Nota: não, eu não sou dona dos personagens. Mas isso não me impede de amá-los...

DISCLAIMER: Todos os personagens da série "Sir Arthur Conan Doyle's The Lost World" são propriedade de John Landis, Telescene, Coote/Hayes, DirecTV, New Line Television, Space, Action Adventure Network, Goodman/Rosen Productions, e Richmel Productions (perdoem qualquer omissão).

Referências: HOTS

Agradecimentos especiais: para Si, que deu a idéia para a fic numa conversa inconsequente de MSN... E despertou meus sonhos, que ficaram se repetindo até eu me decidir a pedir a ela autorização para escrever a fic com o tema dela, mas usando minhas idéias e minhas fantasias. E ela não só autorizou, como aceitou ser a beta-reader, dando-me feedbacks valiosíssimos que contribuíram para o resultado final. Não preciso dizer que você mora no meu coração, né, Si querida? Obrigada, obrigada, obrigada!

Introdução: essa é mais uma versão para a continuação de HOTS, mas com um foco bem diferente das anteriores. O que vocês vão reconhecer é que o momento imediatamente posterior ao HOTS é comum nessa fic e na minha fic "Depois da Tempestade". Mas as semelhanças terminam aí... ;-)

Parte I – Vitória da Tempestade

Capítulo 1 – Retomando de "To be continued..."

Challenger está como que embriagado com o cheiro de clorofórmio da sala de cirurgia onde se encontra, o bisturi já absolutamente próximo à sua pele arrancando-lhe um gemido. A brancura das paredes e de tudo o que o cerca chega a cegá-lo tão intenso é o brilho que tem ao seu redor.

Roxton está correndo, com um pedaço de madeira nas mãos. Suas armas, agora sem munição depois de atirar em tantos conquistadores, já não lhe são úteis. Sabe que agora tem poucas chances, já que os conquistadores, mesmo com as armas antigas de um tiro, têm mais chances de vitória que ele, porque eles são muitos, e ele está sozinho. Sozinho. Seu coração se confrange por Marguerite – onde estará a mulher de sua vida? Mas ele se disciplina rapidamente. Sabe que não pode pensar nela agora. Precisará de toda sua concentração. Apenas tem certeza de dirigir um último olhar para aquela face que está gravada a fogo dentro de seu peito, e tomar coragem na profundidade daqueles olhos cinzentos que o encantam e em que ele sempre se perde. Agora ele é um guerreiro. E avança para os conquistadores, disposto a lutar.

Finn, em 2033, vê um carro aproximar-se a cada vez maior velocidade. Ela se levanta e corre. Precisa encontrar a onda novamente, precisa escapar da Nova Amazônia. Precisa voltar e ajudar Verônica, e ajudar seus amigos. Ela não sabe como pode conseguir ajudá-los, mas sente que precisa voltar. O platô de 111 anos atrás é onde ela se sente em casa agora. Mas por algum motivo ela continua na Nova Amazônia, e apesar dela estar correndo desesperadamente, o carro se aproxima cada vez mais dela na planície aberta onde estão – ela precisa encontrar algum lugar com árvores ou pedras que ofereçam obstáculo ao carro para ganhar alguma vantagem sobre seus perseguidores.

Marguerite vê o punhal erguido nas mãos do druida, sobre sua cabeça. Está deitada sobre o altar, assustada, pois sabe o que acontece em seguida. Afinal, há muito pouco tempo atrás ela encontrou seu próprio corpo nessa mesma caverna. Mas como? Mais uma vez ela maldiz o platô, mas volta atrás. Foi o platô que lhe deu uma família, finalmente: Challenger, Verônica, Summerlee, Ned, Finn. E foi o platô que lhe deu Roxton. Ela continua lutando inutilmente contra as mãos poderosas que a prendem ao altar, com força renovada pela imagem de Roxton que têm gravada em sua mente e em seu coração. Ela precisa lutar. Precisa ter uma boa idéia. Precisa escapar. Ou pelo menos vai morrer lutando. Não vai desistir como quase fez na última vez em que esteve nessa caverna. Não vai dar a ele motivos para achar que ela prezaria tão pouco a vida. Mas o punhal se aproxima inexoravelmente de seu peito, e ela já pode sentir o frio da lâmina, como já sente há muito o frio da pedra contra a qual está deitada. E numa última tentativa desesperada, ela grita e se debate, tentando ainda se livrar das mãos que a aprisionam.

Verônica está de pé, no centro da sala, no centro da Casa da Árvore, no centro do platô. Uma pirâmide de luz a cerca e enche tudo de uma luz estranha. Acima dela, as nuvens de tempestade arrastadas pelo vento formam um enorme redemoinho. A natureza reproduz em larga escala o que o Trion que ela segura em suas mãos representa. Ela chama pela mãe, pedindo ajuda. Ela é uma Protetora, mas não sabe como efetivamente agir para proteger o platô. Pressente que o maelstrom da natureza a seu redor é provavelmente um sinal de que ela não está fazendo a coisa certa, ou pelo menos não está fazendo tudo como deveria, para salvar o lugar onde nasceu e cresceu, o lugar que é seu lar.

'Mãe, eu sou mesmo a protetora?' ela repete, já não se lembra se pela segunda ou terceira vez.

E então, como se soubesse o que fazer, ela põe o Trion em sua testa, olhando para a cima, e o vórtice de luz e de tempestade se estreita, de forma a concentrar-se inteiramente naquele ponto onde ela posicionou o Trion. Luz e sombras se mesclam de forma alucinada e ao mesmo tempo deslumbrante. Mas não há testemunhas para esse espetáculo, exceto os olhos baços de Verônica, que observam hipnotizados o cone acima de sua cabeça. Como um único raio, as forças se concentram e a atingem. A tempestade desaparece. O cone de luz, também. Resta apenas Verônica, jazendo inerte no chão de tábuas da Casa da Árvore.

Challenger fechara os olhos no último segundo. Mesmo ele, o brilhante cientista, não suportaria ver a mão abjeta do andróide executar o corte preciso que acabaria com sua vida. Mas passa-se um instante, e nada acontece. Ele torna a abrir os olhos, mas as salas de brancura e brilho imaculados sumiram, e ele está deitado no chão coberto de folhas do platô. O céu que se mostra acima da copa das árvores que o cobrem parece agora estar totalmente limpo, como se a tempestade que estivera se aproximando e se formando desde aquela manhã não fosse nada além de um sonho ruim. Ainda trêmulo, sentou-se, mas definitivamente não havia nada a seu redor que representasse perigo imediato. Junto a si, percebeu a corda que usava presa ao redor do corpo quando saiu da Casa da Árvore. E sabe que é para lá que tem que voltar se quiser entender o que aconteceu.

Um grito alucinado de guerra, como devem ter feito seus ancestrais mais primitivos, escapa da garganta de Roxton, que fecha os olhos diante da força instintiva desse desabafo. E quando ele os abre novamente, seu corpo distendido pronto para partir para o ataque, se surpreende vendo-se sozinho no platô. Não crê que seu grito tenha espantado os espanhóis. Olha, desconfiado, a seu redor, e vê que não há marcas da presença deles... O que quer que tenha sido aquele plano de realidade onde ele tinha lutado, desapareceu misteriosamente. Ele está apenas cercado da natureza exuberante do platô. Sopra uma brisa suave, e não há o mais leve sinal da tempestade que os ameaçara mais cedo. Onde estará Marguerite? É só nisso que ele consegue pensar nesse momento, e é em busca dela que ele parte.

Finn corre o mais que suas pernas agüentam, mas subitamente ela nota uma diferença: não houve mais o ronco estrondoso do motor do carro, ao qual já havia se desacostumado no platô. Olha, descrente, para trás, sem parar de correr, e percebe que não está mais nos largos descampados devastados da Nova Amazônia, mas sim cercada pelas árvores que começavam a se tornar suas conhecidas no mundo perdido. Estava de volta. Não sabia como, mas estava de volta. Ao tempo de seus amigos. Verônica! E Challenger! Precisava voltar para a Casa da Árvore para encontrá-los!

Marguerite grita e se debate, e de repente percebe que funcionou – seus braços e pernas estão livres. Ela abre os olhos para rolar de lado, de forma a escapar o mais rápido possível da lâmina do punhal que já quase tocava seu peito. Mas agora nota que apesar de ainda estar sobre a rocha fria do altar da caverna, não há absolutamente nenhum druida ali para ameaçá-la, e tudo parece estar absolutamente destruído, exatamente como ela e John tinham deixado a caverna há pouco mais de um mês atrás. Ela sentou-se, ainda arfando devido ao esforço da luta vã que tinha travado com os druidas, trêmula, e olhando ao seu redor viu o nicho na caverna onde devia estar o corpo de sua antepassada, quem quer que fosse ela. Tudo estava no lugar. Apenas ela é que não estava – não queria ficar mais ali. Tão logo acreditou que suas pernas a sustentariam, levantou-se, com uma única idéia fixa: sair dali e procurar John. Sabia que ele sozinho precisava de ajuda para vencer o bando de espanhóis que tinha decidido atacá-lo. Ela sai da caverna, pela mesma abertura que usou com John da outra vez, após a explosão. Tem mais dificuldade, pois dessa vez ele não está ali para ajudá-la. Ela olha a seu redor, desnorteada, pois não sabe por onde começar a procurá-lo. E decide pela direção da Casa da Árvore, mas atenta aos sons que certamente uma tropa de espanhóis certamente estará fazendo, onde quer que esteja – e espera com eles encontrar também algum sinal de John.

Ele corre, tentando voltar para o ponto onde Marguerite foi tomada pela misteriosa onda de espaço-tempo que os separou. Não sabe o que houve com os conquistadores espanhóis que se desintegraram feito fumaça, mas isso pouco importa agora. Ele precisa encontrá-la, e sem nenhum outro perigo imediato a ameaçá-lo, é só nela que toda sua energia se concentra. Ele grita por seu nome, mas como resposta só ouve os sons tradicionais do platô.

A corrida de Marguerite rumo à casa da árvore é silenciosa, e ela procura ouvir além de seus próprios passos. Mas não há nada que indique a presença dos conquistadores espanhóis. Tudo está coberto pelo silêncio dos ruídos naturais do platô, o que a enerva profundamente! Será que está na direção errada? Onde está John? Continua correndo, e resolve gritar por ele. Não se importa que os conquistadores espanhóis a ouçam ou a encontrem, nesse momento o que importa é achar Roxton, de alguma forma, de qualquer forma.

Os gritos finalmente encontram eco. Ela ouve a voz distante de John chamando por ela. Ele ouve a voz ofegante de Marguerite gritando por ele. Guiam sua corrida baseada nos gritos, que se tornam mais freqüentes agora que se percebem próximos. Quando finalmente conseguem se ver, os gritos cessam. Não há alegria ou outras manifestações efusivas. Apenas uma corrida final, instintiva, em que ambos se lançam nos braços um do outro, ofegantes da corrida e do medo de terem perdido um ao outro. Abraçam-se, apenas, com força, como se desse abraço dependesse a vida de ambos, como náufragos que repentinamente encontram a tábua de salvação. Mas mesmo isso dura poucos instantes. Inspecionam-se em silêncio – estão ambos inteiros e intactos das aventuras – e basta uma troca de olhares para saberem o que precisam fazer a seguir: voltar para a Casa da Árvore.

Na sala da Casa da Árvore, Verônica jaz, ainda inerte. Absolutamente imóvel. Seu corpo não é agitado sequer pelo suave arfar da respiração que nos mantêm vivos. E é com essa cena que Challenger e Finn se deparam. Eles se encontraram há pouco, a apenas alguns metros da cerca elétrica, e subiram ansiosamente pelo elevador, gritando por Verônica. Sim, ela está ali. Mas não, ela não responde aos chamados deles. Nunca mais ela responderá aos chamados deles, aliás. Eles estão parados, estupefatos, diante do corpo inerte no chão. Challenger se aproxima, examina-a, mas não há nada mais a fazer. Nenhum sinal vital, nada. Apenas a pele suave dela já começando a esfriar contra sua mão – e um sinal na testa de Verônica, como que tatuado em cor escura, do símbolo do Trion. Finn não precisa se aproximar: conhece a morte por tê-la visto inúmeras vezes em diversas formas em seu próprio tempo. E sabe que Verônica já não pertence mais ao platô – nem a eles.

Marguerite e Roxton se aproximam, ofegantes, da cerca elétrica, estranhamente desligada. As pegadas de Finn e Challenger estão claras, é notável que eles passaram há pouco por ali. Mas o silêncio na parte de cima da casa da árvore é estarrecedor. Eles puxam a alavanca que desce o elevador, e esperam que isso dispare alguma reação de seus amigos lá em cima, mas nada. Não ousam gritar – uma estranha atmosfera os envolve, como se ambos adivinhassem que algo grandioso e grave aconteceu. O elevador parece levar uma eternidade para descer, mas vem vazio. Eles entram e puxam a alavanca de subida. Os segundos se escoam lentamente, e o silêncio que os aguarda é denso e assustador. Quando finalmente atingem o nível da sala e saem do elevador, vêem o que seus corações pareciam adivinhar e negar ao mesmo tempo. Marguerite pára, como que petrificada. John apenas olha, incrédulo, e passa um braço protetor sobre o ombro dela, como que para ampará-la e encontrar algum conforto para si mesmo diante do que vê: Finn está de pé, imóvel, observando Challenger, que está ajoelhado ao lado do corpo de Verônica. E Verônica... Verônica está definitivamente morta.

Capítulo 2 – No Valhalla()

Verônica acordou sobressaltada. Abriu os olhos, fazendo um esforço para sentar-se, mas foi impedida por mãos suaves, e por vozes ainda mais suaves repetindo que permanecesse deitada. Seus olhos demoraram apenas um pouco para se habituar à luz, que não era forte, mas difusa e baça, agradável aos olhos. E o que viu ao seu redor a espantou.

Não estava mais no chão de tábuas da Casa da Árvore, mas sim em um leito macio. E estava cercada por guerreiras parecidas com ela, vestidas com roupas de couro e peles, como as dela própria. Mas suas peles tinham um brilho translúcido.

'Onde estou?' ela perguntou, mas percebeu que as palavras pareciam se formar em sua mente.

O mesmo aconteceu quando ouviu as respostas: as guerreiras que a cercavam não mexiam os lábios para se dirigirem a ela.

'Você está a caminho do Valhalla, em Asgard.'

Verônica nunca tinha ouvido falar naqueles lugares.

'Valhalla? Asgard?'

'Asgard é o mundo que funciona como lar da tribo composta dos deuses e deusas nórdicos. E Valhalla é o "Salão dos Heróis", que pertence a Odin, onde os valorosos heróis que tombam em batalha são trazidos para viver até o fim dos tempos.'

'Mas como eu vim parar aqui?'

'Nós a estamos trazendo.'

'E quem são vocês?'

'Somos as Valkírias. Nossa função é recolher os guerreiros heróis, como você, e trazê-los para cá.'

Verônica estava confusa, mas havia pelo menos uma coisa em tudo aquilo que estava martelando em sua mente.

'Eu estou morta?'

As Valkírias que cuidavam dela se entreolharam, antes de responder. E então, a que parecia a mais velha entre elas respondeu a Verônica:

'Digamos que você tombou em uma batalha de forças sobrenaturais. Lutou bravamente, venceu e salvou o mundo.'

'Desculpe, mas você ainda não respondeu minha pergunta...'

A Valkíria sorriu antes de responder:

'Vê-se que você definitivamente merece estar entre nós. Em uma batalha humana, normal, você certamente estaria morta, sim. Mas não é o caso. Seu corpo realmente foi atingido por uma descarga de energia absolutamente destruidora. Mas o que vai acontecer em seguida depende de uma escolha sua, e de uma escolha de cada uma das pessoas que são de vital importância em sua vida.'

Verônica não estava entendendo tudo aquilo. Ela estava morta, mas não estava morta, ou pelo menos parecia haver uma chance dela voltar.

'Desculpe, mas não sei se estou entendendo...'

'Você deve apontar pessoas, que não tenham seu sangue, e em quem você confie para tomar decisões. Da decisão dessas pessoas dependerá se continuaremos ou não nosso caminho até o Valhalla.'

Verônica parou para pensar. Tinha que escolher pessoas que não fossem seus parentes consangüíneos. Seu sorriso se abriu quando seu coração começou a enumerar quem eram as pessoas a quem ela confiaria sua vida sem piscar. Mas mesmo esse sorriso se dissipou rapidamente.

'Não sabe que nomes nos dizer?' a Valkíria a questionou, com uma certa malícia na voz, que não passou desapercebida a Verônica.

'Não faria uma troca da minha vida a custa de qualquer perigo ou sacrifício que pudesse advir para meus amigos. Que aconteça o que tiver que acontecer comigo, eu já estou aqui, vocês já me têm.'

'Você não entende, é sua vida que está em jogo.'

'Você é que não está entendendo, senhora. Minha vida já não está em jogo – vocês a têm. Deixem meus amigos, quem quer que sejam eles, em paz.' Verônica disse, serena, com a imagem de seus amigos nítida em sua mente, sabendo que não era nada prudente envolvê-los nessa misteriosa situação.

'Você se esquece que nós, Valkírias, temos poderes... São poderes diferentes dos das Protetoras, e entre eles está o de poder ler o que se passa no íntimo das pessoas... Você não precisa me dizer os nomes das pessoas – eu já os li em seu coração.'

O rosto de Verônica se fechou num desafio.

'Você está blefando. Quer assim que eu diga os nomes das pessoas para você!' ela disse, no tom de voz sibilado que frisava sua irritação...

'Ned, Summerlee, Challenger, Roxton, Marguerite e Finn.' A Valkíria disse, lentamente, sem desviar os olhos dos de Verônica, que tentou se manter impassível. 'Você não precisa dizer que essas são as pessoas mais importantes da sua vida, hoje. Seu coração não hesitou por um instante... Mas na verdade só valem cinco deles. A pessoa a quem você chama de Finn, embora vocês não saibam, é sua parente consangüínea e não pode ser uma de suas "testemunhas". Você tem certeza que esses outros cinco nomes são as pessoas a quem você confiaria a decisão final de sua vida e morte?'

Verônica não respondeu, seus olhos flamejantes de raiva. Se sentia profundamente vulnerável pelo fato daquelas mulheres poderem ler o que ia em sua mente. Mas seu coração gritava um 'Sim' inquestionável – e por mais que ela se esforçasse por esconder, a Valkíria podia ler dentro dela. Além disso, Verônica estava confusa: o que eles, seus amigos, teriam que decidir? Que perigos ou riscos estavam envolvidos para eles? Ao mesmo tempo, como Finn poderia ser sua parente? Ela era de outro tempo!

'Muito bem. Será feita a sua vontade.'

'Já lhe disse qual é minha vontade – e ela não tem nada a ver com o que você pretende fazer!'

'O seu coração é a única voz a ser ouvida. E ele é claro em apontar quem são as pessoas mais importantes de sua vida. Não cabe a você decidir negar a chance que está lhe sendo oferecida. Será necessário esperar um pouco, e é bom que você descanse enquanto isso. Viremos chamá-la. E não pense tanto sobre a moça chamada Finn. Tudo será revelado a seu tempo...'

A Valkíria bateu palmas e dois guerreiros apareceram – Verônica se lembrava de já tê-los visto, mas não se lembrava de onde... Sim! Eram os guerreiros avatares que ela tinha visto quando sua mãe desaparecera e seu pai tinha sido morto. A Valkíria explicou rapidamente aos dois guerreiros o que precisava ser feito, e os dispensou.

Depois, ela se voltou para Verônica, e passando a mão suavemente sobre sua fronte, fez com que ela adormecesse imediatamente.

&&&

'Como isso pôde acontecer?' a voz de Roxton estava estrangulada. Era impossível acreditar que a amiga que os acolhera estivesse morta, ali, e que nenhum deles tivesse estado por perto para ajudá-la a defender-se do que quer que a tivesse atacado.

Marguerite chorava em silêncio, o corpo encostado no dele, incapaz de falar. Finn também estava quieta, e as lágrimas rolavam por seu rosto jovem.

Challenger a examinou ainda uma vez antes de responder para Roxton. Sua voz certamente era a que tinha o tom mais fantasmagórico, pois ela era como uma filha para ele, tinham se tornado muito próximos naqueles anos de platô.

'É difícil dizer, John. Ela não tem nenhum ferimento aparente. Exceto por essa marca na testa, que parece de uma tatuagem ou queimadura antiga – o que é impossível, já que nós sabemos que ela nunca teve essa marca. O curioso é o formato da marca: é precisamente o formato do colar que ela recebeu da mãe dela.'

'E onde está o colar agora, George? Não está no pescoço dela!'

Finn se adiantou, a voz embargada:

'Ela tirou o Trion do pescoço quando se posicionou nesse centro da Casa da Árvore e ele começou a queimá-la. A última vez que eu o vi, estava na mão dela.'

Challenger delicadamente verificou as duas mãos de Verônica, mas ela não mais estava segurando o Trion. Procuraram ao redor de onde estavam, mas não o encontraram.

'É estranho. Talvez pudesse nos ajudar a entender o que houve.'

Marguerite não se conteve, e murmurou:

'Pode nos ajudar a entender, mas não vai trazê-la de volta.'

Todos estavam chocados com tudo aquilo, e não pareciam querer dar o próximo passo. Sabiam que mais cedo ou mais tarde precisariam preparar o corpo para dar-lhe sepultura. Mas a dor de se imaginarem fazendo isso era grande demais para o momento.

O silêncio pesado que se seguiu refletia o pesar de todos eles, e foi quebrado por um ruído que vinha do nível do chão.

'Senhores? Senhores?' duas vozes diferentes chamavam.

Eles se entreolharam, e Roxton se afastou do grupo, aproximando-se da varanda, para ver do que se tratava.

Embaixo, dois guerreiros desconhecidos aguardavam, em posição respeitosa e ao mesmo tempo nobre.

'Quem são vocês? O que querem aqui?' a voz dele soou mais ríspida do que desejava, mas não tinha intenção de terem confusões com estranhos num momento como aquele.

'Viemos em nome da Protetora.' Os guerreiros disseram em uníssono, enquanto as costas das mãos deles tocavam o plexo solar e depois o coração.

A boca de Roxton apertou-se num rictus de dor. Lembrava-se agora de Verônica ter descrito os guerreiros avatares quando estivera desacordada diante do portal onde tinham encontrado a tumba do pai dela. Certamente eram como esses homens.

'Temo que tenham chegado tarde... Só um instante que vou descer...'

Os outros observaram o caçador, que apenas disse:

'Guerreiros avatares. Parecem ter vindo atrás de Verônica. Pena que parecem ter chegado tarde demais para protegê-la.' E desceu no elevador, deixando-os em silêncio atrás de si.

Quando ele voltou, estava acompanhado dos dois homens, que respeitosamente ajoelharam-se diante de Verônica, repetindo o gesto de tocar a testa e o coração com as costas das mãos.

'Como eu disse, vocês chegaram tarde para protegê-la.' Roxton disse, num tom calmo. Algo lhe dizia em seu íntimo que mesmo que eles ou os guerreiros tivessem estado lá, nada poderia ter sido feito por eles para salvar Verônica.

Os homens apenas olharam de um para outro dos exploradores, cada um expressando sua própria dor. Então, prepararam-se para remover o corpo de Verônica. Roxton adiantou-se, feroz.

'Ei, o que pensam que estão fazendo?'

Finn também aproximou-se:

'Onde vocês acham que vão?'

Challenger levantou-se e Marguerite aproximou-se, todos circundando os dois guerreiros, ameaçadoramente:

'Ninguém vai levá-la da casa dela.' Marguerite disse, calma mas firmemente.

'Vocês não entendem. Temos que levá-la. É a única chance.'

'Só se passarem por cima de nós.' Foi a reação imediata de Roxton.

'Chance? Chance de quê?' Marguerite perguntou, atenta ao que os homens tinham dito.

'Não podemos levá-la contra a vontade de vocês. Mas vocês devem vir conosco. Pelo menos alguns de vocês, em todo caso. É a única chance.'

'Como assim?'

'Aqueles de vocês que forem nomeados Challenger, Roxton e Marguerite devem nos acompanhar.'

Os mencionados se entreolharam, e depois buscaram os olhos de Finn, que flamejavam:

'E por que aquela que é nomeada Finn não pode ir com vocês?' ela questionou, desafiadoramente.

Eles se levantaram e, ao encararem Finn, repetiram o gesto com que tinham saudado o corpo imóvel de Verônica.

'São as ordens que recebemos.'

Challenger, que observava tudo, pareceu entender. Eles repetirem o gesto de saudação para Finn não passou despercebido a seus olhos atentos. Ele se aproximou de Finn, pegando-a pelo braço, e falando com ela com voz firme, mas com ternura, pois sabia que ela estava sofrendo tanto quanto eles com a perda daquela que ela considerava uma irmã.

'Finn, há mais coisas nessa história do que temos tempo de discutir e explicar agora. Eles falaram de uma chance, e temos que tentar, temos que dar essa chance, qualquer que seja ela, para Verônica. Nós iremos com eles. Se não voltarmos até amanhã nesse mesmo horário, precisaremos de sua ajuda.'

Finn não gostou do arranjo, mas parecia não haver outra opção.

'Para onde iremos?'

'O nome do lugar não importa. Basta que vocês nos sigam. Isso é de suma importância para a Protetora.' Eles responderam, enquanto um deles desenrolava uma chapa de couro que tinha em seu alforje. Juntos, colocaram Verônica delicadamente sobre ela, e se levantaram, erguendo consigo sua preciosa carga. 'Vocês não precisam de arma ou qualquer bagagem. Tudo de que necessitarem lhes será fornecido para onde vamos.'

Challenger, Marguerite e Roxton se entreolharam, e depois de assentirem para Finn, prepararam-se para segui-los.

'Finn, ligue a cerca elétrica e fique na proteção da Casa da Árvore. Não sabemos o que houve, e não queremos que mais nada de errado aconteça.' Challenger instou com ela.

Finn ainda se aproximou deles, e deu beijo leve no rosto de Verônica.

'Adeus, minha irmã...' ela murmurou, antes de deixá-los partir.

Observou o estranho cortejo descer o elevador, depois deixar a Casa da Árvore. Dois homens carregando aquela espécie de esteira onde levavam Verônica. E seus três amigos. Sozinha e em silêncio, ela apenas observou até eles sumirem entre as árvores ao longe. Depois, saiu para religar a cerca elétrica.

Capítulo 3 – As escolhas

Tão logo se certificaram que nem eles nem seus companheiros podiam mais ser vistos na floresta, os dois guerreiros avatares pararam. Depois, como que orientados pela mesma bússola, seguiram numa dada direção, onde um portal parecia se abrir – não muito diferente dos planos de realidade do qual os exploradores tinham escapado há poucas horas. A principal diferença é que ele estava suspenso no ar, e era mais colorido, como um arco-íris. Mas eles entraram resolutamente ali, e os exploradores o seguiram.

Assim que atravessaram o portal, os exploradores se viram numa cidade grandiosa. Havia várias construções, e uma delas, parecendo um palácio, se estendia à frente deles.

Logo foram saudados por outros guerreiros avatares e por mulheres vestindo túnicas de couro e peles. Todos saudaram a Protetora que jazia imóvel, e então uma mulher do grupo se destacou, dizendo a eles:

'Sou uma Valkíria, e nesse momento vocês estão em Asgard – ou em seus portões. A Protetora precisa ser levada, agora. Mas vocês tornarão a vê-la, já que o futuro dela depende das decisões e opções de vocês.'

Eles não entenderam muito bem, mas tiveram que concordar – não parecia haver outra opção. Depois que o grupo de mulheres se afastou, com os guerreiros avatares, a mulher que tinha falado inicialmente dirigiu-se a eles novamente:

'Por favor, me acompanhem, pois o tempo se escoa rapidamente.'

Ela encaminhou-se para uma área lateral, composta por vários pequenos chalés em torno de uma casa de madeira, maior. Sentou-se à vontade, no chão, em frente à casa de madeira, e sinalizou para que eles se sentassem ao seu redor.

'Vocês já devem ter notado que estamos numa área de transição. Essa Protetora não foi ferida, mas seu corpo tombou numa batalha de forças sobrenaturais, em que, para salvar o mundo, ela precisou doar sua própria energia, sua vida.'

'As Protetoras reúnem várias linhagens. Conquanto a antecessora dela viva em Avalon, não há um único lugar do mundo que possa ser realmente chamado de "A Casa das Protetoras".'

'Mesmo aqui, onde estamos agora, é o portão de entrada para um lugar aonde nem todas as Protetoras viriam. Apenas os deuses – e os heróis – podem chegar até aqui.'

'Nós, as Valkírias, recolhemos dos campos de batalhas os homens e mulheres valorosos que tombaram heroicamente – o que é cada vez mais raro. Mas essa Protetora em particular demonstrou um heroísmo grandioso – e esse não era o momento dela partir, mas ela modificou a história, através de seu sacrifício, de sua opção.'

'Há uma chance de não encerrarmos a linhagem dessa Protetora antes que ela tenha continuidade. Estamos em suspenso no tempo. Assim como a opção dela foi uma doação, a chance dela reside na capacidade de cada um de vocês doarem o que é mais importante para vocês. O coração dela nos revelou cinco pessoas, que não eram parentes consangüíneos dela, para fazer essa opção. E vocês foram esses escolhidos.'

Marguerite não resistiu. Olhou para Roxton de um lado, Challenger do outro, e a interrompeu:

'Peço desculpas, mas pelo que vejo somos apenas três.'

A Valkíria sorriu benevolamente.

'Não se preocupe. As duas outras pessoas escolhidas pelo coração dela já foram localizadas.'

'E como devemos proceder?' Challenger perguntou, curioso por todo o mistério envolvido naquela conversa, e ao mesmo tempo ansioso por descobrir como poderiam ajudar Verônica.

'As duas pessoas localizadas antes de vocês já receberam instruções, e portanto serão os primeiros a fazer a opção deles. Enquanto isso, vocês terão tempo para pensar e se preparar para suas próprias opções.'

'E o que está em jogo?' Roxton finalmente se manifestou.

A Valkíria olhou longamente os rostos tristes mas imperturbáveis dos três humanos a sua frente, antes de prosseguir:

'Cada um de vocês ficará em um desses chalés. Ali terão tempo de meditar, basicamente, sobre duas coisas: a primeira é qual a coisa mais importante na vida de vocês. A segunda é se estão dispostos a abrir mão dessa coisa mais importante da vida de vocês para que essa Protetora possa voltar à vida.'

'O que significa exatamente "estar disposto a abrir mão"?' Marguerite perguntou, desconfiada.

'Significa que vocês devem sinceramente estar dispostos a não lutar mais para atingir ou obter isso que é a coisa mais importante para vocês. Não que isso vá deixar de ser importante, mas será importante apenas no seu íntimo, pois vocês nunca mais poderão investir qualquer esforço em atingi-las.'

Os três ficaram em silêncio. Sabiam o que isso significava.

'E esse é o único jeito?' Roxton parecia profundamente grave pela revelação da Valkíria.

'Sim, é o único jeito. Aliás, não é sequer uma certeza. Porque após as escolhas de vocês, a Protetora terá então que fazer uma última escolha, por parte dela. E o que ela escolher é decisivo também para o destino dela... Estão prontos?'

'Sim.' Os três responderam, gravemente.

'Então, vão ocupar seus chalés. Quando for a hora, uma de nós irá buscá-los e levá-los diante de Freyja, que os questionará sobre suas escolhas. Ela saberá se vocês estão sendo sinceros ou não. Lembrem-se apenas de que disso depende o destino dessa Protetora.'

Eles ouviam, em silêncio.

'Depois que passarem por Freyja, vocês terão a opção de registrar sua escolha num pergaminho. É a única forma de vocês poderem compartilhar com os outros o que escolheram. Isso impedirá que qualquer um de vocês estranhe qualquer súbita mudança de atitude, no outro. Vocês só poderão ler a opção dos outros depois que tiverem feito sua própria escolha. E é impossível voltar atrás na escolha feita. Vocês entenderam?'

Eles apenas assentiram, concentrados. Ela levantou-se e entrou na casa de madeira maior. Eles se levantaram também. Mas antes de se dirigirem aos chalés, eles trocaram um olhar de compreensão. Sabiam o que estava em jogo. E não pretendiam falhar.

Notas:

() Valhalla é o nome do palácio para onde heróis e heroínas tombados em batalha são levados pelas Valkírias, na mitologia nórdica. Segundo a mitologia nórdica, esse palácio fica em Asgard, o mundo dos deuses nórdicos. E todos aguardam o dia do julgamento por Freyja.

CONTINUA...

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