Parte 1

Cap. 1: O Sequestro

As aulas tinham terminado mais cedo no colégio porque um professor adoecera e Hotohori estava a fim de dar um passeio sozinho. Não era mais nenhuma criança para não saber andar pela cidade, tinha 16 anos e todo mundo nessa idade fazia isso, por que não ele?

Percebera o rapaz de boné que o seguia, mas não deu importância, era só uma coincidência, nada para se preocupar, provavelmente estavam apenas seguindo o mesmo caminho. Mas os passos do rapaz se apressaram e ele pensou em correr, mas antes de o fazer o jovem o agarrou por trás e pôs um pano em seu nariz, fazendo-o desmaiar.

Quando acordou estava num quartinho, onde só havia a cama em que estava sentado e amarrado e a cadeira em que o seu seqüestrador se sentava. Ele agora usava uma máscara de esqui e apontava um revólver em sua direção.

- Quem é você? – perguntou com a voz firme.

- Acha mesmo que eu vou te dizer? – o rapaz respondeu tentando disfarçar a voz.

- O que pretende me seqüestrando? Um resgate?

- Nossa! Como você é inteligente. – disse ironizando. – Sua família é cheia da grana. Não vai se importar em me dar um pouquinho.

Hotohori deu de ombros.

- E quanto é que você acha que eu valho?

O seqüestrador levantou-se e como se estivesse pensando respondeu.

- Uns cem mil dólares.

- Você deve estar brincando! – disse parecendo irritado. – Acha que eu valho só isso.

O jovem seqüestrador se surpreendeu.

- Você tem que pedir no mínimo quinhentos mil. – opinou. – E se for bastante esperto, pedirá um milhão.

- Eu não preciso de todo esse dinheiro. – disse bruscamente o rapaz.

- O que vai fazer com o dinheiro? – perguntou Hotohori em tom desdenhoso.

- Isso não é de sua conta. - respondeu secamente.

- Não vai gastar com garotos de programa, não é? Seria um desperdício.

O seqüestrador se aproximou dele e segurou-o pelo rosto.

- É melhor você ficar bem caladinho aí, entendeu?

Hotohori sorriu e deu um muxoxo, mas calou-se, observou tranqüilo quando o sequestrador deixou o pequeno quarto. Ouviu quando uma porta bateu e foi trancada, pouco depois começou a se mexer na cama até que a corda que o prendia se desamarrou. Levantou-se e deixou o quarto.

Olhou em volta, apenas um fogão velho, panelas velhas penduradas na parede, uma poltrona rasgada, uma geladeira muito enferrujada e barulhenta, uma mesa e duas cadeiras estavam no lugar. Hotohori viu uma mochila jogada num canto e foi checá-la. A mochila era velha e estava um pouco rasgada, dentro encontrou revistas de moda e culinária, um vestido envolto num saco plástico e uma carteira. Abriu a carteira, papeis e mais papeis enrolados, contas para pagar, na verdade, algumas notas de baixo valor e moedas, mudas de roupas e finalmente e achou uma carteira de identificação. Será que era dele, ou ele tinha roubado a mochila? Tamahome era o nome do dono da carteira. Distraído, não viu quando o rapaz entrou e levou um susto ao ver o revolver em sua frente.

Cap. 2: Identidade Revelada

- O que está fazendo? – perguntou irritado. Estava sem a máscara e Hotohori pode confirmar que era dele mesmo a mochila. Tamahome era um rapaz bonito, tinha dezessete anos, era moreno com cabelos negros e curtos.

Levantou-se sobressaltado e deixou a carteira e seu conteúdo se espalhar no chão, cobrindo o rosto com as mãos.

- Por favor, não me mate! – pediu, mas na verdade só fingia ter medo.

Tamahome o puxou para o quarto e o empurrou para a cama.

- Eu não vou te matar. – disse muito contra-feito e coçou a cabeça com a arma. – Mas como você se soltou?

Hotohori sorriu.

- Com um nó desse? – disse de modo irônico. – Você gosta de vestir-se de mulher? Não parece do tipo.

- Cale-se. – ordenou, pegou a corda e jogou em cima de Hotohori. – Desenrole.

Em segundos não ficou um nó na corda e Tamahome ficou surpreso. Tomou a corda e o empurrou, fazendo-o deitar-se na cama. Enquanto era amarrado Hotohori sentia o cheiro do corpo de Tamahome, ele estava entre suas pernas e a sensação de senti-lo desse jeito deixava-o excitado.

- Quero ver você se soltar agora. – disse quando atou o ultimo nó.

- Por quanto tempo pretende manter-me aqui? – perguntou.

Tamahome abriu o tambor da arma e destravou-a fazendo um estalo que arrepiou Hotohori.

- Até seu velho pagar o resgate. Isso vai depender dele.

- E se ele não quiser pagar? – perguntou desafiador. – Vai me matar?

Tamahome engoliu em seco. Não havia pensado nessa possibilidade. Tentou manter a voz confiante.

- Mas ele vai. Não irá querer perder seu único filho. – agora rezava para isso ser verdade.

- Por que está fazendo isso? – perguntou Hotohori tentando manter a conversa. – Não me parece um bandido.

- O que você sabe sobre ser bandido? – perguntou irritado. – Você é só um filhinho de papai que sempre teve tudo que quis ao seu alcance e nunca precisou dar duro por nada.

- Desculpe-me. – disse Hotohori enrubescendo.

Umedecendo os lábios, Tamahome se surpreendeu mais uma vez com o rapazinho em sua frente e sentiu vergonha de ter gritado com ele.

- Eu vou sair agora. – avisou. – Seja um bom menino e fique bem quietinho, está bem?

- Não fale comigo como se eu fosse criança. – disse Hotohori irritado. Tamahome sorriu e saiu.

Cap. 3: Desejos

Hotohori tentou descansar naquela posição, não podia se mexer e isso o deixava irritado, começou a sentir fome e deu vontade de ir ao banheiro. Quis esperar Tamahome, mas em suas contas se passara mais de uma hora que ele saíra e precisava mesmo ir ao banheiro, então começou a puxar os braços até que novamente o nó mal-dado se soltou de um dos braços, sentou-se na cama e desatou os pés.

Entrou no banheiro, um cômodo apertado, que tinha apenas um chuveiro sujo de limo e um vaso sanitário encardido. O lugar não tinha luz e Hotohori bateu a cabeça na portinha aberta do armário do banheiro, tentou fecha-las, mas desistiu percebendo que estava quebrada. Seu estômago roncou e ele foi ver se Tamahome tinha algo para comer.

A primeira sensação foi de repudio por aquela coisa velha e enferrujada que já foi uma geladeira, mas com um novo ronco de seu estômago abriu a porta e achou uma caixa de leite e duas maçãs, procurou um copo sem sucesso, sentou-se numa das cadeiras e bebeu o leite diretamente na caixa devorando em seguida uma das maçãs. Ouviu um barulho no teto de telhas, começava a chover e Hotohori levantou-se assustado com a goteira bem em cima de sua cabeça. Sabia que anoitecia, pois o feixe de luz embaixo da porta começava a desaparecer. Tocou na fechadura e descobriu que a porta estava aberta, sem dúvidas Tamahome achou que ele estava bem preso e largou-a aberta, nem pensou em fugir, primeiro porque não tinha idéia de onde estava e depois...

Tamahome entrou sacudindo a roupa e o cabelo molhados e levou um susto quando viu Hotohori de pé em sua frente. O rapaz sorriu e Tamahome suspirou.

- Que merda! Você é impossível! – disse com voz cansada e sentou-se na poltrona – Eu não disse para você ficar quieto?

- Disse. – Confirmou Hotohori sorridente. – Mas eu não queria fazer xixi nas calças e além do mais estava com fome.

- Por que não fugiu? – perguntou e apontou para a porta. - A porta estava aberta.

- E perder a coisa mais emocionante que já aconteceu em minha vida? – disse dando de ombros. – Nem pensar.

Tamahome levantou-se e aproximou-se dele. Hotohori era mais baixo e teve que levantar um pouco a cabeça, ficaram com os rostos quase colados.

- Acha isso engraçado, é?

- Hum! – disse Hotohori mordendo o lábio. – Você fica tão sexy assim, todo molhado sabia?

Hotohori tentou tocar Tamahome que se afastou imediatamente sem perceber o gesto. Tirou a jaqueta molhada e já estava com a blusa no meio do peito quando percebeu o olhar de Hotohori.

- Vai para o quarto. – Mandou.

- Por quê? – perguntou sorrindo malicioso. – Agora que está ficando interessante!

Tamahome baixou a camisa e passou por Hotohori que o segui com o olhar.

- Então vou eu. – disse entrando no banheiro.

Hotohori foi até a mochila e retirou uma calça e uma camisa e entrou no quarto. Tamahome o viu pela cortina rasgada que servia para separar quarto e banheiro e avisou:

- Se você entrar aqui eu vou te bater.

- Nossa, que bravo! – disse sentando-se na cama e ironizando o aviso.

Deu um assobio quando viu Tamahome sair do banheiro enrolado apenas numa toalha pequena que segurava com uma as duas mãos.

- Está procurando isso? – perguntou mostrando as roupas na mão.

Tamahome aproximou-se e esticou um dos braços para pegar a roupa, deixando, com isso, a toalha cair. Hotohori fez uma cara de espanto olhando fixamente para o membro de Tamahome, que corou e esticou rapidamente as roupas da mão do distraído Hotohori.

- Uau! – disse suspirando. – Isso é o que eu chamaria de ser bem dotado.

- Não enche. - disse Tamahome seco e um pouco envergonhado.

Hotohori o puxou e o fez cair por cima de si, prendendo-o com as pernas. Tamahome deixou-se envolver por aquela inesperada reação e o beijou.

- Me possua Tamahome. – sussurrou em seu ouvido.

Era a primeira vez que Hotohori pronunciava seu nome e agora fê-lo assim, de forma tão sensual. Tamahome sentiu seu pênis enrijecer e afastou-se empurrando Hotohori com tanta violência que o assustou. Pegou a calça e vestiu-a.

- Por que não me quer? – perguntou Hotohori ofendido, olhando furioso para Tamahome. – Não me acha bonito?

- Para você dizer depois que eu te estuprei? – respondeu rispidamente. - Não senhor. Não quero mais isso em minha ficha criminal.

- Eu nunca faria isso. – disse Hotohori deitando-se de costas para Tamahome

- E por que não? – perguntou cético.

- Porque se eu fizesse isso - respondeu virando o rosto para Tamahome por um instante –, meu pai saberia que eu sou gay.

Tamahome sorriu e vestiu a camisa.

- Se ele ainda não sabe disso. – disse rindo. - É cego ou muito burro. Agora durma. Deve estar indo embora amanhã.

Hotohori virou-se depressa.

- Eles vão pagar o resgate? – indagou.

Tamahome confirmou com a cabeça.

- Droga! – xingou baixinho Hotohori, voltando-se a deitar. – Deveriam esperar mais um pouco.

Cap. 4: O Porque de tudo

Balançando a cabeça, Tamahome deixou o cômodo e abriu a geladeira.

- Merda! Ele comeu tudo o que eu tinha.

Pegou uma das panelas da parede e retirou um pacote de biscoito de dentro e sentou-se exausto na poltrona velha.

- Ainda estou com fome.

A voz de Hotohori assustou-o, por alguns segundos pensou estar só em seu esconderijo. Sempre ia para lá quando queria fugir das pessoas e pensar um pouco sozinho. Suspirou e ofereceu o biscoito a Hotohori, esse puxou uma cadeira e apoiou os cotovelos no braço da poltrona, segurando a cabeça, olhando para Tamahome.

- Por que esta fazendo isso? – perguntou, tentando ser gentil. – Já disse que não parece bandido e eu tenho certeza de que não o é.

Com um suspiro um pouco mais profundo Tamahome se rendeu a voz doce de Hotohori.

- Você tem razão. – disse baixando a cabeça, segurando-a com uma das mãos. – Foi um ato de desespero. Preciso da grana para o tratamento de minha avó, ele está muito doente e os remédios são muito caros, não dá pra pagar com o que ganho.

- Está tudo bem. - Hotohori segurou a mão dele com carinho, percebendo lágrimas em seus olhos. – No que depender de mim. Não direi quem você é. Alem do mais, - disse sorrindo -, achei você muito bonitinho.

Tamahome passou a mãos pelos longos cabelos de Hotohori e o beijou na testa. Hotohori adiantou-se o beijou na boca, Tamahome correspondeu o beijo para logo depois mandar Hotohori para a cama. Sozinho e frustrado.

Cap. 5: Despedida

No dia seguinte, Tamahome passou quase todo fora, já anoitecera quando ele voltou. Hotohori começava a ficar preocupado, quando finalmente chegou foi recebido com beijos e abraços, que ele carinhosamente repeliu. Hotohori pediu desculpas e sentou-se o observando arrumar a mochila e limpar a casa para não deixar nenhuma pista.

- Você já tem o dinheiro? – perguntou, e Tamahome confirmou. – Está nervoso?

- Mas é claro. Eu nunca fiz isso em minha vida. E gostaria de ter não feito. – Retirou um comprimido do bolso e encheu um copo com água. – Beba.

- O que é isso? – perguntou pegando o comprimido.

- Um calmante. – explicou, com calma. – É forte e vai fazer você dormir. Não se preocupe, eles virão lhe buscar logo.

Hotohori engoliu a pílula e tomou de um só gole a água, levantou-se e abraçou Tamahome beijando-o com intensidade. Provavelmente seria a última vez que sentiria a língua dele explorando sua boca. Sentia como se fosse abandonado. Seu coração se partia.

Tamahome o carregou e o pôs no banco de trás do carro, o calmante já fazia efeito e Hotohori estava semiconsciente e nem percebeu para onde era levado. Foi deixado num motel decadente longe dali.

Cap. 6: Resgate

Ainda tonto, Hotohori consegui divisar seus pais. Sua mãe chorava desesperada por ver o filho inconsciente naquela cama suja, tinha medo que ele estivesse morto, o pai fazia cara de nojo enquanto observava o lugar em que o seu filho fora deixado. Policias vasculhavam e tentavam encontrar alguma impressão digital no local.

- Mamãe. Papai. – disse com voz atropelada.

- Ele foi sedado. - Era o médico que examinava Hotohori, pondo uma lanterninha em seus olhos. - Mas está bem, pelo menos fisicamente.

Sentiu que era carregado, não sabia por quem. Não queria acordar, sim queria, mas nos braços de Tamahome. Tinha a certeza de que não o esqueceria jamais e só pensava se iria e em como o encontraria novamente.

No dia seguinte foi levado a delegacia, para prestar depoimento. Disse ao delegado que não vira o rosto e nem ouvira a verdadeira voz do seqüestrador. Disse que ficara amarrado, amordaçado e dopado quase todo o tempo, que o quarto era escuro e ele provavelmente não poderia reconhecer o local. A polícia prometeu aos pais de Hotohori que iria continuar investigando o caso, mas que pouco poderia ser feito sem ao menos o retrato falado do sequestrador.

Pouco tempo depois o inquérito foi arquivado e a família resolveu esquecer o incidente.

Continua...