5. Pedaços e Peças

"Ele fez o quê?"

A voz incrédula do Mestre de Poções fez Claire estremecer e sentir o pé de Sirius embaixo da mesa.

Eles estavam reunidos na sala de Dumbledore para reportar o encontro na casa de Malfoy na noite anterior.

"Ele lançou um feitiço em mim..."

"Imperius." Sirius encarou Snape, sem mostrar nenhuma emoção. "Ele lançou o Imperius sobre ela."

"Se Sirius não tivesse chegado a tempo, ele teria..." Claire corou e descobriu que não podia continuar.

"Mas você os encontrou, não foi, Sirius?" Dumbledore levantou da cadeira e andou em volta da mesa na direção de Claire. Tocando o rosto dela com muita gentileza ele a fez levantar o queixo. Contusões azuis e verdes marcavam o pescoço dela por baixo das roupas. "Quem fez isso?"

"Prenner." Ela fechou os olhos e reviveu o momento com um arrepio. "Eu não conseguia pensar. Eu sabia que não queria fazer o que ele mandava, mas..."

"Mas sua mente estava como cola, grudenta, densa." A voz de Snape a chamou de volta. Ele olhou para ela com seus olhos escuros, demonstrando que entendia muito bem do que estava falando.

"Como você sabe como a pessoa se sente?" Ela perguntou.

"Isso não faz diferença. A questão é, por que você não lançou o feitiço Confundus nele assim que percebeu o que ele ia fazer? Imperius demanda uma tremenda concentração. A maioria dos bruxos não pode apenas sacudir o pulso e lançá-lo. Você deveria ter tido tempo suficiente para distrair Prenner."

O rosto de Claire corou ainda mais. "Eu não percebi o que ele estava fazendo." Ela murmurou.

"Você não percebeu? O que eles ensinaram a você em Beauxbatons que você não consegue reconhecer um dos Feitiços Imperdoáveis?" Ele virou zangado para Dumbledore, que estava sentado na beira da escrivaninha com a mão no ombro de Claire. "Realmente, Diretor, isto é um escândalo. Deveria haver um mínimo de educação padrão, mesmo..."

"Severus." Interrompeu Dumbledore. "Claire não estudou na escola de Beauxbatons. Aquilo foi apenas uma história que os pais delas criaram para encobrir a verdade."

"A verdade?"

Sirius observou como o Mestre de Poções estreitou os olhos, e seu olhar se tornou incrivelmente penetrante. Mesmo quando eles eram alunos era quase impossível enganar Snape por muito tempo.

"Ela é um aborto, não é?"

Claire estremeceu. Outro bruxo que conhecia seu segredo... Ela lembrou seus dias em Hogwarts quando ela estava convencida que aquele aluno da Sonserina, pálido, de cabelos negros podia ver através do seu disfarce. E agora ele conseguira.

"Eu entendo." Ele refletiu, sua voz perigosamente aveludada, disfarçada apenas para apavorá-la ainda mais, quando de repente ele gritou com ela. - não, não com ela, com Sirius.

"Eles esmagaram seu cérebro em Azkaban, Black? Ou você passou muito tempo como um cachorro? Mesmo os meus alunos do primeiro ano não são tão ignorantes!" Ele olhou acusadoramente para o Diretor. "E você, Albus! Você sabia disso! Você permitiu isso!"

Dumbledore concordou solenemente e voltou para sua cadeira.

"Eu sabia disso, sim. E estou muito ciente dos perigos, Severus. Mas é um fato agora, e nós temos que usar isso em nosso benefício." Ele deu um sorriso confortador para Claire. "Você acha que Malfoy confiou em você, minha querida?"

Ela deu de ombros. "Eu não sei. Ele falou muito sobre os incentivos de se aliar a Voldemort, mas quando interrogado ele apenas negará que discutimos o assunto. Por outro lado, eles parecem desesperados por dinheiro. Ele mencionou as necessidades de Voldemort, que sejam lá quais forem, eram muito caras. Talvez isso faça com que eles fiquem menos cuidadosos."

"Sirius?"

"A informação que Arthur Weasley plantou sobre o Sr. White nos arquivos do Ministério parecem ter sido suficientes. Ninguém suspeitou de mim, o feitiço funcionou bem o suficiente." Ele estava bem aliviado quanto a isso. "Talvez Snape possa fazer alguma coisa com a informação que eu consegui. Eu não consigo. Tudo me pareceu baboseira do pessoal da sociedade."

Black passou a ele um rolo de pergaminho onde ele havia anotado os nomes de todos aqueles que ele havia reconhecido na festa. Snape tomou o pergaminho da mão de Dumbledore e começou a estudá-lo imediatamente.

"O malfadado incidente..." Dumbledore começou, apenas para ser interrompido pelas palavras zangadas de Sirius.

"Incidente? Ele tentou violentá-la, Albus."

"E você quebrou o nariz dele do jeito que um guarda costas deve fazer." O velho bruxo continuou firmemente. "O que Prenner fez tornou necessário para Malfoy provar a Claire que ele está no comando e merecedor do envolvimento financeiro dela. Ele vai convidar vocês novamente, e na próxima vez o encontro não vai ser inofensivo como o de ontem." Os olhos dele mantiveram Claire, cativa. "Você tem certeza de que pode fazê-lo, minha querida? Ninguém vai acusar você por desistir agora mesmo."

"Albus, você não vai permitir que ela continue!" Snape interferiu furioso e jogou o pergaminho na escrivaninha. "Leia isso! Goyle estava lá. Simmonds. Genial! Ele é o novo Supervisor de Azkaban. Ele provavelmente vai abrir as portas e deixar todos os Comensais da Morte fugirem. E O'Hanley. Você sabe o que O'Hanley fez há dezesseis anos atrás, Claire?"

Sirius se levantou e ficou de pé entre o Mestre de Poções e Claire. "Cale a boca, Snape." Ele disse suavemente, mas com um tom ameaçador. "Deixe-a em paz!"

"Ele era um dos Comensais da Morte que atearam fogo nos trouxas em Cornwall!"

Claire olhou para ele com olhos arregalados de choque. "Como você sabe?" Ela perguntou novamente.

"Eu estava lá." Ele replicou conciso. "Se alguém pode avaliar a situação, sou eu. E eu quero você fora."

Claire cruzou os braços, desafiante. "Eu vou continuar até quando o Diretor Dumbledore confiar em mim."

"Albus!"

Dumbledore suspirou e olhou para Severus. "Eu confiei em você quando você me disse que podia resistir a Voldemort, e você nunca me desapontou durante todo esse tempo. Agora eu confio em Claire."

O veredicto dele resolveu a questão, pelo menos por enquanto. Ambos, Severus e Sirius, sentaram-se olhando desafiantes um para o outro, mas mantendo seus pensamentos para si mesmos.

O Diretor virou para Fawkes que cantava excitado em seu poleiro. "Fawkes quer que você veja Poppy sobre esses machucados em seu pescoço." Ele traduziu para Claire. "Melhor obedecer, e leve-o para ficar com você enquanto você estiver lá. Nós precisamos olhar a lista de Sirius novamente, e Fawkes pode ser muito irritante quando acaba de renascer."

Assim que Claire saiu do escritório, carregando a bonita fênix nos braços, Snape perdeu a paciência. "Este é o plano mais cabeça de vento, idiota, suicida, do qual já tomei parte!"

"Cale a boca, Snape!" Gritou Sirius e levantou de sua cadeira, pronto para lutar ali mesmo.

Dumbledore levantou os dois braços em desespero. "Meninos! Parem com isso, agora!" Ele secou a testa, exausto. "As coisas eram muito mais fáceis quando eu podia tirar pontos de suas casas."

"Eu sinto muito, Albus." Sirius suspirou. "É apenas que eu..."

"Eu sei." O velho bruxo sentou e desenrolou o pergaminho. "Nós agarramos o rabo do dragão e agora não podemos soltá-lo."

"Apenas uma coisa." Snape se levantou e foi para perto de Sirius que era um dos poucos bruxos que era mais alto que ele, mesmo que apenas por uma polegada. "O que vai acontecer quando Peter Pettigrew algum dia aparecer nas festinhas de Malfoy? Quem vai proteger Claire quando você pular no pescoço dele?"

Sirius engoliu em seco. Ele havia se feito a mesma pergunta naquela manhã. A fúria, o ódio cego que ele sentia sempre que pensava em seu antigo amigo seriam muito difíceis de controlar se algum dia eles se encontrassem pessoalmente.

"Eu não sei." Ele respondeu honestamente. "Como você sabe que eu tentaria matar Peter?"

O Mestre de Poções deu de ombros. "Porque seria isso que eu faria. Claro que eu não o estrangularia." Ele andou para trás e sentou próximo a Dumbledore sem deixar de olhar para Sirius. "Eu envenenaria o miserável rato."


Dumbledore esticou o braço e Fawkes pulou do ombro de Claire.

"Está melhor agora?" ele perguntou.

Madame Pomfrey sorriu e deu umas palmadinhas nas costas de Claire. "Nada que um pequeno feitiço não pudesse curar."

Claire agradeceu a enfermeira e se despediu de Dumbledore.

"Tente não pensar muito sobre o próximo convite. Continue levando sua vida normal." Ele sugeriu.

"Eu vou tentar." O sorriso dela não refletiu em seus olhos.

"Agora corra, querida menina. Seu marido está esperando por você na porta."

Eles ficaram olhando para ela quando ela correu pelo hall.

Poppy suspirou e acariciou a fênix no braço de Dumbledore. "Ela é uma curandeira, você sabe." Ela disse suavemente.

O Diretor olhou para ela. "Eu suspeitava de alguma coisa. Fawkes gosta muito dela, e procura a companhia dela quando se sente doente."

"Ora, isso é raro."

"Mais ainda porque Claire Winterstorm é um aborto."

Os olhos de Poppy se arregalaram. "Ela é? Ela disfarça muito bem. Mas se ela é incapaz de fazer mágica, como ela pode curar?"

"É errado achar que por ser um aborto uma pessoa não possua nenhum dom, pelo contrário. A maioria dos abortos possui pelo menos um dom raro. Pena que eles quase nunca consigam praticar para controlar e usar esse dom. Veja o Sr. Filch, por exemplo.

A enfermeira engoliu o riso. "Ora, Albus, eu tenho certeza que Argus Filch não é um curandeiro."

"Mas ele é um telepata."

Ela ofegou surpresa. "Madame Norrra? Certo, eu nunca havia pensado sobre isso. Como ele poderia se comunicar com aquela gata miserável se não por telepatia?"

Ele concordou. "Exatamente. Agora, Claire não parece ciente de seu dom. Talvez você pudesse se oferecer para ensinar a ela um pouco do que você sabe. Não mágica, nem feitiços, mas fatos sobre o corpo. Nós não queremos que ela remende os ossos da forma errada, queremos?"
Claire estava sentada em seu escritório e esfregou os olhos. Ela havia corrido com a contabilidade dos livros durante toda a tarde. Agora ela fechava o enorme livro-razão e batia com as penas semi-mágicas para fazer as últimas anotações para seus advogados em Londres. O pai dela havia encomendado aquelas penas para ela, uma invenção inteligente que a capacitava a escrever muitas cartas ao mesmo tempo, ou apenas ditar o que ela queria que elas escrevessem. As penas eram mágicas, por isso podiam ser usadas por qualquer aborto ou Trouxa. O único problema era que elas não paravam de escrever enquanto não fossem colocadas de volta em sua caixa.

Quando a carta estava pronta, Claire a selou e colocou em uma pilha de outros rolos que esperavam pelas corujas do vôo da manhã seguinte.

Ela ainda tinha uma hora até o jantar e a usaria para fazer algumas pesquisas sobre Lucius Malfoy e as pessoas que havia encontrado na casa dele. Quanto mais informação ela tivesse, menos ficaria nervosa da próxima vez.

Ela se levantou e foi para o baú arquivo. O pai dela guardava todas as matérias do "Profeta Diário", e elas provavam ser valiosas uma vez ou outra quando ela precisava descobrir coisas sobre os seus possíveis parceiros de negócios. Ela se ajoelhou em frente ao baú e bateu na tranca. Depois da morte de seu pai ela havia mandado alterar o baú. Uma vez que ela não podia usar a varinha para disparar o feitiço, Minerva havia acrescentado outro feitiço que tornava necessário apenas bater na tranca para abri-la.

"Malfoy, Lucius e/ou Narcissa." ela disse claramente.

O baú abriu e um por um, pergaminhos apareceram com a foto de Malfoy. Claire acionou a pena e fez com que ela tomasse notas enquanto ela conseguia as informações. Ela passou pela maioria dos nomes que podia se lembrar da festa que tinha ido com Sirius. Quando terminou quatro rolos tinham sido preenchidos com a bonita escrita da penas. Satisfeita com o resultado, ela estava para fechar o baú, quando uma súbita inspiração a fez falar:

"Black, Sirius."

Uma tempestade de pergaminhos voou do baú e ficou junto a ela, em uma pilha ordenada no chão. Ela folheou a pilha, mas havia muitas folhas. Colocando-as de volta no caldeirão, ela tentou novamente.

"Black, Sirius. Não Azkaban. Não Potter. Não Fuga."

Dessa vez ela só recebeu cinco pergaminhos e os levou com ela para a sua cadeira perto da janela. As três primeiras mencionavam o nome dele ligado a jogos de quadribol em Hogwarts, outra era uma reportagem sobre um acidente envolvendo uma motocicleta - seja lá o que for 'motocicleta' , pensou Claire.

O quinto deles, marrom com a idade, era uma matéria sobre um Chefe Auror Richard Black, de Gynnphyllyn em Wales. Morto por um troll que tentara roubar uma carga de ouro a caminho do Gringotes. Black tinha sido agraciado com a Ordem da Estrela, Segunda classe, postumamente. Ele deixava sua esposa Cassie e quatro filhos, Sirius, Reggie, Pollux e Cãs.

Claire olhou para a pequena foto preto e branco de uma jovem mulher sorrindo com os quatro meninos pequenos, sentada em uma parede de pedra em frente a um chalé. O pergaminho era tão velho que os meninos que acenavam estavam embaçados, mas quando olhou mais de perto ela pôde facilmente identificar Sirius com uns quatro ou cinco anos de idade. Seus braços em volta dos seus irmãos. Os meninos mais novos pareciam ser gêmeos ou de uma idade muito próxima, e deviam ter no máximo três anos. Um ano depois da fotografia ser tirada o pai deles havia sido assassinado.

Quando a porta abriu, Sirius entrou, ela escondeu o pergaminho embaixo dos arquivos dela e corou, se sentindo culpada. Claro, estar casada não dava a ela o direito de investigar o passado dele. Mas ela queria saber tantas coisas a respeito dele, coisas que ela não entendia. Por exemplo, porque ele compartilhava sua cama na maioria das noites, mas em outras ele desaparecia sem explicação? Ou o que acontecia quando ele parecia sair do corpo ou se retrair em um lugar bem fundo dentro da própria alma, como havia feito na casa de Malfoy? Ou como ele podia tocar nela tão facilmente, e parecer tão satisfeito quando ela o tocava, e ainda assim tratá-la como uma conhecida distante assim que eles saíam da cama.

Sirius sorriu para ela e pensou como sua mulher era diferente de todas as outras. Ela preenchia seus dias com trabalho, nunca pedia a ele para ficar em casa e fazer companhia a ela. Ele tinha certeza que ela não sentia sua falta. Ela havia encontrado maneiras de transpor seu próprio defeito. Era um prazer observá-la descobrir a vida e as alegrias da liberdade, como ela mudava a expressão do rosto, sugava novas informações como uma esponja, como uma simples viagem de vassoura podia fazer com que ela gritasse de excitação. E à noite eles faziam sua própria magia. Ainda o perturbava perceber o quanto a desejava. Claro que seu corpo sentia falta dos toques. E talvez segurando o corpo dela, poderia evitar que a escuridão o devorasse completamente.

Ele havia considerado uma ou duas vezes falar a Dumbledore sobre seu medo de ficar louco. As vozes, os ataques de pânico, eram sinais de que sua mente estava se deteriorando. Mas ele preferia não colocar aquele peso sobre os ombros do velho bruxo. Dumbledore já tinha problemas suficientes.

Claire esvaziou sua escrivaninha dos livros e pergaminhos e colocou as penas que protestavam de volta em suas caixas. "Como foi o seu dia?" Ela perguntou. Ela gostava quando ele contava sobre seus alunos e sobre o que acontecia em Hogwarts.

Ele bufou. "Rufus Stanley da Corvinal conseguiu se transfigurar hoje."

"Isso é genial, não é?"

"Em uma truta."

"Uma truta!"

"Muito azar para um Animago, se o animal dele for um peixe. A sorte é que um dos amigos dele o pegou e o jogou no lago. Em seu pânico ele esqueceu como se transfigurar de volta, então eu gastei a maior parte da tarde na água, falando com uma truta apavorada."

Claire riu. "Agora, adivinhe o que temos para jantar?"

Sirius revirou os olhos. Então ele deu um sorriso sugestivo. "Peagreen pediu para avisar a você que o jantar vai ser servido em meia hora."

Ele sentou na escrivaninha e a puxou para entre as pernas dele. Puxando a cabeça dela para mais perto, ele a beijou, primeiro delicadamente, até que sentiu a língua dela empurrando impaciente contra a dele. Oh, ela aprendia depressa.

O seu dedo acariciou o rosto dela.

"Agora o que nós podemos fazer com trinta minutos?"
A última partida de Quadribol do verão se tornou um desastre para a Grifinória. Sirius estava sentado na arquibancada, a cabeça enterrada nas mãos como se temesse que o céu fosse desmoronar. Harry tinha estado péssimo. Duas vezes o pomo tinha estado na frente do seu nariz e ele não tinha notado. Os últimos quinze minutos do jogo tinham transcorrido em completo silêncio, apenas interrompido pelos suspiros de Lee Jordan e a torcida da Corvinal, de vez em quando. Finalmente a audiência teve permissão para sair, e nem mesmo o time vitorioso parecia apreciar muito a partida de sucesso.

Sirius ficou em seu lugar nas arquibancadas e olhou para o campo agora vazio. Um som fez com que ele se virasse. Lupin se sentou perto dele e eles ficaram ali olhando para o vazio, em um silêncio amigável.

Depois de um tempo Remo suspirou.

"Essa foi ruim."

"Realmente ruim."

"Harry estava distraído. Eu vi que ele olhava para você todas as vezes que voava sobre as arquibancadas."

"Ora, Remo!" A mão de Sirius bateu no banco de madeira. "Agora é por minha culpa que a Sonserina ganhou a taça da casa?"

"Eu temo que sim."

Eles ficaram em silêncio novamente.

Então Sirius olhou para o rosto de Remus intensamente. Seu amigo parecia pálido e exausto, e nem estavam perto da lua cheia. Sentindo-se culpado Sirius lembrou que Remo vinha parecendo miserável por uns dias agora. Mas, com o casamento e a espionagem sobre Malfoy, ele tinha estado muito ocupado para perguntar o que estava errado.

"Você não veio para me culpar, veio?"

"Não necessariamente."

Sirius franziu a testa. "O que é? Você nunca foi muito bom em blefar."

"Eu a pedi em casamento. E ela disse não." Remo deu de ombros e o gesto foi tão completamente vazio de esperança, que Sirius podia matar Serene ali mesmo.

"Ah, Remy..."

"Eu sei. Você me avisou. Mas eu não sei o que fazer."

"Quem sou eu para lhe dar conselhos nesse campo?" Sirius riu amargamente. "Eu estou com 36 agora, e não tinha tido um encontro em 14 anos. A última vez que pensei estar apaixonado foi por Carolyn Smitherson, e ela foi dama de honra no casamento de Thiago!

O rosto de Lupin se iluminou por um momento. "Eu lembro de Carolyn. O filho mais velho dela está no primeiro ano na Lufa-Lufa, você sabia?"

Sirius franziu a testa. "Aí está. Então se você precisa de conselho de como conquistar o coração de uma mulher, pergunte a Snape."

"Severus." O professor de Defesa Contra as Artes das Trevas sorriu zombateiro e olhou através do campo para a arquibancada, agora vazia, da Sonserina. "Quem iria pensar que um dia ele se apaixonaria?"

"Você acha que ele está? Apaixonado, quero dizer."

Remus concordou. "Ele tem sorrido muito, ultimamente."

"Apavorante."

"E você, meu amigo? O que tem a me dizer?"

"O que tenho a dizer?" Sirius se levantou e estendeu os braços.

"Você vai se apaixonar por sua esposa?"

"Não."

O desapontamento no rosto de Lupin fez Sirius sorrir.

"Ah Remo, você é uma alma romântica. Claire e eu temos uma missão em comum. Assim que Voldemort for derrotado, nós vamos seguir caminhos separados. Ela precisa ser livre, e eu também.

"Você sempre foi bom em blefes, Black. Mas não esqueça que eu o conheço há bastante tempo para ver através de você."

"O que você está tentando dizer?"

"Nada."

"Remo..."

Lupin se levantou e sorriu para ele. "Nada, realmente. Quer jogar bola? Eu aposto que nós podíamos ensinar alguma coisa a essas crianças."

Um minuto depois eles voavam alto pelo campo, perseguindo uma goles que na verdade era um chapéu esquecido que Sirius tinha enfeitiçado. Nenhum dos dois notou Harry que estava nas sombras observando eles jogarem.


Era começo de verão agora e a feira bienal de Hogsmeade estava aberta. Duas semanas antes do fim do ano escolar e das temidas provas finais. Era o último final de semana que os alunos tinham para relaxar. Barracas e boxes tinham sido erguidos ao longo da rua principal e no gramado, atrás da estação de trens, um parque de diversões oferecia brincadeiras e atrações.

Todos os alunos que tinham permissão de ir a Hogsmeade chegaram na aldeia depois do almoço de sábado e de sua sacada Claire podia ouvir a música e os risos.

Ela tentava vencer o nervosismo que ainda vinha do seu estômago para sua garganta todas as vezes que ela tinha que enfrentar pessoas. Ela não era mais uma mulher solitária em sua gaiola dourada - ela tinha adquirido um marido, duas amigas e mais conhecidos do que ela havia esperado. E mesmo que seu casamento acabasse ela poderia manter seus amigos, mesmo que tivesse que perder Sirius.

Ela respirou fundo, ajeitou a sua roupa e saiu de casa para encontrar Remus e Serene no Três Vassouras.

Quando ela chegou na taverna, todas as mesas e bancos do jardim ao longo da Estrada estavam ocupadas. Centenas de bruxos estavam sentados, bebiam Cerveja amanteigada e limonada espumante, e se divertiam. Claire se sentiu perdida. Era uma coisa viver sozinha e não conhecer ninguém. Mas ficar no meio de uma multidão sem conhecer ninguém...

Com alívio ela viu Remus acenar. Ele guardou um lugar para ela, e lhe sorriu amigavelmente, batendo no banco ao lado dele.

"Bom você estar aqui, Claire. Eu odeio ficar sozinho e ver as pessoas me encarando."

Ele mentiu para fazê-la se sentir melhor e ela aceitou, agradecida.

"Onde está Serene?"

"Serene... decidiu não vir. Sinto muito."

A voz dele deixou claro que preferia não discutir o assunto.

"E Sirius?"

Remus franziu a testa, magoado. "E eu aqui, pensando que você iria gostar da minha companhia!"

"Mas eu estou, realmente." Ela gaguejou e percebeu que ele estava brincando. Soltando a respiração devagar, ela sorriu timidamente. "Sinto muito, eu não estou acostumada com as pessoas sendo irônicas. Mas aprenderei."

"Eu aposto que sim. Sirius é grande em ser irônico. Algumas pessoas o chamariam de cínico."

"Ele não é." Claire sacudiu a cabeça, sem acreditar. "Ele não fala muito também, mas quando fala, parece ser sincero. Onde ele está por falar nisso?"

Remus gesticulou vagamente sobre a rua do festival. "Tentando falar com Harry."

"Oh."

"É difícil para o garoto. Eu não tento desculpar o que ele faz com Sirius, mas ele só tem quinze anos. É uma idade difícil."

Claire enrolou um punhado de cabelo em volta do dedo. "Eu não sei muito sobre adolescentes, para ser honesta."

"E quem sabe? Todos nós estivemos lá, mas assim que você sai da puberdade, você esquece sobre a confusão de emoções e hormônios. E Harry nunca tinha tido outra família além de Sirius. Ele não quer dividir. É natural."

"Ele não teria que dividir." Claire disse muito suavemente. "Sirius e eu estamos casados apenas no nome, você sabe disso."

"É pedir muito que um aluno do quinto ano entenda um conceito tão estranho. Aliás, também é pedir muito de um adulto, mesmo um... lobisomem." Os olhos cinzentos dele procuraram os dela.

"Isso não é realmente estranho. Sirius é..." A voz dela falhou e ela olhou para ele sem acreditar. "Lobisomem? Você é... um lobisomem?"

Ele sorriu. "Snape insiste em que eu conte para as pessoas antes que elas descubram por si mesmas."

"Antes que elas vejam brotar pêlos em você na lua cheia." Claire ria sem conseguir parar.

"Alguma coisa como isso." Ele concordou gravemente. "Pêlos. E patas. E dentes grandes."

"Sinto muito." Claire olhou para ele seriamente agora. "Eu não quis fazer pouco de você. Eu li um bocado sobre lobisomens."

"Não precisa ter medo. Eu tomo A poção do Mata-Cão, e eu estou razoavelmente sob controle."

"O que você quis dizer com não entende o estranho conceito de casamento apenas no nome?" Ela perguntou.

O rosto de Remus demonstrou preocupação. "Se você leu sobre... nós... então você sabe que nós temos uma única companheira por toda a vida. Então o mero pensamento de um casamento sem amor parece... errado." Ele deu de ombros. "Sinto muito."

"Não. Eu... Tudo bem. Não é ruim, realmente. Eu gosto de Sirius. Ele é bom e nunca grita comigo ou me dá a impressão de ter vergonha de mim."

"Vergonha?" Remus bufou. "Por que ele teria vergonha de você?"

Claire respirou fundo. Ele tinha sido honesto, e ela também seria. Lupin era o melhor amigo de Sirius e seu confidente se é que ele já tivera um, e se ela não pudesse confiar no professor de Defesa Contra as Artes das Trevas...

"Eu sou um aborto

Remus tossiu sobre sua Cerveja amanteigada e quase cuspiu sobre a mesa toda.

Claire passou um lenço a ele. "Sinto muito. Eu não deveria ter sido tão brusca."

"Não, não." Remus tentou respirar normalmente. "Isto não é realmente nada para se envergonhar. Mas como eu posso me lembrar de você da época da escola?"

"Você se lembra de mim?"

"Na verdade, lembro. Uma menina pequena, tranças louras, enfurecendo Sirius sempre que se encontravam."

"Ele era uma peste." Claire lembrou a ele algumas das peças que Sirius tinha pregado nela.

"Ele sempre era quando gostava de alguém."

Ela olhou para os olhos cinza claro dele. "Tenho certeza de que ele não gostava de mim nem um pouquinho."

"Olhe, lá vem ele."

A boca de Remus se torceu quando ele percebeu que ela corara ao ver Sirius. Então sua voz se tornou gentil.

"Ele não era desse jeito. Tão... calado, tão zangado." Ele disse suavemente. "Ele era muito divertido, um traquinas, se eu já conheci algum. Antes de Azkaban, quero dizer. E ele tinha jeito com as palavras."

"Oh sim, eu lembro. Todas as meninas eram loucas por ele."

Remus riu. "Sim, ele era um grande conquistador. Mas eu quis dizer outra coisa. Ele escrevia grandes histórias. Eu sempre achei que ele seria um escritor algum dia, um escritor de livros de viagens. Ele veria os lugares mais exóticos e escreveria livros que nos deixariam saber as maravilhas do mundo. Mas Azkaban tirou tudo isso dele. Ele não viajou. Ele perdeu... seu dom com as palavras. E ele perdeu metade de sua vida por um crime que não cometeu."

Claire olhou para o homem alto que caminhava na direção deles através da multidão, e piscou para conter as lágrimas.

Sirius sentou e forçou um sorriso no rosto quando viu Claire. "Que bom que você está aqui." Ele disse suavemente. "Eu precisava ver um rosto amigo."

"Hei, o que eu sou?" Protestou Remus.

"Você tem estado doente de amor e miserável o dia todo, Lupin, então cale a boca." Sirius tomou um gole da limonada de Claire e franziu a testa. Remus entrou na taverna para pedir mais duas canecas de cerveja amanteigada, e Sirius se encostou à parede e levantou seu rosto para o sol. Claire olhou para ele e quase não pôde evitar tocá-lo. Ele parecia infeliz e magoado, embora fizesse o melhor para disfarçar, mas ela podia ler bastante nas expressões dele agora.

"O que está errado?" Ela sussurrou. "Harry ainda está chateado?"

"Chateado?" Sirius deu uma gargalhada amarga. "Ele me odeia."

Claire tocou o braço dele. "Ele não odeia você. Eu tenho certeza que não. Ele apenas está confuso e zangado."

Ele suspirou. "Eu estou no fim de minhas forças. Eu tento explicar. Ele não me ouve. Ele age como se eu não estivesse ali."

"Ele precisa de tempo." Remus colocou uma caneca em frente a ele. "Talvez depois do verão..."

"Eu perdi quinze anos da vida dele, Remus. E agora vou perder outro verão."

"Eu não acho que você possa muita coisa a respeito."

Sirius suspirou, esvaziou sua caneca e se levantou pegando a mão de Claire. "Vamos assistir às corridas. Afinal é por isso que estamos aqui, não é? Assim Claire pode assistir ao seu primeiro festival."

Os dois bruxos, com Claire no meio, passearam pelas barracas, passando pelos clientes que admiravam as jóias, enfeites de objetos mágicos dos mais variados. Remus parou em uma tenda branca onde uma bruxa com moedas douradas na testa vendiam minúsculos modelos de planetas.

"Não." A voz de Sirius era firme e consoladora ao mesmo tempo. "Aluado, deixe para lá."

Lupin deu de ombros e olhou para os pequenos planetas, parecendo infeliz. "Serene gostaria deles."

"Sim, ela gostaria. Mas você tem que deixar essa mulher sair de sua vida, entendeu? Ela é como uma poção ruim para você. E no final ela vai te matar."

"Você não tem idéia, meu amigo. Não tem idéia do que é amor, tem?" A voz de Remus estava amarga.

Claire escorregou a mão dela e segurou a dele, levando-o para longe da barraca, fingindo não perceber o sofrimento dele. Sirius deu a ela um sorriso agradecido.

Eles passaram por um carrossel onde crianças dirigiam dragões de madeira e unicórnios que sacudiam as cabeças a cada volta. Bruxos vendiam poções e ervas estranhas. Claire comeu seu pedaço especial de doce da Dedosdemel, preparados especialmente para o festival, e Sirius e Remus tentaram a sorte em uma barraca onde as pessoas tinham que levitar bolas de prata por um obstáculo. Quando uma das bolas errou o caminho, Remus a segurou instintivamente, apenas para largá-la imediatamente, tremendo de dor. Claire pegou a mão dele, surda a seus protestos. Uma bolha horrível havia se formado na palma da mão dele.

"Prata verdadeira." Remus deu de ombros. "Faz mal aos lobisomens."

Claire colocou a mão esticada sobre a dele e sorriu, e então a dor desapareceu e a bolha também. Ela largou a mão dele e continuou falando com Sirius sobre a feira, sem perceber a surpresa de Remus quando ele olhou para sua mão, agora curada.

No caminho de volta ao Três Vassouras eles encontraram Laurel e Snape, cujo rosto disse muito claramente que estar naquele lugar era pura perda de tempo. Por outro lado, ele estava lá, e carregava um dragão de pelúcia, com asas batendo e tudo mais - que era mais do que alguém já havia visto ele fazer em uma feira. Sirius e Remus tentaram não olhar para o dragão e Snape os desafiou a mencioná-lo.

Laurel sorriu para Claire.

"Não é maravilhoso? Eu já estive em muitas feiras Trouxas, mas essa bate qualquer uma delas. É muito divertida!

Claire pensou que Severus não parecia estar se divertindo, mas ela se lembrou como ele parecia maldoso e frio normalmente, e como parecia... humano... com Laurel ao seu lado. Ele até mesmo segurava a mão de Laurel, um gesto que pareceu tão íntimo que Claire corou e desviou os olhos.

"Você viu as jóias que eles vendem ali? Não são horríveis? Deveria ser proibido." Disse Laurel e apontou para uma barraca à direita.

Remus, que tinha rodado pela feira mais cedo, concordou. "Eu pensei que o conselho havia proibido essas coisas há muito tempo atrás." Para Claire ele explicou: "Eles põe um feitiço em uma pequena borboleta e a colocam em um pequeno enfeite de cristal. Todos parecem realmente bonitos, mas pensar que as borboletas ainda estão vivas e presas para sempre, apenas para serem vendidas como jóias..."

Claire estremeceu. Ela invejava todos que podiam fazer mágica, mas aquilo podia gerar tantas formas de abuso, não apenas pelos Feitiços Imperdoáveis, mas por pequenas coisas como essa. Enquanto Laurel pedia a Remus para provar os doces que ela havia comprado e Sirius vagava pelas barracas, Claire reuniu toda a sua coragem e chegou perto de Snape. Pigarreando nervosamente, ela manteve os olhos presos no dragão de pelúcia.

"Eu preciso perguntar uma coisa a você... Severus."

Ele baixou a cabeça. "Contanto que você não queira que eu atire em um dragão para você também."

Sua boca se torceu, mas ela permaneceu séria. "Remus disse... que você esperava que ele dissesse aos outros que ele era um lobisomem."

"Ou eu faria isso por ele. Sim."

"Mas não é uma coisa muito particular? Se ele falasse ao invés de deixar as pessoas descobrirem?"

Snape deixou o olhar vagar pela multidão para Lupin que estava rindo com Laurel e Sirius. "Remus vivia fugindo. Mas você não pode fugir dos seus próprios demônios, lobisomem ou não. Você precisa encará-los." Claire notou como ele apertava com força o dragão, as dobras dos dedos brancas. E quando você faz isso, você pode descobrir que não é tão horrível como você tinha imaginado."

"E... você espera que eu conte para todo mundo também?"

Ele suspirou. "Não. Ser um aborto não é nada para se envergonhar, não importa o que seus pais tenham feito você acreditar. Mas nesse momento isso apenas colocaria você em perigo se alguém além de nós descobrisse."

Ela quase gritou de alívio. "Obrigada."

Laurel riu atrás dela. "Você está agradecendo a ele? Oh, Severus, não me diga que você deu meu dragão para ela!"


Na manhã seguinte quando Sirius acordou, ele percebeu que alguma coisa estava errada. A luz do amanhecer estava ainda cinza passando entre os galhos das árvores em frente às janelas do quarto de Claire. Levou um minuto para perceber o que o estava perturbando. O quarto estava silencioso. Muito silencioso. Devia haver pelo menos... o som da respiração de Claire... Ele procurou por ela, mas a sua mão não tocou nada além dos lençóis frios.

Agora realmente preocupado, ele se levantou e vestiu as calças. Ele procurou no banheiro, até mesmo no quarto dele, mas ela havia desaparecido.

Quando abriu a porta para o corredor ele estacou.

Uma dúzia, ou mais, de elfos domésticos estavam em frente à porta, as orelhas batendo ameaçadoramente como só os elfos conseguiam fazer.

"O que eu fiz agora?" Sirius suspirou.

Eles barraram o caminho para a escada com uma postura que deixava claro que não o deixariam passar tão facilmente. E se ele os machucasse acidentalmente, Claire ficaria chateada...

"O quê?" Ele perguntou.

Os elfos trocaram olhares nervosos, então Koko deu um passo à frente. Ela olhou para ele com os olhos verdes enormes lançando chispas. "O que você andou fazendo com a Srta. Claire?"

"O quê?" Sirius sacudiu a cabeça e por um momento não teve certeza se aquilo não era apenas um sonho muito estranho. "Eu não fiz nada."

"Mas ela estava chorando, Sirius da Srta. Claire! Muito mesmo!"

Sirius virou nos calcanhares para ficar cara a cara com a elfa. "Ela estava chorando?"

"Muito mesmo. Ela nunca chorou tanto, até hoje!"

"Eu entendo. Ouça, eu não fiz nada a ela." Sirius tentou manter a voz tão calma quanto possível. "Onde ela está?"

Koko deu de ombros e assoou o nariz em um lenço muito bonito que era quase tão grande quanto a sua toalha de chá. "Nós não sabemos. Ela saiu."

Continua...