RECEIO DE AMAR

"A medrosa e vã apreensão dos males que podem

vir, aflige e enegrece toda a beleza e serenidade

da alma."

Charron

Capítulo 14

O quarto é acolhedor. Somente a suave luz do abajur o ilumina brandamente.

Mulder e Scully entram nele.

Não se olham. Nem se falam. Somente uma grande emoção existe neste momento.

Dentro do coração de Scully interpõe-se entre todos os outros sentimentos o receio de amar. Tem a certeza de que ama Mulder verdadeiramente, porem aquele sentimento quase doentio, o receio, a dúvida, a timidez pairam sobre seu coração, deixando-a abalada.

É um conflito de extremo sofrimento o que se está passando neste momento.

A luta contra si mesma, mas ama Mulder e deseja-lhe sempre o melhor.

Sabe que sempre fará tudo por ele. Só precisa de forças no seu interior para agir como é necessário.

Scully pára e fita-o nos olhos, intensamente.

- Mulder, você ficou muito tempo fora; está abatido; quero lhe dizer que lhe proponho dormir hoje aqui, nesta cama. - ela a mostra com os olhos.

Ele nada comenta. Apenas assente.

- Acho que você precisa de um lugar bem aconchegante, no qual possa descansar, pensar... - ela continua.

- E não estar só! - ele conclui.

- É isso! - argumenta Dana, confirmando e o trata com carinho, como a um menino.

- Deite-se, vá! Ponha-se à vontade, Mulder!

Ele observa ao seu redor o ambiente agasalhador.

- Scully...?

- O que?

- Você fica comigo?

- Claro! Não vou sair!

- Está bom! - Mulder concorda - Mas... e...

- Eu?

- Sim.

- Fico na sala. - ela explica, rapidamente.

- Ahn... - ele entende sua proposta.

"Na realidade não podia ser de outra maneira." - pensa Mulder.

Mulder resolve continuar:

- Scully, eu preciso ficar mais à vontade...

- Claro, Mulder, esteja à vontade... eu vou para a sala.

Ele segura-a por um braço:

- Scully, você não vê que não posso fazer isso?

- Isso o que?

- Deixar você ficar na sala, enquanto eu fico aqui nesta cama macia!

- Por que tanta preocupação, Mulder? Às vezes você...

- Eu fico na sala, Scully! - usa um tom decidido.

Scully levanta os braços, indicando que se dá por vencida.

Mulder avista um álbum de fotografias sobre uma cômoda.

- Posso vêr?

- Sem dúvida. - ela responde, enquanto retira uns lençóis para que ele os use no sofá.

Mulder começa a folhear o álbum, interessado.

Sentam-se os dois na beira da cama.

- Sabe, Scully, eu também tenho algumas fotos de família.

- Sente saudades?

- Você conhece a minha vida com a minha família e sabe que nosso relacionamento era indefinido...

Os olhos de Mulder ficam parados, olhando o espaço, o nada, pensativo.

Scully toma-lhe a mão.

- Eu não queria que relembrasse coisas tristes.

- Não, você não é culpada por esse meu momento de melancolia, Scully, a minha vida é que não satisfaz as minhas carências.

Ele continua folheando o álbum.

- Ainda tenho saudades do meu pai... minha irmã... - diz Dana, abrindo o coração.

Mulder segura-lhe o queixo com ternura.

Àquele toque Scully sente necessidade de algo mais que acaba de despontar no seu íntimo.

Ela abaixa a cabeça. Seu rosto se contrai. Sente desejo de chorar.

Chorar, sim, sentindo desvanecer-se nos seus sentimentos o desejo incrivelmente perigoso de abandonar sua capacidade de estar sempre alerta às necessidades que a vida lhe obriga a sentir e deixar para trás sua racionalidade, sua seriedade de mulher de pulso forte e coração imune às coisas sentimentais.

Mulder toma seu rosto entre as mãos.

- Scully, não fique triste...! Olhe... hoje eu estou aqui com você... - beija-lhe a testa e abraça-a com carinho.

- E eu senti tanta falta de suas palavras de conforto, Mulder!

- Eu sei, Scully. É recíproco.

Dana percebe que é aquele toque das mãos dele que ela precisa. Sente que é a necessidade de senti-lo intimamente que a faz ter desejos de jogar para o alto a sua racionalidade.

Afinal, de que valeria a vida, se não houvesse o amor?

Essa troca recíproca de carinhos que se sente pelo ser amado?

O álbum de fotografias desliza para o chão.

Mulder percebe que Scully está vulnerável.

Ela não faz nenhum gesto de resistência a seus carinhos.

Experimenta a boca; ela entreabre os lábios e ele deposita neles toda a sua ansiedade amorosa num beijo suave.

- Scully... - murmura após segundos.

Mulder desliza os lábios pelo pescoço de Scully, achando gostosa aquela morna sensação a lhe fazer vibrar o corpo de desejo.

- Eu sempre te disse... - sussurra ele.

- O que?

- Eu te amo, Scully! - faz uma pausa, enquanto a beija.

Tenta apartar-se dela, agora.

- Eu vou embora... - ele avisa.

- Não! - ela aperta-se mais contra ele.

- Não posso ficar, Scully, você está me provocando!

Dana sente nos ouvidos o soar das palavras sussurrantes como apelos ansiosos, de Mulder.

- Eu não estou, Mulder! Eu quero que fique aqui!

- Não posso!

- Pode! É aqui na cama... comigo!

Há uma pausa de longos minutos.

"Pronto! - pensa - Finalmente, consegui! É isso exatamente o que eu necessitava dizer a ele de uma vez por todas!"

- Tem certeza? - ele diz e fita-a com seus olhos esquadrinhadores, como que querendo ler a verdade de suas palavras encravadas na mente; acha-se um tanto receoso de ter entendido mal.

- Completa, Mulder! - sente que faz um grande esforço para murmurar: - Eu te amo, Mulder!

E a sua sempre cuidadosa insistência pelas coisas corretas? Seria plausível de explicação o que o corpo lhe exige agora? Não, não há uma científica explanação ao que se passa dentro de si, neste momento!

Agora só deseja mesmo perder toda aquela impávida pose de mulher cientista e culta! Quer somente amar! Quer somente ser de Mulder! Inteiramente! Ele é a sua vida! E há quanto tempo o ama e o deseja!

Nota que ele está arfante de desejo e ansiedade.

Vibra com todas as fibras de seu corpo com as emoções por sentir que ele, voluptuosamente, lhe toca em suas carnes frementes de desejo.

Sente que os dedos dele a querem explorar, mas estão nervosos, tateantes e além de tudo, tímidos.

Ela percebe que necessita facilitar e estimular os impulsos dele e abre os botões da blusa que veste.

Abraçados, lentamente deixam-se cair no leito.

"Os mais enamorados da vida são os tímidos

e para auxiliá-los, nada melhor que amá-los."

Anatole France