AUDÁCIA

"A audácia leva os homens

ao céu ou ao inferno."

de Colofón

Capítulo 21

Mulder olha o relógio no pulso: 01:35 horas.

"E o Skinner me disse que a conversa era rápida. - pensa - Agora nem vou mais ao quarto de Scully. Ela já deve estar dormindo há bastante tempo."

Sente aborrecido por não poder vê-la novamente, mas terá que ser assim sempre, e conformar-se, já que suas vidas são quase que completamente tomadas pelos casos do Bureau.

X x x x x X

Scully abre os olhos e vê que o dia lá fora não clareara o bastante. Nuvens esparsas escurecem o céu.

"Cedo ainda, demais!" - pensa Scully.

Porem não consegue mais permanecer na cama; sente-se impaciente para iniciar as investigações que tem a fazer. E quanto antes, melhor.

Arruma-se e, como sempre, com um traje bem formal, como deve ser o de uma Agente Federal.

Deixa o quarto para dirigir-se ao salão de refeições.

Está, na verdade, ansiosa por um bom e quente café.

Lá já pode avistar Mulder e Skinner, sentados, aguardando algo, enquanto ela aproxima-se.

- Bom dia. - diz ela, cumprimentando os dois.

- Bom dia, Scully! - retribui Mulder, levantando-se e ajudando-a a puxar uma cadeira para sentar-se.

- Bom dia, Agente Scully. - responde Skinner.

Neste momento é servida a refeição da manhã.

- Vamos sair logo depois, Agentes. - informa Skinner.

X x x x x X

Após passarem o dia atrás de pistas do desaparecimento de Bruce Donat, chegam ao local de sua residência quase ao entardecer.

Descem do carro os três Agentes.

O local, um tanto lúgubre, os inspira a pensar em seres fantasmagóricos.

Mulder bate à porta; espera por alguns segundos sair uma mulher que, assusta-se ao vê-los.

- Agentes do FBI, senhora. - anuncia, enquanto apresenta à idosa mulher sua insígnia, gesto esse acompanhado por Skinner e Scully.

A mulher parece, além de apavorada, também insatisfeita pelos inesperados visitantes.

- O que foi que aconteceu? - ela quer saber.

- Precisamos de informações sobre o desaparecimento de seu neto Bruce. - inicia Mulder.

- O desaparecimento...? - ela demonstra surpresa.

- Podemos entrar para tomar informações, senhora? - indaga Scully.

- Bem... podem sim... por favor. - faz um gesto para que entrem.

A sala onde penetram os três Agentes tem um desagradável odor de mofo. Seu aspecto lúgubre causa mal-estar em Scully, que olha de soslaio para Mulder.

- Senhora Donat, eu preciso falar com o Troy. - explica Skinner.

- Ah, o Troy...? Ele... ele... ele se foi. - diz, evasivamente.

- Se foi pra onde? - quer saber Skinner.

- Bem, ele deixou a mim e à sua filha... - abaixa a voz em tom confidente - ... não quis mais saber de nós.

Skinner a olha, sem acreditar.

Scully aproxima-se de Mulder, murmurando-lhe:

- Ela parece não estar com a mente muito sã.

- Já notei, Scully. - diz Mulder; aproxima-se da mulher - E a filha dele, senhora Donat? Ela está em casa?

- Não... não... ela não está.

Skinner afasta-se da mulher para achegar-se até Scully.

- Eu falei com o senhor Troy, ainda anteontem.

- É ele o seu amigo?

- Sim. E não me falou nada sobre essa decisão de deixar a família.

Scully levanta uma sobrancelha, franzindo os lábios.

Mulder coloca as duas mãos em concha sobre a boca e alisa o lugar onde seria o bigode.

- Esta mulher está mentindo, Scully. - comenta.

- Senhora Donat, obrigado por nos receber. - fala Skinner.

Os três preparam-se para deixar a casa.

Ainda nem está perto da noite e a casa encontra-se em quase completa escuridão devido às grossas cortinas cerradas nas janelas.

Do lado de fora podem observar a grama totalmente ressecada e um velho poste que mantém uma pouca iluminação, próximo à porta de entrada.

Scully olha duas vezes para ter a certeza de que vira alguém em um outro compartimento da casa puxando um pouco a cortina, com certeza para observá-los.

- Que bom sair dessa casa, Mulder! - comenta Scully - Na verdade é meio esquisita.

- Aliás, são os moradores que a fazem ser assim! - rebate Mulder.

Tomam o carro para sairem dali.

X x x x x X

Mulder distrai-se vendo os transeuntes caminhando apressados sobre a calçada.

- Fox!

Mulder volta-se para olhar quem o chama assim.

- Ah, você!

- Oh, nem finge ser amável em me ver, Fox!

Mulder sorri.

- Desculpe. Pegou-me de surpresa.

- Podemos conversar?

- Sobre o que?

- A minha admiração por você é um dos assuntos.

Mulder passa a mão pelos cabelos.

Tivera um dia preocupante, cansativo, cheio de um trabalho insolúvel e não está muito disposto a ficar com alguém, ali, jogando conversa fora.

Encontram-se neste momento numa espécie de galeria em um prédio antigo, onde as poucas lojas que existem já haviam cerrado suas portas.

Mulder continua aguardando a chegada de Scully, que viria no carro encontrá-lo ali.

- Betsy... não podia deixar pra outro dia essa conversa?

- Entendo... - ela fita-o com interesse - ... isso não lhe agrada, não é?

- Não, não é isso... é que...

- Ah, Fox, não seja mauzinho! Apenas satisfaça as curiosidades de uma admiradora.

Mulder diverte-se com a frase, mostrando seu belo sorriso.

- Estou me sentindo um artista, Betsy!

Ela faz um gesto insinuante para chamar a atenção dele para seu belo corpo.

O carro de Scully acaba de aproximar-se do meio-fio da calçada.

Mulder sai da galeria para encontrá-la.

Betsy o vê aproximar-se de sua parceira. O seu olhar é de pura inveja, ciúme, maldade.

Scully o chama para entrar no carro:

- Venha, Mulder!

- Espere, Agente Dana! - exclama Betsy - Por favor, venha até aqui!

Ela leva a mão à testa, cambaleando, ao dar uns poucos passos.

Mulder ampara-a, impedindo-a de cair.

Scully sai do carro e aproxima-se:

- O que aconteceu com você? - pergunta à moça.

- Não sei... eu não estou me sentindo bem.

- Quer que a levemos a um hospital? - pergunta Mulder.

- Não... não...! - dirige-se a Scully - Agente Dana, pode ir comigo ao banheiro? - pergunta com respiração ofegante.

- Claro! Onde fica o banheiro aqui?

Scully observa que, na comprida galeria quase escura, somente consegue ver as portas fechadas das lojas.

- Venha comigo! Sei que é médica, pode ajudar. - pede, puxando-a pela mão.

Dana dirige o olhar para Mulder, como que pedindo sua opinião.

Ele segura-a por um braço:

- Vá com ela, Scully. Eu espero aqui.

As duas caminham em direção ao final da escurecida galeria.

- O que você está sentindo? - pergunta Scully.

- Uma horrível tonteira... vejo tudo rodando... estou enjoada...

Ao chegarem bem no fundo da longa galeria, Dana volta a olhar para a saída e somente consegue ver o vulto de Mulder contra a claridade que vem dos postes da rua.

Betsy abre uma porta estreita e entra. Mántém a porta aberta.

- Venha, também, por favor! - a moça pede, com semblante de sofrimento.

- Eu aguardo você aqui mesmo.

- Não! Por favor, me atenda! - ela está com as mãos na cabeça.

Scully observa suas longas unhas pintadas de um vermelho brilhante. O corpo aparece, modelado em toda sua forma, através do justo vestido que usa.

Entra , então, no pequeno e desconfortante compartimento.

Betsy está apoiada no lavatório, dobrada sobre o estômago, arfante.

Scully aproxima-se mais da moça, colocando a mão sobre sua testa, pretendendo examiná-la.

- Espere! - Betsy diz e afasta-se de Dana.

Num gesto muito rápido encaminha-se para a saída do banheiro, trancando a porta a seguir, pelo lado de fora.

Em rápidos segundos Scully percebe que havia caído numa cilada da diabólica criatura.

Bate na porta, enraivecida.

- Abre isso aqui! - grita.

Betsy corre através da galeria, aproximando-se da saída.

Mulder aguarda sua chegada, mas não vendo Scully, pergunta:

- Onde está Scully?

- Ela vem já, Fox. Vem já. - informa Betsy.

Olha-o com deslavado interesse, mirando-o de alto a baixo.

- Você, por alguns minutos está em minhas mãos, Agente Mulder! Este é o prazer que eu tenho de realizar o que quero, agora!

- E o que você quer? - ele a olha, confuso.

- Um beijo. É . Só um beijo!

Mulder ri e joga a cabeça para o lado, pela impetuosidade e audácia da estranha criatura que, neste momento atira-se entre seus braços.

- Contenha-se, Betsy! - ele pede, sem abraçá-la.

- Só um beijo, Fox! Só um! Mata esse meu desejo e eu quero realizá-lo agora!

- Você não deve estar bem mesmo, Betsy! - diz ele, segurando-lhe os pulsos, para tentar afastá-la dele.

- Fox, por que não me beija?

Um tiro ecoa, vindo do fundo da galeria.

Mulder corre para a direção de onde viera o tiro.

Betty, adivinhando já o que acontecera, afasta-se, correndo pela calçada, desaparecendo logo do local.

Mulder chega até o final da galeria, quando, então, vê Scully com a arma na mão.

Ela acabara de estourar a fechadura da porta com um tiro.

- Scully! - grita Mulder, chegando onde ela está.

- Onde está aquela...? - Scully reclama, cheia de raiva.

- Desapareceu, Scully. É uma louca!

Scully sacode da roupa os frangalhos de farpa da madeira que despedaçara-se com o tiro.

- O que ela queria, Mulder? Essa... essa...?

- É perturbada da cabeça, Scully; só pode ser!

Scully o fita, interrogativamente:

- Você não me diz! - protesta.

- Vamos embora. - fala ele, puxando-a para sairem.

Caminham pela galeria para chegar até a calçada.

Entram no carro.

- Mas afinal de contas, Mulder, será que você não vai dizer o que quero saber?

- O que você quer saber?

Dana faz um gesto impaciente. Ele está fingindo que não entende sua curiosidade sobre a mulher. Resolve calar-se. Não vai mais perguntar nada, decide, então.

Mulder dirige calado.

Olha de soslaio para Scully e a nota fria.

- Scully...?

Ela o olha, somente.

- Não gosto de ver você assim.

Dana mantém-se calada, fixando seu olhar para as pessoas que passam na rua.

- Scully... aquela mulher é louca, completamente louca!

- Mas é bonita! - retruca ela - E tem muita audácia!

Mulder faz um gesto em que demonstra concordar.

- E você está querendo insinuar o que?

- Bem... precisamente eu não sei... mas é óbvio que ela está totalmente apaixonada por você.

Mulder dá uma risada; tenta disfarçar a tensão:

- Scully, você é uma ótima palpiteira!

Ela lança-lhe um olhar de reprovação.

- Você sabe que aquela idiota me trancou no banheiro para poder estar a sós com você! - fala mais alto, irritada.

- Scully! - agora Mulder está surpreso - Eu pensei que tivesse enguiçado a fechadura! Juro!

- O que ela queria, Mulder?

Ele pára o carro num sinal vermelho. Volta-se para Scully, com meio sorriso nos lábios.

- Que eu a beijasse.

Os grandes olhos de Scully arregalam-se de espanto, porem nada comenta. De sua garganta sai o som de uma risada que vai desmontando, gradativamente até transformar-se num gemido.

Sofre, sente isso. Teria sido preferivel nada perguntar; querer saber detalhes para que? Para padecer esse horrível ciúme?

Mulder estaciona o carro junto ao hotel em que estão hospedados.

- Scully? - procura olhá-la nos olhos.

Ela esforça-se para recuperar-se e pergunta, fingindo indiferença:

- E você?

- Eu o que?

Dana apenas olha para a frente, através do parabrisa do carro.

Suspira fundo.

- Scully... eu não a beijei.

Ela dá de ombros:

- Isso é um problema seu, Mulder! - segura a maçaneta da porta - Até amanhã.

- Espera aí! Calma! Vou com você.

- Não, Mulder, eu vou para o meu quarto.

- E eu a acompanho.

Scully não recusa. Caminha somente.

Mulder acompanha seus passos.

Entram no hotel e dirigem-se à ala do quarto de Scully.

Ela abre a porta.

- Mulder, é melhor não.

- Por que não? Sempre estamos no apartamento um do outro quantas horas precisamos, por que hoje não podemos?

- Por causa de Skinner, você sabe.

- Ah, Skinner...! - faz um gesto de desprezo com a mão.

Entram.

Mulder joga numa cadeira o casaco. Segue os passos de Dana.

- É verdade o que eu disse, Scully. Aquela mulher é uma psicopata!

Scully está retirando o casaco, calmamente.

Mulder alcança-a e a toma nos braços.

- Scully... não fique assim comigo!

Ele procura-lhe os lábios. Sente desejos de beijá-la neste instante.

- Espera, Mulder...

Ela quase nem resiste àqueles braços que a apertam e àquela boca que adora e deseja tanto.

Tenta desvencilhar-se fracamente dos braços dele que a seguram firmemente.

Sente-se vencida, sente-se atraida, sente-se sem forças, sente-se exangue e não mais quer permanecer fingindo não desejar ardentemente o beijo dele.

Abre os lábios e o deixa tocar sua boca com a veemência de um homem apaixonado.

Finalmente separam-se.

Ele continua abraçando-a, com calor.

- Tudo bem? - indaga, falando com a boca sobre seus cabelos.

Como resposta ela somente agarra-se a seu peito mais fortemente.

Batem à porta.

Mulder suspira. Solta Scully.

Ela vai atender.

Skinner está diante dela. Ajeita o óculos para observá-la.

Vê Mulder em pé mais adiante.

- Está aqui, Agente Mulder?

- Sim, senhor. É... eu e a Scully falávamos sobre o caso do Troy Donat.

- Posso sentar? - fala o Diretor Assistente.

- Por favor. - diz Scully, mostrando-lhe o lugar.

Mulder dirige a Scully um olhar de compreensão, entendendo que, mediante a presença de Skinner ali, oportunidade nenhuma teriam para conversarem entre si.

X x x x x X

No dia seguinte, Mulder e Scully haviam resolvido voltar à casa de Donat, a fim de prosseguirem na investigação.

Mulder bate à porta de entrada.

- Senhora Donat! - chama.

Continuam aguardando, pacientemente, parados ali.

Ninguém vem abrir a porta.

Mulder retira do bolso o seu molho de chaves para fazer girar uma na fechadura. Experimenta algumas.

Finalmente consegue abrir a porta.

Empunham suas armas, atentos.

Mulder abre a porta, num ímpeto, porem sem fazer ruídos.

Entram na casa escura.

Caminham cuidadosamente pelo ambiente, focando suas lanternas sobre tudo por ali.

Num móvel baixo vários porta-retratos estão à mostra.

Numa alta estante muitos livros bem envelhecidos, estátuas expostas, assim como alguns objetos de louça e vidro espalhados pelas prateleiras.

Antigos aparelhos de rádio e TV estão colocados nela.

Scully, por curiosidade, retorna ao móvel onde vira os porta-retratos.

Seus olhos fixam-se numa foto ali colocada.

- Mulder! - chama ela - Olhe isto.

Ele aproxima-se para ver o que Scully lhe quer mostrar. Focaliza o porta-retrato.

- É Betsy, Scully. Ela é a neta da senhora Donat!

Scully assente.

- Eis como soube que eu viria para esta cidade. - conclui ele.

Scully, afastando-se de Mulder, continua em sua busca por algo que esclareça melhor os fatos.

No outro compartimento escuro da casa, ela continua caminhando, cautelosamente. Passa para um outro quarto.

Num rápido movimento, após ouvir um ruído às suas costas, mira a pistola para essa direção, quando, então, uma grande dor toma conta de sua cabeça.

Um forte impacto sentira, deixando-a atordoada. Tudo à sua volta desaparece num imenso entorpecimento de profunda escuridão.

X x x x x X

- Muito bem, Fox! Mais uma vez estamos juntos, não é?

Betsy o olha, insinuante e hostil ao mesmo tempo.

A arma de Scully mirando a sua própria cabeça. O cano da arma está encostado em sua fronte.

- Eu disparo, se você não fizer o que eu quero, Fox.

Mulder olha para a infeliz e astuta mulher.

- Você depende desse tipo de atos para viver, Betsy?

- O que quer dizer?

- Você já tentou um tratamento?

- O que você quer dizer? - grita agora, como alucinada.

Mulder espalma a mão esquerda, enquanto a direita ainda empunha a arma.

- Betsy, calma! Você está doente! Na verdade, você não quer fazer isso...

Ela começa a chorar. Seu rosto contrai-se, demonstrando amargura.

- É tão pouco o que te peço, Fox! Só quero ficar um pouco com você...!

- Betsy, você nem me conhece! Você precisa amar alguém, dedicar-se a uma pessoa...

- Pára! Pára! - ela leva a outra mão à cabeça, angustiada; chora ainda - Ela ama você, não é? E você a ama! - soluça mais - Vocês transam?

Mulder sacode a cabeça, inquieto, para dizer:

- Betsy... você é uma garota bonita, pode ter tanta oportunidade ainda ... tem o horizonte pela frente... por que faz isso? Por que alimenta essa idéia na cabeça?

- É uma idéia errada se achar que está apaixonada por alguém? - diz ela, com voz queixosa.

- Quando esse alguém pode, no mínimo, estar sempre próximo a nós.

- Filosofia, Fox, filosofia... hipóteses... sei lá... na vida prática não é nada disso! - fala alto, nervosa.

Betsy dá pequenas, mas firmes batidas na própria cabeça com o cano da arma; o rosto contrai-se de dor.

Mulder olha penalizado a constrangedora cena, mas em seu interior somente importa-se com Scully.

- Scully! - chama - Scully! - volta-se para a moça - Onde ela está?

Betsy apenas aperta a mão contra a cabeça com o semblante contraido pela dor. Não responde.

Mulder faz menção de sair do lugar para dirigir-se ao interior da casa.

- Fique aí! - grita Betsy, com furor no olhar, agora apontando a arma em direção de Mulder.

Ele pára seus passos.

- Você tem que largar essa arma, Betsy, para o seu próprio bem.

Rapidamente ela coloca o cano da arma novamente sua própria cabeça.

Mulder abaixa a pistola que está em sua mão.

- Ei, olha aqui, você é uma garota bonita, jovem, esperta... por que fazer bobagens?

- É só você se aproximar de mim, Fox... só isso e eu não faço mais nada!

- O que você fez com a Scully?

- Por que você só quer saber isso? - grita - Olhe pra mim... Fox... eu estou bem aqui... eu só quero você... só isso...!

- Betsy...?

- Han? - ela geme, ainda com o cano da arma encostado à fronte e os olhos fechando-se, apertadamente.

- O que você fez com ela? - insiste.

- Pára com isso! - ela grita, enfurecida e chorando ao mesmo tempo.

- Olha Betsy, você pode até matar-se como está planejando... mas porque isso é, simplesmente, um desejo seu... uma psicose... quer libertar-se de algo que a maltrata, não por causa de um amor que não é correspondido... e eu não vou fazer nada para impedi-la, Betsy, porque eu quero saber somente se a Scully está bem...

Betsy chora, e com a mão trêmula, ainda, segura a arma na mesma posição e mantém os olhos fechados.

- Eu vou deixar você com essa arma aí, Betsy, e vou procurar Scully. Portanto, cuide-se!

Mulder, assim falando, vai afastando-se de costas, na direção do outro compartimento da casa.

Ao alcançar a porta, sai correndo, com a lanterna ligada, procurando por Scully, deixando Betsy na escuridão da casa.

Scully está ainda no mesmo lugar onde fôra atacada, caida ao chão; de sua testa corre um filete de sangue.

Mulder toma-a nos braços, ansioso e preocupado com o que possa ter acontecido com ela.

Logo à entrada daquele aposento, aparece Betsy, com a arma de Scully na mão, apontando em direção deles.

- Aí está! Lindo quadro! Muito apaixonante mesmo! Sua querida Scully em seus braços!

Scully movimenta a cabeça, enquanto geme.

Mulder, ajoelhado a seu lado, a retém em seus braços, ansioso. Repara que, ao seu lado, no chão, está uma barra de ferro que, certamente, fôra usada por Betsy para agredir Scully.

- Scully! Scully! - aperta-a de encontro ao seu peito.

O sangue da testa dela mancha o branco de sua camisa.

Betsy tateia a mão na parede para ligar o interruptor da luz e acendê-la em seguida.

Com as duas mãos, continua segurando a arma no direção dos Agentes. O seu olhar é de fúria.

Um tiro ressoa no ambiente.

Ela havia disparado a arma.

Para sorte de Mulder e Scully a má pontaria da moça os salvara da morte, naturalmente.

Neste momento Scully abre, enfim, os olhos enquanto Mulder, atento aos gestos de Betsy, notara sua disposição para disparar mais uma vez.

Num gesto rápido, ele impede essa reação de Betsy com um certeiro tiro em seus dedos, que feridos, deixam cair a arma no chão.

Betsy grita de dor.

Mulder larga Scully rápida, mas cuidadosamente, recostando-a na parede, para pegar a arma que havia caído no solo, das mãos de Betsy.

Tira do bolso o par de algemas e prende-as aos pulsos da moça, cuja mão sangra abundantemente.

Liga um número no celular para chamar a Polícia local.

Sabe que Betsy deve ser interrogada e isso ficaria por conta da justiça da cidade, decide.

Em seguida entra em contato com Skinner.

Avisa-o de que seu amigo Troy é pai da desmiolada Betsy. E o desaparecido irmão dela é fato para ser resolvido por trâmites comuns da Polícia e não é um Arquivo-X.

Neste momento em sua mente somente tem esclarecimento da verdade pura e simples: a inclusão dos dois Agentes no caso havia sido apenas uma concessão de Skinner para ajudar o amigo.

Scully tenta falar:

- Mulder... - balbucia.

Ele aproxima-se e toma-a nos braços, novamente:

- Como você está?

- Tonta... muita dor... - queixa-se ela.

Betsy os observa, com furor no seu semblante.

Nos olhos de Mulder e Scully porem há a troca inflamada do amor incontido entre eles.

Ele aperta-a contra seu peito.

Mulder, com todo carinho, toma Scully nos braços, carregando-a para fora da casa, enquanto ainda está apertando-a contra seu peito com ardor, como se aquele acontecimento pudesse pô-lo em risco de perdê-la para sempre.

O semblante de Betsy é de fúria incontida.

Scully olha para ela, sentindo compaixão e ira ao mesmo tempo.

Mulder leva Scully para o carro e decide aguardar a chegada dos policiais para levarem Betsy.

Entra, em seguida, novamente na casa.

Betsy está ainda de pé, algemada, gemendo de dor, mas há ódio em seu olhar.

Os ouvidos de Mulder captam um gemido vindo do interior da casa.

- É sua avó, Betsy? Você a prendeu?

A moça não responde. Apenas dá de ombros, com ar de pouco caso.

Contrai as feições, novamente, cheia de dor.

Mulder antes de penetrar no interior da casa, pára perto de Betsy.

Algemada às colunas de uma cama, agora está de joelhos e gemendo.

Mulder ainda a fita por alguns segundos, mordendo o lábio inferior, vendo a a posição incômoda e humilhante daquela moça que sobrevive apenas de alimentar ilusões em seu coração.

"As ilusões são o pão de

cada dia dos infelizes."

Fabre