b Capítulo 9 /b
Quando os três chegaram à ala hospitalar, Lupin estava de pé em frente à entrada, andando de um lado para o outro e logo indicou para tia Lucy entrar. Madame Pomfrey tinha proibido outras pessoas de entrar na enfermaria. Miranda definitivamente tinha entrado em trabalho de parto, pelo menos duas semanas antes do prazo esperado.
O clima na porta da ala estava tenso. Harry Potter encarava o Mestre de Poções com um brilho homicida nos olhos verdes. Ele cochichou com Lupin:
– Por que ele está aqui? Depois do que ele fez com você...
Em voz alta, Lupin garantiu:
– O Prof. Snape tem mais direito de estar aqui do que nós dois, Harry. Na verdade, Severus, se você falar com Madame Pomfrey, tenho certeza de que ela o deixará ficar lá dentro.
– Isso não será necessário, Lupin.
Harry fez um comentário maldoso:
– Claro que ele não quer entrar, Remus. Ele não tem o mínimo interesse de assumir sua responsabilidade pela situação da Profª Montgomery.
– Harry! – exclamou Lupin. – Isso não é jeito de falar com seu professor.
– Deixe-o, Lupin – sibilou Severus. – Deixe que ele fale o que quiser. Com sorte, eu terei desculpas suficientes para expulsá-lo de Hogwarts antes mesmo da formatura.
O garoto parecia indignado:
– Eu estava começando a ter outra idéia a seu respeito, Prof. Snape. Depois do que passamos na guerra, depois de tudo que fizemos, passei a admirá-lo. Achei que talvez não fosse o canalha que todos acreditavam. Mas aí uma coisa dessas acontece e o senhor volta a ser o seboso nojento de sempre.
– O que você quer que eu faça, Potter?
– O senhor deveria estar do lado da Profª Montgomery! – ele se inflou. – É seu dever cuidar dela e do bebê!
Lupin tentou dizer:
– Harry...
– Não sei o que você pensa que sabe, Potter, mas a verdade é que eu jamais fugi à minha responsabilidade. Se você tivesse sido informado corretamente, saberia que é ela quem não me aceita. Mas eu não preciso ficar aqui explicando minhas atitudes para um adolescente!
– Severus – pediu Lupin –, por favor, fique. É o nascimento de sua filha, você não vai querer perder isso, vai?
– Não, mas a companhia pode se tornar insuportável para mim – ele disse, azedo. – Eu apreciaria se vocês permanecessem quietos ou se abstivessem de comentar assuntos sobre os quais têm pouca ou nenhuma informação.
Severus disse aquilo encarando diretamente Harry, que devolveu o olhar intimidador. Lupin puxou o garoto para um canto do corredor e começou a cochichar. Com sorte, eles continuariam a falar entre si mesmos e o esqueceriam.
As horas se passaram, Harry teve que se recolher ao dormitório, mas alguns professores passaram pela enfermaria, avisados que Miranda estava ganhando o nenê. Eles estavam esperando há quatro horas quando tia Lucy foi ao corredor. Estavam lá Severus, Lupin e o Prof. Dumbledore.
– Ela está bem – tranqüilizou a bruxa. – Mas ainda falta dilatação. Madame Pomfrey está tentando induzir magicamente maior dilatação, para evitar uma cesariana.
– Excelente – Dumbledore sorriu, sentado numa poltrona que tinha conjurado. – Pedirei aos elfos que tragam um lanche. Parece que a espera vai se prolongar por mais algum tempo.
Tia Lucy se dirigiu ao Prof. Snape:
– Madame Pomfrey realmente prefere que ninguém entre na enfermaria, professor, mas se quiser, eu posso insistir com ela.
– Não é Madame Pomfrey que me impede de entrar.
– Oh, Miranda não se opõe a que entre – ela garantiu. – Ela me disse isso textualmente.
Severus se admirou, e ficou pensando nisso nas horas que se seguiram, madrugada adentro. Ele também ficou pensando no que tia Lucy tinha dito. Será que ele deveria ir contra o que seus instintos lhe diziam e tentar se aproximar de Miranda? Tão ensimesmado estava que se esqueceu das outras pessoas que também esperavam notícias na porta da enfermaria.
Finalmente, a porta se abriu e tia Lucy saiu rapidamente dizendo:
– Nasceu!
Os presentes soltaram exclamações e só então Severus reparou que estavam ali Dumbledore, McGonagall e Lupin, além dele mesmo.
– É uma linda menina de 49 cm e 295 gramas – continuou a tia Lucy, sorrindo emocionada. – E é perfeita! Já contamos todos os dedinhos dos pés e das mãos!
– Que notícia fantástica, Mrs. Hengisworth – entusiasmou-se McGonagall. – E Miranda?
– Ótima. Exausta, mas feliz. Ela está amamentando agora, mas assim que ela terminar vocês podem vê-la. Prof. Snape, o senhor tem permissão de entrar agora, se quiser.
Surpreso, ao ver todos olhando para ele, Severus pensou em recusar. Afinal, provavelmente a criança cresceria longe dele, então de que adiantava conhecê-la? Por outro lado, ele se deu conta de que aquela poderia ser última chance de ver sua filha. Não seria prudente desperdiçar uma oportunidade tão preciosa. Entrou sem hesitar.
Miranda estava numa área reservada da enfermaria, atrás de biombos. Severus foi incentivado a entrar, e viu Miranda sentada na cama, apoiada em travesseiros, segurando o que parecia ser uma trouxinha feita de cobertor contra o ombro. Ela tinha uma fisionomia abatida, mas estava sorrindo.
– Ela estava tão cansada por vir ao mundo que não comeu muito. Deixe só eu fazê-la arrotar – Um pequeno ruído a interrompeu. – Opa, já foi. Muito bom, Silvinha. Pronto, já pode pegá-la.
– Pegá-la? Não, eu...
– Não tem problema – insistiu Miranda. – Assim você poderá vê-la melhor. Tia Lucy, por favor, ajude aqui.
– Claro – a bruxa idosa pegou a criança dos braços de Miranda.
– Mas... mas... – Antes que ele pudesse reagir, a trouxinha já estava sem seus braços, tia Lucy o guiando para apoiar a cabecinha corretamente. – Eu... eu...
As palavras de protesto morreram em sua boca quando ele olhou para a criaturinha envolta num cobertorzinho verde. Era uma coisinha rosada que dormia tranqüilamente, uma mãozinha de dedos longos como os seus aparecendo entre as cobertas. Ele a olhou com atenção, absorvendo cada detalhe. O cabelo bem preto estava agarradinho à cabeça, em fios finos e compridos. O narizinho parecia pequeno e Severus ficou aliviado em perceber que não puxara ao nariz característico dos Snape. De repente, ela bocejou: a boquinha sem dentes abrindo-se impossivelmente, a mãozinha se abrindo e fechando como se fosse uma pequena estrela.
Sua filha era lindíssima.
Severus não conseguiu deter uma poderosa onda de emoção que lhe percorreu o corpo. Aquela criaturinha o tinha conquistado completamente em questão de segundos, entrado no seu coração instantaneamente. Naquele minuto, ele soube que a amaria para sempre, com todas as suas forças.
Ele olhou para Miranda. Ela estava abatida, suada e ofegante, mas irradiava uma felicidade que ele bem podia compreender. Ela estava adorável, ele percebeu.
Miranda o viu a encará-la e sorriu, exausta. Tinha sido o olhar mais doce que ela lhe lançara desde que se conheceram, e talvez Madame Pomfrey lhe tivesse dado alguma medicação para ter tão bizarro comportamento. Severus então tomou a decisão mais dolorosa de toda a sua vida.
– Ela é adorável, parabéns. – Devolveu a criança à mãe e sentiu a voz querendo se estrangular de emoção. – Gostaria de agradecer por me permitir estar aqui. Sei que minha presença a incomoda e não vou mais me impor. Pode descansar tranqüila, porque eu não vou mais incomodá-la. Nem à senhora nem à pequena. Boa-noite.
Virou-se, e Miranda chamou:
– Não, por favor, não vá! Não podemos conversar?
– A senhora deve descansar. Pode dormir tranqüila.
E saiu, ignorando os olhares de Miranda e Lucy. Quando chegou ao corredor, ignorou também Dumbledore, McGonagall e Lupin, e foi direto às masmorras.
