FOI MAL! Parte 3
A honra de um digimon
Miyako Inoue estava deitada no sofá, com as pernas cruzadas para o alto.Assistir à TV de cabeça para baixo não a tornara menos tediosa.Alcançou com alguma dificuldade o controle remoto e desligou o aparelho.Nesse momento, Hawkmon entrou na sala, com uma toalha sobre os ombros.
"Senta direito, Miyako, o seu sangue vai parar todo na sua cabeça, sabia? Se é que já não aconteceu coisa pior com ela!" O pássaro revirou os olhos.
Miyako deu uma risadinha e girou o corpo, sentando sobre as pernas e fitando o digimon."Eu queria tanto saber qual foi a reação dele quando leu a carta!Hawkmon,você devia ter ficado um pouco mais pra me trazer uma resposta!"
"Resposta!Que tipo de resposta uma temeridade como aquela teria,Miyako?Eu aposto que ele deve estar mudo até agora..."
"Será que ele gostou?" Miyako divagou maliciosamente."Você acha que ele virá até aqui?".
"Bom, se ele estiver com medo de ser estuprado, duvido muito!".
"De qualquer maneira, não tem problema!" Declarou Miyako, com os olhos brilhando e um sorriso determinado."Se ele não vier até aqui, eu vou até a casa dele! Eu avisei que seria pior se ele não viesse... e ele pode esperar que vai ser!"
Hawkmon fitou a amiga com temor e desconfiança."Isso não vai prestar, Miya-chan! Eu acho que daqui pra frente o Ken vai virar uma estátua de gelo toda vez que chegar perto de você... e isso sem falar no barraco que o Wormmon vai armar quando ele souber que você pretende arruinar a pureza do garoto...".
"Primeiro: eu não pretendo arruinar a pureza do Ken... ele é quem vai arruinar a minha!" Hawkmon arregalou os olhos."Segundo: se ele virar uma estátua de gelo eu sei como fazê-lo derreter rapidinho..." Miyako balançou os ombros com alegria."E finalmente, terceiro..." Nesse momento, ela ficou séria e ergueu um dedo."Quem quer que possua um mínimo de amor à vida e raciocínio lúcido não vai se interpor entre o Ken e eu... você entendeu?".
Miyako cruzou as pernas delicadamente, batendo as pestanas.Hawkmon estava mortificado.
"Deve ser tão... tão normal ser parceiro da Kari...!".
"Assim como deve ser muito divertido o chove-não-molha em que ela e o TK estão! Eu não sou normal, Hawkmon, eu sou de uma série diferente, e muito especial...".
Então, a campainha tocou.
"Será que é o Ken?" Miyako pulou do sofá ansiosa, alisando as roupas e arrumando o cabelo.
"Seja quem for não vai me impedir de tomar um banho quente e relaxante, por isso atenda você!".
Miyako não fez objeção quando o digimon águia a deixou sozinha, diante da porta de entrada.Ela respirou fundo, sem nunca deixar de sorrir.Girou a maçaneta, abriu a porta e...
A garota continuou sorrindo durante os trinta segundos que se seguiram.O sorriso se transformou numa careta de impaciência quando ela colocou a cabeça para fora e olhou de um lado para o outro.O corredor estava vazio.
Aborrecida, ela bufou e bateu a porta, mas antes que chegasse ao sofá, a campainha tocou outra vez.
Recuperando de imediato o entusiasmo, Miyako arrumou o cabelo, resistiu à enorme vontade de coçar o olho direito ("Maldita lente de contato!"), girou a maçaneta devagar e abriu abruptamente a porta, encostando um lado do corpo no portal, fazendo charme.
Mais uma vez, não tinha ninguém ali.Miyako teve vontade de gritar, mas ao invés disso, preferiu bater a porta com toda a força.
Revirando os olhos para o alto, ela chegou até o sofá pisando duro, pronta para desabar sobre o assento, mas já havia alguém lá...
"Wormmon!".
Miyako piscou, sinceramente surpresa.Ela pôs as mãos na cintura e sorriu."Era você da primeira vez?".
"Era!" Respondeu o digimon inseto, sua voz esganiçada soando estranhamente severa."Não se aproxime de mim, sua... sua menina má e pervertida!".
Miyako, que fizera menção de tomar a pequenina criatura nos braços, os recolheu imediatamente junto ao corpo.
"Porquê você está falando assim comigo!".A garota estava dividida entre o choque e a irritação.Os olhos de Wormmon estavam cheios de lágrimas.
"O que significa isso?".
O pequeno lagarto agitou as antenas, fazendo cair o papel, mas Miyako o apanhou depressa e começou a ler.
Wormmon se esticava para um lado e para o outro, para frente e para cima, tentando ver o rosto da garota, oculto atrás do papel.Não demorou muito, para as mãos dela começarem a tremer loucamente e para surgirem ruídos guturais e abafados detrás da carta...
"Oooh, você ficou com ciúme, Wormmy-kun?" Apenas o olhar meigo de Miyako apareceu, por cima do papel. "Mas não precisa!" Ela exclamou, ajoelhando-se diante dele."Eu não disse que nós podemos perfeitamente dividir o...".
"Eu não vou permitir que você corte Ken-chan em pedaços como se ele fosse uma torta! E depois, depois... o devore de uma só vez! Você é má,muito má!".
Com a voz chorosa e esganiçada, Wormmon, no entanto, tremia de indignação.Miyako percebeu, e decidiu que era hora de se divertir um pouco e quem sabe até quebrar o gelo...
"Olha só, Wormmy-kun..." Começou, fazendo um esforço supremo para não rir da pose de soldado valente do digimon."Nós sempre podemos dar um jeito em tudo na vida... o Ken não precisa ser cortado como se fosse uma torta... nós podemos devorá-lo juntos, o que você acha?".
Miyako enchera sua voz de trânquila malícia, enquanto acariciava, com um dedo, as antenas do bichinho.Wormmon arqueou as sobrancelhas de uma só vez e sua boca se abriu.
"Porquê você está fazendo essa cara?" A menina segurou o rostinho dele entre as mãos e se fez manhosa."Eu tenho certeza de que você também é uma tortinha deliciosa!".
Nesse momento, ela não agüentou mais e tombou sobre o tapete, dando murros contra o chão, chorando de tanto rir.Enquanto isso, algo se acendeu no interior de Wormmon.Ele, que era sem discussão o mais doce e amável dos digimons, jamais admitiria que alguém chamasse à si ou ao parceiro de 'tortinha deliciosa'!Claro que gostava muito das tortas que a mãe de Ken preparava...mas algo lhe dizia que as 'tortas' de que Miyako Inoue falava estavam recheadas de más intenções...
"IÁÁÁÁÁÁ!"
"Nossa, mas o quê... AAAAAAAAAH!"
Miyako teve tempo apenas de se virar, e ver Wormmon saltando em sua direção, com a determinação feroz de um guerreiro!
