Depois que Duo completou maior idade, o processo de adoção foi cancelado. E ele só se prolongou tanto graças a influência de Quatre, foram anos com medo que o tirassem de mim, mas o árabe foi nosso anjo da guarda.

Viajamos por praticamente todo o mundo, dos EUA, país onde Duo nasceu, ao Japão, meu país de origem. Sinceramente eu poderia ter ido a falência com aquelas viagens, mas não me importaria nem um pouco. Ele perdeu períodos na faculdade, eu perdi bons negócios, mas eu fazia tudo para ver os sorrisos satisfeitos em seu rosto. Ainda bem que minha empresa se expandia bastante.

Meus amigos? Diria que não ficaram surpresos, na verdade recebi apoio incontestável deles, não que isso me importasse tanto. O fato de ter amolecido com Duo não quer dizer que isso se expandiu além dele. Depois de mais de quatro de anos juntos, orgulho-me em dizer que apenas ele driblava minhas barreiras.

-Amor! Amooooor!

-Aqui, Duo! – Ele veio rapidamente, se jogando sobre mim, quase fazendo o sofá virar.

Mais ou menos três anos depois daquela declaração na cozinha do nosso apartamento, estávamos absolutamente juntos. Indubitavelmente agarrados e, sinceramente, acho que seria assim por toda a eternidade.

-Já lhe disse que te amo? Amo muito mesmo? – Eu me perguntava se um dia aquelas doses absurdamente grandes de açúcar deixariam nosso sangue.

-Sim, amor, mas nunca me canso de ouvir. – Afirmei, enlaçando sua cintura com meus braços.

Duo estava um pouco maior, músculos mais firmes, coxas mais grossas, mas ainda sim tinha aquela beleza quase andrógena que tanto me fascinava.

-Hum...Hee. – Ergui uma sobrancelha, certo de que ele me pediria algo. Mesmo com 21 anos ele parecia eternamente uma criança querendo doce.

-Pode pedir, amor. – Suspirei, encaixando a cabeça na curva de seu ombro.

-Um dia vamos começar a ler realmente a mente um do outro. – Ele se ajeitou melhor em meu colo, uma perna de cada lado das minhas coxas. – Será que você pode...visitar meus pais e meu irmão comigo? – O encarei, vendo-o morder os lábios.

Ainda era um assunto um pouco delicado, tanto que Duo nunca me chamava para ir ao cemitério com ele. Tínhamos uma espécie de acordo silencioso, era uma coisa que eu julgava extremamente pessoal, mas jamais me recusaria a dividir aquela dor com ele, era só ele me pedir.

-Claro, amor. – Acariciei gentilmente suas costas. – Quando quer ir?

-Hoje. – Ele tentou sorrir. – Quer dizer...agora. – Fiquei surpreso, mas não deixei que ele percebesse.

-Tudo bem, só preciso trocar de roupa, ta bom? – Ele assentiu.

-Você não os conhece...eu gostaria que...

-Não precisa me dar explicações, meu amor, eu vou aonde você pedir e dividir todo o peso que você carrega, é só você deixar. – Ele me abraçou dolorosamente.

-Sim, amor...eu quero. – Ele se afastou. – Mamãe vai gostar de você e Solo também. – Uma pontada de dor passou por seus olhos. – Papai talvez implique, mas não tem como não gostar de você.

-Claro, eu sou o genro que todo pai pediu a Deus! – Seu sorriso sincero fez meu peito se aquecer.

Dez minutos depois estávamos no carro, ouvindo nada além do silêncio. Ele precisava pensar e eu...eu apenas esperei.

Esperei pelo momento da cura.

(¯·..·¯·..·¯)

Às vezes era doloroso trilhar aquele caminho de pedra que me levava até eles. Me fazia pensar no que teria sido caso o acidente não acontecesse.

-Tudo bem, amor? – Senti os dedos de Heero apertarem mais firmemente os meus.

-Sim, Hee. – Encostei a cabeça em seu ombro. – É aqui. – Apontei para três lápides que se erguiam do chão coberto de grama bem tratada.

Caminhamos até elas, parando em frente. Meus olhos caíram sobre as fotos na pedra, onde cada um sorria, parecendo felizes em me ver.

-Essa é minha família, Hee. – Me agachei, tocando a lápide de minha mãe com a ponta dos dedos, sentindo Heero se ajoelhar ao meu lado. – Mamãe, papai e Solo, este é Heero Yuy, o homem que eu sempre falo quando venho aqui, lembram? Ele quem cuida de mim e me faz a pessoa mais feliz do mundo.

-Me sinto honrado em conhecê-los. – A voz de Heero soou baixa, quase respeitosa. – Duo é uma pessoa maravilhosa e eu o amo mais que tudo, prometo que vou cuidar dele enquanto houver ar em meus pulmões. – Meus olhos encheram-se d'água ao ouvir aquelas palavras e ao ver, tão de perto, meu passado e meu presente, juntos.

Meus dedos percorreram cada lápide, como se pudesse tocar neles. Podia ver o sorriso de Solo, o rosto sempre alegre de minha mãe e o semblante do meu pai.

Céus! Como eu sentia falta deles!

-Sabe, senhor Maxwell, às vezes me pergunto a quem o Duo, puxou, sabe? – Arregalei os olhos, vendo Heero se sentar no chão como se fosse conversar com algum amigo de longa data. – Essa teimosia toda. – As lágrimas escorreram e eu agradeci, silenciosamente por ter Heero perto de mim. – Ele não fala muito de vocês, mas...eu gostaria saber mais...gostaria de saber tudo. – Ele me olhou, seus olhos tão doces como eu nunca tinha visto.

-Oh, amor! – Me joguei em seus braços, soluçando contra seu ombro. – Obrigado...obrigado! – Senti os dedos firmes acariciando minhas costas.

-Não há porque agradecer, coração, eu quero saber...por que...por que não me conta? – Ele foi até uma árvore que havia em frente aos túmulos, encostando-se no tronco. – Huh? Vamos...quero saber se Solo é o pestinha que imagino! – Eu sorri e me sentei entre suas pernas, encostando minhas costas em seu peito, deixando minha cabeça descansar em seus ombros.

Eu contei tudo que me vinha a cabeça, deixando todas as memórias e lembranças, que havia escondido, saírem, deixando meus lábios, ecoando no silêncio do lugar.

Heero me abraçava forte, enquanto ouvia atentamente minhas palavras fora de ordem e, muitas vezes, desconexas.

E, pela primeira vez, eu senti todas as feridas cicatrizarem. Uma a uma...curadas com minhas lembranças que agora eu dividia com Heero.

Quando minhas palavras acabaram eu encarei os túmulos daqueles que eu mais amava e depois me virei, olhando para Heero. Meu passado, meu presente e meu futuro. Juntos.

-As lembranças doloridas não tem que ser esquecidas, amor, porque se elas se forem também levam as boas. – Busquei os olhos de Heero, encontrando tudo que precisava neles. – Podemos sempre construir mais lembranças, mas...só seremos felizes se aprendermos a conviver com as outras, as antigas...e até mesmo as que machucam. Vê? – Ele apontou pras lápides. – Algumas de suas melhores lembranças estão com eles, não perca isso por causa das lembranças ruins e se...se por algum acaso você cair, se ferir com elas...eu vou estar sempre pra você, pra te ajudar a curar. – Novas lágrimas escorreram por meu rosto, mas Heero as secou. – Eu te amo, Duo, mais que qualquer coisa que você possa imaginar, mas...eu não quero ser sua única lembrança...quero ser uma das lembranças que construíram sua vida.

-Oh, amor! Sim! – Sentei de lado entre suas pernas, abraçando-o fortemente. – Você...não é tudo, amor...eu ainda os tenho...meus pais, Solo...eles estão aqui, comigo...pra sempre, como você também sempre vai estar. – Ele assentiu, beijando levemente minha testa.

Ficamos algum tempo apenas juntos, sendo observados por minha família.

-Hee...venha...quero me despedir deles. – Nos levantamos e, abraçados, paramos em frente às lápides.

Observei por um longo tempo as pedras frias em minha frente, mas, diferentemente das outras vezes, uma sensação de calor me envolveu.

-Papai, mamãe, Solo... – Comecei, sorrindo. – Heero é minha família agora e vai me ajudar a nunca esquecer de vocês, vou compartilhar nossas lembranças com ele e então...então eu serei plenamente feliz, tendo vocês comigo...sempre. – Senti os braços fortes de Heero me envolverem e suspirei, baixinho, pensando o quanto amava aquele calor. – E ele... – Continuei. – Ele também vai estar sempre comigo.

-Cuidando e amando cada vez mais. – Seus lábios pousaram sobre os meus. – É uma promessa.

Derreti com aquelas palavras e teria desabado, se os braços fortes e protetores de Heero não tivessem me envolvendo.

Juntos, caminhamos até a saída, mas daquela vez eu não deixava minha família para trás, como fazia quando deixava o lugar, eu a levava junto. No meu coração. Sem mágoas nem feridas abertas.

-Hee...eu te amo. – Murmurei, encostando minha cabeça em seu ombro. – Você é minha melhor lembrança e minha realidade...tão doce...tão maravilhosa.

-Sim, amor. – Ele parou em frente o carro, me abraçando forte. – E vamos construir mais lembranças e ser, cada vez mais, a realidade mais doce um do outro. – Estremeci ao sentir suas lágrimas em meu pescoço. – E eu vou ser sempre sua família, seu lar.

-E eu serei tudo pra você...tudo que você quiser, que precisar. – Completei, molhando sua blusa com minhas próprias lágrimas. – Eternamente.

Não importava o que eu perdesse dali pra frente.

Eu teria sempre minha realidade maravilhosa com Heero.

E minhas lembranças.

FIM


Esse é realmente fim... espero que tenham gostado!

Obrigada pelos comentários e até a próxima!