DÚVIDA
"A dúvida é a nossa
eterna companheira."
Campoamor
Capítulo 16
A porta do escritório é batida com estrépito.
Mulder entra na sala.
Scully levanta o olhar de sobre a pilha de pastas-arquivo à sua frente sobre a mesa.
Nada fala.
Mulder aparenta estar com os nervos em frangalhos.
Scully franze as sobrancelhas para melhor observá-lo, em silêncio. Retira os óculos.
Mulder atira-se sobre uma cadeira; a gravata, como sempre, afastada do lugar. Ele arranca o paletó de sobre o corpo e atira-o, displiscentemente sobre a mesa.
A enorme pilha de pastas, equilibrando-se perigosamente, balança ao passar por ela o vento formado no espaço pelo paletó de Mulder.
- Ô oooooooo! - acompanha com graça, Scully, a pilha balançando, prestes a cair.
Mas os valentes arquivos empilhados conseguem manter-se equilibrados.
- Mulder! - diz, enfim - O que houve?
- O que houve? - ele a olha incrédulo - E você ainda pergunta, Scully? Lembra-se de que horas Skinner nos chamou para esse trabalho?
- Quatro e meia da manhã...! - ela fala, meneando a cabeça, com dó de si mesma.
- Pois é... - ele deixa o corpo estirar-se com os pés à frente, relaxando o mais possivel - E depois disso tudo você acha que fica como?
- Fica como o que?
Mulder leva as mãos ao rosto, sem acreditar em sua pergunta:
- Ah, não, Scully! - faz uma voz chorosa.
Permanece assim por quase um minuto.
Scully levanta-se e vai para junto dele.
- Mulder, me diga de uma vez: o que houve? O que está acontecendo? Me fala, anda!
Ele retira lentamente as mãos do rosto, deslizando-as sobre a pele...
- Scully... estamos na nossa sala de trabalho... fizemos nossa tarefa que conseguimos resolver, aliás com bons resultados... - consulta o relógio de pulso - e agora temos que descansar nossas carcaças...
Scully já encostada a ele passa-lhe a mão nos cabelos revoltos. Fala com voz mansa:
- Sei... mas o que está acontecendo?
Mulder levanta-se. Aperta-a contra si, sem mais inibição como antes.
- E agora, lindinha?
- Mas agora o que, Mulder? Me fala!
- Eu não quero ir para casa... só!
Scully sentira que, lá dentro do coração, já adivinhara há muitos minutos atrás, o que Mulder lhe iria falar.
- Meu Deus, que problema, Mulder! - zomba, segurando o rosto dele entre suas mãos - E agora, o que vamos fazer!
Mulder, de imediato quer procurar-lhe a boca, porem Scully afasta-se, saindo de seus braços.
- Não, aqui não! Não podemos deixar-nos levar pelas emoções aqui no trabalho. Se alguém entrar aqui e nos pegar assim...
Mulder levanta as mãos espalmadas.
- Agente Especial Dana Scully! Sempre usando sua racionalidade! - diz, fitando-a sedutoramente.
Neste exato momento a porta abre-se e entra um dos agentes no escritório.
- Olá, Agente Mulder! Dana! - sauda-os o recém-chegado.
- Oi, Agente Kearns. - responde Scully o cumprimento, enquanto Mulder faz um meneio de cabeça.
Em seguida ela lança a Mulder um olhar de cumplicidade, que refere-se à discreção que, necessáriamente, deve ser usada dentro do escritório a fim de evitar flagrantes românticos.
Mulder franze os lábios, entendendo.
Scully afasta-se mais e cruza os braços.
- Olha, Mulder, estou aqui para pedir um favor. - diz Kearns - Poderia dar uma olhada nos arquivos do assunto que você está investigando?
- Para que? - Mulder não entende o significado do pedido.
- Ah... bem... eu gostaria só de encontrar o nome de um falso investigador que vive na cidade onde vocês foram, porque há uma certa suspeita de que esse homem era um sujeito malfeitor há algum tempo atrás. A Polícia do local nem tem idéia...
- Ei! Pára por aí! - está nervoso - Desde quando tem que algum outro agente meter o nariz onde não é chamado? Os Arquivos-X pertencem a mim e a Agente Scully! Olhe Kearns...
Scully aproxima-se e, discretamente, segura-o pelo braço, para que àquele toque ele sinta sua força e ponderação, procurando acalmar-se.
- O sujeito está usando uma identidade falsa e nem a própria Polícia consegue acabar com a ousadia dele, Mulder! Já usou várias identidad...
- Já disse-lhe o que penso sobre isso, Kearns. - corta-lhe Mulder a frase, convicto de suas palavras.
- Bem, Agente Mulder, o Diretor Skinner permitiu-me vir falar com você sobre isso... mas...
Mulder, agitado, vai até a porta e abre-a, fazendo um gesto sem olhar para ele.
- Faz favor, Agente Kearns.
Kearns entende a ordem um tanto velada de Mulder e sai, não sem antes lançar um olhar para Scully, que mantivera-se de pé, braços cruzados.
Scully está um tanto temerosa em vêr Mulder nervoso com o fato.
Mulder bate a porta com força à saída de Kearns.
- Scully - ele começa - Skinner sempre dá asas a esse cara... nessas horas há sempre um sujeito desses para vir dar palpites ao "spooky" Mulder. Era com ele que você iria trabalhar outro dia...- conclui, amargo.
- Não fique lembrando bobagens, Mulder. - ela aproxima-se da mesa, dá uma arrumada nos papéis que estão espalhados, organizando-os, cuidadosamente.
- É... eu ia trabalhar com ele, mas em compensação eu não tive nenhum caso com esse homem, ao passo que você...
- Eu o que? - pergunta, espantado com a frase.
- Você ia trabalhar com aquela Detetive e tinha rolado um caso entre vocês...
Mulder mostra para Scully um largo sorriso.
- Aquilo foi um passado bem infeliz, Scully. Nem fale mais nisso.
Agora ele chega perto dela, apanhando o paletó de sobre a mesa.
Sussurra aos seus ouvidos:
- Não tenha mais ciúmes. Você é a única, Scully.
Aperta-a contra si.
Scully sorri.
Mulder veste o paletó e seu braço, inadvertidamente, encosta na grande pilha de pastas-arquivos sobre a escrivaninha.
Esta, desequilibrada, despenca ruidosamente no chão, esparramando-se.
Os dois contemplam o desastre acontecido.
Seus olhares atônitos em princípio, transformam-se, aos poucos em olhares zombeteiros e seus lábios começam a distender-se num sorriso, que, logo em seguida, transforma-se em boas risadas.
Abraçam-se ali mesmo, diante das pastas esparramadas no chão.
- Scully...?
- Han?
- Só amanhã vamos arrumar isto. O que acha?
- Só amanhã. - ela concorda.
Abraçados deixam o escritório, trancam a porta e saem.
Ali, no entanto, do lado de fora, afastam-se e como sempre o fizeram, sobem as escadas somente como dois colegas e amigos, para tomar o elevador.
X x x x x X
Mulder bate a porta do carro, para em seguida ligá-lo.
Lá adiante, já bem distante, já pode divisar o carro de Scully que dirige-se para casa, visto que ela pegara seu carro na garagem em local mais à distância do seu e saira em primeiro lugar.
Em sua mente não lembra de forma alguma ter falado a ela que iria vê-la depois, mais tarde.
Automaticamente consulta o relógio: 7:40hs.
A noite está fria e em seu pensamento sente que tem necessidade de estar junto dela numa noite como essa... e nas outras também.
Ela nada lhe insinuara, porem; nem uma palavra sequer, se iria esperá-lo ou não.
Essa dúvida martela a mente de Mulder.
Sente-se incomodado.
Tateia o bolso para sentir o celular.
" Devo chamá-la?" - pensa se deve ligar e perguntar alguma coisa sobre isso.
Mas não o faz. A dúvida sobrepuja todos os seus desejos. Continua a dirigir, vendo as luzes da rua desfazerem seus focos diante de sua vista cansada.
X x x x x X
Mulder joga as chaves e o celular no sofá.
Tira o paletó, camisa e os vai jogando pelo chão.
Sente necessidade de um benfazejo banho para adquirir forças e pensar com mais clareza.
É o que se predispõe a fazer agora.
X x x x x X
Scully entra no apartamento pensativa.
Gira a chave na fechadura para trancar a porta.
Sente que seus gestos estão desalentados, sem ânimo.
"É a falta dele!" Seu coração anuncia.
Vai para o quarto. Está escuro. Ela assim o deixar ficar.
Permanece de pé, por alguns minutos, olhos fechados, rememorando a cena da noite anterior.
"Foi tudo tão bom! Senti o seu amor, o seu calor, o seu corpo ansiando pelo meu!" - pensa.
Tira o blazer. A roupa toda em seguida e dirige-se para o banheiro.
Acende a luz. Coloca-se diante do espelho.
"Ele me tocou com aquelas mãos que adoro! Me possuiu toda pra ele! Eu o amo!"
Toca levemente em seu busto, sabendo que Mulder agora era o dono total de todo o seu corpo, toda a sua vida, até.
X x x x x X
Mulder está sentado, displicentemente, mordiscando uma a uma suas sementes favoritas.
Necessitaria agora estar com as pálpebras a cair sem forças, pelo sono e o enfado do dia.
Entretanto está com o olhos bem abertos; sente o corpo excitado. E o cansaço? E o sono que não vem!
Na TV a tela exibe imagens que passam aos seus olhos como flashes sem nenhum sentido.
Não vê e nem ouve nada do que ali aparece.
O tilintar do telefone o faz estremecer de susto.
Joga a mão por sobre o aparelho próximo de onde está, com os olhos fixos à tela da TV.
- Mulder. - ele fala, atendendo.
Porem o aparelho está mudo. Irritado, solta um muxôxo.
O chamado continua e, por fim, ele nota que é o celular que está tocando.
Pega-o para atender.
- Mulder, sou eu! - ouve, vindo uma voz do outro lado da linha.
- Scully... - pronuncia com voz suspirante e ansiosa.
- Mulder... queria saber...
- O que?
Ele percebe que ela vacila para responder.
- Scully...? - insiste para que ela fale.
- Mulder... é...
Ele não está mais com paciência de esperar:
- Scully... olhe... só responde sim ou não... eu vou entender... - anda a passos largos, nervoso, de um lado para outro.
- O que? - agora é ela quem pergunta.
- Posso ir pra aí?
- Mulder... vem! - sua voz diminui de intensidade e fala sussurrando - Estou te esperando!
- Vou já pra aí. - é só o que ele fala e desliga.
X x x x x X
Mulder dá uma rápida batidinha na porta. Logo gira a chave na fechadura.
Sente os dedos trêmulos de ansiedade.
Entra na sala e fecha a porta.
- Scully?
Ela aparece à porta do quarto.
Mulder solta um assobio de admiração
- Scully! Nunca a vi assim!
- Ah Mulder, pára! - demonstra sentir-se encabulada - É porque você nunca havia me visto um pouco mais à vontade.
Scully usa um traje completamente informal, porem sem nada notadamente diferente.
Apenas Mulder a está vendo de um outro modo agora, e isto a faz tornar-se mais bela diante de seus olhos.
Mulder nem se atreve a abraça-la de imediato. Aguarda.
Scully chega até ele. Toma seu rosto entre as mãos. Beija-o suavemente nos lábios.
- Olha o que preparei para você. - ela mostra a mesa.
- O que! - surpreende-se - Eu não vim para...
Scully ri, achando engraçada a atitude dele:
- Eu sei que não, Mulder! Mas o convido para jantar!
Ela o fita, com as mãos na cintura, sorridente.
X x x x x X
Sentados no sofá, dão uma lida no jornal do dia. Estão sentados bem juntinhos.
Mulder passa o braço por sobre os ombros de Scully.
Ela deixa-se puxar para mais perto.
- Gosto desse seu perfume, Scully. - diz, aspirando-lhe a nuca.
- Eu só o coloco em ocasiões especiais. - sorri, brejeiramente.
- Só em ocasiões...? Mas eu sempre o sinto em você...!
- Pra mim, estar com você é sempre uma ocasião especial, Mulder.
Ele aconchega-a mais para si:
- Especial é sempre você, lindinha!
Os dois falam bem baixinho, juntinhos; ele ainda segura seus ombros, apertando-os ternamente contra os seus.
- Mulder... o que você quer fazer?
- O que?
- É. O que? Responda!
- Você sabe.
- Sei?
- Sabe, Scully. - fala, murmurando, olhando-a bem nos olhos, apertando seus olhos verdes.
Segura-lhe a mão.
Scully segura as mãos de Mulder, por sua vez.
- Bom... e o que pretende fazer amanhã, então?
- Amanhã! - estende as pernas para a frente - Sem ser FBI, FBI, FBI, trabalho, trabalho... não sei! - faz uma pausa; olha somente para o jornal em seu colo, agora - Scully ... ahn... é...
Ela o fita, levantando as sobrancelhas, estranhando a hesitante pergunta dele.
- Scully... nós vamos dormir juntos? - ele joga as palavras rapidamente, fixando nela o olhar esquadrinhador e carente.
Scully assente, fitando-o, intensamente.
- Hoje...? - ele quer saber.
- Sim.
- E em outros dias também?
- Você é quem decide, Mulder.
- Eu quero, Scully... e você?
- Também
Ele abraça-a, carinhoso.
Toma-lhe as mãos e conserva-as bem juntinho de seu corpo.
- Você tem certeza? - murmura aos ouvidos dela.
Um frêmito de prazer corre pelas fibras do corpo de Scully ao sentir o roçar dos lábios dele em seus ouvidos.
Sente a ansiedade que emana dele, pelo ruído da respiração ofegante que penetra até o âmago do seu ser.
A boca sensual de Mulder que ela tanto adora, continua a deixa-la em êxtase.
- Mulder? - sussurra.
- O que? - faz uma pausa nas carícias.
- Não dá mais pra viver sem você.
- Só agora você pensa assim?
- Não; e você?
- Desde há vinte minutos atrás.
Scully sorri com os gracejos de Mulder.
Deixa-se mais acariciar.
Scully decide parar de fingir que está descontraida. Suas emoções estão à flor da pele. Apenas não tem a coragem de iniciar algum gesto de sedução para o homem que tanto ama.
Encosta a cabeça no ombro de Mulder. Suspira profundamente.
Sente-se em paz e feliz por estar ao lado dele.
Mulder sente o calor dela em seu ombro.
Volta a cabeça para beijá-la levemente na face.
Beija-a em seguida sob os lábios, no queixo; apenas uma suave carícia. Não quer força-la se não desejar corresponder ao seu gesto de intenso amor.
Aos pouquinhos, porem, chega até seus lábios.
Mulder coloca a boca sobre a de Scully, com timidez.
Ela corresponde àquele ato de amor.
Logo aquela ternura transforma-se em volúpia e paixão.
Apartam-se finalmente.
- Você acaba de me atiçar, Scully! - ele murmura, afogueado.
- Eu nem notei! - ela responde, levando a mão dele até o generoso decote de sua blusa.
Em seguida levanta-se, segurando-o pela mão.
- Vem. - sussurra.
- Espera! - ele diz.
Num gesto inesperado toma-a nos braços e carrega-a para o quarto.
- Não estamos em lua-de-mel?
- Prometo ter muito mais mel ainda pra te dar... o melhor de mim... !
- Huuuuum... isso é bom! - murmura aos ouvidos dela.
Entram no quarto.
Mulder, com um pé bate a porta para fechá-la atrás deles.
"A vida é uma flor de que
o amor é o mel."
Victor Hugo
