TRY – Capítulo 2

"O que ele está fazendo aqui?" Ela ficou encarando-o como se nunca o tivesse visto tamanha a surpresa pela presença do cavaleiro e ao mesmo tempo sem saber como agir. Ele só fez erguer uma sobrancelha, um gesto característico dele que indicava interrogação.

Saori percebeu que estava exagerando na reação, não podia demonstrar o quanto a presença de Saga a perturbava. Controlou-se e assumiu o ar solícito e natural que sempre procurava usar perto dele, era um ato desesperado de sobrevivência que praticava quase diariamente.

- O que houve Saga? Achei que fosse aproveitar mais a festa. – começou a olhar para a janela ao lado, apesar de não ver nada através dela devido aos vidros escuros. Precisava não olhar para ele, mesmo na penumbra do veículo poderia acabar se traindo.

- O mesmo para você. – fez uma pausa e depois completou – Essa festa deu tudo que tinha para dar.

- Entendo... – calou-se então.

Na verdade os dois calaram-se. Saga só a observava e ela estava começando a ficar cada vez mais nervosa por sentir aqueles olhos sobre si. Ajeitou-se um pouco no lugar procurando uma postura mais confortável, o gesto não passou despercebido para ele.

- Você parece bem nervosa essa noite Saori.

- Não estou nervosa. – "Além de bonito, ele lê pensamentos?"

- Mesmo? – perguntou nada convencido com as palavras da deusa – Tem certeza que não há nada incomodando-lhe?

- Tenho.

Observou-a mais intensamente, tinha absoluta certeza da inquietação dela, mesmo negando, até os mínimos gestos a traíam. Saori sabia que estava sendo analisada por ele, ficou mais nervosa ainda. O cavaleiro então mexeu-se um pouco no assento, coisa que provocou uma reação imediata na moça, essa aprumou-se mais parecendo tensa. Sorriu levemente sem que ela percebesse, estava tendo uma idéia do que se passava.

- Eu fiz alguma coisa errada?

- Não.

- Então por que está agindo assim?

- Assim como?

- Como se fôssemos estranhos e eu estivesse perto de matá-la.

- Eu não estou agindo assim... – a frase morreu na boca, ele se levantara do banco e viera em sua direção sentando-se ao seu lado – O que está fazendo?

- Analisando mais de perto. Já que você parece recusar-se a admitir que está incomodada com alguma coisa talvez estando ao seu lado eu consiga respostas melhores. – falou casualmente como se fosse a coisa mais natural do mundo.

Ela só o olhou com uma mistura de confusão e surpresa. "O que ele quer?" E seu olhar foi retribuído à altura, distinguia bem os olhos de Saga em meio a penumbra embora não conseguisse dizer o que eles estavam transmitindo agora. Ele então abriu um sorriso e ela prendeu a respiração mordendo o lábio inferior, sabia que isso podia acontecer, bastava um sorriso dele pra ela perder o fôlego. O que ia fazer agora? Por que não chegavam logo ao Santuário para que pudesse se afastar dele?

- Por que tem tanto medo de mim? – perguntou ele de repente.

- Eu... não tenho medo de você.

- Não é o que parece. Você está tão tensa que eu acho muito difícil que isso não esteja relacionado à minha presença. – fez uma pausa esperando que dissesse algo, mas ela só endireitou-se e olhou pra frente evitando encará-lo – Não vai dizer nada?

- Vou.

- E...?

- Desculpe-me por agir assim. Não era minha intenção ser rude com você.

- Oh... mas você não está sendo rude comigo, está sendo educada. Educada demais para meu gosto. Alguma coisa está errada e você não quer me dizer.

- Não há nada errado. Estou cansada, só isso.

Ela aparentava indiferença, mas estava longe disso, muito longe. O cavaleiro então baixou o olhar e localizou a mão dela sobre o assento, devagar ele cobriu-a com sua própria mão. Ela imediatamente olhou pra ele com surpresa.

- O que está fazendo?

- Testando. – e tomou a mão dela entre a sua erguendo-a até a altura de seus olhos. Virou a palma dela para cima e com a outra mão colocou dois dedos encostados no pulso dela. Saori só o encarava confusa e assustada com aquilo tudo – Sua pulsação está acelerada. Consegue me dizer por que?

- Eu... eu... – não conseguia dizer nada, só olhava para ele, seus pensamentos estavam confusos e nada parecia coerente, não sabia dizer se havia ar entrando e saindo de seus pulmões.

Com os dois dedos que tocavam-na, Saga começou a fazer leves carícias pela extensão do pulso e antebraço dela chegando quase até a parte interior do cotovelo. Olhava para o braço dela com tanta intensidade que parecia procurar algo. Ela se arrepiou com isso, a carícia, o olhar dele, a penumbra, o corpo tão próximo do seu, tudo estava hipnotizando-a de um modo difícil de descrever.

- O que está sentindo Saori? – perguntou suavemente fazendo-a arrepiar-se.

Ela não conseguia pensar nada para dizer, só olhava para ele. Saga então levantou o olhar do braço dela para seu rosto fazendo seus olhares se encontrarem. Isso foi um choque tremendo para a moça, aqueles olhos mesmo na penumbra eram fascinantes. Sabia que não deveria cruzar seu olhar com o dele, mas seu corpo simplesmente ignorava qualquer pensamento coerente naquele momento. O que estava acontecendo?

- Já que você não diz nada... – foi aproximando seu rosto do dela mantendo o olhar fixo nos seus olhos. Hipnotizada por aquele olhar, Saori ficou imóvel sem nada fazer. Ele chegou bem perto ficando a centímetros dos lábios da moça e ainda assim de olhos bem abertos captando qualquer movimento que a ela fizesse. Saga aproximou mais seus lábios até que estes tocassem os dela bem de leve numa carícia suave. Depois afastou o rosto para olhar melhor para ela.

- Nem um não à vista? Nem um gesto para afastar-me? – abriu um sorriso daqueles de tirar o fôlego – Interessante...

E sem que ela desse conta dos movimentos dele a mão sobre seu pulso circundou a cintura dela rapidamente e com um leve puxão trouxe seu corpo para se colar ao dele enquanto suas bocas se chocavam para um beijo. Começou devagar, mas os lábios dele pareciam adquirir mais fome, mais vontade e exigiam isso da boca dela. Não sabia como, mas correspondia na mesma intensidade, levantou o outro braço e introduziu a mão entre os cabelos dele por trás do pescoço aproximando mais a cabeça dele para aprofundar o beijo. Abriu mais os lábios deixando que a língua dele penetrasse ao mesmo tempo que a sua experimentava sua boca. Parecia que iam se consumir em chamas naquele beijo tal a intensidade com que seus lábios se entregavam na exploração um do outro.

A mão em sua cintura apertou mais firmemente seu corpo contra o dele, o que arrancou um gemido dela entre o beijo. Isso pareceu enlouquecer algo dentro dele porque redobrou a intensidade do beijo bem como a força do abraço. Inclinou-se sobre ela fazendo-a deitar-se sobre o banco sem desgrudar os lábios, uma posição um tanto desconfortável, mas nenhum dos dois parecia se importar com isso.

Então ele interrompeu o beijo separando seus lábios e olhou para os lados deixando-a atordoada.

- Chegamos.

Ela então recuperou um pouco do bom senso e levantou-se empurrando ele e endireitando-se. Agradecia a penumbra por esconder o rubor que tingia seu rosto. Não se atrevia a dizer uma palavra sequer naquele momento, estava confusa com tudo aquilo.

- Sinto muito. – murmurou ela antes de abrir a porta e sair apressada.

- Espere! – saiu também para impedi-la de deixá-lo, mas quando estava fora do veículo, Athena já subia correndo as escadarias de Áries. Ficou ali parado vendo-a desaparecer na entrada da primeira casa confuso com a reação da moça – O que deu nela?

Olhou então para trás e viu algo sobre o banco do veículo que provocou um sorriso nos seus lábios. "Isso não vai ficar assim" pensou ele enquanto pegava o objeto e começava a andar calmamente em direção às escadarias. Se quisesse poderia alcançá-la facilmente antes que a reencarnação da deusa chegasse na segunda casa zodiacal, mas tinha idéias muito mais interessantes em mente. Daria uma trégua para Saori, por hora, afinal não devia estar acostumada com aquilo, precisava ir devagar com ela. "Mas aquele beijo não foi nada inexperiente" Involuntariamente levou a mão aos lábios e tocou-os de leve, riu só para si ao pensar no beijo trocado instantes antes, ainda sentia o gosto da boca dela. Queria mais... e foi subindo as escadarias devagar enquanto pensava em Saori que agora deveria estar chegando na escadaria da casa de Gêmeos. Sentiu-se tentado a retê-la em sua casa usando ilusões até que ele chegasse para terminar o beijo que começaram no carro, não seria difícil estando em Áries, já fizera algo parecido antes de uma distância muito maior. Mas ia esperar até amanhã para falar com ela, realmente estava se sentindo um pouco cansado hoje.

Só que mal o cavaleiro sabia o que o aguardava.

Andando de um lado para outro na entrada da casa de Gêmeos se encontrava Saori nervosa e esperando-o. Essa noite estava longe de acabar para esses dois.