Alegria e Tristeza – parte II

Uma hora, duas horas se passaram e nada. Ninguém apareceu para dar uma notícia aos cavaleiros aflitos. Parece que toda a equipe de plantão estava mobilizada para atender aquele parto de alto risco. Já passam das três da manhã e todos continuam esperando no corredor até que um médico aparece.

'Com licença, quem é o marido da senhora June Amamiya?

'Sou eu! Como ela está? E o bebê?

'Calma, calma. Responderei a todas as suas perguntas dentro do meu consultório, por favor me siga.

Shun sentiu as pernas bambearem. "O que aconteceu? Por que ele quer conversar comigo em particular? Algo de errado aconteceu!". Vendo o rosto de Shun ficar cada vez mais pálido, Ikki se levanta do sofá.

'Vamos Shun, eu vou junto com você!

'Está certo Ikki.

'Força amigo! Shiryu, Hyoga, Seiya e Saori o incentivam.

Os dois irmãos entram na sala do médico que os convida a sentar nas cadeiras em frente à sua mesa. Shun já se adianta:

'Doutor aconteceu alguma coisa grave? Por que todo esse suspense? Diga logo o que aconteceu com a minha esposa e minha filha! Shun levanta da cadeira e quase ameaça o médico a sua frente. Ikki se surpreende com a reação do irmão, tá certo que essa era uma situação desesperadora, mas ele nunca havia visto Shun se irritar tanto assim com uma pessoa.

'Calma Shun! Ele não está fazendo suspense, apenas quer conversar com você em particular.

'Isso mesmo rapaz, é melhor você se acalmar um pouco para podermos conversar.

'Está certo, me desculpem... fale doutor, por favor.

'A situação é a seguinte: a June teve um aumento de pressão arterial e tivemos que fazer uma cesariana de emergência para não comprometermos a vida dela e do bebê. Isso foi inesperado, tanto que o parto deveria ter sido normal, mas não houve jeito. Se insistíssemos poderíamos ter perdido uma das duas.

'E como elas estão? Ikki pergunta por Shun que está meio paralisado com a notícia.

'A June já está fora de risco...

'E minha filha? Como ela está? O que aconteceu com ela? Shun desperta do rápido transe.

'Bem, conseguimos salvá-la mas...

'Mas o que doutor, pare com essa tortura! De novo Shun se altera.

'Shun, se você não parar de interromper o médico ele nunca vai conseguir terminar de falar! Ikki pega no braço de Shun e o faz sentar.

'Sua filha terá que ficar algum tempo ainda no hospital em observação. Ela ainda corre risco de vida.

'O quê? Ela corre risco de vida? Dessa vez Shun não gritou nem se levantou, pelo contrário, permaneceu sentado e falou tão baixo que a voz saiu quase como um sussurro. – Quando poderei vê-las?

'Vou pedir que a enfermeira o acompanhe.

O médico chama a enfermeira pelo telefone. Enquanto aguardam Shun permanece em silêncio, ainda tentando absorver o impacto dos acontecimentos. Está tão atônito que nem ouve a conversa entre o médico e Ikki. O cavaleiro de Fênix percebe que Shun não estava em condições de dialogar e resolve ele mesmo perguntar sobre o que aconteceu com detalhes.

A enfermeira o conduz primeiro para a UTI onde ficavam os bebês. Shun nunca imaginou que sentiria tanta tristeza no dia que para ele deveria ser o mais feliz de sua vida. Ver sua tão esperada filhinha assim, toda envolvida em aparelhos. De longe ele podia vê-la, era linda como June e tinha os cabelos verdes como os dele. Mesmo tão triste conseguiu sorrir, ela era realmente muito linda.

A enfermeira o leva ao quarto onde June estava descansando. Shun entra bem devagar para não acorda-la, senta na cadeira ao lado da cama e começa a acariciar bem de leve o rosto da amazona. "Meu amor, como eu queria que você não tivesse que passar por todo esse sofrimento. Você não merece!" June vai acordando aos poucos, está meio desnorteada por causa do efeito da anestesia.

'Olá meu amor! Mesmo se sentindo muito mal ela sorri pra Shun, que retribui o sorriso mesmo não sabendo o que dizer quando ela perguntar sobre a filha.

'Olá minha querida! Como você está?

'Mais ou menos... me sinto estranha... mas, onde está nossa filha? Não me lembro de ter visto ela ainda...

'É por que você estava inconsciente... então levaram ela direto para o berçário. "Como vou dizer a ela?"

'Inconsciente? Por que Shun? O que aconteceu?

'Calma meu amor, não se altere por favor! Você precisa descansar, se esforçou muito...

'Shun, pare de me enrolar, responda logo! O que aconteceu?

'Amor, depois conversamos sobre isso ok?

'Shun, o que você está me escondendo? Você não está mentindo pra mim, não é? Nossa filha está bem não está? O rosto de June emana preocupação principalmente depois de perceber que Shun ficava cada vez mais nervoso. Ela o conhecia muito bem e logo percebeu que parecia que o cavaleiro queria lhe esconder algo.

Shun envolve as duas mãos de June entre as suas. Ele tenta a todo custo segurar as lágrimas para não alarmar ainda mais June.

'Querida, vou lhe contar, mas por favor, não se altere, pois isso não irá lhe fazer bem. 'Você teve um pequeno aumento de pressão que dificultou um pouco o parto, mas graças aos Céus está tudo bem com você agora. Shun tentava a todo custo suavizar um pouco a situação.

'E a nossa filha?

'Bem, ela...

'Ela o quê? Fale logo! June não esconde sua impaciência.

'Está certo June. Shun respira fundo. – Ela ainda não está totalmente fora de risco...

'O quê? Ela está correndo risco de vida? Shun teve a impressão de que se June tivesse forças pularia naquele instante da cama e sairia correndo daquele quarto.

'Sim querida, mas tenho certeza que nada de ruim acontecerá. Saori disse que todos os deuses estão olhando por ela agora...

'Não quero saber o que Saori disse Shun! Quero minha filha aqui comigo agora! June está tão desnorteada por causa da angústia que sente que nem sabe mais o que está dizendo.

A loira faz menção em se levantar, mas Shun a segura pelos ombros.

'June está louca! Não pode se levantar! Não nessas condições! Shun fala alto com ela e a segura forte.

June arregala os olhos de tão surpresa que ficou com a atitude de Shun. Ele geralmente era muito delicado e gentil com ela. A última vez que agira assim tão bruscamente foi quando ela tentou impedi-lo de ir ao Santuário combater os Cavaleiros de Ouro.

Depois dessa sacudida ela despertou. Durante toda sua vida sempre tentou a todo custo parecer forte, nunca permitiu que ninguém a visse chorando – exceto Shun – ou que conhecessem suas fraquezas. Mas naquele momento não agüentava mais, não conseguia mais sufocar suas emoções. Estava muito fragilizada, agora era mãe e não tinha consigo sua pequenina, fruto de seu amor com Shun.

Nove meses antes estava tão preocupada. Não tinha certeza se desejava ter essa criança, mas Shun com toda a sua ternura a convenceu que seria muito bom pra eles mesmo sendo tão jovens e imaturos. Agora queria a todo custo sua filha perto de si, leva-la pra casa junto com seu marido e viver uma vida sossegada em paz.

Abraçou Shun com força e se pôs a chorar compulsivamente. Agora nem mesmo o cavaleiro de Andrômeda podia mais se segurar. Não desejavam mais esconder os sentimentos um para o outro. Abraçados, choraram juntos. Não podiam mais conter as emoções que afloravam em seus corações. Nesse momento só podiam contar com eles próprios, apesar de os amigos estarem perto a todo instante, não podiam entender o que estavam passando. Só eles entendiam a proporção de toda essa situação. A filha que esperavam com tanto carinho estava agora entre a vida e a morte, tão pequenina e já tendo que lutar pela sua sobrevivência.

Abraçados, cada um tentava lembrar dos momentos ternos que viveram nesses últimos meses. Shun lembrava da felicidade que sentiu juntamente com June quando descobriram através da ultra-sonografia que esperavam uma menininha. Era tudo que ele queria. June não demonstrava preferências, mas Shun queria muito ter uma filhinha, pois imaginava que seria tão linda e forte quanto June e poderia mima-la tanto quanto fazia com sua amada. June lembrava com ficou manhosa durante a gravidez e como o cavaleiro de Andrômeda a paparicava por causa disso. A amazona adorava toda a preocupação e os cuidados que Shun tinha com ela.

No começo June sentia muito receio quanto a idéia de ter um filho, era uma coisa muito inesperada em sua vida. Mas com o passar dos meses, Shun acabou fazendo-a amar a idéia. Os últimos meses foram bastante tumultuados, a noticia inesperada da gravidez que pegou todos de surpresa, o casamento meio às pressas, todos os enjôos e mal-estares típicos de gravidez – amenizados pelos carinhos de Shun.

Apesar desses pequenos contratempos, os últimos meses foram maravilhosos, os melhores das vidas dos dois jovens. Descobriram o quanto pode ser boa a vida a dois. Aprenderam juntos a serem mais maduros, a ter responsabilidades como cuidar de uma casa e de uma criança que estava por vir. Prepararam tudo, o quartinho do bebê, o berço, os brinquedos, o enxoval, tudo escolhido pelos dois juntos.

Tiveram muitas dúvidas quanto ao nome, cogitaram uma série de possibilidades. Pediram a ajuda dos amigos, procuraram até na lista telefônica. Mas pelo jeito até o dia do nascimento ainda não tinham se decidido. Neste ponto eles não concordavam, a maioria dos nomes sugeridos por Shun não eram aceitos por June e vice-versa. Ela queria colocar um nome de origem etíope enquanto que ele desejava um nome japonês.

Enquanto estavam abraçados, uma enfermeira entra no quarto de June, pois precisava lhe administrar alguma medicação. Ela se dirige a Shun:

'Meu jovem, acho que ela já teve emoções demais por hoje! Melhor a deixarmos descansar, pois ainda não está totalmente recuperada.

'Claro... claro. Shun se afasta um pouco de June limpando as suas lágrimas e as dela. – meu amor, fique tranqüila por favor, estarei aqui o tempo todo. Você vai dormir agora e quando acordar me encontrará do seu lado!

'Eu não quero dormir Shun, me leve para ver nossa filha, por favor! Seus olhos vermelhos de choro olhavam pra Shun suplicantes.

Aquele olhar cortou ainda mais o coração de Shun, ele ficou sem reação, sem saber o que dizer pra June. Sempre quis realizar todos os desejos e vontades dela, mas agora estava de mãos atadas, não podia fazer nada. Para sua sorte a enfermeira interrompeu:

'Infelizmente isso não será possível agora June. Você não pode se levantar dessa cama e nem sua filha pode ser retirada da UTI agora. Acalme-se que logo, logo ela estará com vocês, eu garanto! A enfermeira, uma senhora com um rosto bem amigável, sorria confiante tentando animar o jovem casal.

'Claro que eu consigo me levantar daqui! Diz a amazona com cara de irritada para a enfermeira. – Shun, você sabe que já enfrentei coisas muito piores! Ela olha de novo pra ele com um olhar desamparado. Vê-se claramente que está desesperada, se sentindo como um animal acuado.

June era assim mesmo, um pouco arredia, um pouco impulsiva. Shun se assustou um pouco com as reações dela, lógico que toda essa situação justificava aquelas atitudes, mas apesar de ser impulsiva, June sempre foi muito ponderada. No entanto, naquele momento o cavaleiro de Andrômeda teve a impressão de que a loira iria pular da cama. A viu se esforçar para sentar-se, Shun sabia que June era capaz de levantar da cama e ir até o berçário, afinal de contas ela era uma defensora de Atena, mas ela não estava considerando que os guardiões da deusa também eram humanos e tinham suas limitações. O corpo dela não iria agüentar, ele precisava fazer alguma coisa, chamá-la à razão. Mas novamente a enfermeira se adiantou:

'Entendo a situação, mas ela não pode continuar agitada como está. Teve problemas de pressão arterial e não pode continuar se exaltando dessa maneira! Vou ter que lhe aplicar um calmante.

'O quê? Calmante? Por que estão me tratando como se fosse uma louca perigosa? Shun, não deixe ela fazer isso!

'Meu amor, é pro seu bem, você não ouviu o que ela disse? Você ainda não está totalmente bem, não pode ficar tão agitada assim! Por favor June, pense em mim, pense na nossa filha! Como poderemos viver sem você?

'Shun... a amazona se acalma por uns instantes e novamente não se contem, tem uma nova crise de choro. Shun a abraça ternamente, tentando consola-la e a si mesmo.

A enfermeira aproveita que June está distraída e lhe aplica no braço a injeção com um calmante. A loira está tão desolada que nem percebe a picada, Shun a abraça ainda com mais força na tentativa de faze-la sentir-se melhor. Difícil, pois ele próprio estava se sentindo péssimo e é extremamente complicado tentar ajudar alguém nessas condições.

Logo June caiu no sono e assim como a enfermeira tinha pedido, Shun saiu do quarto para deixá-la descansar.

Continua...