ESPERANÇA
"Não neguemos nada, não
afirmemos nada; esperemos."
Renan
Capitulo 15
Scully abre os olhos.
Despertara, enfim.
- Hummm... - dá um gemido prazeroso; distende os músculos.
Olha para o lado.
- Ahn? - surpreende-se por segundos. Parece-lhe estar sendo a protagonista de algum sonho romântico.
Vê Mulder.
- Mulder! - murmura.
Ele dorme, ainda. Sua fisionomia é serena.
"Mulder está aqui, ao meu lado! Tivemos a nossa primeira noite de amor! Depois de todos esses anos! E ele me amou como eu queria! Me sentí no céu! Estou feliz, meu Deus!" - divagam os pensamentos de Scully.
Um movimento de Mulder a desperta de suas divagações.
Queda-se a contemplar embevecida a face dele, bem juntinho de seu rosto.
Observa o rosto dele: a boca que desvendara todos os segredos do seu corpo; o nariz que roçara sua pele e sentira-lhe o mais íntimo odor; os olhos que lhe vasculharam até o âmago do seu ser.
Tudo isso naquele rosto que ela adora e por onde agora desliza o olhar por cada linha horizontal que se desenha na testa dele, e que faz denotar que, aos poucos, a juventude vai dando lugar à maturidade naquele semblante que pertence a uma criatura de um sério caráter e muito segura de si.
- Ola a a a á... - cantarola baixinho, chamando-o
Ele abre os olhos, vagarosamente.
- Scully? Meu Deus, Scully! - passa a mão pelos cabelos - Nós...?
- ...fizemos amor, Mulder! - fala tranquila.
Ele sorri e deita-se apoiando-se sobre um cotovelo.
- E como poderia esquecer? É que eu ainda não despertei do sonho! Me belisca, me belisca, Scully! - olha-a sorrindo - Você acordou já há muito tempo?
- Han, han. - confirma - Estava olhando você.
- Scully...?
- O que?
- Eu nem sei... - começa, sem saber o que perguntar.
- Mulder... eu quis, você quis, nós quisemos...
- E há quanto tempo, Scully, eu desejava ter esse instante... estar com você aqui!
- Eu também.
Mulder vira-se e deita, olhando para o teto:
- Eu nem acredito, Scully... ainda!
- Obrigada, Mulder.
- Do que?
- Por me fazer tão feliz.
Ele volta-se para ela e procura-lhe os lábios. Beija-os levemente.
- Eu te amo, Scully. Acredite.
- Eu acredito. E também te quero muito! - faz uma pausa - Mulder...?
- O que é?
- Nós precisamos acabar com a solidão em nossas vidas.
- Tenho certeza que sim... - olha-a com ternura - Scully...?
- Fala. - acaricia-lhe os cabelos do peito.
- Era disso que eu precisava para transformar a minha insípida existência! E eu nunca perdi a esperança!
- E você acha que comigo era diferente?
- Eu não tinha certeza de que você...
- Não pode dizer isso, Mulder. Posso até não ter demonstrado claramente tudo o que sinto por você por uma questão...
- De ética? - ele ri e puxa-a para si - Ah, Scully, Scully, quanto tempo perdemos, não acha?
Ela somente sorri com um certo recato.
Mulder toma seu rosto entre as mãos e beija-a nos lábios repetidas vezes.
- Muitas vezes ficamos procurando a outra metade da laranja, quando ela está bem junto de nós...
- Hum, hum. - ela concorda.
Scully aconchega-se ao corpo quente de Mulder sob os lençois.
Afagam-se, agarram-se e permanecem assim, calados, unidos, olhos fechados, sentindo-se... um ao outro.
Muitos minutos se passam.
Repentinamente um estridente ruído ressoa no aconchegante ambiente.
Ambos parecem emergir de um agradável torpor.
Scully, com olhos esgazeados, não consegue compreender, de pronto o que se passa.
Mulder, por sua vez, levanta a cabeça.
- O telefone? - exclamam ambos, em uníssono.
Scully senta-se na cama, cobrindo-se com o lençol.
- Mas o que significa isso? - reclama.
- É um aparelho usado para transmitir a palavra a grandes distâncias, segundo Graham Bell. - brinca Mulder.
Scully ergue a mão para pegar o telefone na mesinha de cabeceira.
Mulder coloca sua mão por sobre a dela, impedindo-a de segurar o aparelho.
- Não. - ele diz.
- Não...?
- Você não acha que devemos ficar em paz? Pelo menos agora?
- Sim, acho.
- Vamos deixá-lo tocar, então.
Mulder enlaça-a, fazendo com que o pequeno corpo de Dana seja completamente envolvido pelos seus braços.
Volta a beija-la intensamente e procurá-lhe a boca com lábios sôfregos.
Dana o recebe com extremo desejo. Nunca havia amado Mulder! Nunca havia permitido os seus sentidos perderem-se sob o poder sedutor dele. Agora está com ele ali, aconchegado ao seu corpo, sentindo o calor que emana daquela carne vibrante e cheia de volúpia de Mulder.
Sente em êxtase a leveza e o carinho com que ele beija e toca com lábios e mãos as partes mais íntimas de seu corpo, e ele assim age como se manuseasse uma peça rara e frágil de algum material diáfano que ele pudesse perder a qualquer momento em que usasse de menos sutileza.
E Scully quer mais.
E entrega-se totalmente a ele. Deseja-o
Necessita dele como o ar que respira. Agora sente que precisa viver e viver sem Mulder não tem razão de ser.
X x x x x x X
- Mulder...? - consegue falar.
- Diga, Scully.
- E depois?
- Depois...?
- É.
- Não entendi.
- O que vai ser depois?
- O que vai ser? - ele larga-a sobre os lençois - Scully, já é chegada a hora de termos nossos direitos. Precisamos um do outro. Não dá mais pra fingir, Scully! Vivemos até ontem apenas de esperanças e desejos reprimidos. Por que não assumir de vez e mostrar pra nós mesmos que não podemos viver um sem o outro?
- Sabe, Mulder, quando você me beijava suavemente, quando me fazia um carinho, eu me sentia arrebatada. Os meus sentidos tornavam-se extremamente excitados somente pelo pensamento de poder estar assim... ao seu lado... desse jeito, Mulder! Quando fomos àquele cidade, lembra-se, quando fingimos ser marido e mulher...?
- Arcadia... - ele relembra.
- Pois é, você dizia-me aquelas coisas e naquele instante em que me chamou para a cama... se eu não estivesse tão...
- ... ligada à racionalidade.
- Isso mesmo... certamente que eu esqueceria tudo e iria para o seu lado, Mulder!
Ele envolve com os braços o corpo de Dana, sorridente.
- Ah, lindinha, esquece o que já foi...! Hoje estamos aqui e devemos somente pensar no futuro, não acha?
Ela senta-se na cama e veste o quimono.
Mulder vira-se de bruços na cama:
- Scully?
- Hum?
- Você me fez passar cada situação...!
- Eu?
- Claro! Te peguei nua naquele gelo na Antartica e depois vi um pouco de você naquele chuveiro no ano passado...
- Mulder, pára! - ela ri, divertida - Pensa que não fiquei depois pensando na situação? Mas a minha sorte é que eu estava com a minha mente meio atrapalhada e era a minha vida em jogo.
- A sua sorte não foi bem essa, exatamente. - afirma - Sorte sua mesmo foi eu estar quase congelando todos os meus membros, senão a situação ia ficar bem atrapalhada... pra mim!
Scully novamente dá uma risada, entendendo.
- Do que eu escapei, hein?
Ele a enlaça, novamente, cheio de calor.
- Só que agora não há como escapar, Agente do FBI!
- Não faço o menor esforço para isso...! - ela diz, inclinando-se sobre ele, sussurrando-lhe aos ouvidos.
X x x x x X
O tímido sol da manhã já começa a penetrar pelas vidraças da janela.
Já podem ouvir o leve trinar dos pássaros nos arvoredos próximos, lá fora.
O latido de um cão, uma busina de automóvel, o ronco de um motor.
- Mulder... a vida nos reserva muitas surpresas, não é?
- Com certeza, sim. Refere-se a nós?
- Sim.
- Não é surpresa pra mim.
Ela ergue as sobrancelhas, em dúvida:
- Não?
- É óbvio que não. Sou um cara perseverante, Scully, nunca perdi a esperança de ter você assim nos meus braços, como agora!
Scully sorri.
- Tem alguém que gostará de saber.
- Quem?
- Minha mãe.
- Gosto de sua mãe, Scully; é uma pessoa especial... e quanto aos outros?
- Bill, por exemplo?
Mulder assente.
- Não se importe com isso...
- Não me importo.
Mulder volta-se para Scully, retira de seu rosto alguns fios de cabelo, amorosamente.
- Quero que sejas minha, Scully.
- Sou tua.
- Eu preciso de você, de seu amor, de sua força, de seus ensinamentos...
- Ensinamentos...? - Scully ri - O que eu posso ensinar a essa potência de sabedoria?
- Não brinque... eu falo assim porque neste mundo não se pode mesmo viver somente de teorias espirituais ou psicológicas...
- Temos que ter sempre os pés à terra, nem sempre o coração preso a hipóteses sem fundamento... é isso que quer dizer?
- Certissimo, lindinha.
Ele busca as mãos dela para segurá-las e prendê-las à volta de seu corpo:
- Você é tudo o que eu buscava e que eu preciso... - junta os lábios aos dela.
Prova-os como a algo do qual procura conhecer o sabor.
Scully o espera e devolve aquela carícia.
Sente agora que a boca sensual dele prende-se às partes sinuosas e mais sensíveis de seu corpo, sugando-as com prazer. Freme de paixão por aquelas carícias.
Arrebata-lhe os sentidos os afagos que ele faz com lábios úmidos e desejosos.
Suas carnes túmidas impelem-na a desejar mais e mais carícias.
Sente no corpo dele o retesamento de seus músculos ansiando por sua entrega.
Que é total agora.
X x x x x x X
Scully levanta-se.
Mulder fica na cama; olhos dirigidos para o teto, mente divagando em mil pensamentos.
Sente, de certa forma, felicidade nesse novo estilo de vida que deverá seguir daqui para a frente.
Um leve sorriso aparece-lhe nos lábios e um brilho de paixão nos olhos verdes.
Sabe que deste momento em diante sua vida terá um novo sentido.
A esperança será o esteio para sua vida em tudo que tentar realizar, porque confia num futuro feliz.
Embora a sua Scully tenha sido a companheira de todas as horas nesses sete anos de conhecimento, a partir de então, até nos momentos de maior intimidade estarão compartilhando dos mesmos lugares, coisas, pensamentos e sentimentos.
E sente que foi muito gostoso acontecer na sua vida aquele encontro, num acaso, com a sua parceira, naquele 10 de setembro de 1993, a qual seria sua colega, sua amiga e o seu amor.
"O acaso é, talvez, o pseudônimo de Deus
quando Ele não quer assinar o próprio nome."
Theophile Gautier
