CAPíTULO 8

O jantar no nº 12 do Largo Grimmauld foi a coisa mais estranha que já vivi: comida diferente (Jorge me disse que era guisado de carne, mas não sei se posso acreditar no que ele e Fred dizem. Acharam engraçado demais ter na casa dos pais uma Trouxa de outro mundo), acompanhada de um delicioso suco de abóbora e, para sobremesa, tarte de mel com creme de leite, que eu comi desconfiada (apesar do magnífico sabor), temendo que elas tivessem sido enfeitiçadas pelos gêmeos, como em "Harry Potter e o Cálice de Fogo" e que eu terminasse o jantar coberta de asas de canário!

Felizmente, não tive que passar por tal humilhação. Pensando melhor, duvido que os gêmeos fossem capazes de fazer tal coisa debaixo dos narizes de Molly e Arthur. No entanto, é melhor prevenir do que remediar.

-Você está parecendo o Olho-Tonto. - Comentou Gui, perante o meu ar desconfiado, fazendo todo mundo rir e Fred dizer, em coro com Jorge, imitando aquilo que deveria ser a voz de Moody:

-Vigilância constante!

Ao mesmo tempo, Carlinhos apertava debaixo da mesa a mão de Ioio Granger, outra menina do fórum, apaixonada por ele e que, assim como eu, também tinha conseguido passagem para aquele mundo mágico. Pelo olhar que os dois trocaram, a impressão que eu tive foi que Ioio também havia passado os seus momentos de "vigilância constante".

Na manhã seguinte, levei um susto, ao me ver num lugar diferente do meu quarto. Levei alguns segundos a lembrar que estava no nº 12 do Largo Grimmauld e que nada daquilo havia sido um sonho... ou, se fosse, ainda estaria sonhando.

Olhei para o outro lado da cama. Lupin não estava lá. Já devia ser tarde, para ele já ter se levantado. Tinhamos ficado conversando até tarde da noite e não fora uma conversa nada agradável: ele tinha me explicado, finalmente, o que Molly deixara escapar:

-Dumbledore andou estudando o portal. - Disse ele. - Eu ainda não tinha te contado, porque só tive certeza absoluta ontem, antes de ir te buscar. A verdade é que o portal vai se fechar, assim que sair o livro 6. Você não vai mais poder entrar aqui de vez em quando. Se estiver aqui, quando sair o livro, vai ficar para sempre aqui, presa... e, como não vai ter mais nada no seu mundo para alimentar a nossa história, o meu mundo vai desaparecer... e nós com ele.

Eu já tinha percebido que deveria ser algo assim, mas me recusava a acreditar. Não poder ficar indo e vindo de um mundo para o outro?

-Porquê? - Inquiri, em desespero.

-É que Dumbledore descobriu que, afinal, os livros da Rowling têm influência, sim, já que foi ela quem primeiro criou o nosso universo. Ele é dela, entendeu? Os livros influenciam os leitores... e, se acontecer alguma coisa que contrarie o que eles imaginam, esse mundo imaginado por eles simplesmente deixa de existir.

-Como assim? - Insisti, teimando em não querer aceitar a explicação dele. Remus sabia que eu já tinha entendido tudo, mas continuou a explicar, com a maior das paciências:

-Bom, vou te dar um exemplo bem básico. Você me disse uma vez que achava um absurdo a ideia de muita gente que escreve fics em que Draco Malfoy vive uma história de amor proibido com Gina Weasley. Lembra do que eu respondi?

-Que não era absurdo, porque o que elas sonhavam, acontecia realmente, em outro universo paralelo. - Respondi, baixinho.

-Isso mesmo. - Lupin continuou, paciente. - Nesse mundo imaginário que elas criaram, Draco e Gina são um casal, sim. Só que Dumbledore descobriu, também, que certas coisas que acontecem nos livros destroem esse mundo imaginário. Por exemplo, se a Gina namorar o Harry, como você acha que vai acontecer, deixará de existir Draco/Gina como casal.

-Mas porquê? - Perguntei de novo, com lágrimas nos olhos, pois agora tinha certeza que sabia direitinho o que ele estava querendo dizer: se, nos livros, ele morresse ou ficasse com a Tonks, o mundo da minha imaginação desapareceria de vez.

-Por maior que seja o amor das pessoas que escrevem fics e sonham com esse mundo de fantasia, tem que ter alguém alimentando o sonho delas. - Pegou a minha mão e me olhou nos olhos - Mary, eu não duvido do seu amor, não tem nada a ver com isso. Só que até um amor verdadeiro precisa de alimento para sobreviver.

-Não! - Exclamei, desesperada. - O amor verdadeiro pode tudo! Eu estou disposta a lutar por você, Remus, contra tudo e contra todos! Eu passo o portal, eu posso ficar aqui para sempre, com você!

-Não! - Ele exclamou. - Isso não! Eu sou um lobisomem, não posso me dar ao luxo de Ter uma mulher sempre do meu lado. Em noite de lua cheia, você teria que voltar para o seu mundo... mas agora eu sei que isso é impossível.

-Eu não quero saber! - Exclamei, mas ele interrompeu, com a voz muito triste:

-Mesmo assim, é impossível. Se você vier para cá, não vai ter ninguém para escrever a nossa história e, como esse mundo é de fantasia, nós vamos deixar de existir, porque ninguém vai saber da nossa história. O meu mundo vai ser destruído, assim como todos aqueles que morarem nele. Inclusive você. Olha só: as fics que você escreve só fazem sentido quando alguém as lê e acredita que, de alguma forma, aquilo poderia acontecer. Um mundo imaginário só faz sentido quando tem mais de uma pessoa sonhando com ele. Quando alguma coisa nos livros torna absurda a história das fics (por exemplo, um namoro de Harry com Gina invalidaria o casal Draco/Gina), essas fics simplesmente deixam de ter força e esse mundo de fantasia termina. Lembra de "História Sem Fim"? Deixando de acreditar no mundo da fantasia, ele deixa de existir. E não é só você quem tem que acreditar...

-Mas e se a J. K. Rowling não escrever que você... morre ou... fica com a Tonks? - Interrompi, com uma réstea de esperança surgindo como uma luz no fundo do túnel do meu desespero. - O portal vai continuar aberto?

Ele esboçou um sorriso triste, baixou os olhos, e replicou baixinho:

-Isso era o que eu achava, até Dumbledore me contar que as coisas não são assim. É como eu te disse, o portal vai se fechar no dia 16 de Julho... Aconteça o que acontecer, ele vai se fechar... Porque muita coisa que você imaginou, com certeza não vai acontecer nos livros. Você é romântica e otimista demais e a J. K. Rowling já falou que o final da história vai ser negro.

-Então você acha que você... vai... morrer? - Não esperei a resposta. Chorando, me aninhei nos braços dele e adormeci assim, prometendo a mim mesma arrumar uma forma de fazer com que Remus e o mundo dele permanecessem existindo, vivos, para sempre... e prometendo também aproveitar cada minuto em que eu pudesse ficar com ele.