O grupo estava reunido no vilarejo da velha Kaede. Após o incidente, todos concordaram que deviam voltar e pensar numa maneira de libertar Shanara do Naraku. Kamala havia voltado para a outra era com Kagome, para informar Yuri do ocorrido. Kaede preparava o jantar dentro da cabana, mas os jovens estavam do lado de fora. O luar iluminava todos os arredores da floresta do Inuyasha.

- Talvez fosse conveniente – começo Miroku – pedirmos ajuda do meu mestre Mujin. Ele conhece muito sobre lendas antigas, talvez saiba nos dizer uma maneira de trazer a moça novamente á razão.

- Acho pouco provável – respondeu Sango – o seu mestre Mujin é um velho bêbado e sem vergonha com você.

- Também não precisa ofender, né Sango... – fungou o monge se sentindo derrotado.

- É melhor esperar pelo Kamala – falou Shippou mordendo um doce. – Ele conhece a Shanara melhor que nós, você não acha Inuyasha? Ei Inuyasha, falei com você! O que deu nesse idiota?

Mas o hanyou não respondia. De repente ele se levantou e saiu andando em direção a floresta. Sango cutucou Kagome.

- Ei, não é melhor ir atrás dele Kagome?

- Não. – suspirou a mocinha – é melhor que ele fique sozinho um pouco. Sabe, ele se culpa pelo que aconteceu. Por causa do sangue.

- Mas isso é um absurdo! Se ele não tivesse dado o sangue a ela, Shanara teria morrido!

- Sim, mas ele acha que por causa disso o Naraku conseguiu acordar a alma negra dela. É o que ele queria fazer com a Kikyou, fazendo ela odiar o Inuyasha para corromper a jóia de quatro almas. Só que desta vez ele não usou a aparência de Inuyasha, e sim o próprio sangue dele.

- Pobre Inuyasha. – disse finalmente Sango.

O hanyou caminhava vagarosamente pela floresta, cujo caminho era banhado pela luz prateada da lua. De repente uma luz mais forte chamou a atenção dele e pode ver uma serpente caçadora em direção a uma velha árvore. Ele correu até lá e viu Kikyou, em meio a seus youkais carregadores.

- Kikyou...

- Inuyasha. Porque veio até mim?

Ele se aproximou da miko.

- O que faz por aqui Kikyou?

Ela sorriu.

- Senti a presença do Naraku por aqui e vim investigar. Me diga Inuyasha, ainda está acompanhado daqueles dois guerreiros?

Ele se surpreendeu com a pergunta dela.

- Porque quer saber?

- É simples. O Naraku está atrás deles não está?

O hanyou estava cada vez mais intrigado.

- Como sabe Kikyou?

- Estive observando vocês. A garota não está mais aqui. E como o Naraku está por perto...

- É. Ele a levou.

Os olhos dele se entristeceram. Kikyou se aproximou do hanyou e tocou seu rosto.

- Inuyasha, sinto em você uma profunda tristeza.

Ele não disse nada. Afastou a mão da miko e virou as costas. Sumiu no meio da escuridão.

No dia seguinte todos esperavam a volta de Kamala e Kagome. O grupo estava reunido ao redor do poço come-ossos. O silencio era total. Inuyasha finalmente quebrou esse silêncio gritando como era seu jeito.

- Maldição! Será que aqueles dois não voltam mais? Vou até lá buscar eles!

E com um pé já no poço, foi interrompido por Sango.

- Espere Inuyasha!

O poço começou a brilhar. Kagome foi a primeira que saiu, com uma mochila enorme nas costas.

- Ai Inuyasha, me ajuda aqui!

- Como! O maldito trancinha não te ajudou com isso?

- Claro que sim! Não foi só isso que trouxe, ele ficou com o mais pesado.

Kamala saltou fora do poço carregando umas caixas de lamen enormes. Inuyasha lambeu os beiços ao ver aquilo. Mas ficou bravo porque Kamala jogou os caixotes todos em cima dele.

- Devia ter trazido ração Biriba pra esse cachorrinho mal educado Kagome. Você é boazinha demais com ele.

- Sseu... eu vou te matar!

As caixas voaram longe. Inuyasha sacou a Tessaiga furioso mas levou um golpe poderoso que o fez cair no chão. Sango e Miroku se prepararam pra lutar. Uma moça esguia, com uma trança parecida com a de Kamala, e uma espada dupla nas mãos, apontava a arma para o pescoço do hanyou que ainda estava bobo no chão.

- Ei que idéia foi essa carinha?

- Mas quem é você? – Sango se preparava para atacar. Kamala a deteve.

- Calma Sango! Ela está do nosso lado. Hamala, abaixa essa coisa, o cachorro late mais não morde não.

Ela sorriu e deu a mão pra Inuyasha, mas este saltou veloz para trás.

- Quem é essa aí?

- É a irmã do Kamala Inuyasha! Não seja grosso!

Ele estava pasmo.

- Grosso! Ela me atacou primeiro!

- Porque você ia atacar meu irmão. Nada contra você.

- Feh! Maldição!

- Inuyasha! Senta!

O resultado do senta agradou Kamala.

- Onde compro esses colares ein Kagome? – o hanyou praguejou de cara no chão ante o comentário do rapaz. Miroku não perdeu a oportunidade e chegou perto de Hamala.

- Muito prazer bela senhorita! Não gostaria de ter um filho meu?

Ela riu divertida.

- O que é maninho, tem concorrência pra você do lado de cá do poço? Hahahaha! Não me faça rir!

O monge se encolheu de vergonha, nunca uma mulher tinha zombado de seus galanteios. Sango riu baixinho. Kagome revirou os olhos.

- Ela veio ajudar a salvar a Shanara – Kamala se sentou na beira do poço – ei maninha, deixa eu te apresentar o pessoal.

Enquanto isso no vilarejo Kaede recebia a visita de sua irmã mais velha. Kikyou adentrou na cabana da velhota, que estava sentada perto do fogo. Quando viu a miko a velha sorriu.

- Minha irmã, o que a traz aqui?

- Diga-me Kaede – ela se ajoelhou em frente a velhota – o que está acontecendo, por que a moça foi raptada pelo Naraku?

- Não sabemos o que aquele monstro quer com ela. Mas não é nada bom, podemos ter certeza. O que sabemos é que ele deseja usar os poderes dela em seu favor, como faz com todos.

- Poderes?

- Sim. Você deve ter sentido a aura sinistra que emana dela, não é?

- É verdade.

- Pois ela bebeu o sangue de Inuyasha e essa aura sinistra se fortaleceu, e o lado negro despertou.

- Entendo. A lenda do sacerdote e do dragão é verdadeira então. E o que Inuyasha pretende fazer? Resgatá-la?

- Claro que eles vão tentar salvá-la minha irmã.

- Diga pra desistirem.

- O que? - A velha estava pasma.

- É isso mesmo Kaede – Kikyou se levantou e se dirigiu a porta – aquela menina está perdida. Diga para desistirem ou serão mortos.

A sacerdotisa saiu da cabana deixando Kaede preocupada. Depois de algum tempo eles chegavam ao vilarejo. O grupo de mulheres seguia na frente, com Kamala. Inuyasha, Miroku e Shippou iam mais atrás. Miroku cochichou para o hanyou.

- Ei Inuyasha, o que você achou dessa irmã do Kamala?

- Bah! É ainda mais arrogante que o irmão! Não sei em que vão nos ajudar a trazer a Shanara de volta.

- É – o monge fez cara de safado – principalmente porque ela lhe distrai a beça, não é?

Inuyasha se virou revoltado.

- Olha aqui Miroku se você não parar com esses comentários idiotas vou te jogar naquele poço entendeu?

O monge se afastou com o tom de voz do hanyou. Ele nunca demonstrara tamanha frieza na voz como naquela hora. Será que Inuyasha estaria voltando a ser o meio youkai que não se importava com ninguém? A pergunta soou na cabeça de Miroku.

Chegando ao vilarejo as moças entraram na cabana e encontraram a velhota com semblante preocupado. Kagome se aproximou dela e perguntou.

- O que foi vovó Kaede? A senhora parece tão inquieta?

- Não é nada querida. – a velha disfarçou e sorriu – quem é essa mocinha?

- É irmã do Kamala, ela veio nos ajudar a encontrar a Shanara e salvá-la do Naraku.

- Meu nome é Hamala, muito prazer! – ela estendeu a mão sorrindo.

Depois das apresentações elas trataram de preparar algo para comerem. Os rapazes ficaram do lado de fora, um pouco distantes da cabana. O cheiro da comida atraiu a atenção de Shippou, que correu para dentro. Kamala disse para Miroku ao ver que Inuyasha estava calado desde que voltaram do poço.

- Ei houshi-sama, o que tem o vira-lata? Que bicho mordeu esse pulguento que ele não xinga nem pragueja a um tempão?

- Ele está deprimido – sussurrou o monge temendo levar um coque – é por causa do que aconteceu com a Shanara. Inuyasha é muito sensível a coisas como essas, porque lembra o que aconteceu com a Kikyou. Sabe como é, ela ter caído nas garras de um sujeito vil como o Naraku, como a cinqüenta anos atrás.

- Claro. – suspirou Kamala – mas ele tem que sair dessa paranóia, a gente vai tirar a Narinha das mãos daquele idiota. Você vai ver.

O hanyou permanecia calado, sentado no alto de uma árvore. Sua face não tinha nenhum vestígio de irritação ou ansiedade, apenas um vazio. Os olhos dourados fitavam o nada, como olhos de um morto. Sim, um morto, como Shanara e como Kikyou, duas das mulheres que tinham sido e ainda eram muito importantes para ele. De um jeito ou de outro a vida de Inuyasha se ligava a uma humana, assim como seu pai. Será que o seu destino era semelhante ao de Inu-Taisho, morrer pra defender uma humana?

As divagações dele foram interrompidas por uma brisa suave, que trouxe levemente um cheiro familiar. No primeiro momento não quis acreditar, mas depois teve vontade de ir tirar a duvida. Afinal, ali por perto haviam muitos canteiros selvagens e esse cheiro impregnava as terras feudais essa época do ano. Mas o perfume era um pouco diferente, tinha um odor tropical, misterioso. Não podia ser.

Ele saltou e seguiu a direção do vento, e o cheiro foi ficando cada vez mais forte e familiar. Sim, era o cheiro dela. Ele correu mais veloz ainda, com medo do perfume desaparecer na imensidão da tarde avermelhada pelo sol de primavera. Seguiram alguns segundos para ele avistá-la de costas no alto de uma colina, toda florida aos seus pés. Os longos cabelos voavam deliciosamente ao sabor da ventania, manchando o rubor do entardecer. O hanyou gritou seu nome e num segundo ela se virou, fitando-o com os olhos amarelos e demoníacos. Mas sua face branca não estava transfigurada, mantinha o ar sereno de sempre. Em seus olhos rolavam lágrimas de sangue e ao ver isso Inuyasha estacou e não se aproximou mais. O cheiro dela está misturado ao do maldito Naraku, pensou ele com pesar. E seu sangue era o de um youkai completo.

- Shanara... me perdoe... eu não devia...

- Não é sua culpa – interrompeu ela – o que aconteceu comigo foi uma sucessão de acontecimentos dos quais eu não poderia fugir, era o meu destino.

- Não! – gritou ele – se eu não tivesse sido tão imprudente... eu não consigo proteger ninguém, todos que estão ao meu redor sofrem – ele abaixou o olhar – talvez eu devesse ter continuado lacrado naquela árvore, eu nunca deveria ter saído de lá.

- Não é verdade – ela se aproximou dele e tocou seu rosto - o que as pessoas que te amam fariam sem você meu querido...

Ela lhe beijou a face amorosamente, e ele a puxou e a abraçou tão forte que pareciam um só. As árvores rangeram ao sabor do vento que agora soprava mais intensamente. Embora ela tivesse o sangue de um demônio ainda era a sua Shanara, pensou o hanyou embriagado com o perfume de flores que dela emanava. Ele estremeceu ao sentir a frieza daquele corpo semi morto, o corpo de uma vampira completa.

Repentinamente uma pulsação fez Shanara tremer. Era o fragmento corrompido que vibrava com a força maligna de Naraku. Ela tentou inutilmente lutar contra aquela energia mas não teve forças. Os caninos dela cresceram mais ainda e ela se preparou para morder o pescoço de Inuyasha e sugar seu sangue. Sussurou concentrando sua força ao máximo.

- F... fuja... Inu... yasha...

Mas ele não ouvia mais nada. Ela então usando das ultimas energias de seu coração puxou seu tridente e perfurou a barriga de Inuyasha, que caiu ferido.

- Me perdoe... Inuyasha...

Ela chorava e se ajoelhou perto do hanyou que a olhava sorrindo.

- Não chore... minha Shanara...

Ele desmaiou ante o golpe. Sentiu o calor do sangue de Inuyasha que estava em sua arma e em suas mãos. Ela se levantou, afastou-se dele. Invocou o lobo com um grito de dor.

- Lealdade!

Saltou no dorso do lobo e fugiu montada em Lealdade.

No vilarejo as garotas chamaram os rapazes para comer, e Miroku gritava em vão pelo nome do hanyou. Ele entrou na cabana com ar preocupado.

- Eu não encontro o Inuyasha, onde será que ele foi?

De repente Kagome teve um mal pressentimento.

- Vamos procurar o Inuyasha – ela falou e sua voz tinha um vibrar amedrontado – ele não está bem.

Todos saíram a procura do hanyou pela floresta e redondezas. Haviam passado alguns minutos quando Kagome pressentiu a presença de fragmentos da jóia de quatro almas. Na hora imaginou seu o Kouga e sua surpresa foi enorme quando viu o youkai lobo chegando carregando Inuyasha nas costas. Todos correram até ele.

- Inuyasha! – gritou Kagome e seu horror foi ainda maior quando Kouga o colocou no chão e ela pode ver o ferimento que ele tinha na barriga. Sangrava muito.

- Mas o que aconteceu com ele? – disse Miroku e logo olhou feio pra Kouga – Você...

- Não me olhe desse jeito monge, eu não fiz isso ao cara de cachorro. Quando o encontrei ele já estava assim.

Ele se virou para pegar as mãos de Kagome mas ela estava ajoelhada ao lado do hanyou, em prantos.

- Ele está morto? – questionou ela desesperada.

- E esse cara morre tão facilmente Kagome? – zombou o youkai lobo – está vivo mas muito ferido.

- Senhorita Kagome, é melhor levar ele pra dentro – falou Miroku.

Eles o carregaram para dentro da cabana. Quando tiraram a capa e o kimono dele é que viram a gravidade do ferimento. Kamala arregalou os olhos.

- Peraí, esse ferimento foi feito pelo Lealdade!

- Como sabe? – quis saber Sango.

- Veja aqui... mostrou ele – o ferimento está cauterizado pela energia que emanou da arma, e são três ferimentos paralelos, isso é o tipo de ferimento que um tridente, que tem três pontas, causa na carne. Não tenho duvidas, foi a Shanara que feriu ele.

- Mas isso é impossível! – disse Kagome – ela está a serviço do Naraku, porque não o matou então?

Hamala afastou os cabelos do pescoço de Inuyasha e pode ver os vestígios dos dentes na pele do hanyou. No entanto não chegaram a perfurar.

- Olhe isso maninho, as marcas dos dentes dela, ela ia morder ele.

- Sim... então é isso...

Todos questionaram os irmãos. Hamala falou.

- Parece que ela veio até ele para amaldiçoá-lo sugando seu sangue, mas em vez disso o feriu com o tridente. Ela fez pra proteger o carinha de um destino pior que a morte.

Ela examinou o ferimento e sacou sua espada dupla, apontando a lamina para Inuyasha. Sango pegou seu braço para impedir.

- O que vai fazer? Ainda podemos salvá-lo!

- Mas é isso que eu vou fazer ora bolas! – se desvencilhou da exterminadora e uma serpente de energia emanou da arma e volteou sobre o ferimento que se fechou. Todos estavam admirados. Kamala sorriu.

- Saibam que se a minha irmã não estivesse aqui o vira lata já era! Nada pode curar um ferimento provocado por uma arma sagrada, somente o poder de cura da serpente é capaz disso.

- Sim. – Hamala se sentou mais no canto e suspirou. – A Shanara deve saber que eu estou aqui, por isso o feriu com o Lealdade.

- Impressionante – falou a velha Kaede examinando a barriga de Inuyasha que continuava desmaiado. – Mas e agora?

- Deixe que ele durma, precisa recuperar as energias, perdeu muito sangue. Amanhã ele nos conta o que aconteceu.

Naquela noite Kagome não saiu do lado de Inuyasha. Temia pela vida do hanyou. Tinha esquecido o quanto ele era importante para ela. Mas essa noite ela zelaria por ele. E assim fez.