b Capítulo 5 /b
No mês seguinte, os dois cumpriram à risca o trato de convivência pacífica. O ambiente na sala dos professores se tornou visivelmente mais relaxado e até o Prof. Binns, que mal se ligava nas coisas materiais, notou a diferença. Portanto, não foi o estresse da proximidade com Snape que fez a saúde de Miranda decair.
Ela se sentia cansada, enjoada, com tonturas. Primeiro ela pensou que fosse problema de estômago, depois estresse e por último achou que fosse uma gripe se aproximando. No final, depois de colocar para fora o café da manhã, ela desistiu de adivinhar e foi ver Madame Pomfrey, que lhe deu um exame completo.
O diagnóstico é que a deixou surpresa.
– Não há nada de errado com sua saúde.
– Tem certeza? Meu estômago anda muito irritado. Hoje eu até vomitei.
– O que é muito natural, na sua condição. Você está grávida.
O coração dela perdeu o ritmo por um segundo e meio.
– Não... Não, deve haver algum engano.
– Engano nenhum. Você está grávida de pelo menos quatro semanas.
A mente de Miranda trabalhou velozmente e num átimo ela soube como tinha engravidado. Uma sombra caiu sobre seu coração ao se dar conta de que carregava um filho de Snape. Não podia ser!... Um filho, e logo de Snape!
Os deuses estavam rindo dela.
Madame Pomfrey viu-lhe a tristeza:
– O que foi, querida? Não são boas notícias?
– Não estou muito certa – confessou. – O pai não quer nada comigo e certamente não vai querer saber do filho.
– Oh, minha querida.
– Ainda não estou acreditando. Poppy, eu não quero que ele saiba. Por favor, pode confirmar a identidade do pai para mim? Preciso ver para aceitar.
– Mas... você tem dúvidas de quem é o pai?
– Não. Mas eu preciso acreditar, Poppy. Se você me disser, talvez eu me convença de que não estou sonhando e que isso está realmente acontecendo comigo.
– Está bem, eu vou fazer o feitiço. Mas ele gera um documento formal, não se esqueça.
– Mesmo?
– Sim. Ao mesmo tempo em que você conhece a identidade do pai de seu filho, um documento aparece, o certificado de paternidade. – Ela ergueu a varinha. – Pater eclaro!
Uma vibração percorreu o abdômen de Miranda e segundos depois, da varinha de Poppy saiu um pergaminho – que Miranda leu com pesar. i "Certificado de Paternidade. Mãe: Miranda L. Montgomery. Pai: Severus Snape." /i
– Oh – fez a enfermeira, impressionada. – Agora entendo toda a sua resistência.
– Por favor, Poppy, eu não quero que ele saiba. Pode manter segredo?
– Eu estou sob o juramento de Hipócrates, Miranda. Por dever de ofício, eu devo guardar seu segredo. Mas deixe-me dizer, como profissional de saúde, que uma gravidez bruxa tem componentes mágicos, emocionais e físicos. E um segredo desse pode ser devastador para o aspecto emocional de sua gravidez. Para a segurança de seu bebê, eu recomendo que não procure se estressar desnecessariamente.
– E o bebê? – Ela se alarmou. – Ele está bem?
– O bebê está ótimo, e sua saúde também é boa. Vou lhe prescrever algumas poções, descanso, boa alimentação e ar puro. Procure não se estressar no trabalho. Quero vê-la regularmente, a cada 15 dias, ou antes, se os enjôos matinais persistirem.
– Sim, Poppy.
– E se quiser conversar, meu consultório está sempre aberto. Lembre-se de que você pode ter grandes variações de humor, e às vezes conversar sobre isso ajuda.
Miranda sorriu, tocada com a gentileza de Madame Pomfrey. A jovem professora tinha muito que pensar, depois dessa notícia.
Com um mês de gravidez, ela tinha a opção técnica de fazer um outro aborto. Mas essa era a última coisa em que Miranda podia pensar. Depois do fiasco com Edwin, ela jamais perderia a oportunidade de ter outro filho. Mesmo que fosse com Snape.
Ela dava como líquido e certo de que Snape nada queria com seu filho, já que ele tinha deixado claro que nada queria com ela. Ficou em dúvida se contava para ele ou não. Claro que ela sabia que contar seria o correto; afinal de contas, sendo ele o pai, ele tinha direito de saber. Mas Snape detestava crianças, como qualquer um podia ver. O que garantia que ele se sentiria diferente só porque era seu filho?
E Miranda não deixaria ninguém machucar seu bebê. Mesmo que fosse filho de Snape, ele era filho dela, e ela já se sentia imensamente possessiva em relação a ele. Sentia o instinto maternal se instalando plenamente dentro de si – o mesmo instinto que a fazia se sentir gentil e suave, capaz de amar imensamente aquela coisinha que crescia em seu ventre, fazia-a virar bicho só de pensar que alguém poderia querer ferir seu bebê. Era uma leoa que se manifestava dentro de Miranda, uma mulher que já era naturalmente orgulhosa, tinha uma forte personalidade e não levava desaforo para casa.
Seguindo as recomendações de Madame Pomfrey, ela adquiriu o hábito de passear à beira do lago no final da tarde, sozinha. A temperatura era fresca, naquela época do ano, e isso ajudava a clarear seus pensamentos. Por isso, ela não demorou a tomar uma decisão. Ela tinha que contar para uma pessoa, pelo menos. Alguém que precisava saber, que merecia saber.
– Balinha de limão?
– Não, obrigada, diretor. Agradeço por me receber. Receio não ter boas notícias.
– Verdade? Parece tensa, criança.
– Estou grávida, senhor.
– Mas que excelente notícia! Parabéns!
Mas Miranda não compartilhava de seu entusiasmo:
– Prof. Dumbledore, eu não sei qual é a política de Hogwarts em relação a professoras grávidas não-casadas, por isso estou disposta a deixar meu cargo se o senhor for obrigado a me dispensar.
– Isso jamais me passou pela cabeça. Claro que se quiser deixar a escola para ter mais tempo de cuidar do seu bebê, eu entenderei.
– Não me entenda mal, diretor. Eu adoro Hogwarts. Fui muito bem acolhida aqui. Odiaria ter que sair, e só faria isso obrigada. Mas não sei como seria possível acomodar um bebê aqui.
– Não precisa se preocupar com isso. Para quando é o bebê?
– Está previsto para junho, talvez final de maio. Tudo indica que não terminarei o ano.
– Eu vou arranjar para um substituto ajudá-la nos meses finais. Estou pensando em Kingsley Shacklebolt ou Remus Lupin.
– Não conheço Lupin. Kingsley e eu somos bons amigos.
– Lupin é excelente professor, e já lecionou em Hogwarts há cerca de quatro anos. Muito qualificado. Já decidiu se vai querer continuar como professora depois de ter o bebê?
– Eu poderia continuar em Hogwarts mesmo com um bebê?
– Minha cara, eu jamais pensaria em separar um bebê de sua mãe. E não há nada de mais nisso: afinal, Hogwarts é uma escola para crianças. Mas o pai não ficará com saudades do pequeno?
Uma dor perpassou o coração de Miranda.
– O pai... – ela tomou fôlego – provavelmente não vai querer saber de nós dois.
– Você já conversou com ele, ao menos?
– Não, isso seria inútil.
– Pelo menos ele sabe sobre a gravidez?
– Não.
Dumbledore meneou a cabeça e manteve a voz suave.
– Claro que eu não sou ninguém para dizer o que você deve fazer com sua vida, Miranda. Mas se me permite uma indiscrição, não acho prudente deixá-lo de fora num momento tão sublime de vocês dois. Se depois de saber, ele ainda assim optar por permanecer distante, ele tem esse direito, claro. Mas se eu aprendi uma coisa nos meus anos todos, foi isso: nunca subestime as pessoas. Muito facilmente, elas podem nos surpreender. Dê ao pai de sua criança a chance de surpreendê-la.
Miranda não respondeu.
center o 0 o /center
Caía a tarde quando Severus observou Miranda atravessar o gramado, indo em direção ao lago, como fazia todas as tardes. E como fazia todas as tardes, Severus a observava, pensativa, meio tristonha.
Sim, ele notava certa mudança em suas atitudes. Agora ela raramente aparecia para o café da manhã junto com os demais professores no salão, e parecia mais melancólica e distante. Ele tinha que admitir que sentia falta do olhar indignado e do brilho nos olhos azuis quando os dois discutiam. Mas ele concordara com a trégua e iria respeitá-la.
O pior é que ela continuava na sua cabeça. Maldição!
Por mais que ele tentasse reprimir as lembranças, ele não se esquecia daquela noite, daquela única noite e de sua pele alva, do cheiro de seus cabelos, do toque de seus seios, dos gritinhos que ela dava quando...
Não! Chega daquilo. Talvez ele precisasse preparar uma Poção do Esquecimento. Mas será que ele realmente queria esquecer aquela noite?
As coisas se complicaram numa manhã, cedinho. Severus subia as escadas para o café da manhã no salão quando divisou uma silhueta estranha na porta dos aposentos de Miranda. Era uma figura que parecia estar dobrada sobre o estômago.
Miranda.
Sem pensar no que fazia, ele correu e confirmou que era ela mesma, curvada, aparentemente tentando manter o conteúdo de seu estômago dentro dele. Ela estava pálida e trêmula, e havia papéis e livros espalhados a seus pés.
– Você está bem?
– Vai passar – ela ofegou, fraca. – É só... passageiro...
Mas suas palavras a traíram e ela caiu de joelhos, incapaz de continuar de pé. Severus a segurou:
– É melhor irmos até a ala hospitalar. Pode andar?
Ela tentou se erguer, apoiando-se nele.
– Não será necessá...
Não completou a frase, desfalecendo nos braços dele. Severus a ergueu nos braços e levou-a até a ala hospitalar, ignorando os olhares espantados dos alunos que se dirigiam ao salão para o café da manhã.
Quando o viu, Madame Pomfrey se alarmou:
– Pelo amor de Merlin, o que aconteceu? – Apontou o leito mais próximo. – Aqui, Severus, por favor.
– Pouco sei sobre isso, Poppy. Eu a encontrei passando mal no corredor. Ela realmente não parece nada bem.
A matrona começou o exame imediatamente, dizendo mais para si mesma:
– Ah, eu devia ter adivinhado. Ela não está tomando as poções que eu indiquei e não tem se alimentado também. O estresse é grande e... Ah, ela realmente não tem tomado as poções.
– Poções? Por quê? Ela está doente?
Só então Madame Pomfrey se deu conta de que ele ainda estava lá:
– Obrigada, Severus, mas eu assumo daqui para frente. Se puder avisar o diretor que a Srta. Montgomery vai precisar ficar afastada por uns dois dias, eu agradeceria.
– Ela vai ficar bem?
– Oh, sim, sim, pode ficar tranqüilo. Agora vá para que eu possa examiná-la devidamente.
Ele relutou em sair, curioso. Mas sabia que não adiantava discutir com a enfermeira. Já estava no corredor quando um elfo doméstico materializou-se diante dele:
– Mestre Snape, senhor! Estes são os livros e papéis da Srta. Montgomery. Dippy achou no chão e quer entregar.
Severus recolheu a pilha mal-feita, dizendo:
– Deixe que eu cuido disso.
– Obrigado, Mestre Snape, senhor!
Dippy desapareceu tão rápido que alguns dos papéis voaram da pilha precária e o Mestre de Poções agachou-se para pegar. Arregalou os olhos quando viu seu nome escrito num deles. Era um certificado de paternidade.
O nome da mãe era Miranda Montgomery. Ele era o pai.
Durante alguns segundos ele deixou a informação penetrar totalmente. A Srta. Montgomery esperava um filho seu. Ele ia ser pai.
E ela tinha conseguido esconder isso esse tempo todo. Não que Severus soubesse ou desconfiasse, mas ele tinha achado incomum o pedido de Madame Pomfrey por mais Poção Anti-Náuseas, e agora via a explicação. Também era óbvio que Miranda estava usando feitiços para disfarçar o volume de seu ventre.
O choque permaneceu com ele praticamente o dia inteiro. Os alunos perceberam, claro, mas quando viram que o Mestre de Poções não estava tirando pontos de suas casas, nenhum deles quis fazer alarde.
No final do dia, Severus voltou à enfermaria. Madame Pomfrey pareceu agradavelmente surpresa quando ele anunciou que tinha vindo visitar a Srta. Montgomery e levou-o até a paciente. Ela estava deitada, pensativa, e Severus achou-a pálida.
– Prof. Snape – ela tentou se sentar.
– Por favor, não se mexa por minha causa – ele puxou uma cadeira – Sente-se melhor?
– Sim, obrigada. Agradeço a ajuda que me deu hoje de manhã.
– A senhorita me pareceu muito mal. É bom ver que está melhor.
– É, eu achei que fosse apenas um mal passageiro. De qualquer forma, Madame Pomfrey deu um jeito em mim e eu vou ficar nova em folha.
– Folgo em saber – ele inclinou a cabeça, respeitoso – Trouxe seus livros e papéis, mas posso mantê-los sob minha guarda até que seja liberada.
– Pode deixar comigo, obrigada. Está sendo muito gentil, Prof. Snape.
– Apenas cortesia para com um colega de trabalho. Há alguma coisa que eu possa fazer para ajudá-la enquanto estiver incapacitada?
– Não, obrigada. Já fez mais do que devia. Seria um abuso.
– Bobagem. Acredito que essa possa ser uma oportunidade para termos uma convivência menos penosa – Ela arregalou os olhos e franziu o cenho. – Afinal, somos colegas e devemos contar uns com os outros. Não concorda?
– Certamente, claro. – Miranda ainda parecia intrigada.
– Excelente. Se eu puder fazer algo, qualquer coisa, por favor, não hesite em pedir.
Ela mordeu o lábio, enrubescendo. Pela Legilimência, Severus pôde constatar que ela relutava muito em lhe contar. Ele achou melhor não confrontá-la. Daria um tempo para que ela abordasse o assunto primeiro.
– Agradeço a oferta, professor.
– Chame-me de Severus.
– Eu sou Miranda.
– Nesse caso, Miranda, se me permitir, gostaria de acompanhar seu progresso. Posso vê-la amanhã?
– Se quiser.
– Eu insisto. Cuide-se bem.
Severus saiu dali satisfeito, mas ainda intrigado. Era óbvio que a moça tinha sentimentos confusos, desconfiava de suas intenções e continuava não simpatizando com ele. Por um momento, ele tentou imaginar qual a melhor forma de lidar com a situação tão delicada.
Tudo aquilo era tão novo para ele. Certamente jamais passara por sua cabeça a possibilidade de ter um filho. Na verdade, ele odiava crianças. Mas acima de tudo ele era um Slytherin e um sangue-puro, e aquela podia ser sua melhor chance de assegurar a sucessão da linhagem dos Snape. Não iria deixar escapar essa oportunidade. Com o tempo, pensou, ele aprenderia a suportar a mãe de seu herdeiro. Não que aquilo fosse necessário, claro. Mas seria interessante tentar gostar da mãe. Ao menos foi isso que ele disse a si mesmo.
Severus mal sabia o que o futuro lhe reservava.
