Cap. 2: Snuffles.
Na esquina do quarteirão que eu me encontrava, mancando da pata traseira, estava um lindo cachorro preto, era médio, nem muito grande nem muito pequeno, ele parecia perdido e confuso, estava meio magro e parecia cansado e nervoso, parecia ter corrido um grande pedaço de chão pra fugir de alguma coisa, provavelmente da coisa que machucou sua pata.
Não pude deixar de sentir pena do pobre bichinho, ele se aproximou de mim com cuidado, mas eu ainda era bem pequeno, até demais pra minha idade, minhas primas da mesma idade que eu era bem mais altas, por isso acho que não intimidei muito o cachorro, eu abaixei e afaguei a cabeça, ele pareceu se acalmar, não pude deixar de pensar que era um amiguinho pra mim, eu andei um pouco com ele pela rua e sentei em uma esquina, ele imitou meu gesto com um pouco de dificuldade pela pata machucada, ficamos lá um tempo, comigo brincando com ele, quando ouvi um grupo de meninos conversando ao longe, eles ainda não haviam aparecido no meu campo de visão, mas podia ouvi-los perfeitamente, falavam bem alto, e sobre um alguma coisa que havia fugido, eles estavam rindo bem alto, o cachorro na minha frente se ergueu de repente e ficou agitado, eu não entendi porque imediatamente, mas logo percebi.
Os garotos imitavam um som de um ganido de cachorro e riam, logo entendi que foram esses garotos que haviam machucado o pobre cão, eu tinha que tira-lo dali, não podiam vê-lo, eu era muito pequeno e os garotos tinham vozes grossas o que indicava que provavelmente eram bem maiores, eu não poderia enfrenta-los, era muito mais fácil correr, e foi o que eu fiz, mas o pobre cachorro estava muito machucado, não conseguia ir muito rápido, não conseguiria ir muito longe, e os garotos já apareciam no final da rua, mas eles ainda falavam alto não pareciam ter nos notado, quando de repente foram se calando, e eu logo percebi que eles tinha nos visto, logo começaram a falar mais alto ainda para que nós os ouvíssemos(como se não estivéssemos conseguindo antes).
- Ei! Vocês ai na frente, estão com pressa? –risadas- não precisam se preocupar, não vamos machucar vocês...
- Muito....- completou um outro moleque do grupo.
- Venham cá... ei pirralhinho! Esse cachorro é seu? Vem cá!
Comecei a correr com todas as forças mas o pobre cachorro não conseguia ter a mesma velocidade que eu, eu não sabia o que fazer. Mas isso logo veio a se resolver, comecei a ouvir passos rápidos atrás de mim, e logo os garotos nos alcançaram, apesar de ser pequeno eu fiz a melhor cara que eu consegui, tentei parecer bravo e corajoso, mas a única coisa que fiz foi provocar mais riso nos meninos.
- Saiam da minha frente! – Falei com força e raiva mas ainda sim nada aconteceu, então eu resolvi só andar e empurra-los, mas um dos meninos passou o pé na minha frente e eu cai de cara no chão, em seguida ele me levantou pela gola e começou a me balançar, eu não demostrei medo, não podia demonstrar, ele me jogou de costas no chão com força e colocou o pé em cima de mim de uma maneira que me imobilizou, e virou para o cachorro, finalmente demostrei medo, e os garotos perceberam.
- Esse cachorro é seu moleque?
- Sim! – Achei que se respondesse isso o cachorro seria poupado de qualquer coisa que quisessem fazer com ele, eu podia ser uma criança mas se o cachorro fosse meu teria um responsável por mim que não gostaria que o cachorro fosse machucado, não achariam que eu era um menino que rua, com certeza era a última coisa que eu parecia, minha mãe fazia questão de me vestir com o melhor, ilusão minha achar que isso me ajudaria.
- Olha só a ropinha dele toda engomadinha, deve ser um riquinho...
- Espera.. eu conheço o muleque.. é um Black...
- Há... mas que honra.. encontrar um membro dos Blacks... então, esse é o cachorro dos Black...
- O cachorro preto dos Black..- E começaram a rir com isso, como eu os achei patéticos.
- Bom.. vamos mandar uma lembrancinha pra sua família – O menino ergueu a mão e fechou o punho, eu fechei o olho esperando o soco, mas o que eu ouvi foi um rosnado alto e um grito de dor, quando abri os olhos vi o cachorro agarrado ao braço do menino com toda a força, mas um dos meninos chutou o pobre animal que soltou o braço do menino e soltou um ganido alto de dor, a única coisa que eu podia fazer no momento era gritar.
- Corra! Saia daqui! Corra pra longe! – O animal já ferido olhou para meu rosto como se resistisse a idéia, mas quando um outro garoto se aproximou dele ele seguiu meu conselho e saiu correndo o máximo que a sua perna deixava,um dos meninos fez menção de correr atrás dele mas eu resolvi agir. Bati com toda força que pude nas costas do joelho do garoto que me prendia, que amoleceu a perna me deixando forças pra levantar
- Peguem o pirralho! –Foi o que eu ouvi ele gritar, e é claro eles me pegaram fácil, e eu paguei pelo que fiz.
- Pirralho, você vai pagar pelo que fez – E a última coisa que eu fiz antes de fechar os olhos foi ver a cara furiosa do menino, e em seguida só senti uma dor forte no rosto, e depois do nariz, e em seguida no estômago, cai no chão sem forças e sem ar, achei que fosse desmaiar, mas não aconteceu, só fiquei lá com a mão no estômago sem forças pra levantar.
- Isso é pra você aprender muleque – E em seguida empunhou a varinha e apertou com força contra meu pescoço.
- Eu poderia ferrar você agora se eu quisesse garotinho, mas eu vou deixar você sair dessa por que não quero encrenca com a sua família!- Então ele se levantou e de despedida me deu mais um chute nas costelas que milagrosamente não quebraram.
- Vamos embora, e torça pra não encontrarmos seu cãozinho por ai!
Um pouco depois dos garotos saírem e desaparecer de vista o pobre cão apareceu de novo, eu me apoiei nele pra levantar, e não pude deixar de olhar zangado pra ele, mas ao ver que o cachorro parecia pior do que antes, e que tinha um corte perto da barriga me fez esquecer a raiva, eu só pensava que ele merecia cuidados, e eu ia dar.
Chegando em casa olhei pra dentro pra ver se tinha alguém a vista, se tivesse seria um problema, o cachorro não seria bem aceito em casa eu sabia disso, vendo que não tinha ninguém eu entrei com o cachorro atrás de mim, subi com cuidado as escadas e fui para o meu quarto, deixei o cachorro lá e fui procurar Kreacher para que ele pegasse o estojo de poções e curativos.
O achei na cozinha lavando a louça em cima de um banquinho de madeira, quando me ouviu chegando olhou pra traz com ar de reprovação, bom, minha aparência era engraçada, um olho roxo, um nariz sangrando e andando meio torto e mancando um pouco.
- Kreacher vá pegar o estojo de poções e curativos pra mim, rápido e não conte a ninguém que me viu assim entendeu?
- Sim senhor!
- Ótimo! Espero você no meu quarto!
Fui para o meu quarto esperar Kreacher, mas escondi o cachorro no armário, não confiava em Kreacher, ele adorava minha mãe, e podia muito bem acabar contando a ela.
Depois de uns 2 minutos Kreacher voltou e trouxe o estojo, olhou o quarto em volta como se procura-se algo errado.
- É tudo! Obrigada Kreacher!
- Disponha senhorsinho!
Quando tive certeza de que Kreacher já voltara a cozinha levantei e fui ao armário tirar o cachorro de lá, ele estava encolhido de cabeça baixa e parecia muito cansado, comecei a cuidar dele o mais depressa possível, como eu fiquei furioso aquele dia, minhas costelas estavam doendo, e meu olho latejava, e eu via o pobre cachorro cansado deitado em minha cama sem forças, eu jurei pra mim mesmo aquele dia que eu nunca meia deixaria nada desse tipo acontecer, nem comigo, nem com ninguém que eu gostava, se era assim que as pessoas agiam eu agiria assim também, quem se metesse em meu caminho pagaria.
Quando anoiteceu deixei o cachorro dormindo em minha cama e fechei a porta, desci as escadas para a cozinha para jantar, e contrabandear um pouco de comida para o cachorro, aliás, ele precisava de um nome eu pensei, decidiria isso depois, no meio do caminho tinha um espelho no qual me olhei, as poções eram ótimas, não só tratavam os machucados como os fazia sumir completamente, mamãe as tinha para usos imediatos, para que caso algum membro da família se machucasse não aparecesse com um olho roxo em publico por exemplo, tudo para manter a boa aparência.
Depois do jantar subi para meu quarto com grandes pedaços de carne enfiados nos bolsos do casaco, e um copo de água na mão, quando cheguei no quarto o pobre bichinho ainda estava dormindo, coloquei as carnes em cima de uma pequeno pote que tinha no quarto e coloquei o copo de água em cima do criado mudo, me deitei na cama também pronto pra cair no sono, finalmente eu teria companhia, alguém pra brincar, pra conversar, um animal que não me intenderia em nada, no entanto, eu achava muito mais interessante do que minha família, talvez, justamente por esse motivo.
De manhã eu decidi que a primeira coisa que eu faria era decidir um nome para o meu amigo, decidi por Snuffles, um nome diferente e original, coisa que só a mente de uma criança consegue pensar.
Não desci para o café nem para o almoço, eu tinha um amigo agora, e eu queria passar o dia inteiro brincando com ele, a tarde eu desci pra pegar um pouco de comida e desci para a cozinha, mal eu pus o pé na entrada ouvi um latido alto vindo do meu quarto, seguido de um choro de bebê, e um grito de minha mãe, subi as escadas correndo e encontrei a minha mãe na porta do meu quarto vermelha de raiva, entrei no quarto e fiquei na frente do cachorro, não deixaria que o machucassem de novo.
- O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO COM ESSE ANIMAL AQUI!
- Eu não tenho ninguém pra brincar! Por favor deixe eu ficar com ele! Eu cuido! Não deixo ele latir mais! Por fav...
- CALE A BOCA E DE JÁ UM FIM NESSE CACHORRO OU EU MESMO ME ENCARREGO DISSO ENTENDEU?!
Em seguida ela saiu rápido do quarto batendo a porta, provavelmente indo cuidar do meu irmão, e eu fiquei lá, chocado, apavorado, meu coração batia rápido e eu tinha a sensação de ter alguma coisa grossa e áspera na minha garganta.
Fiquei naquela posição ainda muito tempo, apoiado nos joelho abraçando forte Snuffles, até que eu levantei e me dirigi a porta, abri e esperei o cachorro me seguir, e assim ele fez, fui a rua e parei depois de andar muito, não queria que aqueles garotos encontrassem Snuffles.
Já estava bem longe de casa quando parei, ignorando as brincadeiras que o cachorro fazia a minha volta, dei tudo de mim pra não chorar, juntei forças e coragem pra fazer o que tinha que ser feito.
- Vá! – Estiquei a mão e apontei pra longe – Vá! Você não pode ficar aqui! Vá! Você não sabe o que eles podem fazer com você se ficar, vá! Vá pra longe! Vá embora!
O cachorro parou de brincar e me olhou serio, mas ficou ali, parado, me olhando, sem se mover um centímetro. Eu fiquei com raiva, eu estava triste, e com ódio, finalmente eu tinha um amigo, uma companhia, alguém pra brincar, mas eu não podia ficar com ele, o cachorro era esperto e podia se cuidar, se ele ficasse comigo acabaria morto por alguém da família, não suportaria se isso acontecesse, ele tinha que ir embora, pro bem dele.
Peguei uma pedra no chão e atirei perto dele! Eu vi seu olhar assustado, tentando entender o que estava acontecendo, ele olhou a pedra, e me olhou de novo, por um longo tempo, e então ele olhou pra longe, o caminho que teria que seguir, e finalmente se mexeu, mal ele deu dois passos se virou, e voltou, veio pra perto de mim e abaixou a cabeça como se pedisse um ultimo carinho, e assim eu fiz, abracei o cachorro com força, e minha vista se embaçou pelas lagrimas em meus olhos, soltei finalmente meu cachorrinho, e em seguida ele se virou e andou até a pedra ,a pedra que eu tinha atirado e a empurrou com o focinho na minha direção, olhou pra mim e finalmente saiu, andou pra bem longe, e eu fiquei lá, parado, olhando.
Quando ele já tinha atingido uma grande distancia parou novamente e olhou pra traz, então eu não pude aguentar, as lagrimas simplesmente caíram sem que eu pudesse controla-las, é cruel que uma criança passe por isso, é sujo e nojento. Eu me sentia perdido, só, e desamparado, sem saber o que fazer eu me abaixei e peguei a pedra, e não pude solta-la, pra mim era como se fosse o presente dele para mim, para que eu sempre me lembrasse dele, e é assim até hoje, eu guardei a pedra em uma pequena caixinha que eu tinha, decidi que ali, seria minha caixinha de segredos, onde eu guardaria tudo que significasse algo pra mim, depois, sentei me no chão do meu quarto, ao lado da minha cama, abracei os joelho e chorei, chorei como uma criança que eu era, uma criança só, e que sempre estaria assim, naquele momento, eu achei que seria só para sempre, e que para sempre seria incompreendido, nunca teria amigos, e sempre teria que aguentar aquela família, aquela família que pra mim, a partir daquele momento, nunca mais respeitaria.
