

– Não, me chamam de menina chorona porque invejam a posição que sempre tive enquanto o homem que me chamava de filho, que era – só para comentar – imensamente mais poderoso que você, era o Mestre legítimo deste Santuário e o servo maior de Athena.

– Um servo que se dava ao desfrute com um outro servo de Athena – um fujão – e que está morto.

– Vai engolir o que disse.

Shaka deu uma das suas risadinhas sarcásticas que tanto irritavam Mu.

– E que exército de cavaleiros de Athena fará com que eu engula as minhas palavras, Mu? E que servo de Athena poderia dizer que manchei minha língua com uma calúnia? Shion acaso não se deitava com um outro homem no lugar sagrado que devia proteger do mal e da sujeira do mundo? E também este não fugiu daqui quando seu mestre morreu? É mentira? Minto? Se estiver mentindo, ponho-me de joelhos ao chão e imploro o seu perdão... é mentira?

Mu estava trêmulo de ódio.

– Você é tão baixo, tão sórdido e tão pequeno, Shaka, que consegue manchar até o que é sagrado!

– Sagrado? O que há de sagrado em corpos de homens esfregando-se por prazeres da carne tão baixos e primários que são instintivos para os animais? Chafurdando nos prazeres corruptos do mundo e desviando energia cósmica preciosa com fins menores! É inadmissível comportamento assim em homens superiores! Se queremos servir aos deuses devemos nos parecer com eles!

– Eles entregavam-se ao amor, mas eu não esperaria que você entendesse uma coisa assim, porque está bem visto que você não tem a mais tênue idéia do que seja amor e é bem capaz que jamais tenha sido amado por ninguém!

– E nem pretendo ser amado por uma criatura suja como...

– Como eu?

– Como você, Mu! Você é sujo e corrupto debaixo dessa sua fantasia de anjo barroco!

– Eu?

– É! Agora percebo porque Shion nunca corrigiu sua conduta e postura! Ele o fez propositadamente frágil e belo como uma fada para que sua beleza inocente seduzisse desavisados! Mas eu tenho um cosmo superior e jamais me permitiria chegar tão baixo e deitar por terra anos de treinamento por um momento de luxúria que ia me enfraquecer e me tornar indigno perante os deuses!

– Você já é indigno! Um homem como você não poderia vestir uma armadura!

– Vou merecer minha armadura e não tom�-la por hereditariedade de um morto!

Mu sentiu as forças do seu cosmo fraquejarem. Era dor como poucas vezes sentira, a dor da pancada de Dohko, dor... dor...

– Insinua que não mereço minha armadura?

– Não sou covarde. Eu DIGO que não merece sua armadura.

– Eu a dou a você com gosto se me derrotar ao invés de lutar com Camus!

– Está ansioso para morrer... eu sei! Mas não serei eu a livrar você do peso da vida! Eu quero Virgem! Eu serei e já sou Cavaleiro de Virgem!

– Não lute com Camus!

– Está com medo de que eu mate o amante do seu amiguinho? Ou ele também já se deitou com você, Mu?

Mu levantou a mão para estape�-lo, mas Shaka segurou o punho delicado do ariano no ar. Sentiu que Mu então elevou seu cosmo, um cosmo de uma força que ele nunca tinha sentido antes exceto no seu mestre, ardendo e queimando por igual. Levantou seu cosmo também. Ambos os cosmos brilhavam, Shaka sentia o peso da força sobre sua mão e Mu também sentia, um peso puxando sua mão para baixo. A voz de Shion na sua cabeça "Exploda e concentre. Não espalhe. Concentre. A força em um ponto só, fulminante." Forçou o seu cosmo desordenado e poderoso para seu braço de maneira que apenas seu braço brilhava como um sol. Shaka caiu, derrubado pela firmeza do cosmo concentrado nas mãos de Mu.

– Não porá sua mão suja em Camus.

– É o que veremos.

Mu desapareceu no ar.

-x-

– Onde está Camus?

– Ele já vem, Mestre Ares.

– Ah, hoje será um belo dia.

– Acha que o estranho vencer�, Mestre?

– Que me importa? De qualquer maneira, veremos quem são os bons. Um cavaleiro de Athena deve ser sempre o melhor. Que lutem! Que fique o melhor de pé! Em uma batalha de verdade não há regras, nem leis! Vence o mais forte somente! É para isso que estou aqui: escolher os fortes para proteger Athena...

– O seu trono já foi preparado, Mestre.

– Onde está o traidor?

– Mu, mestre?

– E por acaso há outro traidor?

– Ele foi visto pela manhã conversando com Milo. Mas ainda não chegou.

– Shaka?

– Está lá embaixo, veja. Medita antes da luta.

O mestre sorriu.

– Sim, nosso mongezinho... será útil para nós. É forte... a cosmo energia dele é sentida ainda que ele esteja em repouso... será um reforço aos nossos cavaleiros mais antigos...

-x-

O tempo passou e logo Camus surgiu. Milo sentiu seu coração se despedaçar ao ver Camus orgulhoso e firme, brilhante como um deus, trajando sua armadura dourada. Teve pânico ao vê-lo, lembrou-se imediatamente de Mu, pupilo do Mestre que todos diziam ser um homem invencível... invencível e morto. Também ele, Milo, achava que Camus era invencível. Logo atrás de Camus ele viu a esbelta e delicada figura de Mu, logo em oposição à Shaka que surgia do outro lado da arena e viu também Aioria surgir.

– Oh, mas que reunião adorável! – debochou Ares. – Mais gente vai ter o privilégio de ver meus melhores cavaleiros lutando. Shaka! Veja! Ele brilha a ouro! esta tarde, sob o corpo de Camus, você estará brilhando em dourado também! Ou não! Pode ser que Camus brilhe menos por causa do seu sangue nele...

– A visão do sangue deve ser agradável aos seus olhos, não, Mestre Ares? – a voz de Mu tinha a mesma característica da voz de Shion, baixíssima, mas tão finamente projetada que parecia ser um sussurro no ouvido até dos que estavam mais distantes.

– Agradável não diria, mas necessária. Muitos antes de mim não pensavam assim, e veja o resultado! Temos cavaleiros aqui que jamais presenciaram uma morte. Não queremos meninas choronas entre os defensores de Athena, não é Mu?

– Não... mas Camus não precisa sujar nem seu manto nem sua armadura, eu mesmo posso mostrar ao nosso visitante ilustre o resultado do treinamento de "meninos chorões" dos mestres antigos.

– Ora, ora! Mas quanta coragem! Mostre para Shaka o que você pode fazer! – Ares esfregou as mãos de satisfação. Tinha certeza absoluta de Shaka podia derrotar Mu, e o agradeceria pela eternidade se o fizesse.

– Não... – Mu respondeu, ante a expressão de nulidade absoluta da face de Shaka. – Ele é que precisa provar alguma coisa! Eu sou cavaleiro de ouro, e sou pupilo de Shion. E esta – ele puxou a bainha que Aioria lhe trouxe – É a espada de Shion. A minha espada agora.

– Ladrão! Esta espada pertence ao Santuário e à armadura de Libra!

– Deixe que eu refresque sua memória, mestre: Shion a deixou para mim. É minha. E sabe muito bem que se não fosse assim, a espada não me aceitaria como seu dono, e não me seria permitido us�-la. Veja como brilha! – havia um brilho sádico, misto de orgulho e revanche nos olhos de Mu. – Brilha nas mãos do cavaleiro que ela escolheu para empunh�-la. E ninguém poderia manejar a espada de ouro melhor do que eu. Palavras de Dohko, a quem Athena já havia confiado a guarda das armas do Santuário.

Ares usava uma máscara que lhe ocultava o rosto; mas não era preciso ver suas expressões faciais para perceber a fúria na sua voz de trovão, contrariado como estava, ele que desejava tenaz e brutalmente a posse sobre as armas douradas. E ver nas mãos de Mu, aquela que era a menina dos seus olhos, a espada de Shion, a mais mortal das armas que Athena havia permitido aos seus cavaleiros do zodíaco, fazia seu sangue ferver de ódio. Aquela criança élfica atrevida tivera não apenas a petulância de sobreviver à guerra santa, mas ainda apossara-se do legado de Shion... engoliu sua fúria – afinal, tinha um Santuário para governar – e replicou:

– Que seja. Se o futuro cavaleiro não se opuser... você se opõe, Shaka?

– Absolutamente. – Shaka respondeu, a voz serena e calma.

– Mas eu não aceito! O que deu em você, Mu? Está louco? Eu posso muito bem me defender sozinho! – Camus protestou, indignado, para desespero de Milo.

– Essa não é a questão. – Mu pôs as mãos sobre os ombros da armadura de ouro de aquário. – A questão é que nunca disputamos armaduras.

– Eu cuido disso. – Camus afastou Mu delicadamente. Shaka apenas ergueu seu dedo indicador. Esperava pelo golpe de Camus; Aquário fez menção de levantar os punhos para um trovão aurora. Quando a descarga de gelo fluía de suas mãos, Shaka apenas moveu o indicador para que o golpe voltasse, e o gelo das mãos de Camus retornou para ele. Camus fechou os olhos esperando que sua própria rajada gelada o atingisse em cheio no peito, mas o que sentiu foi apenas algo morno, macio e perfumado contra seu corpo. Era Milo.

– MILO! Milo! Fale comigo, fale! – Camus balançou delicadamente o corpo do amante, que havia heroicamente atirado-se na sua frente, aparando o retorno do golpe. – Milo seu imbecil! Se este golpe não machucar você, eu juro que prendo você num esquife para sempre por ser tão cabeça dura... anda... não me envergonha na frente dos outros... – Camus estava a ponto de chorar. – Não me faça chorar como uma menina... por tudo que é mais sagrado, filho...

– Não sou seu filho e não levante minha cabeça... – Milo gemeu. – Eu devo estar descabelado e roxo... não levante minha cabeça até chegarmos em Aquário!

– Milo, seu... seu! Seu grandessíssimo idiota! Por que fez isso? – Camus perguntava, beijando suavemente os cabelos espalhados de Milo sobre seu peito brilhante e armado.

– Ele ia matar você... e eu não podia deixar...

– Milo! Criança tola!

– Amo você, gelinho... mon petit amour...

– Amo você também, seu menino bobo...

– Ora, ora... que demonstração mais afetada de companheirismo dos meus cavaleiros! Lindo! Mas não é o bastante! – Ares proclamou do alto do seu trono. – Um dedo para reverter um golpe! Muito bem! Enfrente Mu agora! Enfrente-o, Shaka! Se Mu estiver morto no chão desta arena até o poente, terá sua a armadura!

Aioria sacudiu vigorosamente os ombros de Mu, contraídos de susto pelo incidente com dois dos seus melhores amigos.

– V�, Mu! Mostre para esse desgraçado! Mostre para todos eles quem você é! Você não é covarde! Você é aprendiz do melhor cavaleiro que já viveu! Você é pupilo de Shion de Áries, o grande Mestre, mostre para eles! Passe essa espada no bucho desse maldito!

Mu levantou a espada de Shion. Ela parecia arder em chamas cósmicas quando o sol atravessava a lâmina de ouro amarelo e branco.

– Avance, Mu. – desafiou Shaka. – Faça o que tiver de ser feito.

Mu sentiu-se tomado de um ímpeto e uma ferocidade que nunca antes experimentara. Avançou como um viking raivoso sobre Shaka, a espada em punho, e viu os lábios de Shaka começarem a pronunciar algo... algo que começava com 'tembo'... ah! Um golpe... Mu sabia o que fazer. Avançou sobre ele veloz e quando os lábios dele começaram a pronunciar o resto do golpe, Mu desapareceu no ar. Antes que Shaka conseguisse perceber o cosmo de Mu, sentiu a lâmina gelada da espada no seu pescoço, o corpo de Mu contra o seu, atrás de si.

– Podia sangrar você como um porco agora.

– Podia. – Shaka permanecia sereno, quase que feliz, sentindo-se inteiramente à mercê de Mu. O braço delicado do ariano ao seu redor. Pendeu a cabeça para trás, roçando-a com um prazer imoral contra o peito de Mu, acomodando melhor seu pescoço alvíssimo contra a lâmina da espada. Percebeu que os olhos de Mu estavam apaixonadamente fixos nas suas pálpebras fechadas. – Mu, eu podia abrir meus olhos...

– E que tem isso?

Shaka segurou a lâmina da espada, afastou-a do seu pescoço, apenas o suficiente para abaixar a cabeça, até mirar um aprendiz de cavaleiro imenso, que devia medir ao menos uns três metros. Abriu os olhos lentamente, sentindo dor com o excesso de luz. O homem recebeu o olhar de olhos azuis claros como se recebesse um choque de centenas de milhares de volts. Caiu fulminado, membros enegrecidos, retorcendo-se e babando sangue por angustiantes minutos, até parar de se mexer e os olhos girarem nas órbitas, como se, mesmo morto, seu espírito padecesse a mesma dor que o matara. Aterrorizados, os cavaleiros e aprendizes observavam a destruição de um mero olhar do estranho. Ares sorriu. Ele olharia Mu nos olhos. O maior obstáculo ao seu reinado sobre a Acrópole estaria fulminado. Aquele homem poderoso seria seu cavaleiro...

Mu, trêmulo, continuou segurando Shaka, com a espada empunhada.

– Por que não me olha, Shaka?

– Quer que eu o mate, Mu?

– Temos um problema agora: você quer a armadura. E eu quero me vingar.

– Vingar-se de mim?

– Sim, de você também.

– Mu, eu já poderia...

– Eu sei – sussurrou Mu. – Já poderia ter me tomado a espada... – ele olhou para o próprio punho, onde seus dedos seguravam lassos a espada dourada.

– Eu não quero matar você.

– Eu também não.

Shaka fez um movimento brusco, tomou a espada da mão de Mu. Olhou para o mestre em seu trono e atirou a espada nos pés de Mu.

– Eu já provei mais de uma vez que sou merecedor da armadura. É contra todo o ensinamento que recebi atacar uma mão que já me foi estendida; é sabido que a ingratidão é das mais abomináveis falhas para os deuses.

Mu abaixou-se e tomou a espada de volta. Sabia muito bem que Shaka não acreditava naquilo, e que teria arrancado a mão que o alimentava com um único golpe, preciso fosse. Mas ele não queria mat�-lo. Não soube ali se aquilo era bom ou ruim – sentia alívio apenas, por não precisar defender-se dele ou atac�-lo.

Ares, indignado, pronunciou-se;

– Shaka, você pode ficar em Virgem de hoje em diante. Eu o avisarei, quando a cerimônia de entrega da armadura estiver pronta. Suas 18 virgens sairão do templo de Diana em Éfeso. Estarão aqui em alguns dias. Até l�, as criadas de Star Hill arrumarão a casa para que se instale.

Shaka fez uma meia reverência discreta, porém, jamais abaixava a cabeça, fazia um meneio discreto.

-x-

O mestre se retirou, mas a Arena continuou lotada.

Mu e Shaka também não foram embora. Os gritos de 'Luta, luta' ecoavam pela arena.

...continua


Nana: sanguinária, esse capítulo tem sangue até em excesso para você se divertir. Está grande e grande por eu ter demorado a atualizar. Quanto à sua fic de MuxShaka, estou lendo e dando os meus 'pitacos'. J�, já você receberá o arquivo de volta com meus comentários!

Lili Psique: Como eu sou uma criatura monstruosa dos Tártaros, nada de beijinhos por enquanto... afinal, nada como torturar o carneirinho e o meu queridinho budista... hehe. Ah, claro, obrigada pelos comentários, fico feliz e lisonjeada! Este foi uma capítulo beeem longo também...

Dark Lien: Olha aí, não deu em nada a luta em Camus e Shaka, foi só mais uma oportunidade sórrrrdida de explorar ao amorzinho meigo dele e do Milo! ( ah, eu sei que não presto! ).

Mikage-sama: Minha camarada de MSN... tadinho do Mu duplamente! Além de ficar na seca porque o Shakinha é virgem, ainda tem que aturar o mal humor da criança... fazer o quê, né? A rapadura é doce, mas não é mole não!

Ilia-Chan: Mushakismo é uma febre contagiosa, mais contagiosa e mortal que a gripe espanhola! E sim, Dido é mal, mas não tanto... e o Shaka é arrogante demais. Eu sempre gostei de imaginar ele assim: tão preocupado com sua 'divindade' que se esquecia de olhar para os lados.

Ia-Chan: pronto, menina! Eles reagiram e agora o bicho vai pegar no santuário...obrigada pelo review, estou muito contente!


Meninos e meninas más que lêem e não postam review: A Tia Verlaine também ama vocês! Nhé! É verdade! Tímidos e tímidas e preguiçosos meu Brasil varonil, eu vos compreendo! Vinde a mim! Beijocas!