CAPÍTULO VIII – Descoberta ao Acaso

'- Isso vai contra todas as normas da Monitoria... mas, vamos fazer essa poção! E descobrir de uma vez por todas o segredo de Alice!

As outras três garotas assoviaram e aplaudiram a fala resoluta de Lily com um entusiasmo sarcástico, mas pararam tão logo Madame Pince lançou-lhes um olhar medonho por sobre seus óculos de aro fino.

'- Legal. Precisamos agora descobrir um lugar para fazer essa poção. – disse Lene, sentando-se novamente.

'- Podemos fazer onde eu sempre faço as minhas experiências que são um pouco mais... mal cheirosas ou perigosas. O banheiro da Murta Que Geme. – sugeriu Jade, pegando um livro de Transfiguração de uma das prateleiras.

Lily parecia estar em um terrível confronto interno, em que desobedecer regras e bancar a espiã estava levando a melhor sem qualquer sombra de dúvida.

'- Ok, então. Vamos ao banheiro da Murta. Mas se essa poção quebrar alguma coisa ou soltar gases tóxicos que transformem a Murta numa geléia de vida própria que muito provavelmente vai se multiplicar e tentar dominar o mundo, eu não tenho culpa de nada! – falou ela, de um fôlego só.

'- Hum... uau. Ainda estou tentando imaginar a Murta como uma geléia... como era o resto mesmo? – disse Ann, coçando o queixo.

Lene apenas lançou um olhar superior à Ann, e balançou a cabeça em desalento. Jade sorriu.

'- Perfeito! E o melhor dia que poderíamos escolher é amanhã: o último dia de lua cheia.

'- Por que, Jade?

'- Bem, Lily, uma das plantas necessárias é a Agrimina Tiposuleicanus, que desabrocha apenas à meia-noite do último dia de lua cheia. – respondeu a garota, correndo uma pena pelos cabelos longos e sem um corte definido.

O que Jade não mencionou, é que as garotas teriam de colher essa planta no dia em que fariam a poção. Terminado o dever de Transfiguração, elas saíram da biblioteca para os corredores já escuros de Hogwarts.

'- Vamos jantar? – convidou Jade - Estou com tanta fome que poderia comer um elefante.

'- Exagerada... mas também estou faminta. Acho que ainda não acabaram os bolinhos de chocolate. – disse Marlene, tomando o caminho do Salão Principal.

Ouviram um barulho estalado. Lily estacou e bateu com a mão espalmada na própria testa, comprimindo as feições. Agora dava soquinhos na própria cabeça.

'- Que auto flagelação toda é essa, Lil? – perguntou Ann, sorrindo.

'- Esqueci meu dever na biblioteca! Se eu tiver que fazer tudo aquilo de novo, me atiro no lago. – exclamou a ruiva, exasperada. – Vão indo que eu já vou jantar!

Lily saiu correndo, desembestada pelos corredores. As garotas viram quando ela ainda tropeçou na escada, desequilibrou-se, praguejou e voltou a correr. Annie olhou para a pesada mochila que carregava nas mãos.

'- Nos encontramos depois, ok? Vou levar minha mochila até o dormitório. – disse ela às outras duas.

Tomando alguns atalhos através de tapeçarias e quadros, Annie logo chegou à torre da Grifinória. Aproximava-se do retrato da Mulher Gorda, mas viu uma cena que a fez parar, subitamente enjoada. Sirius e Lucy Bosworth beijavam-se ardentemente logo ao lado do retrato. Não pareciam ter visto que não estavam sós no corredor. Annie sentia como se seu estômago tivesse sido perfurado e banhado em ácido. Por um momento, pensou em dar meia-volta e voltar ao salão, a fim de jantar. Porém, percebeu que não poderia mais jantar. E também confessou a si mesma que queria fazer algo para acabar com aquilo. E teria que ser logo, pois Bosworth, prensada contra a parede, enlaçara a perna direita no tronco do rapaz, e passeava as mãos pelas costas de Sirius, sob a camisa.

Ann pensou rápido e agiu mais ainda. Puxou da mochila um pacote de bombinhas de tinta, que ela e Jade inventaram. Chegou mais perto do casal, e virou o pacote de boca para baixo, ao mesmo tempo em que deixava cair a mochila e exclamava um teatral "Droga!". O que aconteceu depois foi em rápida sucessão. As bombinhas, do tamanho de ervilhas, estouraram, e, a despeito de seu tamanho, cada uma delas liberava meio litro de tinta colorida. Tudo num raio de dez metros ficou pintado de cores fortes e vibrantes, inclusive os três, parados no corredor. Annie limpou um pouco da tinta laranjada que cobrira seus olhos, e a cena que viu deu-lhe vontade de rir.

Lucy Bosworth, coberta de tinta dos pés a cabeça, tinha uma expressão dividida entre raivosa e indignada. Fuzilava Ann com o olhar. Já Sirius, ao olhar para as duas garotas, o corredor colorido, e a tinta violeta que cobria suas calças, desatou a rir. Ele sentou-se no espaço do chão colorido de azul, e suas gargalhadas ecoavam solitariamente pelo corredor de pedra.

'- Ah. Me desculpem. Minha mochila caiu. – balbuciou Annie, lutando contra o riso.

Lucy estreitou os olhos.

'- Hells... você arruinou tudo! Olhe para o meu cabelo – ela puxou uma mecha dos cabelos agora verdes – Você me paga, sua aberração! – exclamou, com voz esganiçada.

'- Cara, olha só isso! Ann, você conseguiu pintar o corredor todo em dois segundos! Imagina essas bombinhas numa sala de aula! Ah, eu tenho que fazer isso um dia! – disse Sirius, animado e com os olhos brilhando.

'-Vai levar horas pra eu tirar essa tinta do meu cabelo, e minha pele vai ficar um lixo! Ah, que horror! Sirius, eu vou embora. Não agüento essa sua coleguinha. Nos vemos amanhã. – Lucy mal disse a frase e saiu andando a passos histéricos, para chegar até a torre da Lufa-lufa.

Sirius levantou-se, ainda sorrindo, e deu uma longa olhada para o corredor, os quadros na parede, cujos ocupantes berravam indignados por terem sido banhados por tinta, e, por fim, examinou uma Annie multicor, que agora juntava a mochila manchada e o pacote vazio das bombinhas. Sirius levou a mão ao cabelo de Annie, e ergueu delicadamente uma mecha.

'- Você está parecendo a Lily. – comentou ele, num tom divertido.

Annie olhou para o próprio cabelo, no qual a tinta vermelha caiu em abundância. Sorriu um sorriso forçado; a cena do beijo ainda dolorosamente fresca em sua memória.

'- Tem razão. Só preciso começar a estudar e gritar com o Tiago. Bem, é melhor eu entrar. – disse ela, virando-se para uma Mulher Gorda com o vestido, geralmente rosa, preenchido de amarelo.

'- Não é melhor limparmo-nos antes? – indagou o rapaz, segurando-a pelo antebraço. – Limpar!

Nada aconteceu. Continuaram tão coloridos quanto antes. Sirius agitou novamente a varinha, pronunciando o encantamento, mas novamente foi inútil. Ann balançou a cabeça.

'- Desista. Essa tinta só vai sair daqui a uma hora. Não podemos limpá-la com magia ou mesmo água e sabão.

'- Uau. Onde você conseguiu essas belezinhas?

'- Fabricação própria. – respondeu ela – Eu fiz a tinta temporária, e Jade deu um jeito de inseri-la nas cápsulas, e fazê-las estourar.

'- Acha que conseguiria umas dessas para mim? – indagou ele, esperançoso. - Imagina só a McGonagall pintada de rosa! E o Ranhoso colorido! Ah, doce sonho...

'- Veremos. Mas Lily não pode saber de jeito nenhum, ou ela nos pica em pedacinhos e serve no jantar como prato principal. Mas você não vai atrás da sua namorada? – ela perguntou, pretensamente descontraída.

'- Ah, não. – respondeu Sirius, com um gesto da mão. – Ela faz um pouco de drama com as coisas. Meio exagerada.

Os dois passaram pelo buraco do retrato, ouvindo a Mulher Gorda ralhar com eles, por achar que parecia um girassol gigante. Annie não agüentaria ficar ali embaixo. Murmurou qualquer coisa parecida com "Boa-noite" e subiu as escadas do quarto correndo. Esquecera-se do jantar e de tudo mais. Sentia-se fisicamente mal, seu corpo doía horrivelmente. Ela foi até o banheiro, ficando de frente para o grande espelho sobre a pia de mármore escuro. Seus olhos azuis pareciam estranhamente sem cor aquela noite. Ann encostou a testa no espelho e murmurava repetidamente.

'- Não seja idiota. Não seja idiota. Não seja idiota...

Levantou a cabeça e sacudiu-a com força, como que para espantar algum mau pensamento. Ela tinha uma vaga idéia do motivo dessa dor tão forte que sentia. Seu mal estar súbito após a cena, que ainda estava tão terrivelmente viva em seus olhos. Mas estava fazendo de tudo para ignorar essa possibilidade. Aquilo passaria, era algo de momento.

Despiu-se e entrou embaixo do chuveiro. Virou o registro e a água começou a cair abundante. Annie deixou que a água exageradamente quente castigasse sua pele, e o ambiente logo começou a ficar repleto de vapor. Mas demorou um bom tempo até que ela visse a tinta colorida escorrer pelo ralo.

Lily saía da biblioteca sob os gritos de protesto da Madame Pince.

'- E não se atreva a vir aqui a essa hora, mocinha! Quanta irresponsabilidade!

Ela ouviu uma porta bater e continuou seu caminho, abraçando contra o peito o livro que esquecera e recuperara. Subitamente notou que combinara com as garotas para irem jantar, e começou a correr olhando para o chão. Só o que soube era que no momento seguinte estava estatelada no chão, com toda a "retaguarda" dolorida e o chão parecia estranhamente gelado e liso. Obviamente havia se chocado com alguém, e logo percebeu com quem.

'- LILY! Ah, meu Merlin, Lily, você se machucou? Está tudo bem? Me desculpe, eu estava correndo e olha só no que deu! Por favor, diga que você está bem! – Tiago Potter começou a falar muito rápido e teria continuado, se Lily não o houvesse interrompido.

'- Tiago, cala a boca.

O rosto de Tiago entrou no seu campo de visão, e tinha uma expressão tremendamente preocupada.

'- Você está bem? – ele perguntou novamente.

'- Sim, porquê? Tá a fim de repetir a dose? – respondeu ela, meio mal-humorada.

Tiago estendeu a mão para ajudá-la a se levantar, e ela aceitou. Mas, assim que conseguiu ficar de pé, notou que o chão de pedra transformara-se em gelo, e ela escorregou novamente, fazendo Tiago cair sentado no chão, e ela acabou por estirar-se por cima dele. Afastou um pouco o rosto, até que conseguiu olhar para Tiago.

'- Por que diabos você transformou o corredor numa pista de patinação?

Ele deu um sorriso sem graça.

'- Não era pra bolsa de gelo cair nesse corredor. Era pra cair no da Sonserina.

'- Tiago! Eu não acredito nisso!

Lily tentou sair de cima do garoto, mas tudo o que conseguiu foi despencar com as mãos espalmadas no peito dele. Notou que os olhos de Tiago brilhavam estranhamente, e sentiu-se corar.

'- Acho que não vamos conseguir muita coisa assim. – murmurou o rapaz, numa voz rouca.

Lily não compreendeu direito. Sua mente estava entorpecida pelo perfume envolvente de Tiago, e pelo calor de seu corpo grudado no dela. Pela primeira vez pôde ver cada gota verde em suas íris castanhas, e a boca pequena do maroto nunca lhe pareceu tão instigante. Conseguia distinguir cada traço de seu rosto bonito, estando muito consciente de que estava deitada sobre o garoto que odiara até tão pouco tempo, e que passara a amar desde então. Mas, se o amava, por que aquilo parecia ser tão errado? Lily compreendeu que era porque a imagem que tinha de Tiago Potter era aquela do garoto irresponsável, imaturo e idiota. Precisava de um tempo até acostumar-se a enxergar o garoto com outros olhos.

Tiago passou os dedos ao longo dos cabelos ruivos de Lily, e levou a mão até a nuca da garota. Lily sentiu-se sendo suave mas irresistivelmente puxada para mais perto dele, e não fez nada para impedir. Estavam absurdamente próximos agora, e ela, já sem controle de suas ações, tocou seu rosto com a mão. Seus lábios uniram-se com os de Tiago, e ela deixou-se levar pelo momento. Percebeu vagamente que corria as mãos pelos cabelos desarrumados do garoto, e que as mãos dele estavam na sua cintura. Tiago tocava-a como se ela fosse de vidro, com um medo imenso de quebrá-la, machucá-la.

Lílian recuperou sua consciência e quebrou o beijo, levantando-se com dificuldade. Tiago levantou-se também, e a olhava com crescente espanto e receio.

'- Eu... sinto muito Lily. – balbuciou.

Ela não sabia onde pôr as mãos. Estava estupidificada demais para dizer qualquer coisa. Abriu e fechou a boca algumas vezes, e, finalmente, juntou o livro do chão e saiu correndo desesperada, derrapando no gelo azulado. Corria sem rumo, mas seus pés a levaram para a torre da Grifinória. Foi ao dormitório e atirou-se na cama, abraçando o travesseiro tão forte que seus braços amorteceram. Ela levou a mão bobamente até os lábios, ainda sentindo o gosto dos de Tiago. Ela não sabia se explodia de felicidade, saía gargalhando pelo quarto, chorava copiosamente ou ia até o rapaz para dar-lhe um bom tapa na cara. Sua cabeça fervilhava, e seus pensamentos corriam rápidos. Ainda sentindo-se estranha e eufórica, acabou por adormecer.Não viu quando Ann saiu do banheiro e, encontrando-a adormecida sobre os lençóis, cobriu-a com um cobertor.

'- Vamos, a Murta não está aqui. – informou Jade.

'- Graças aos céus. – Ann ouviu Lene murmurar.

Faltava cerca de uma hora para a meia-noite, e as quatro garotas entravam no banheiro da Murta-Que-Geme, a fim de fazer a poção de que precisavam. Lily – que andava estranhamente alheia a tudo desde a noite anterior – fechou a porta atrás de si, e Marlene acendeu os archotes com um toque de varinha. A luz revelou o enorme banheiro, com várias pias e alguns espelhos rachados. O chão estava inundado, provavelmente trabalho da Murta. Assim que abriram a porta de um dos reservados, Annie confirmou suas suspeitas de que Mark Lovegood realmente era adepto a aparecimentos repentinos.

'- Espera aí! O que você está fazendo num banheiro feminino? – indagou ela para o garoto indolentemente sentado sobre a tampa do vaso sanitário.

'- Tudo bem, Ann, eu precisava de ajuda para a poção, enquanto vocês vão pegar a planta, então o chamei. – esclareceu Jade, sorrindo para Mark.

'- Como é? Você quer dizer pegar a planta lá fora? Essa hora da noite? – disse Lene, assumindo uma expressão entre enraivecida e amedrontada.

Jade colocou o caldeirão no chão e começou a retirar alguns ingredientes de sua sacola de couro. Após tocar Mark de cima da tampa do vaso, enfileirou-os ali.

'- Exatamente. – respondeu, virando os rótulos dos frascos para si – A planta deve ser colhida por quem pretende beber a poção, portanto vão vocês três. Eu trouxe a minha de casa – disse, e ergueu um saquinho plástico com uma espécie de folhagem alaranjada.

Enquanto Marlene fazia uma careta cômica, que fez Lily e Ann caírem na gargalhada, Jade cortou algumas raízes e jogou-as no caldeirão já com água fervente. Voltou-se para Ann.

'- Ann, trouxe o que eu lhe pedi?

Annie pegou a caixa de madeira, na qual estavam todos os frascos de vidro que trouxera do porão de sua casa. Entregou-a à Jade, que a arrumou aberta sobre a bancada de uma das pias, e iniciou o ritual de tirar metodicamente os tubos de ensaio dali. Erguendo um dos vidros à altura dos olhos, pingou uma gota de um líquido cor de terra.

'- O caldeirão está fervendo há quanto tempo? – perguntou ela, sem tirar os olhos da gosma transparente que derramava no frasco agora.

'- Cerca de cinco minutos. – informou Lily.

'- Ótimo. – murmurou a outra – Só para desencargo de consciência, que cor está essa poção?

Todos olharam para o líquido dentro do caldeirão.

'- Caqui. – disse Lily

'- Castanha. – opinou Lene

'- Cor-de-burro-quando-foge. – sugeriu Ann

'- Bege. – falou Mark

'- Hum, pode estar qualquer cor menos bege. – discordou Annie.

'- Não se deixe enganar pela cor do caldeirão. – retrucou ele.

Jade pegou uma concha e encheu do líquido. Derramou num vidro transparente e estava realmente... bege.

'- Ele tem razão, Annie. – disse ela, divertida.

'- Não. – protestou Ann – Isso não é bege. É... sei lá, marrom claro, creme, tanto faz!

Lene revirou os olhos.

'- Como se não desse tudo na mesma. É bege, admita que perdeu.

'- Perdi o quê?

'- A discussão, oras! Você é muito teimosa.

'- Ah, sou eu, McKinnon, claro que sou eu. – tornou Ann, sarcástica.

'- Com licença. – falou Jade, aproximando-se de Ann.

'- AAAAAIIII! Enlouqueceu, J.? – berrou ela. – Pra quê me deixar careca?

Jade segurou cuidadosamente o fio de cabelo que havia arrancado da cabeça de Ann, e voltou-se para Lily.

'- Foi só um fio, Ann. Preciso de um fio do cabelo de cada uma de nós para a poção.

'- É Poção Polissuco, por acaso?

'- Não, Lene. Uma adaptação dela. – respondeu Jade, com um ar sábio.

Ela puxou um fio vermelho do cabelo de Lílian, que não gritou. Na verdade, ela nem pareceu notar.

'- Lily está na lua hoje. – comentou então. – Lene...

Ela escolheu um fio da mecha prateada que Marlene tinha na parte da frente dos cabelos, e arrancou-o.

'- Tinha que ser bem desse lugar? – protestou Lene.

'- Adoro essa sua mecha, apesar de não saber como é possível ela existir. – retrucou a outra.

'- É a genética... – resmungou Marlene – Detesto os cromossomos.

'- Cromossomos felizes... – cantarolou Jade, enquanto puxava um fio dos próprios cabelos negros e acetinados.

Foi até Mark e, ficando na ponta dos pés, tirou um fio claro de cerca de cinco centímetros da cabeça do rapaz.

'- Ué. Eu também vou beber esse negócio? – indagou ele, observando o caldeirão.

'- Desculpe. – disse Jade, dando um sorrisinho indulgente – Me empolguei.

A garota jogou fora o fio dourado e serviu uma concha da poção bege em quatro vidros de boca larga. Colocou com todo o cuidados os fios multicoloridos ao lado da poção, e bateu palmas, animada.

'- Agora vem o show pirotécnico!

Ela segurou o fio ondeado que retirara de Ann, e dobrando-o ao meio, deixou cair no recipiente. Imediatamente o líquido borbulhou e saltaram muitas faíscas azuis que subiram aproximadamente meio metro, antes de se dissolverem no ar. Uma névoa pontilhada de minúsculas estrelas da mesma cor emergiu da poção, e pairou sobre o copo, sem sumir. O líquido tomou uma coloração de chocolate, e começou a fumegar.

Jade depositava agora os outros fios de cabelos nos copos separados, e logo faíscas verdes, transparentes e cinzentas formaram um belo espetáculo silencioso no banheiro da Murta-Que-Geme.

'- Gostei da técnica. – comentou Mark, olhando as poções multicoloridas.

Lily segurou o copo que continha a própria poção, de uma coloração laranja-fogo.

'- As poções... têm algo em comum no jogo de cores. – falou, apontando as estrelinhas verdes que flutuavam entre a névoa de seu copo.

'- Sim! Eu usei um reagente que retira as principais características da sua aparência física. Ele vai buscar no DNA do seu fio de cabelo a cor dos seus olhos e a cor dos seus cabelos. – esclareceu ela, gesticulando enquanto falava.

'- E essa tal planta que elas vão buscar, se não me engano serve para fixar essas características e, a partir do código genético, moldar a projeção do corpo? – arriscou Mark, olhando o teto abobadado do banheiro.

'- Precisamente. – disse Jade - Agora, meninas, vocês têm exatamente meia hora para conseguir três folhas da Agrimina Tiposuleicanus e trazer até aqui, ok? Podem encontrar na orla da Floresta Proibida, ou ainda na região do gramado do Salgueiro Lutador. Fica à escolha de vocês.

'- Oh, que escolha maravilhosa: morrer espetada como um churrasquinho pelos centauros ou morrer amassada feito uma bola de carne por uma árvore anti-social. – murmurou Lene, sarcástica. – Isso, claro, se o Filch não nos pegar antes e nos der uma detenção.

'- Tem razão... podemos ser expulsas! – constatou Lily, pensando no fato pelo que parecia ser a primeira vez.

Marlene cruzou os braços e lançou um olhar enfadado para a amiga.

'- Onde você andava? Em Marte? Claro que podemos ser expulsas, Lily, estamos quebrando milhares de regulamentos do colégio que você devia ter decorado, porque você é a Monitora-Chefe.

Lily começou a dar sinais evidentes de nervosismo a partir daí.

'- Hum, só um minuto. – interrompeu Ann, antes delas saírem do banheiro - J., agora me ocorreu... como é que você fez o gato do Mark colher a planta?

Jade fez um gesto desesperado de silêncio, e Mark voltou seus olhos para Ann.

'- O quê o Iago tem a ver com isso? – perguntou, franzindo as sobrancelhas douradas.

'- Nada. Ele apenas foi cobaia de uma das experiências da Jade. – soltou Marlene. Jade lançou-lhe um olhar fulminante, e ela rapidamente acrescentou, empurrando Ann e Lily para fora do banheiro. – Errr, acho que temos uma planta para colher. Andem, garotas, que lerdeza!

'- Nós não deveríamos estar aqui. Vamos morrer. Ou pior, muito pior, vamos ser expulsas. Vamos sair daqui. Eu não quero ficar aqui. – murmurava Marlene, encolhida no meio de Annie e Lily.

As três garotas davam a volta no Salgueiro Lutador, mantendo uma distância relativamente segura de seus longos galhos. Elas mantinham as varinhas em mãos, mas, apesar do breu total no qual os terrenos de Hogwarts estavam envolvidos, não as acenderam.

'- Deixa de drama, Lene. – resmungou Annie

'- Mas é sério! Vocês sabem que eu não posso ser expulsa! Aliás, se Dumbledore não fosse um velhinho bacana...

'- E imensamente parecido com um Papai Noel desnutrido... – interrompeu Lily

'- Também, mas, se ele não fosse assim, eu nem pod...

Marlene parou de falar subitamente. Seus olhos arregalaram-se, e, mesmo no escuro, Annie pôde perceber que ela empalideceu por completo. Lily olhou na mesma direção do olhar da amiga e sua reação foi a mesma. Então Annie compreendeu o que estava acontecendo: os galhos do Salgueiro Lutador paralisaram-se de súbito, e, também de repente, um grande cervo imponente, com uma imensa galhada esgueirou-se por uma abertura na casca da árvore. E, para completa surpresa delas, atrás do cervo surgiu Sirius Black, parecendo estranhamente animado. Os olhos do animal brilharam por um instante na direção das meninas, e ele rapidamente voltou a entrar pelo buraco do Salgueiro. Então Sirius as viu; ficou momentaneamente sem fala, e não parecia saber o que fazer. Finalmente, correu até onde elas estavam, e começou a falar de maneira desordenada e apavorada.

'- Ah, meu Deus! O quê vocês estão fazendo aqui? Voltem, vamos, pelo amor de tudo o que é mais sagrado, voltem para o castelo!

'- Mas que diabos está acontecendo aqui? – perguntou Lily, exasperada - O que era aquele veado? P...

'- Não importa agora! – interrompeu Sirius, empurrando Lily pelas costas – Apenas voltem. Me ouçam, voltem para o castelo! Vamos!

Sua fala foi pontuada por um uivo alto e angustiado, que ecoou sinistramente pelas montanhas que rodeavam Hogwarts. Marlene balbuciou alguma coisa ininteligível. Sirius fez Lily correr pelo gramado, e puxava Ann por uma das mãos, e obrigava Marlene – que ainda tinha a boca aberta e os movimentos enrijecidos – a acompanhá-lo, conduzindo-a pelos ombros.

Já adentravam em silêncio o castelo, quando Annie recobrou os plenos sentidos. Sirius ainda as guiava, e, sem que pensassem muito no assunto, as garotas voltaram ao banheiro da Murta-Que-Geme. Sirius manteve-se parado à porta, uma das mãos na maçaneta.

'- O que está acontecendo? – perguntou Jade, espantada, saindo de um dos reservados.

Sirius olhou para Jade, que segurava algumas folhas numa das mãos, para Mark, que estava abanando o vapor que saía do caldeirão, de Mark para as três garotas ofegantes, de olhos arregalados e totalmente confusas. Só então falou, dando um sorriso forçado.

'- Ah, estávamos fazendo uma festa no Salgueiro Lutador.

Sua frase saiu totalmente desconexa e impossível de ser levada em consideração. Ann ergueu as sobrancelhas, e Lily lançou um olhar inquiridor ao rapaz. Ele notou que ninguém acreditou no que disse, e tentou consertar.

'- Tudo bem, tudo bem. – continuou, em um tom resignado – Remo é um lobisomem.

Aos ouvidos dos ocupantes do banheiro, essa segunda desculpa soou tão nonsense quanto a primeira. Eles esperavam Sirius parar de brincadeiras e falar a verdade, mas não foi bem o que aconteceu.

'- Ah, menos mal. Eu já ia pedir para que não me fizessem perguntas. Volto logo, eu juro. Não saiam daí. – disse, e saiu do banheiro, fechando a porta.

Um barulho metálico fez-se ouvir, e depois, apenas o silêncio estupefato dos cinco adolescentes, calados em sua surpresa molhada pelas lágrimas de um fantasma. Lily foi a primeira a explodir.

'- HEEEY! BLACK, VOLTE AQUI AGORA! ABRA ESSA PORTAAAAAAAA! VOU AVISAR O DUMBLEDORE E VOCÊ VAI SER EXPULSO, GAROTO! ABRA ISSOOOOOOO! – Lily voara na maçaneta de metal, e chacoalhava-a incessantemente. A cena poderia ser cômica, se alguém ali tivesse humor para rir àquela hora.

'- Lily. – chamou Annie, tentando acalmá-la – Não vai abrir. O barulho foi de uma das trancas mágicas da Zonko's, só quem a trancou pode destrancar.

Lily soltou um urro tão parecido com o de um leão que Ann chegou a dar dois passos para trás. Voltou a chacoalhar a maçaneta, quase quebrando a porta.

'- ABRE! ABRE! ABREEEEEE! MAS QUE MERDAAAAAAA!

'- Lílian, menos! – Mark falou pela primeira vez desde que foram trancados ali. O garoto foi até Lily e segurou seus braços, obrigando-a a afastar-se dali.

Mark, surpreendentemente, conseguiu acalmar Lily, embora de uma forma estranha. Ele segurou suas mãos, e fê-la sentar-se sobre a bancada de uma das pias. Então, ainda sem dizer nada, abriu a torneira e molhou as mãos da garota na água. Lily piscou algumas vezes, e Mark olhou-a demoradamente.

'- Tudo bem. – disse ela, em resposta à pergunta muda do rapaz.

Annie sabia que Lily tinha crises de claustrofobia ao se ver nervosa, ou em situações difíceis. Mas nunca tinha visto alguém acalmá-la tão facilmente quanto Mark o fez. Ela voltou-se para Marlene, que ainda estava assustada, e aparentemente à beira das lágrimas.

'- Lene? – chamou Ann, tocando o ombro da amiga. Esta virou-se para ela, hesitante.

'- O que foi aquilo, Annie?

Ann não disse nada. Apenas passou os braços em torno da amiga, e Lene deixou-se abraçar. Só quando suas pernas fraquejaram é que Annie notou o quanto também estava abalada.

'- Vai nos contar porque está tão avoada assim hoje, Lil? – perguntou Ann.

Era cerca de duas horas da manhã, e eles continuavam trancados no banheiro. Cada um arrumara-se numa posição mais confortável – sentados na bancada das pias, ou sobre os vasos sanitários – e agora, depois de passarem um bom tempo discutindo os motivos pelos quais Sirius estava fora do castelo, em companhia de um veado, e ainda por cima trancara-os no banheiro, eles tentavam extrair de Lily a verdade sobre o que estava acontecendo.

'- Ah, eu... – Lily hesitou.

Olhou para Mark, indicando claramente que não queria falar com ele por perto. Porém, talvez o olhar vago de menino perdido que Mark ostentava a impeliu a falar.

'- É que ontem à noite, eu... Tiago... eu... Tiago... nós... eu e Tiago nos beijamos. – concluiu, de um fôlego só, e então baixou o olhar.

As reações foram muito distintas; Jade ergueu as sobrancelhas e abriu a boca, Lene fez uma careta entre enojada e divertida, Annie gargalhou estrondosamente, e Mark murmurou um "Eu sabia." que soou extremamente zombeteiro. Lily corou ruidosamente, e gesticulava aborrecida, para Annie deixar de rir.

'- Bem, Lily – desculpou-se ela – Sinto muito, mas acho que depois de tanto tempo, já estava na hora de algo acontecer.

'- Não está acontecendo nada!

'- Então o que significa o beijo?

'- Um deslize! – respondeu Lily, exasperada – Um infeliz deslize!

'- Sei... – Annie não pôde dizer mais nada, pois um jato de água a acertou em cheio, vindo de um dos sanitários.

Uma cabeça prateada emergiu da peça de porcelana, e depois um corpo. Uma garota baixa, com os cabelos escuros e óculos enormes olhou para eles em uma tristeza raivosa. Quando falou, o fez com uma voz chorosa e esganiçada.

'- O que estão fazendo aqui?

'- Nada que te interesse, Murta. – retrucou Lene, rude.

'- Vieram zombar de mim? A Murta chorona? A Murta apática? A Murta feia? Foi isso? – tornou o fantasma, sobrevoando os reservados.

'- Não exatamente, mas nos sentiremos felizes em fazer isso se você não sair daqui agora. – devolveu Marlene.

'- Esse é o MEU banheiro!

'- Achei que o banheiro fosse público.

'- Ele – e Murta apontou Mark – é um garoto! Garotos não devem entrar aqui!

'- Você tem algo a ver com isso? Não, portanto, cale a boca.

Murta irrompeu num choro exageradamente estridente, e pronunciando alguns xingamentos enfiou-se novamente no vaso sanitário aberto, molhando tudo num raio de dez metros.

'- Pra onde ela foi? – perguntou Ann.

'- Provavelmente espiar algum dos monitores tomar banho. – Lily balançou os ombros.

'- Ela faz isso? – admirou-se Jade.

'- O tempo todo.

Era madrugada quando Annie sentiu-se acordar por uma voz falando baixo. Instantaneamente, lembrou onde estava. A luz dos archotes nas paredes do banheiro haviam se extinguido, e estava tudo às escuras. O contorno dos objetos não passava de meros borrões, mas sentia algo muito quente pousado em suas costas. Eram as costas de Mark, e a cabeça de Jade estava molemente apoiada no ombro do rapaz. Annie afastou vagarosamente a mão da garota, jogada sobre sua barriga. Dormiam meio embolados, num canto seco do banheiro. Marlene estava recostada na parede, respirando forte, e a cabeça de Lily estava no colo da amiga.

'- Não é tão impossível. – Annie distinguiu a voz de Mark sussurrando.

'- Eu estava dormindo. – resmungou ela.

'- Mas não é impossível, de jeito nenhum. – insistiu o garoto.

'- Se você continuar falando, é. – retrucou ela, tentando adormecer novamente.

'- Estou falando de Remo Lupin ser um lobisomem.

Annie acordou-se imediatamente.

'- O que quer dizer?

'- Todas essas saídas dele... parentes mortos ou doentes, não? Mas coincidem com a lua cheia. Ele parece estar sempre muito cansado depois disso... e hoje... último dia dessa fase lunar, e vocês ouvem uivos, e Remo Lupin não está aqui.

Annie sentiu suas pernas adormecerem. Tentava assimilar aquilo. Realmente tinha sentido... logo ela passou a se apavorar com essa possibilidade. Não conseguiu dormir até que a noite terminasse, o sol despontasse no horizonte, e Sirius destrancasse a porta, parecendo exausto e pedindo para que o acompanhassem.

O sol pálido lançava seus raios sobre a cama do único ocupante da ala hospitalar àquela hora. Remo Lupin estava recostado em muitos travesseiros, parecendo mais doente e cansado que nunca, e ostentava alguns arranhões no rosto, braços e em seu peito. Estava coberto até a cintura pelos lençóis imaculadamente brancos, e tinha alguns curativos e bandagens manchados de vermelho vivo no tronco. Tiago e Pedro estavam acomodados em cadeiras ao lado do leito, e Sirius mantinha-se em pé. Annie, Jade, Mark e Lene sentaram-se na cama em frente, e Lily ficou do lado oposto da cadeira de Tiago.

'- Vamos Remo. Acho melhor contar tudo antes que eles descubram pelo modo errado, meu velho. – disse Sirius, e sua atitude era de descaso, porém, a mão que mantinha sobre o ombro do amigo dizia totalmente o contrário.

Remo assentiu com um sorriso triste, e quando falou, sua voz denotava resignação apreensiva.

'- Bem, vou entender perfeitamente se vocês quiserem... hm, se afastar de mim, quando souberem de tudo. Eu preferia não contar, mas Sirius está certo, cedo ou tarde vocês iriam descobrir, e confio em todos aqui. – Remo mexeu-se na cama, e Tiago arrumou-lhe os travesseiros. – Não há nenhum parente morto ou doente. Minha mãe nunca me chamou para ir ao velório da minha avó. A verdade é que eu nunca saí de Hogwarts. Ou melhor, saí sim. Saio todos os meses, nos períodos de lua cheia, e vou até a Casa dos Gritos.

Remo fez uma pausa, mas a essa altura todos já sabiam que Sirius havia dito a verdade naquele banheiro. Annie estava apenas apreensiva pelo que iria escutar da boca do amigo. Um raio de sol dançou nos cabelos castanhos do rapaz, atingindo seus olhos. Ela notou que os olhos de Remo estavam amarelados, com as pupilas estreitas e verticais.

'- De fato, eu sou um lobisomem. Conto apenas com o sigilo de vocês. – concluiu ele, e a Ann, Remo aparentava uma angústia insuportável.

Por uma fração de segundo, o som da voz do garoto reboou na enfermaria vazia e cirurgicamente limpa. Lily adiantou-se, com a voz trêmula.

'- O que quer dizer com "nos afastarmos de você", Remo?

Ele ergueu a cabeça que havia abaixado.

'- Bem, você sabe... as pessoas têm... medo. Não querem estar perto. – respondeu, vacilante.

'- Não diga bobagens, Remo. Você não tem culpa disso, e apenas quem é muito ignorante tem medo de um amigo. – atalhou Annie, sorrindo.

'- Pode contar é com a nossa ajuda! – reforçou Jade.

Mark sorriu e balançou a cabeça em concordância. Marlene não disse nada. Mirava Remo com uma expressão distante, e Ann sabia no que a amiga estava pensando naquele momento.

Remo olhou para cada um deles, e seus olhos emanavam uma esperança selvagem, uma alegria agradecida. Sirius, se sorrisse mais, provavelmente racharia o rosto. Tiago levou a mão direita ao cabelo de Remo, num ímpeto de afeto sincero. Pedro apenas sorriu, balançando os pés na cadeira.

'- Passagem... – disse Jade, meio aérea – Salgueiro Lutador... mas como Sirius estava lá? Estavam juntos... lobisomens e pessoas... cervo...

Para Ann o que Jade dizia não fazia o menor sentido. Mas para Mark pareceu fazer.

'- É... animais... animagos. Vocês são animagos? – disparou a pergunta contra Sirius.

Este empalideceu, e olhou de volta para os três amigos. Tiago balançou minimamente os ombros, e Sirius devolveu com um sinal afirmativo de cabeça.

'- Maldito seja o raciocínio dos corvinais! – disse ele relutante, brincando – Você está certo. Se é pra contar, que contemos tudo. Sim, Tiago, Pedro e eu viramos animagos em nosso quinto ano, para poder estar com Remo durante as transformações. Eu me transformo em cachorro, Pedro em rato e Tiago em veado.

'- Cervo, Sirius, cervo. – corrigiu Tiago, emburrado.

O sentido ambíguo atribuído ao animal em que Tiago se transformava fez um sorrisinho irônico aparecer no canto da boca de Lily. Annie reprimiu uma risada, mas Jade gargalhou. Ria como se o mundo fosse acabar, e como se a situação não fosse, de certa forma, delicada. Annie só pôde concluir que ria de nervoso. Ela comprimia a barriga, e o colchão todo da cama se chacoalhava junto com seu corpo. Levou um tempo até que ela erguesse a cabeça, enxugasse as lágrimas dos olhos e pedisse desculpas pelo ataque de riso.

'- Acho melhor irmos tomar café, cambada. Afinal, Aluado está de repouso. – sugeriu Tiago, após um tempo, durante o qual todos conversaram fervorosamente.

Todos despediram-se de Remo, menos Marlene, que teve a atitude mais improvável que Ann já imaginou que a garota pudesse ter. Ela pediu para que os outros fossem, mas que ficaria para conversar um pouco com Remo.

'- Preciso falar com ele. – alegou, e eles assentiram.

Marlene não acreditava no que estava fazendo. Conversar com Lupin? Ela era uma idiota sentimental mesmo. Em contradição, acreditava que realmente precisava fazer aquilo. Era quase como se não tivesse um controle pleno de seus atos ou pensamentos.

'- Está se sentindo bem? – perguntou Lupin, olhando-a entre intrigado e divertido.

Marlene ignorou a pergunta, e aproximou-se mais da cama. Baixou os olhos para o corpo do rapaz, cerrando as sobrancelhas ao notar as bandagens sobre a pele pálida.

'- Você sempre se machuca assim? – perguntou, percorrendo com o dedo uma das cicatrizes finas no ombro de Lupin.

Ele levantou-se, e não respondeu. Apenas tirou a mão dela de seu ombro, e segurou entre a sua.

'- Por que está aqui? – indagou numa voz suave.

Marlene notou a dúvida e o sofrimento naqueles olhos lupinos. Uma réstia de sol brincava no rosto pálido e nos cabelos de Remo, emprestando-lhes tonalidades douradas. Lene baixou a guarda, e olhou para o chão, sentindo-se entre envergonhada e exasperada.

'- Sei como se sente.

'- Não, não sabe. – afirmou ele em resposta.

'- Acredite. – tornou Marlene, fixando os olhos dele - Sente-se isolado, sozinho, injustiçado. Pergunta-se porque isso aconteceu justamente com você. Tem medo da rejeição, vive uma mentira. Sofre constantemente, acha que seu futuro será vazio. Seus momentos de alegria lhe são tirados pela dor de saber que nunca deixará de ser o que é. Sim, sei como se sente.

Remo tocou-lhe o rosto com a mão. Marlene sentiu as lágrimas acumulando-se nos olhos. Não poderia deixá-las cair, mas era tarde. Elas rolaram-lhe pelas bochechas deixando um rastro quente de angústia.

'- Quando vai me dizer quem você realmente é? – perguntou Remo, quase como que para ele mesmo.

Marlene enlaçou o pescoço dele com os braços, sentindo a pele morna das costas do rapaz sob suas mãos. Remo pareceu surpreso por um momento, mas então deslizou as mãos pela cintura da garota, puxando-a de encontro a si. A respiração dele atingia a nuca de Lene, e ela sentiu-se estremecer, antes que pudesse murmurar:

'- Saberá quando for a hora.

Remo a afastou de si, afagando ternamente seus cabelos negros, e limpando as lágrimas que ainda insistiam em cair pelo rosto de Lene com o dedo. Ela deu um passo para trás, como se tivesse percebido o que fizera, e passou convulsivamente as mãos pelo rosto, num gesto de nervosismo.

'- Olha, será que podemos... voltar às discussões? – perguntou ansiosa.

'- Por mim, tudo bem. – respondeu Remo, com um sorriso misterioso.

'- Ok, então. – concordou ela, e, fechando a cara, continuou – Lupin, o que você está fazendo fora da cama desse jeito indecente?

Remo olhou para a calça de pijama – e apenas ela – que vestia.

'- Você não é minha mãe, McKinnon. Os incomodados que se mudem. – respondeu ele, desdenhoso.

'- Olha o respeito! Estamos numa enfermaria!

'- Que, por acaso, está vazia! Sendo assim, vira apenas um cômodo como qualquer outro.

'- Você está começando a me encher, Lupin!

'- Você me encheu há muito tempo, McKinnon!

'- Ótimo! – berrou ela, abrindo a porta da enfermaria.

'- Ótimo! – devolveu ele, com os punhos cerrados.

Marlene fechou a porta da enfermaria com um estrondo, e apoiou as costas nela, então. Com um leve sorriso aliviado no rosto, deixou-se escorregar até o chão. Do outro lado da porta, Remo ficara em pé, mirando a porta fechada, e com a mão no ombro, onde ela havia tocado-o.


N/A: Salve, cambada! Antes de tudo, quero pedir milhares de desculpas pela demora catastrófica a atualizar. Sei que não é como se alguém se importasse, mas preciso me desculpar. O problema é que fiquei sem net por um bom tempo, e depois, sem PC. Portanto, não pude escrever. Mas já resolvi o problema, e aproveitei pra fazer uma macumba básica contra aquele técnico lerdo. Mwahaahaauahauahaua! Mas espero que o tamanho do capítulo compense.

Acho que vcs notaram que eu mudei um pouco o foco principal da história por alguns momentos, não? Mas só assim se eu quiser dar um toquezinho romântico a mais nessa joça. O beijo da Lily e do Tiago revoltou vcs pela descrição pobre e incompleta? Desculpem-me, mas sou totalmente nula quando é pra escrever esse tipo de coisa. E a pequena interação Remo/Lene no finzinho do capítulo pode OU não significar algo mais futuramente. Ainda não sei, preciso me decidir.

By the way, notaram que finalmente elas ficaram sabendo que Remo é um lobisomem? E decidi entregar o jogo dos Marotos de uma vez, pra não ficar embromando muito. Mas eu gostaria de ter feito algo mais elaborado nessa "revelação" toda.

Quero pedir desculpas também porque nesse capítulo não vai ter resposta de reviews. Caso contrário, demoraria mais ainda. E também vai haver, mais aqui embaixo, uma intromissão da minha amiga e escritora Mia Moony. Eu ainda não sei o que ela vai escrever, portanto, não posso dizer-lhes para quê devem se preparar. Hehe. Mas é uma participação especial, uma vez que esse capítulo também saiu mais pela insistência irritante dela. (Quatro e-mails, uma review e um comentário no blog dizendo pra eu andar com isso? Enchi o saco e escrevi logo, hauehaueaheu!). Obrigada, Mia, por me empurrar sempre pra frente, nem que seja à força!

N/M (nota da Mia): Oi,tudo bem? Estou eu aqui se intrometendo na fic da minha querida amiga Lira. Bem,vocês devem seus sinceros agradecimentos a mim, porque se não fosse pela minha insistência irritante,segundo a Lira, acho que esse capítulo não sairia nunca. Sério,ela tem razão quanto a minha insistência. Eu sou chata mesmo,mas ela é uma pessoa malvada. Eu quase morri de curiosidade! E isso não se faz,né,gente? Nós não merecemos isso... Agora, vou falar sobre o que achei do capítulo. Eu amei.Lira, eu particularmente não ligo para sua "descrição pobre e incompleta". Eu tenho imaginação (e acredito que os outros leitores também) para "ver" coisas além das que você descreve. Então,não esquenta. Gostei da revelação de que Remo é um lobisomem e os outros Marotos animagos. Adorei,simplesmente. A parte que mais gostei foi a do Aluado e da Lene. Adoro as discussões deles, e espero que isso dê em alguma coisa. Porque eu amo a Lene e amo o Aluado. As razões de amar a Lene são simples: ela é inspirada em mim, e não poderia ser mais perfeita (rsrsrsrsrs... desculpem esse "momento Sirius Black"). Mas sério,vocês gostam da Lene (não se detenham em falar que acham ela insuportável só porque eu disse que foi inspirada em mim,por favor)? Também amo o Aluado,porque ele é perfeito,meu Aluado. Voltando a assuntos menos egocêntricos, cada vez eu gosto mais do Mark. Ele é tão... ai, ai.../suspira/. Muito fofo. E inteligente. E legal. E... ok, vou parar de elogiar o menino. Mas ele é tudo isso e muito mais.

Me ajudem a insistir para que o próximo capítulo não demore tanto quanto esse, por favor! Agora, vou acabar por aqui essa loucura...tchau, gente! E, se a Lira permitir, futuramente estarei aqui incomodando novamente.

propaganda é a alma do negócio...e eu sou uma chata de galochas por se aproveitar da suposta bondade imensa de minha amiga e, além de deixar uma N/M, ainda fazer uma propaganda. Bem, leiam minha fic, Liz Hollowe, se possível. Ela não é ruim. E eu fico realmente feliz quando sei que as pessoas lêem. Então, está dado o recado...rsrsrsrs.

N/A2: A Mia é um poço de modéstia, não? De fato, tentarei não demorar tanto na postagem do próximo capítulo. Quero mandar um beijão para todos vocês, que de alguma maneira misteriosa continuam me agüentando. Para quem não está comentando, um belo soco na cara. Até a próxima. Hasta la vista!