Os Mistérios de Londres

Sexta Parte: O último amanhecer

Capítulo 23: Vermelho e Negro


31 de julho de 1941

James observou os papéis que se espalhavam pela mesa. Cartas, mapas, documentos... Virou-se para o enorme painel com o mapa múndi que tinha na parede. Tachas negras dominavam quase toda a Europa Continental.

Ele observou o território que representava a França. Estava totalmente tomado pelas tachas negras. Os nazistas tinham o controle da antiga Gália. O moreno suspirou. Estavam perdendo territórios muito rápido para os malditos.

Alguém bateu à porta e ele voltou-se para ela. Um garoto razoavelmente alto para sua idade passou por ela, encarando-o.

'- Pai, o senhor mandou me chamar?

James assentiu, sorrindo, embora o sorriso não chegasse aos seus olhos.

'- Primeiro eu quero lhe entregar seu presente de aniversário. Doze anos, não é mesmo?

Harry também deu um sorriso triste, confirmando. James empurrou um pequeno embrulho para ele. O garoto desembrulhou o presente, deparando-se com uma pequena pistola prateada com um delicado cabo de marfim entalhado.

'- Era da sua mãe. Ela deixou no convento antes de você nascer.

O garoto observou a arma por alguns instantes, incerto se devia ou não pegá-la.

'- Porque está me dando isso?

James suspirou.

'- Estamos em guerra, Harry. Você precisa aprender a se defender. O ambiente em que você vive não lhe ensinou isso?

Harry assentiu.

'- Sirius me ensinou a atirar. Ele também falou que eu corro muito mais riscos porque sou filho do líder dos Valetes. Mas não é da arma que estou falando. Quero saber porque está me dando a pistola que era de minha mãe. O que isso significa? O senhor descobriu alguma coisa sobre...

'- Continuamos no escuro acerca de sua mãe. Eu não sei onde Lily está. Não sei se ela está viva, se é isso que lhe preocupa. Ela deve estar com um nome falso ou algo do tipo. Mas eu não irei descansar enquanto não encontrá-la. Eu prometo, Harry.

O garoto finalmente tomou a pistola nas mãos, observando o cabo de marfim. James passou a mão pelos cabelos, nervoso. Harry deu um meio sorriso ao perceber a velha mania do pai.

'- O senhor ainda tem mais alguma coisa para falar, não é?

James assentiu.

'- Você irá para a Suíça com Lyncis quando ela voltar para o internato. A Suíça é um país neutro, você estará mais seguro lá.

'- Tem medo do que pode me acontecer aqui? – Harry perguntou com um suspiro.

'- Você se tornou bem esperto para sua idade. – James observou, sentando-se.

'- Não existe lugar para a inocência quando estamos em guerra, pai. – ele respondeu tristemente – Mais alguma coisa que queira me dizer?

O homem observou-o em silêncio por alguns instantes.

'- Não, Harry. Acho que você já teve notícias ruins o suficiente por hoje. Procure alguma diversão. Finja por hoje que é uma criança normal. Que só tem doze anos de idade.

Harry sorriu, assentindo, e deixou o escritório. James observou a porta por alguns instantes antes de se voltar novamente para o mapa. Só esquecera de dizer uma coisa a Harry.

No dia em que o garoto embarcasse para a Suíça, James também viajaria para o continente. Estava cansado de deixar as coisas nas mãos de subordinados. Era hora de ele procurar Lily Evans pessoalmente.


Remus suspirou cansado, tirando uma mecha de cabelo de cima dos olhos. Estava sem dormir a quase três dias, trabalhando sem parar. Tinha que arranjar um jeito de se concentrar; não podia permitir que seus detetives corressem riscos por conta de algum deslize seu.

Engoliu o conteúdo de sua décima sexta xícara de café e voltou aos mapas que dominavam sua mesa.

'- Detetive Lupin? – uma voz rouca chamou-o da porta.

Remus levantou o rosto, sorrindo.

'- Não precisa fingir pra mim, detetive Jones. Eu sei quem você realmente é, lembra?

Hestia suspirou, entrando no escritório com o braço cheio de papéis.

'- Tudo bem, então. Já que eu não tenho que fingir, pode me ajudar com isso aqui? Está pesado.

'- O que é isso? – ele perguntou, levantando-se para ajudá-la com a papelada.

'- Relatórios da Resistência. De Gaulle está entrando em contato com muitos grupos franceses... Se nós ajudarmos eles a se armarem, podemos ter alguma vantagem a médio prazo.

Remus aproximou-se dela para segurar os papéis, mas antes que pudesse fazê-lo, Hestia tropeçou em um dos mapas que se encontravam no chão e caiu sobre ele. Todos os documentos caíram e, no meio daquele mar de papel, Remus e Hestia se entreolharam.

'- Parece que estamos todos muito cansados. – Remus observou, ajudando-a a se levantar.

'- É a guerra. Não há tempo para descansos. – Hestia esfregou os olhos de leve, abrindo a boca – Há quanto tempo o senhor não dorme, detetive Lupin? Eu não prego os olhos desde semana passada.

'- Três dias. – ele respondeu – Mas porque você não tem dormido? Ao que eu saiba, não está envolvido em nenhuma missão.

Hestia suspirou.

'- Minha família mora na França. Não tenho notícias deles já há um bom tempo.

Remus assentiu, observando o cabelo da moça, que escorregara do enorme chapéu que ela usava para escondê-los.

'- Porque você entrou na Scotland Yard?

Hestia observou-o surpresa.

'- Bem... Há muitos motivos. Talvez o principal seja a necessidade de ser útil em alguma coisa. Meu pai morreu em um assalto.

'- Eu sinto muito. – Remus sorriu para ela, sentindo uma estranha simpatia pela moça.

'- Não sinta. – Hestia também sorriu - Eu agora posso fazer alguma coisa. Me sinto feliz por ser útil.

Remus sentiu-se tentado a abraçar a mulher, mas se conteve. Não se lembrava de ter conhecido alguém como ela. Hestia desviou o olhar dele, observando a sala bagunçada.

'- Parece que temos que arrumar isso, não?

O homem suspirou.

'- É o que parece.

Hestia sorriu quando ele se abaixou para começar a arrumar a bagunça. Antes que ele pudesse entender, ela começou a arrastá-lo pelo braço para fora da sala.

'- O que você...

'- Vamos tomar um sorvete. - ela respondeu antes que ele pudesse perguntar - Estamos realmente precisando de um tempo, não acha?

Ele também sorriu, assentindo. Quando já estavam razoavelmente distante do prédio da Scotland Yard, Hestia tirou o chapéu, deixando os cabelos soltos.

'- Você devia deixá-los assim mais vezes. - ele observou.

'- Como?

Remus corou ao perceber a careta de dúvida dela. Gaguajando um pouco, ele apontou para o cabelo dela.

'- Devia deixar seu cabelo solto mais vezes.

Foi a vez de Hestia corar.

'- Bem... É um tanto difícil quando se está fingindo ser um garoto.

'- Moody nunca desconfiou de você?

Ela meneou a cabeça.

'- Moody é ligeiramente cego. E como eu só trabalho com ele e com você... A única pessoa que poderia perceber era Snape. Não duvido que ele desconfiasse. Mas nunca pode provar.

'- E você confia em mim? - Remus perguntou interessado - Eu poderia ir agora a Moody e dizer que o detetive Jones é na verdade uma garota. Você estaria em maus lençóis.

Hestia parou, observando-o em silêncio por alguns instantes.

'- Você morreria antes de perder uma de suas melhores agentes. Vai querer se privar da minha companhia, detetive Lupin?

Remus apenas sorriu em resposta.


Sirius observou o avião alquebrado que pousara há pouco numa das muitas pistas improvisadas de propriedade dos valetes.

'- James, você tem certeza de que vai embarcar nisso aí? Além dele estar quase caindo aos pedaços, o que te garante que os alemães vão realmente te receber de braços abertos?

'- Sirius, você sabe que eles acreditam que podem me levar para o lado deles. E não se esqueça que eles ainda não são idiotas o suficiente para brincar com os valetes. Tom criou uma bela fama com eles... E Moody também fez um bom trabalho deixando que eles "descobrissem" que sou um dos mais fortes suspeitos de traição na Scotland Yard.

'- Ou seja, eles acham que você é inimigo dos Aliados. E quem é inimigo dos Aliados, é amigo do Eixo. – Sirius suspirou – Boa sorte, meu amigo. É tudo o que posso lhe desejar. Gostaria de ir com você, tenho certeza que poderia precisar...

James sorriu.

'- Já conversamos sobre isso. E eu repito o que disse anteriormente; eu preciso mais de você aqui do que comigo. Preciso que cuide do clube e ajude Remus. Além disso, Susan está grávida, e eu não me perdoaria se você estivesse longe quando meu mais novo sobrinho estivesse para nascer.

Sirius suspirou.

'- Muito bem... Então, novamente, boa sorte, James. E cuide-se, meu irmão.

James assentiu, abraçando o amigo antes de penetrar na pista, onde o piloto alemão já o esperava.

'- Sir Potter? – o homem de uniforme negro cumprimentou com a cabeça em um inglês carregado de sotaque.

'- Exatamente, senhor... – James respondeu em alemão.

'- Tenente Klaus Wenticht ao seu dispor. – o oficial sorriu, entendendo a mão e estufando o peito onde o símbolo da suástica destacava-se contra o vermelho e o negro.