– Essa é Relena Peacecraft. – Apresentei. Duo tomou a mão dela na sua, em um aperto puramente mecânico. Seu sorriso forçado mostrou o quanto aquilo o desagradava. – Este é Duo Maxwell. – Ela sorriu sinceramente, bagunçando a franja dele.

– Oi, Duo, eu sou a ex-futura namorada do Heero.

(¯·..·¯·..·¯)

Ex...namorada...futura...namorada...futura...ex...Minha mente continuaria com esse joguinho de palavras doentio se Heero não apertasse firmemente meu ombro, fazendo meu coração voltar a bater.

Aquela era...a droga da verdade nua e crua? Oh...eu não queria eles juntos, eu não queria aquela dor que acometeu todos os meus sentidos.

– Duo? – A voz de Heero soou distante aos meus ouvidos. Eu até mesmo consegui sentir raiva dele por um milésimo de segundo, mas passou quando seus braços se fecharam a minha volta.

– Ele está pálido, Heero, sente-o no sofá. – Fechei firmemente os olhos e levei minhas mãos a cabeça, tentando impedir aquela enxurrada de sentimentos e sensações.

– Duo, o que foi? Você está bem? – Aquela voz baixa de novo. Senti meu corpo ser colocado no sofá, mas não tirei as mãos da cabeça. – Olha pra mim, por favor! – Não...não...não! Doeria demais olhar...doeria saber que não poderia ter a única coisa que queria.

– Deixa-me ver a temperatura dele, Heero. – Minha mente só assimilou as palavras quando dedos frios tocaram minha testa.

Em um pulo estava de pé, os olhos arregalados e respirando rapidamente. E lá estavam os dois, sentados no sofá, um ao lado do outro.

Não!

Minha mente gritou, mas a palavra nunca deixou meus lábios.

Mamãe, papai, Solo...e Heero. Eu havia perdido tudo que amava.

Como se por vontade própria meu corpo se moveu rapidamente, procurando abrigo nas sombras, achando o caminho do quarto de Heero. Ainda pude ouvir as vozes deles, levemente alteradas.

-Heero, o que ele...

-Apenas deixe, Relena, eu vou falar com ele.

Tranquei a porta atrás de mim, me jogando nos lençóis em seguida. Mas eu não chorei. Nem sequer uma lágrima desceu por meu rosto. Eu não agüentava mais chorar, nunca me trazia alívio, nunca resolvia meus problemas, nem nunca destruía meus sentimentos.

Uma, duas, três batidas...Heero me gritando. Tudo tão longe da minha realidade no momento.

Em pouco tempo eles estariam juntos e então minha alma se partiria em mil pedacinhos. E eu não poderia mais juntá-la, não conseguiria reunir novamente todos os cacos e tentar reconstruir tudo. Eu sabia o quão doloroso era o processo.

– Duo Maxwell! – A porta foi arrombada, mas não me assustei, apenas me sentei e o olhei. – Por Deus! – Seu corpo logo estava junto do meu, num abraço doloroso.

"Pare, por favor, não me toque...não me faça sentir. Não me dê para depois tirar." Implorei em pensamento, mas obviamente Heero não ouviu e continuou me apertando em seus braços.

– Nunca...nunca alguém vai tomar o seu lugar. – Sorri de forma triste, me afastando. – Esse é o seu lar. – Assenti, perdido demais para fazer outra coisa.

Na porta, estava Relena com os olhos repletos de piedade. "Ele é seu" Pensei, olhando-a. "Pegue seu prêmio"

– Escute, Duo, os papéis...os papéis da adoção estão prontos, está tudo certo, amanhã mesmo nós... – O que ele disse depois eu não sei dizer.

Mergulhei em algum lugar escuro e frio. Fiquei por lá...planando sozinho tremendo e deixando minhas lágrimas amargas escorrerem.

Nunca. Eu nunca seria adotado por ele. Era bizarro ser adotado pelo homem por quem eu estava...

– Não fique assim, Duo, eu sei que você ficou chateado por eu ter trazido a Relena, da mesma forma que eu fiquei quando Hilde veio aqui, é um ciúme normal, estivemos aqui apenas um para outro durante muito tempo. – Seus dedos tocaram minhas bochechas. – E estaremos sempre, não é mesmo? – Seu sorriso triste quase me convenceu. – Como...pai e filho.

Clap!

Poderia ser barulho de algo se partindo, se quebrando de forma dolorosa, mas foi apenas minha mão que encontrou a face de Heero, com tanta força quanto eu possuía naquela situação.

Não fiquei para ver a reação de Heero. Não queria mais olha-lo. Passei por uma Relena chocada na porta do quarto. Mão cobrindo os lábios e olhos assustados. "Vá lá, garota, console-o! Ele é seu!"

O que aconteceu eu não sei, porque minhas pernas me levaram para onde eu precisava.

Para longe de Heero.

(¯·..·¯·..·¯)

Quente...meu rosto estava quente. Pelo tapa, pelas lágrimas, pela vergonha de não ter percebido como certas coisas poderiam magoa-lo.

Levei minha mão até minha bochecha, acariciando-a de leve. O danadinho tinha uma mão pesada! Quando eu o pegasse...

– O Duo...ele saiu. – Arregalei meus olhos, correndo até a porta da sala, quase derrubando Relena no processo.

O casaco vermelho...aquele que Duo adorava estava lá, pendurado. As botas...no chão, intocadas. Respirei fundo, já calçando meus sapatos. Não o deixaria morrer de frio por algo tão sem importância como Relena.

– Deixe-o, Heero. – Os dedos delgados de Relena pousaram em meu ombro. – Ele deve precisar de tempo. – Ela estava certa, mas ainda sim nevava do lado de fora e Duo estava apenas com uma blusa de mangas compridas, uma calça de moletom e descalço. – Ele deve estar no prédio ainda, deixe-o sozinho, vai ser melhor para vocês. – Assenti e como, uma criança, permiti que ela me levasse de volta até o centro da sala.

Seus braços se fecharam em volta do meu corpo, num abraço gentil. Eu a abracei de volta, sentindo uma dor lacerante no peito.

Eu o havia magoado. Eu havia magoado a única pessoa de quem me aproximei verdadeiramente, a única pessoa que me abraçava quando víamos desenhos animados nos domingos de manhã, a única pessoa que ia comigo ao parque de diversões, dar voltas e mais voltas na montanha russa.

E eu o havia magoado levando uma estranha, para ele, para dentro do nosso lar.

Eu havia sentido uma parcela daquela dor que ele, seguramente, estava sentindo. Quando Hilde nos visitou eu senti como se tivessem invadindo meu espaço e roubassem o que tinha de mais valioso. Mas Duo...com ele deve ter sido pior. Tudo com ele era mais intenso.

Me livrei do abraço e tentei sentar no sofá, mas Relena segurou meu braço.

– Acho que sei um dos motivos da reação dele, além do ciúme. – E então ela me guiou até a cozinha.

A pia estava cheia de louça, o forno de microondas aberto e em cima da mesa uma travessa de macarrão. No fogão uma panela com o que parecia ser uma espécie de molho e almôndegas. Os pratos já estavam separados, bem como os copos e talheres.

"Daqui a pouco, quando eu voltar, nós vamos jantar algo delicioso e assistir mais filmes, prometo".

A dor me atingiu como um soco estômago, tirando todo o ar de meus pulmões. Cambaleei me encostando na parede mais próxima.

Duo havia feito aquilo para nós. Para nosso jantar de domingo. Comida simples, que eu geralmente fazia. Mas nada nos dava mais satisfação do que sentar com nossos pratos no sofá, com um belo copo de suco de laranja e assistiríamos TV. Eu roubaria algumas almôndegas de sue prato e ele protestaria bebendo meu suco.

Olhei a travessa de macarrão sobre a mesa, sentindo meu coração apertar ainda mais, deixando um grande espaço em minha caixa torácica. Era, secretamente, minha comida favorita. Não que fosse tão secreta assim, já que sempre que Duo queria me fazer um agrado a mais ele fazia uma bela travessa de macarrão. E também uma jarra de suco de laranja. Minha combinação favorita, que se completava com Duo sentado ao meu lado, me emprestando um pouco daquela alegria que só ele tinha.

Fui até a geladeira só para ter certeza que o suco estava lá. Peguei a jarra, inalando o cheiro que exalava. Laranja. Definitivamente laranja. Duo havia feito uma grande jarra de suco de laranja e macarrão com almôndegas para o nosso domingo especial.

E eu o havia magoado.

(¯·..·¯·..·¯)

Quanto tempo estava ali? Uma hora? Duas? Três?

Frio. Estava bem frio debaixo daquela marquise. Me encolhi, abraçando meus joelhos. Não estava muito longe da casa de Heero. Uns cinco minutos correndo apenas. Eu não tinha conseguido ir muito longe com aquele frio que parecia congelar meus ossos.

A neve parara de cair e eu olhei o manto branco que se estendia a minha frente. Uma casa de aspecto bem inglês estava com a frente coberta de neve. Sorri. Há dias atrás, em frente aquela mesma casa, eu bombardeara Heero com bolas de neve, adorando provocar aquele lado "eu detesto frio" dele.

O sorriso morreu instantes depois, quando percebi que nunca mais teria momentos como aquele e nem veria aquele sorriso aberto para mim.

Não depois de eu ter lhe acertado um belo tapa.

Escondi o rosto nos joelhos, envergonhado comigo mesmo. Por que eu fizera aquilo? Acho que...foi a válvula de escape. Teria sido pior se o beijasse.

Senti um calor gostoso me envolver quando lembrei dos lábios quentes contra os meus. Incrivelmente quentes e macios. Eu queria tanto ter mais daquilo...mostrar o que realmente sentia, mas depois de tudo...com sorte ficaria feliz se ele deixasse eu pegar ao menos o casaco vermelho.

Um vento extremamente gelado e desagradável envolveu meu corpo e tudo que pude fazer foi bater os dentes e lembrar do quanto os abraços quentes de Heero me faziam falta.

Os abraços, os suaves beijos de boa noite, todo o carinho que compartilhávamos apenas um com outro...tudo perdido. Tudo jogado fora porque eu quis abrir a caixa e deixar meus sentimentos voarem para fora, tão livres o quanto pudessem. Mas eles encontraram nova prisão e dessa eu não poderia livra-los. A dor...aquela dor que sentia.

Respirei fundo, sentindo o ar frio quase congelar meus pulmões. Eu...precisava voltar. Não por Heero, mas porque aquele frio na melhor das hipóteses me presentearia com uma pneumonia.

Estupidez. Eu queria ver Heero.

Eu queria construir mais uma lembrança.

Apenas mais uma. Se eu a tivesse poderia seguir em frente.

Corri pelas ruas, sentindo meus ossos congelarem dentro do meu corpo. Por que diabos o inverno em Londres tinha que ser tão horrivelmente frio?

Quando alcancei a porta do apartamento, olhei para baixo vendo meus dedos dos pés estupidamente sem cor. Meneei a cabeça. Os das mãos não pareciam melhores.

Era difícil. Era difícil abrir a porta e me deparar com Heero. Provavelmente ele estaria irado ou aos beijos com Relena. Esse último pensamento me fez recuar um passo. Isso não...seria demais pra mim. Demais pro meu coração.

Hesitante, toquei a maçaneta, sentindo metal frio contra meus dedos. E se ele me expulsasse? E se dissesse palavras rudes? O que eu faria? Correria de novo pro meio da rua?

Balancei a cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos. Eu só precisava entrar e ver o que iria acontecer. Quando finalmente reuni coragem suficiente para girar a maçaneta, a porta se abriu, revelando uma Relena parecendo bem irritada.

– Você... – Ela sussurrou, fechando a porta atrás de si. – Eu entendo sua mágoa, mas por sua causa os lençóis da cama de Heero estão frios. Eu poderia fazê-lo feliz, Duo. – E sem mais uma palavra ela se foi, batendo o salto de sua bota no chão, furiosamente.

Engoli o bolo que se formou na minha garganta, finalmente entrando no apartamento. Estava tudo escuro e silencioso. Caminhei cautelosamente até o quarto, vendo que a única luz vinha de lá, provavelmente do abajur.

– Relena, eu já disse para me deixar em paz eu não... – Ele me olhou, parecendo petrificado demais para articular mais alguma coisa.

Então ele veio, caminhando dolorosamente até a porta. Uma sensação de ansiedade me invadiu. Quando seu corpo estava a poucos centímetros do meu, seus braços quentes me envolveram de forma extremamente dolorosa.

Arregalei os olhos, sentindo seu corpo ser sacudido por alguns soluços. Mais que rapidamente o envolvi, derramando as lágrimas que achei que não derramaria mais.

Elas não eram inúteis.

Podiam curar.

(¯·..·¯·..·¯)

Era ele. Duo estava ali em meus braços, protegido do frio, chorando tanto ou mais que eu. Céus! Eu pensei que nunca mais o veria! Mas...era ele ali comigo. E eu não o deixaria fugir de novo.

Lentamente me afastei do abraço e sentei na cama, convidando-o a fazer o mesmo. Ele me olhou, confuso e amedrontado. Mordi os lábios, sentindo o aperto em meu coração sumir aos poucos.

– Por favor... – Pedi em um sussurro.

Então ele veio, dolorosamente devagar e se sentou, o mais perto que podia de mim. Sorri e acariciei seu rosto gelado, que parecia mais pálido. Analisei suas mãos e notei que seus dedos estavam extremamente brancos.

– Frio demais... – Murmurei, segurando uma de suas mãos e levando até os lábios.

O fiz se sentar de pernas cruzadas, no meio da cama. O cobri com um edredom, tentando manter meu sorriso mais bonito nos lábios. Mas estava difícil.

Os olhos de Duo faiscavam, como se ele estivesse tomando uma séria decisão. Desisti de tentar aquecê-lo com panos e voltei a abraça-lo, esfregando vigorosamente suas costas.

– Me perdoa, meu anjo, eu não quis te magoar. – Seu corpo todo ficou tenso e me afastei, beijando sua testa. – Eu deveria imaginar que seria difícil pra você ver Relena aqui...eu vi o jantar... – Seus dedos encontraram meus lábios e senti o peso daquele olhar violeta.

O mesmo olhar de mais cedo. O mesmo brilho, a mesma entrega.

– Nunca quis te magoar. – Repeti docemente, esfregando seus braços. – Nunca mesmo, você é o que tenho de mais importante. – Ele sorriu, mas não amplamente como fazia. Era um sorriso triste, melancólico...doloroso.

Suas mãos vieram de encontro ao meu pescoço, fazendo meus pêlos se arrepiarem quando os dedos frios encostaram na minha pele quente. A distância entre nossos rostos diminuiu e quando percebi Duo estava sentado sobre os tornozelos, ainda me olhando daquela forma tão...assustadoramente familiar.

Eu sabia o que era. Eu soube no momento que vi aquele olhar a primeira vez, mas me negava a acreditar, a enxergar e a pensar no assunto. Por isso eu fugira para encontrar Relena. Por isso doía tanto machuca-lo.

Minhas mãos encontraram sua cintura, aproximando-o mais de mim. Seu sorriso fugiu dos lábios e só o que ficou foi a expressão crua, seus sentimentos despidos de todas as máscaras.

Quando nossos lábios estavam a menos de um palmo de distância ele voltou a sorrir de forma doce. Não um grande sorriso, seus lábios apenas se curvaram levemente, mas foi o bastante para que eu me rendesse completamente.

– Heero...eu amo você.

Continua...


Hey, pessoas!

Desculpe pelo atraso desse cap, mas tive alguns probleminhas.

Como o site ta tirando do ar os fics com grandes agradecimentos (é o que tão dizendo) vou apenas citar o nome das fofas que deixaram seus comentários e quero que saibam que, apesar de não comentar individualmente, fiquei imensamente feliz com os comentários!

Anna Malfoy, Lady Une, Sakuya, MaiMai, Sy.P, Karin Kamya, Serennity Le Faye e minha queria miguinha Ju, que me deu muuuuuita força nesse fic! Aliás...Karin...esse cap veio mais rápido por causa do seu apelo, huh?

Bjus, lindas!

Ahhhhhhh...comentem! Quanto mais comentários...mais rápido vem o próximo cap!

Bjoks pra todos!