Laços de Sangue

Parte Três

Arashi caminhava de um lado para outro em seu quarto, não conseguia evitar aquela horrível sensação de claustrofobia. ' Não importa o lugar, porão ou um luxuoso quarto, depois de mais de algumas horas presa dentro dele a sensação de que ele está diminuindo a cada segundo é inevitável' Ela queria gritar de frustração, quase uma semana havia se passado e ela não encontrara uma maneira de deixar o palácio sem ser notada. Ou os guardas ficaram mais espertos repentinamente ou Inu no Taisho estava realmente empenhado em enlouquecê-la. ' A segunda opção é a mais provável' Reconhecera o cheiro do marido parado no corredor por diversas vezes ' Maldito seja ele e toda sua linhagem!'

- Meu pai chega amanhã! – Ela parou de repente no meio do espaçoso quarto e caiu de joelhos, escondendo o rosto nas mãos – Eu não tive a chance de fazer nada! NADA!

'Eu só precisava sair uma vez... umas poucas horas e tudo estaria terminado' Ao menos dos problemas atuais, se não estivesse tão desesperada para criar uma distração para Sesshoumaru e Inu no Taisho não teria feito o pagamento dos yokais com as jóias de casamento.

'Na verdade, eu teria sim... abominava aquela coisa' Um sorriso curvou seus lábios ao lembrar da satisfação ao entregar o presente de casamento ao yokai que contratara, mas a conseqüência de seus atos logo lhe voltou a mente e ela voltou a ficar séria ' Vou me vingar de todos esses idiotas, não importa o que tenha que fazer.' Pousou as mãos no colo calmamente, alisando o tecido fino do quimono ' Preciso fazer algo, matar Haru... ver o sofrimento no rosto prepotente de Sesshoumaru!' Socou o chão com força com um gemido frustrado por nada acontecer como tinha planejado ' Preciso me vingar dos dois antes que seja tarde demais'

Voltou sua atenção para a janela ao ouvir o barulho de cavalos aproximando-se. 'Não! Eles não podem ter chegado'

- Não! Ele está adiantado! – Levantou de um pulo, correndo para a janela, debruçando-se sobre o parapeito tentando enxergar sobre as muralhas, mas o som vinha da floresta e Arashi não conseguia identificar quem eram os visitantes.' Não posso partir... Não agora, sem me vingar de nenhum desses adoradores de humanos!' Apertou o beiral da janela com força o suficiente para que suas juntas ficassem brancas, praguejou baixinho quando viu o marido sair do castelo para saudar os recém chegados – Vão embora! Vocês só devem chegar amanhã!

Seus gritos atraíram a atenção dos servos que se encontravam no pátio, mas ela não se importou até encontrar o olhar frio de Inu no Taisho, que transmitia uma clara e silenciosa ordem para que ela parasse com aquilo. Por alguns segundos teve vontade de permanecer ali e continuar gritando, mas sabia que aquilo apenas pioraria sua situação. Suspirou dando-se por vencida' Eles realmente chegaram...' Afastou-se da janela relutante, o sangue pulsando em seus ouvidos enquanto via suas chances diminuírem mais a cada segundo que passava ' Eu não posso partir...' Encostou-se na parede fria e deixou-se escorregar para o chão ' Eles têm que pagar...'

- Isso não é justo...Ainda não tive a chance de matar Haru...

0

Haru apagou a ultima vela que iluminava o cômodo, tinha visto os yokais passando pela estrada que levava ao castelo. 'Mais um dia.' Pensou com um sorriso ' Apenas mais um dia e poderei vê-lo todos os dias novamente'. Sentou em sua cama improvisada ao lado da lareira e ficou admirando a suave dança das chamas, sentia falta de Sesshoumaru. A última vez que o vira fora naquela noite que haviam passado juntos, fora a primeira vez que sentira-se realmente feliz e tranqüila.

FlashBack

Quando abrira os olhos na manhã seguinte não o encontrara mais a seu lado, por alguns minutos permaneceu deitada frustrada por pensar que aquilo não passara de um sonho. Sentou na cama lentamente, xingando-se mentalmente por ser tão tola perdendo o tempo com sonhos que nunca se tornariam realidade. 'Sesshoumaru é apenas um amigo, ele nunca me verá de outra forma a não ser...'' seus pensamentos foram cortados por batidas fortes na porta.

- Um minuto... – Levantou rapidamente, pegando o quimono cuidadosamente dobrado a seu lado e o vestindo a caminho da porta. – Desculpe, eu... – Fechou os olhos, momentaneamente cega pela luminosidade intensa do sol ' Quanto tempo eu dormi?'

- Sesshoumaru-sama mandou que eu lhe entregasse isso. – A voz esganiçada e desconhecida fez com que ela abrisse os olhos novamente. Olhou com curiosidade o pequeno yokai parado na soleira de sua porta.

- Sinto muito, o que disse?

- Isso é seu. – O sapo yokai empurrou um rolo de pergaminho para suas mãos e deu meia volta impaciente – Tenha um bom dia – Murmurou a contra-gosto.

Haru concordou com um aceno, ainda surpresa com aquilo. Esperou até que o pequeno yokai desaparecesse antes de fechar a porta e olhar para ' a entrega' em suas mãos. A folha era de qualidade, observou enquanto a desenrolava cuidadosamente, e a caligrafia desconhecida primorosa.

' Haru,

Sinto muito por ter saído antes que você acordasse, mas achei que não seria uma boa idéia que os aldeões me vissem saindo de sua casa logo pela manhã. Já tenho problemas demais para enfrentar, não quero ter que me preocupar com sua segurança quanto a sua própria raça também.'

- Então não foi um sonho! – Ela sorriu apertando o papel contra si – Ele ficou comigo a noite inteira... – Com relutância, deixou seu 'tesouro' sobre a mesa e afastou-se para colocar água no fogo antes de sentar-se novamente e continuar com a leitura.

' Eu tinha pensado em voltar à tarde para que conversássemos melhor, mas alguns imprevistos surgiram aqui no castelo. Ao que parece ficarei impossibilitado de vê-la durante alguns dias.

Espero que não tenha se assustado com Jaken, ele pode não ter uma aparência muito agradável aos olhos e uma 'delicadeza' peculiar, mas... serve aos propósitos. É fiel a mim desde que salvei sua inútil existência.'

A garota baixou o delicado papel novamente, rindo com aquela descrição do pequeno yokai, ele realmente tinha parecido forçadamente 'educado', provavelmente uma tentativa de seguir as ordens de seu mestre.

' Estou escrevendo esta carta apenas para que você não pense novamente que eu a abandonei por causa de outra cabeça-oca que minha 'adorável' mãe arrumou. Fico feliz em lhe informar de que isso logo irá terminar, nos livraremos de Arashi permanentemente dessa vez ao que tudo indica.

Se as coisas demorarem mais do que o previsto eu voltarei a lhe escrever, mas o provável é que no máximo em duas semanas tudo esteja terminado.

Aguardarei ansioso até esse dia.Temos muito o que conversar, pequena Haru. Coisas importantes que eu escondi de você por tempo demais. Tenho esperança de entrarmos em uma relação diferente e acho imprescindível que haja confiança e para tanto eu preciso lhe contar toda a verdade.'

- Coisas importantes que escondeu de mim? – Ela repetiu em voz alta, confusa com aquelas palavras. Tudo o que sabia de sua vida ela devia a Sesshoumaru, não tinha lembranças verdadeiramente suas, tudo havia sido baseado nas palavras do jovem yokai. – Tolice... – balançou a cabeça, voltando sua atenção para as ultimas linhas.

' Até lá, Jaken tem ordens de vigiá-la. Acho que estará segura, mas mesmo assim não é bom abusar da sorte.

Qualquer problema, se algo estranho acontecer ou estiver com medo, procure por essa coisinha verde e marrom e mande-o me avisar imediatamente.

Vou protegê-la, Haru. Com minha própria vida se preciso for.

Fique tranqüila, até que possamos nos encontrar novamente Jaken será meus olhos sobre você.

Sesshoumaru'

Fim do FlashBack

- Eu preferia seus olhos sobre mim, meu lorde. – Ela murmurou enquanto as lembranças desmanchavam-se a sua frente dando lugar a visão do fogo novamente. Deslizou a mão para baixo do travesseiro pegando o pergaminho delicadamente, trazendo-o para junto do peito. Sorriu com a infantilidade do ato, mas o abraçou mesmo assim. ' Já fiquei mais tempo sem vê-lo...só faz uma semana...' – Por que eu sinto tanta falta dele?

- Sente falta de quem?

Haru sentou de um pulo assustada com a voz masculina dentro da pequena casa, abriu a boca para gritar, sentindo o coração acelerar quando uma mão cobriu seus lábios rapidamente ' Não estava tão perto', fechou os olhos tentando pensar em como escapar e estava a ponto de morder o que a impedia de pedir socorro quando reconheceu a risada masculina.

- Fico feliz em saber que ao menos seus instintos são bons.

' Sesshoumaru' Sua voz saiu abafada pela mão dele transformando-se em um som irreconhecível, ela estreitou os olhos quando ele riu novamente e pensou em mordê-lo mesmo sabendo quem era ' Como ousa rir de mim?' Antes que pudesse concretizar seus planos, sentiu a mão se afastar e a brisa noturna atingir seu rosto quente.

- Idéias assassinas, Haru? – Sesshoumaru sentou ao lado dela, a uma distancia segura. Continuou a sorrir, observando o brilho dos olhos verdes a sua frente.

- Pare de rir de mim! – A garota levantou a mão, lentamente tocando os próprios lábios ligeiramente inchados pela pressão da mão dele. – Não tenho culpa se entrou aqui como um maníaco.

- Teria percebido minha chegada se não estivesse sonhando acordada com algum admirador secreto que adquiriu na minha ausência... – Ele respondeu calmamente, o sorriso morrendo em seus lábios ao lembrar da razão de tê-la assustado poucos minutos antes.

Parara do lado de fora da cabana e observara os arredores em busca de qualquer tipo de ameaça antes de entrar a tempo de ouvi-la murmurar sonhadora que sentia falta de alguém. Fizera a pergunta em voz alta sem perceber até vê-la pular na cama, teve apenas tempo de mergulhar no chão a seu lado e cobrir sua boca antes que ela acordasse todo o vilarejo.

- Admirador secreto? – perguntou confusa, então lembrou que estivera falando sozinha abraçada ao pergaminho que recebera e sorriu – Você me deixou sozinha por tanto tempo, qual o problema em fazer outros amigos?

- Uma semana, Haru. Eu estive longe por uma mísera semana. – Cruzou os braços na frente do peito – E deixei Jaken aqui para tomar conta de você... – ' Por que aquele inútil não me avisou que tinha alguém se aproximando dela?'

- Oh sim, minha nova sombra... – A garota suspirou desanimada – Não há um só lugar que eu vá que aquela pequena coisa verde não siga, tropecei nele algumas vezes...

- Como assim 'tropeçou'?

- Ele não pára de me seguir, não tenho olhos nas costas. Virei sem perceber, ele estava lá e acabei pisando nele. – Baixou os olhos desconfortável, arrumando as cobertas sobre as pernas – Ele me chama de 'garota desastrada' agora, como se eu tivesse culpa por... – Parou de falar ao ouvi-lo rir novamente, levantou os olhos para encontrar os dele e sorriu. – Meu sofrimento o diverte?

- Não exatamente. – Levantou uma sobrancelha quando algo rolou do meio das cobertas para o chão até encostar na lateral de sua perna. Viu os olhos verdes se abrirem em espanto e ela tentar pegar o papel rapidamente – Achei a fonte de seu segredo? – Sorriu triunfante quando pegou o pergaminho poucos segundos antes dela.

- Devolva!

- Claro... – Ficou de pé em um pulo quando ela tentou arrancar o papel de suas mãos – Depois que ler o nome da pessoa que escreveu isso.

- Pare, Sesshoumaru... – Ela tentou levantar rapidamente e caiu sentada novamente enroscada nos lençóis. – Devolva.

Sesshoumaru olhou rapidamente em sua direção, certificando-se de que estava bem antes de voltar sua atenção para o papel. Ignorou o suspiro frustrado da garota ao reconhecer sua própria caligrafia no papel, um sorriso curvou seus lábios ao compreender o sentido das palavras dela e do desespero em pegar de volta o pergaminho antes que ele o visse.

- Sentiu minha falta, Haru?

- Não! – Ficou de joelhos depois de livrar-se das cobertas e puxou o pergaminho de suas mãos – Você é detestável, pior do que aquele sapo verde que arrumou para me seguir! – Jogou o pergaminho embaixo do travesseiro antes de sentar novamente sem conseguir encará-lo.

-Sinto muito por constrangê-la, Haru – Sesshoumaru ajoelhou-se a seu lado, tocando o rosto delicado carinhosamente – Ajuda se eu disser que também senti sua falta?

- Sentiu? – Ela levantou os olhos lentamente, sentindo a leve pressão que os dedos dele faziam em seu queixo.

- Sim, senti – Ele deu um pequeno sorriso – Vim vê-la no meio da noite, não foi?

- Sua mãe está melhor? – Haru perguntou tentando disfarçar a satisfação que aquelas palavras lhe causaram.

- Como? – Ele perguntou confuso.

- Na carta, você disse que não podia vir porque ela—

- Arashi não está doente. – Ele a cortou rapidamente - Meu pai finalmente obteve provas de sua traição, ela voltará ao clã do Norte amanhã.

A garota concordou com um aceno, sem realmente entender aquilo. 'Traição?' A Senhora do castelo estava sendo expulsa?

- Você deve estar triste, sua mãe...

- Estou aliviado, ela deveria ter partido há muito tempo atrás. – A conhecida expressão indiferente escondeu as verdadeiras emoções do jovem yokai – Teria poupado muitos problemas, mortes desnecessárias... – Flexionou os dedos distraidamente, atraindo o olhar da garota para as juntas delicadas que estalavam a cada movimento.

- Não vai sentir falta de sua mãe?

- Ela só causou destruição, Haru. – Os olhos dourados encontraram os dela e a frieza diminuiu um pouco – Acabo com as chances que eu poderia ter de uma infância normal... Acabou com sua... – Parou de falar de repente e levantou rapidamente. – Todos ficarão melhores com minha 'adorável' mãe longe daqui.

- Ela não pode ser tão má.

- Você não sabe de nada! – Ele a cortou rispidamente, fechou os olhos virando-se de costas ouvindo o roçar dos lençóis quando a garota se encolheu. – Não foi uma boa idéia vir aqui, voltarei quando Arashi estiver longe daqui.

- Não... tudo bem... – Ela murmurou desconfortável – A culpa foi minha, você não queria falar sobre isso e eu—

- Você não tem culpa, Haru. – O jovem yokai fechou os olhos por alguns minutos antes de caminhar em direção a porta – Não sabe o que aconteceu no passado e se quer saber acho que isso é uma coisa boa.

- Tem a ver com a conversa que disse que precisávamos ter? – Ela piscou quando o viu estacar no meio do caminho, parecia tenso novamente. Suspirou desanimada com o silencio, ao que parecia Arashi não era um bom a assunto para que conversassem, ele estava indo embora novamente. Baixou a cabeça, sem querer vê-lo partir.

- Sim... – A voz masculina ressoou no aposento atraindo o olhar da garota – Arashi matou algumas pessoas no passado. – Fez uma pausa sem conseguir continuar 'O que está havendo comigo afinal?' Podia sentir o coração batendo acelerado, sua voz estava falhando ' Estou com... medo?' Balançou a cabeça, afastando tais pensamentos e forçou-se a continuar. – Ela não queria que eu me envolvesse com humanos, então...

- Ela os matou. – um sorriso curvou os lábios delicados da garota quando o viu se virar espantado para encará-la a poucos centímetros de distancia. – Não precisa falar sobre isso se não quiser, Sesshoumaru.

- Vou voltar ao castelo. – Desviou os olhos da garota, não conseguindo entender como ela havia se aproximado sem que percebesse. – Conversaremos disso...

- Não quer passar a noite comigo? – Ela baixou a cabeça quando ele a encarou, espantado com suas palavras, sua intenção era apenas impedi-lo de se afastar tão depressa, mas soara tão estranho. Apertou as cobertas nervosamente e perguntou baixinho – Eu quis dizer... dormir aqui como na outra noite.

- É isso o que quer?

- Quero que fique comigo e... – Levantou os olhos para encontrar os dele, piscando para afastar as lágrimas – Não me faça chorar novamente...

- Sou a causa de suas lágrimas? – Ele perguntou em um misto de surpresa e tristeza. Vira Haru crescer, presenciara fatos que deixariam qualquer outro humano chorando por horas e mesmo assim ela enfrentara corajosamente as situações, sempre com um sorriso nos lábios.' Prometi a mim mesmo que a protegeria, que não deixaria esses olhos verdes serem embaçados por lágrimas e agora... eu sou a causa?'

- Não. – A voz feminina fraquejou enquanto ela enxugava as lágrimas teimosas disfarçadamente – Sua partida é a razão.

- Quero ficar com você! – Ela falou mais firmemente. Era algo tão simples, por que não conseguia fazê-lo compreender e ficar a seu lado? - Vou chorar se você me deixar... – Levantou a cabeça, um pequeno sorriso curvando os lábios delicados – Agora ou depois. Você tem que ficar comigo.

- Tenho é? – Ele sorriu de volta, as palavras quase infantis da garota tendo um efeito calmante em seu peito.

- Sim, você é meu. – Estremeceu quando os olhos dourados encontraram os seus, uma sensação estranha que aqueceu todo seu corpo. – Vai ficar comigo? – Piscou embaraçada, forçando-se a permanecer parada quando o rosto dele aproximou-se do seu, sentiu seu coração acelerando novamente quando a respiração dele tocou sua pele. – Sesshoumaru...?

- Sim, eu vou. – Acariciou a curva delicada de seu queixo, os dedos afundando na massa de cabelos negros delicadamente – Como você mesma disse, eu sou seu.

0

Arashi permaneceu sentada no parapeito de sua janela por toda a noite, viu quando o vulto branco deixou o castelo e por pouco não conseguiu segui-lo. Os guardas estavam descuidados naquele pequeno momento em particular, conversavam com os recém-chegados animadamente, mas no segundo em que um sorriso iluminou suas feições e ela apoiou as mãos nos batentes para dar impulso, a porta do quarto se abriu e ela teve que disfarçar estar observando os telhados antes de voltar-se para encarar o marido.

Horas haviam se passado desde aquela chance perdida, Sesshoumaru não retornara e os guardas estavam em suas posições novamente, mais alertas do que nunca. Ao que tudo indicava, Inu no Taisho não caíra em sua encenação. Os perfeitos olhos dourados encaravam a escuridão que cercava o castelo com atenção, queria ver o exato momento que o filho petulante cruzasse os portões. Maldito fosse, como ousava desafiá-la daquele modo?

' Eu nem parti ainda e ele acha que pode ficar fazendo 'visitas' àquela ...humana.' Estreitou mais os olhos em busca de qualquer movimento na floresta, um sinal qualquer que indicasse o retorno do jovem yokai, mas foi em vão. As arvores continuavam em sua lenta dança ao ritmo do vento e nada podia ser visto ou ouvido além dos sons da natureza. ' Ele devia temer a mim! Ficar no castelo e vigiar sua pobre e louca mãe!' Afundou as garras nas palmas com força, um sorriso curvando seus lábios ao imagina que era o corpo de Haru que suas afiadas garras penetravam 'Não há motivo para sentir paz, esperança ou amor! Sua Haru vai acabar em breve, querido filho'

Arashi recostou-se a parede fria de pedras, os olhos pesavam, mas ela continuava alerta ao que acontecia a sua volta. ' Resta tão pouco tempo...' A frustração que tais palavras lhe traziam era quase insuportável, todos ficariam felizes com sua partida enquanto ela amargaria o castigo que seu pai lhe impusesse. ' Ao menos ele não veio me buscar pessoalmente, a humilhação será particular e não pública'

- Por que não fecharam as malditas cortinas? – Arashi abriu os olhos de repente, a resposta por sua própria pergunta acordando cada lugar de sua mente e corpo – Eu dormi! – Levantou de um pulo e olhou para fora, observando o sol levantando no céu. Piscou algumas vezes, os olhos doendo com a súbita iluminação, mas ela ignorou o desconforto inicial buscando algum sinal da volta do filho ao castelo. – Ele não voltou! – Um choramingo nasceu em sua garganta e antes que pudesse controlar-se deixou seus lábios, o som parecido com o de um lobo ferido. – Ele devia temer a mim! Arashi!

- Quem exatamente deveria temê-la?

Arashi pulou para trás ao ouvir a voz inesperada, caiu sentada no chão e olhou para a janela surpresa. Quando ele tinha chegado ali?

- Sesshoumaru... o que?

- Apreciando o nascer do sol, está um lindo dia, não acha? – Ele sorriu calmamente para a figura de Arashi sentada no chão do quarto sem fazer menção de ajudá-la alevantar. – Acho que ouvi um lobo agora a pouco...

- Ahn... lobo? – Ela levantou rapidamente e passou as mãos pelo tecido fino de seu quimono – Não ouvi nada.

- Talvez tenha sido outra coisa. – Ele deu de ombros antes de levantar do se lugar no telhado – Vou entrar, quase não dormi essa noite...

Arashi concordou com um aceno, não tinha como explicar o som de poucos momentos atrás e preferia mesmo que o filho não fizesse mais perguntas. Fechou os olhos, deixando que a brisa matutina acariciasse seu rosto. Não podia se ater a detalhes a uma hora dessas. 'Só algumas horas... tudo o que tenho são algumas horas antes que...' Abriu os olhos repentinamente quando o cheiro adocicado atingiu suas narinas.

- Você não fez isso! – Jogou metade do corpo para fora da janela e encarou o filho – Não pode ter feito isso! Eu o proibi de tomar uma mulher humana como esposa!

- Proibiu? – Sesshoumaru perguntou ironicamente, arqueou uma sobrancelha antes de dar as costas à mãe – Não é uma pena que estivesse ocupada demais com planos de traição e morte para educar seu filho a obedecê-la?

0

- Isso não está acontecendo. Isso não está acontecendo. Isso não está acontecendo.... – Arashi caminhava de um lado para o outro do quarto repetindo as palavras como se fosse um mantra, desejava com todas as suas forças que aquilo fosse apenas um pesadelo e que acordasse a qualquer momento. – Ele não fez isso comigo!

Jogou-se na cama puxando as cobertas sobre a cabeça, queria se livrar daquele odioso cheiro, mas parecia impossível. Aquilo era pior do que as vezes em que os tinha visto juntos, antes ela podia pensar nos dois como...amigos, mas agora...

- Maldito seja! – Sentou na cama jogando o primeiro objeto que alcançou contra a parede, rosnou alto, frustrada quando nem essa visão a fez sentir aquele pequeno resquício de prazer, de calma. – Eu preciso matar aquela... aquela... aquela coisa!

Ignorou os chamados do lado de fora do quarto, as vozes falsamente preocupadas pela origem do barulho enquanto deixava sua mente trabalhar rapidamente em busca de um meio de acabar com aquilo.

- Não existe! – A dura constatação quase a fez chorar de raiva e frustração. Desde as primeiras horas ouvia os guardas conversando animadamente enquanto se preparavam para a partida.' Eu vou mesmo partir sem ter a chance de me vingar.' Baixou os olhos para as mãos delicadas, observando os pequenos cortes em suas palmas. ' A menos que...' Um sorriso se formou nos lábios bem feitos enquanto a imagem dos corpos dos guardas de seu pai surgia em sua mente ' Servos não são indispensáveis...' Flexionou os dedos longos e delicados lentamente ' Vai ser tão fácil'

0

Inu no Taisho permaneceu parado à porta do castelo observando Arashi subir no cavalo que tinha cedido para sua partida. Algo na expressão calma, quase...feliz da mulher lhe dava a impressão de que ela tinha um plano. Estreitou os olhos quando percebeu que podia apenas avisar que tivessem cuidado com sua mulher, não podia mantê-la ali para sempre. ' Na verdade, quanto mais depressa ela sumir de minhas vistas...'

- Não a soltem até chegar ao castelo do Clã do Norte. – Ignorou o olhar irritado da mulher, voltando sua atenção aos guardas novamente – Não parem a não ser quando for extremamente necessário.

- A viagem é longa, Senhor... – O jovem yokai sorriu – Temos que parar ou mataremos os cavalos na metade do caminho de cansaço.

- Não a soltem.

- Tenho certeza que Lady Arashi—

- Não a soltem até que estejam dentro do castelo de seu clã. – Olhou firmemente para o rapaz, deixando claro que na estava brincando – Isso não é um pedido.

- Sim... Sim, senhor.

0

Inu no Taisho continuou com os olhos fixos na comitiva que afastava-se rapidamente do castelo, sentia-se triste por aquilo estar terminando daquele modo. Apesar de todas as loucuras de Arashi, ele sempre pensara que o tempo faria com que a mulher se acalmasse, mas estava errado. Com o passar dos anos, ao invés de tornar-se mais dócil, a 'Princesa do Clã do Norte' tornara-se cada vez mais obcecada apenas com uma coisa, exterminar todos os humanos.

- Acha que terminou, meu pai?

O yokai mais velho voltou os olhos para o filho parado a seu lado, analisando-o por alguns minutos antes de lançar um último olhar à nuvem de poeira longínqua que a comitiva se tornara.

- Provocá-la foi um erro, Sesshoumaru.

- Eu não—

- Eu lhe disse para esperar até a partida de sua mãe antes de tomar a garota humana como esposa. – Os olhos dourados fitaram o filho duramente. - Traga-a para o castelo o quanto antes.

- Pensa que minha mãe tentará voltar?

- Tenho certeza disso. – Inu no Taisho suspirou antes de começar entrar – Avisei os guardas para a vigiarem, mas não faço idéia de quanto tempo vai levar até que ela os convença de que é inocente.

- Vou com eles.

- Você não vai a lugar nenhum! – Parou na entrada, virando-se para encarar o filho que o olhou espantado – Arashi não é mais problema nosso, por enquanto. – Sesshoumaru o olhou desafiante, antes de virar na direção dos estábulos – Quer mesmo me desobedecer, Sesshoumaru? – Inu no Taisho estreitou os olhos perigosamente, colocando a mão sobre o cabo da espada em sua cintura – Desrespeitar as ordens de seu avô apenas nos fará começar uma guerra com o Clã do Norte... Quer mesmo ter a culpa pela morte de todas as pessoas do vilarejo sobre suas costas?

Sesshoumaru parou quando as palavras do pai o alcançaram, virou-se em silencio, travando uma batalha de olhares com seu progenitor por alguns segundos antes de dar-se por vencido.

- Farei do seu modo, meu pai.

- Ótimo. – Inu no Taisho tirou a mão lentamente da espada, sua expressão suavizando-se – Vá até vilarejo e tente convencer sua mulher a vir para cá onde podemos protegê-la melhor. – Sorriu quando o filho pareceu relaxar com suas palavras. – Talvez eu esteja enganado e nossos problemas realmente tenham terminado.

Duas semanas depois

Arashi sorriu quando a lua saiu de seu esconderijo atrás das nuvens e iluminou o acampamento silencioso. A visão do sangue, o cheiro metálico de todo aquele maravilhoso sangue a acalmava. ' Finalmente... algo deu certo.' Olhou para as próprias mãos com um estremecimento de prazer, ' Cheiro de morte... Sempre tão reconfortante...' Respirou fundo deixando-se preencher por aquilo, a sensação de prazer e liberdade há muito esquecida, percorreu seu corpo com força e um riso cristalino ecoou na clareira.

- Duas semanas... mais duas semanas até que possa vê-los novamente – Caminhou lentamente, ignorando os corpos sem vida espalhados pelo chão enquanto pensava em suas próximas ações. 'Melhor do que não ter oportunidade nenhuma,' deu de ombros enquanto procurava pela única montaria que deixara escapar com vida. ' Essa pausa dará aos tolos tempo o suficiente para se acalmarem... pensarem que se livraram de mim de uma vez por todas...' Sorriu satisfeita consigo mesma e correu na direção em que o resfolegar do cavalo podia ser ouvido. ' Talvez... Apenas talvez, eu aguarde mais tempo... Observe nas sombras o momento oportuno para cobrar minha vingança...'

Montou o cavalo com um sorriso vitorioso nos lábios, iluminando os traços delicados. A quem queria enganar? Mal podia esperar a chance de colocar as mãos naquela garotinha humana.

0

Haru permaneceu em silêncio em seu esconderijo no meio dos arbustos altos enquanto observava o sapo yokai passar correndo desesperado chamando seu nome. Toda aquela super-proteção estava começando a irritá-la. Suspirou aliviada quando a voz esganiçada a chamou ao longe, cobriu os lábios com as mãos, abafando o riso ao ouvi-lo cair, choramingando a alguns metros adiante.

- Finalmente um pouco de paz. – Levantou lentamente passando as mãos pelo tecido macio do kimono, retirando as folhas que haviam se prendido em sua ânsia de se esconder.

- Lady Haru!

- Pelos deuses – Murmurou desanimada, apressando-se a adentrar na mata – Quando ele vai desis... – Abriu os olhos quando um par de braços a agarrou pelas costas, puxando-a contra um corpo sólido. – Solte... – O restante de suas palavras foram abafadas pela mão que cobriu sua boca delicadamente, impedindo-a de continuar. Ignorando o medo que ameaçava imobilizá-la, a garota começou a se debater em uma vã tentativa de livrar-se da 'prisão' que se encontrava.

Sentia o corpo começar a amolecer depois de alguns minutos de luta, quando o abraço tornou-se mais possessivo antes que o homem pulasse a uma altura suspeita para um humano, tirando-a do chão e pousando suavemente no galho grosso de uma arvore. Haru fechou os olhos com força, parando de lutar. Lágrimas formaram-se em seus olhos quando percebeu que não conseguiria escapar agora. ' Se é que tive alguma chance antes...'

- Já desistiu?

Jaken gritou seu nome mais uma vez na clareira lá embaixo, agora podia ver onde o servo yokai se encontrava e arrependia-se por ter se escondido dele daquela maneira. O braço em sua cintura aumentou a pressão, chamando sua atenção antes que o homem as suas costas repetisse a pergunta anterior.

- Desistiu de lutar, Haru? – O riso era audível na voz masculina conhecida as suas costas, mas o modo que seu nome foi pronunciado foi o responsável pela calma que desabou sobre a garota. – Se vai fugir de Jaken para perambular sozinha pela floresta, tem que lutar mais que isso quando alguém a captura.

Os olhos verdes estreitaram-se com o misto de raiva e revolta que as palavras dele despertaram, colocou as mãos sobre a dele em sua cintura, firmando-se antes de afundar os dentes com toda a força que podia na palma macia sobre seus lábios. A imprecaução espantada, seguida pela voz masculina praguejando fez com que a garota sorrisse.

- Nunca subestime o inimigo, Sesshoumaru. – Ela falou satisfeita, soltando-se de seu abraço. Virou rapidamente quando ouviu um som espantado às suas costas e abriu a boca sem conseguir dizer nada enquanto o via cair. – Sesshoumaru... – Fechou os olhos agarrando-se ao tronco e esperou pelo som do impacto.

Passada a surpresa pelo ato repentino da garota, o yokai girou o corpo ainda no ar e pousou em perfeita segurança aos pés da árvore. Sorriu arrogante para Haru, que permanecia com os olhos fechados, provavelmente pensando que ele se machucaria com a queda.

- Está melhorando, Haru.

- Tolo! Podia ter se machucado! – Ela o acusou em voz alta, ainda segurando-se ao tronco.

- Você me empurrou!

- Eu te mordi, é diferente.

- Eu caí, não caí?

- Você me assustou!

- Foi divertido. – Ele deu de ombros, desviando quando algumas frutas passaram voando. – Não é muito esperto fazer isso quando ainda está aí em cima – Ele sorriu apontando para a garota – E eu aqui embaixo onde posso me afastar...

- Venha me tirar daqui ou... – Haru parou de falar ao ver uma mancha verde e marrom correndo na direção dos dois – Acho melhor você sair daí porque—

- Não vou cair nessa, Haru.

- Lady, Haru! Não pode se afastar desse jeito, eu... – O yokai sapo parou de falar ao se chocar com as pernas de seu mestre e cair para trás com a força do impacto. – Senhor Sesshoumaru... – Esganiçou meio zonzo.

Haru girou os olhos antes de sentar-se calmamente no galho, pelo olhar de Sesshoumaru ele parecia a ponto de matar o pequeno sapo yokai. Isso seria interessante de ver.

- Preste atenção por onde anda, Jaken.

- Eu ouvi minha Lady gritar e—

- Então...você a deixou sair sozinha?

- Sim! – Arregalou os olhos em pavor ao ver seu mestre estreitar os olhos perigosamente – Isso é...Quer dizer... Não foi bem isso...Eu... Ela... – Encolheu-se no chão, fechando os olhos com força – Por favor, não me mate, Senhor Sesshoumaru.

- Se algo tivesse acontecido a Haru seria sua responsabilidade... – Flexionou os dedos, estalando as juntas perigosamente – Sabe o que isso quer dizer, não sabe?

- Sim, mas não foi culpa minha...

- Está dizendo que Haru é a culpada?

- Não... – Jaken murmurou, pelo visto, não havia um modo de sair daquilo ileso.

- Nem posso colocar em palavras como é interessante assistir a essa pequena discussão, mas... – Haru sorriu quando os dois pares de olhos voltaram em sua direção – Eu a apreciaria muito mais se estivesse no chão.

- Pode ir, Jaken... – Sesshoumaru saltou para o lado da garota e sorriu, abraçando-a – Aprendeu sua lição?

- Como derrubar você? – Ela sorriu de volta enquanto ele a levava de volta para o chão. – Claro que sim.

0

O som do riso do casal ecoou pela floresta, olhos dourados que observavam das sombras a cena estreitaram-se ainda mais enquanto as outrora bem cuidadas garras penetravam no tronco maciço da árvore à sua frente.

- Quanta indelicadeza sua, meu 'querido' filho... – Um sorriso perigoso curvou os lábios femininos, sua voz tão baixa que nem mesmo ela seria capaz de ouvi-la, enquanto seu olhar seguia o casal que voltava para o castelo – Trazer uma esposa enquanto eu estive ausente. – Baixou os olhos para suas roupas, irritada ao ver o tecido normalmente impecável manchado de sangue e barro, precisava dar um jeito naquelas roupas. Seria imperdoável apresentar-se naquelas condições. – Mamãe está voltando... Querido...

0

Continua


N.A. – Oi minna,

Demorei não é? Sinto muito, de verdade.

Estou tentando escrever esse capítulo desde dezembro e nada de conseguir terminar, mas enfim... Aqui está.

Eu estendi um pouquinho as coisas e acabei tendo que deixar o final para o próximo. Não sei se isso é bom ou ruim para vocês, mas... Espero que seja bom!

Vocês poderão odiar Arashi mais um pouquinho.

Obrigada as reviews do último capítulo - Akemi, Kohime, Kisamadesu, Sofy Lupin, Polly, Cah Kinomoto, LP Vanny-chan, Leila Wood, Gushi, bela-isa23, Madam Spooky, Juliane.chan, DanyMoon.

DanyMoon, seu nome não constou no capítulo anterior porque a review apareceu no meu e-mail logo após eu ter postado o capítulo 2. Sinto muito por isso e obrigada por ler.

Obrigada a Kisamadesu por revisar.

Beijo no coração de todas que gastaram esse tempinho a mais para me deixar suas opiniões. Muito obrigada a quem apenas leu também, mas não disse nada XD.

Espero que meu bloqueio colabore e que o próximo capítulo não demore tanto para sair.

Kissus e ja ne,

Naru.