Nos braços do amor
cap.1
O reverendo Miuga Higurashi ergueu-se da mesa do café onde estivera lendo durante quase toda a manhã, e dirigiu-se para a porta. Ao abri-la sua neta o chamou...
Tio Miuga, o senhor esqueceu de ler a carta!
Deve ser alguma conta filha; não tenho tempo de abri-la agora. Volto mais tarde, até logo!
Assim que o pastor saiu, Kagome olhou para Souta, seu irmão mais novo, sentado do outro lado da mesa, e ambos caíram na risada.
Tio Miuga não tem jeito mesmo, sempre evitando coisas desagradáveis.
É um homem sábio – comentou Souta, com seriedade.
Kagome o olhou de esguelha, seu irmãozinho estava crescendo rápido e se tornando um belo jovem, sério e sábio. Não tardou em lhe mandar um de seus melhores sorrisos. Sempre que o via com aquela cara séria, lembrava-se instantaneamente de seu pai. Souta estava ficando cada vez mais parecido com ele, tanto na aparência física como no jeito de se expressar.
Jovem e bonito, Souta Higurashi no auge dos seus quatorze anos tinha curtos cabelos negros e belos olhos azuis que davam a ele um charme a mais.
Kagome, entretanto, tinha longos cabelos negros, olhos castanhos, pele clara e corpo esguio. Era uma mulher muito bonita e atraente, tinha vinte e três anos e chamava muita atenção por onde passava graças a sua linda carinha de anjo e seu corpo de mulher.
Quer mais café? – perguntou ela
É melhor abrir a carta e encarar logo a má notícia. Espero que não seja nada muito grave, nem uma grande dívida, pois se as coisas continuarem desse jeito não poderemos sald�-la.
Souta não vai me dizer que já gastou todo o dinheiro que lhe dei!
Claro que sim. Você não faz idéia de como o internato é dispendioso!
Mas quando conseguimos a bolsa você sabia que teria que economizar cada centavo. O dinheiro que papai e mamãe deixaram está no fim e você sabe muito bem disso, além do que o titio já está muito velho para trabalhar e logo será destituído do cargo de reverendo e eu terei que me virar para conseguir nos sustentar!
Eu sei, eu sei... mas é difícil economizar no meio de todos aqueles sujeitos ricos.
Eu sei, mas como você mesmo disse não estamos em uma situação favorável, então não abuse.
Pode deixar.
Não vai abrir a carta? – disse ele impaciente
Ah?
A carta não vai abrir?
Ah sim... tinha me esquecido! – diz com um sorriso no rosto
Kagome abriu a carta e a cada trecho que lia seus olhos se esbugalhavam cada vez mais.
Não é possível, isso não pode estar acontecendo. – disse já com lágrimas nos olhos. Ela não queria chorar, não na frente do irmão, mas aquilo era muito sério.
O quê...o quê está acontecendo Kagome, o que há na carta? – dizia já em meio a berros. O que poderia ser tão grave a ponto de deixar a irmã tão perturbada? Aquilo o estava perturbando. Kagome não o respondia.
Souta nós...nós estamos ruindo em dívidas, eles pedem muito mais do que podemos pagar, e o pior é que a garantia é a nossa casa! – diz ela já histérica.
Calma Kagome, isso deve ser um engano. Aí não diz como foi contraída a dívida?
Você está certo, aqui diz que a dívida foi contraída em uma casa de jogos, mas você não pode entrar em uma, pois és de menor.
Me admira você pensar que eu faria algo assim com a nossa família. – diz ofendido.
Desculpa, mas se não foi eu e nem você só pode ter sido o...
Tio Miuga! – fala os dois em uníssono.
Não, ele não faria isso conosco. Além do mais ele está trabalhando, não há como. – diz Kagome apreensiva.
Não tenha tanta certeza, o titio já entregou o salário para as despesas?
Não, mas...
Nem mais nem menos mais, o mês já acabou a semanas e até agora nada de dinheiro, ou ele foi destituído do cargo ou tá ficando caduco para fazer algo assim!
Ah! Souta não temos provas de nada, teremos que esper�-lo para esclarecermos as coisas.
Você tem razão.
Após o café, cada um foi para os seus afazeres. Souta como estava de férias, foi dar uma volta para poder pensar em algo que os tirasse dessa roubada. Kagome foi para a venda onde trabalhava.
Já era tarde da noite quando Miuga chegou em casa, sabia que seus sobrinhos já estariam dormindo e então tentou fazer o mínimo de barulho possível, mas o seu estado de embriagues não facilitava. Ultimamente seus dias se resumiam nisso, saia de casa cedo, se embriagava, jogava, gastava todo o dinheiro que sua adorável sobrinha arranjava. Sabia que isso era errado, mas nada mais importava, tinha perdido seu emprego, sua casa e agora podia perder o carinho de seus sobrinhos, tudo culpa desse seu maldito vício. Andando pelo corredor, viu que a luz do quarto de seu sobrinho estava acesa, passou o mais silenciosamente possível afim de não chamar atenção dos dois jovens que se encontravam ali dentro, porém...
Tio Miuga, que bom que o senhor chegou. Estávamos preocupados.
Precisava...ic...se..ic.. preocupar..ic..
O senhor está bêbado?
É claro que ele está Kagome, não está vendo?
É, você tem razão. Vem aqui tio, que eu vou fazer um café bem forte para o senhor.
Não..ic.. precisa..ic.. minha filha..ic..
É claro que precisa. Depois o senhor vai dormir, porque amanhã precisaremos conversar.
Na manhã seguinteKagome preparava o desjejum absorta em pensamentos. Porque isso tinha que acontecer comigo? Porque tudo é tão difícil? Uma hora estava feliz ao lado de sua família, tinha seus pais, amigos e de repente todo o mundinho de contos de fadas que cultivava vai por água a baixo, tudo por causa daquele acidente. Se pudesse voltar ao passado, teria impedido seus pais de saírem de casa naquele fatídico dia, mas isso era impossível. Seus pais estavam mortos e não havia nada que pudesse fazer para mudar o passado, se lembrava perfeitamente da última conversa que teve com sua mãe...
FLASHBACK
Sta. Higurashi sua mãe quer vê-la! – disse uma das enfermeiras.
Ah sim! Já estou indo. – Não sabia ao certo quantos dias estava naquele lugar. Após receber a notícia de que seu pai havia morrido em um acidente e que sua mãe estava entre a vida e a morte no hospital, saíra correndo de casa só dando tempo de deixar Souta na casa de um de seus vizinhos e explicando a estes o sucedido. Desde então não saíra mais daquele lugar. Sabia que seu irmão estava bem, pois todo dia ele ia no hospital ver como sua mãe estava, junto com alguns vizinhos e amigos da família. Na época, Souta era muito pequeno, tinha apenas quatro anos. Sabia que não era certo privar seu irmãozinho de ficar ali com ela, mas tinha plena consciência de que o clima mórbido de um hospital não era o melhor lugar para uma criança, então por bem achara melhor deix�-lo com a família Reeds, que eram vizinhos e amigos da família a muito tempo. Foi tirada de seus devaneios ao perceber que havia chegado a porta do quarto de sua mãe.
Como a senhora está mamãe?
Não muito bem querida, mas estou feliz em saber que você está aqui!
... – era deprimente ver sua mãe naquele estado, ela que sempre fora tão forte e independente agora sobrevivia por meio de aparelhos...
Onde está seu irmão doçura?
Mamãe já disse para não me chamar assim, faz com que eu pareça uma criança – disse tentando fazer uma voz divertida, mas falhando miseravelmente. Era quase impossível fazer brincadeiras em tais circunstâncias.
Oh! Desculpe querida é força do hábito... – disse com um pouco de dificuldade.
Não se preocupe mamãe era brincadeira, agora respondendo sua pergunta, Souta está na casa dos Reeds. Achei que o clima pesado do hospital não faria bem a ele, mas se você quiser posso cham�-lo agora! – disse já se levantando da cadeira onde se encontrava.
Você fez bem querida, mas não precisa cham�-lo, tenho pouco tempo e não queria que Souta me visse morrer. Seria algo traumatizaste para uma criança de quatro anos.. – sua voz estava falhando mas sabia que tinha que continuar.
Mamãe, não fale uma coisa dessas nem brincando – repreendeu Kagome.
Deixe-me continuar Kagome... – sua voz agora era mais forte, mas não menos debilitada.
Eu sei que meu fim está próximo, eu sinto isso querida e nem você nem ninguém podem me dizer o contrário... – Sua voz estava cada vez mais baixa... A tarefa de respirar estava ficando árdua demais, mas nem por isso iria parar agora.
Mamãe... – Seus olhos se encontravam cheios de lágrimas, ouvir tudo aquilo e saber que era verdade era muito difícil, pior era insuportável, se sentia fraca perante a mãe, se sentia uma incapacitada vendo um de seus entes mais queridos indo embora sem ao menos fazer nada para evitar. Já havia perdido o pai não suportaria perder a mãe também, se sentia uma inútil, suas mãos estavam atadas e não podia fazer nada para desamarra-las...
Querida entenda, isso também não esta sendo fácil para mim, mas é a lei da vida...eu só gostaria...ai...como dói..
Mamãe o que ouve, agüente firme vou chamar o médico – Já não segurava mais as lágrimas, estas percorriam livremente por seu rosto. Se levantou de pressa, estava se afastando da cama quando uma mão segurou o seu pulso.
Não me escute primeiro... – sua voz não passava de um sussurro.
Mas mamãe, a senhora mesmo disse que está doendo, não vou deix�-la sofrer. Não a quero perder como perdi o papai...- tentava inutilmente se libertar da mão de sua mãe, mas mesmo doente sua mãe a segurava com força impossibilitando a sua fuga.
Me escute Kagome, você sabe que isso é inútil, eu estou morrendo e isso é fato.. – sua voz era sofrida, mal passava de um sussurro
NÃO, VOCÊ NÃO PODE NOS DEIXAR, JÁ PERDEMOS O PAPAI , NÃO PODEMOS PERDER VOCÊ TAMBÉM... – a essa altura as lágrimas já corriam incessantemente pelo seu rosto
Me escute Kagome, não importa o que você diga nada irá mudar a realidade, o seu pai me espera, por isso não tenho muito tempo, só faça o que estou mandando... – não estava mais agüentando a dor era forte demais, o ar estava ficando rarefeito e respirar estava se tornando cada vez mais difícil. Soltou o braço da filha e disse com a voz embargada.
Procure...seu tio Miuga, você se lembra ...dele não lembra? – recebeu um sim como resposta
E por favor...querida cuide...de seu irmão...ele é muito...pequeno ainda, te...tenho...certeza que...cuidará bem dele me ..prometa ...isso querida
Mamãe...
Me prometa Kagome
Eu prometo mamãe, eu prometo...
Mas.. nunca...esqueça da ...sua feli...felicidade e saiba que...mesmo...que...eu não esteja mas com...vocês eu sempre...vou am�-los...
PI...PI...PI...PI...
O barulho incessante dos aparelhos preencheu o quarto para desespero de Kagome.
Mãe? MÃE, MÃE ACORDA POR FAVOR – debruçada ao corpo inerte de sua mãe Kagome viu tudo acontecer muito rápido. O médico chegando, a inútil tentativa de reanimação... Era o fim, ali na cama jazia sua mãe morta.
Após a morte de sua mãe Kagome fez o que ela pediu e jurou para si mesma que iria cumprir a promessa que havia feito a ela, nem que para isso tivesse que sacrificar a sua felicidade.
Fim do FLASHBACK
Aquela época havia sido muito difícil para ela e seu irmão, mas os tempo foi passando e a saudade crescendo. Aparentava ser forte, tinha que dar o exemplo, mas quando ninguém via se debulhava em lágrimas. Com o tempo aprendeu a conviver com essa dor e fazer das lágrimas recordações do tempo em que ainda os tinha ali ao seu lado. Sabia que de algum jeito eles ainda estavam ali zelando por ela e seu irmão, e de certa forma isso a confortava.
Já faz mais de dez anos que eles se foram e de vez em quando a saudade ainda aperta, mas conviver com seu tio não era de todo o ruim, ele era muito carinhoso e compreensivo era como se fosse o nosso segundo pai, mas pensar que ele havia destruído tudo o que haviam construído nesses anos, dava até certo ponto raiva.
Foi tirada de seus devaneios quando a porta a sua frente é aberta e por ela passa seu irmão.
Tio Miuga já acordou? – pergunta Kagome.
Não e pelo jeito vai dormir até tarde.
Sinceramente não consigo acreditar que isso esteja acontecendo com a gente – disse Souta se sentando à mesa
Também não consigo acreditar – disse Kagome repetindo o gesto do irmão
Eu estive pensando mana, acho que seria bom se eu largasse a escola e ajudasse nas despesas, isso facilitaria muito na questão da dívida e não perderíamos a casa, o que você acha?
Sinceramente Souta, eu acho isso um absurdo. Francamente, você só tem doze anos. Acha mesmo que vou deixar que faça essa loucura?
Mas...
Nada de mais mocinho, eu fiz uma promessa à mamãe e pretendo cumpri-la.
Kagome, você não está compreendendo a gravidade da situação, nós podemos perder a casa! – disse já se alterando
Eu sei muito bem quão grande é a gravidade da situação, mas nem por isso quero ter um irmão burro – também alterada.
Mas...
Nada de mais, você vai para escola, vai terminar os estudos e ser alguém na vida. E eu vou conseguir esse dinheiro nem que para isso eu precise me desdobrar em mil. Eu fiz uma promessa, disse que cuidaria de você e é isso que vou fazer. Agora tome o seu café logo e depois suba para arrumar suas coisas, pois sua aula começa amanhã.
Está bem.
O café da manhã transcorreu normalmente, tio Miuga acordou umas horas depois e teve que esclarecer o porque da dívida aos seus sobrinhos que ficaram chocados ao saber que ele havia perdido o emprego pelo simples motivo de estar muito velho, e em vez de tentar arranjar outro, se rendeu aos vícios arruinando toda a família.
Tio Miuga, o senhor pode nos mostrar a carta? – perguntou Souta encostado ao lado da lareira
Claro meu filho, tome aqui está
Souta leia em voz alta por favor.. – pediu Kagome
"Ao reverendo Miuga Higurashi:
Sob instruções de Sua Graça, a duquesa Kagura Stanton, agora que o senhor alcançou a idade de sessenta e cinco anos, pode retirar-se da igreja e deixar seu posto dentro de um mês.
Respeitosamente
Onigumo Carstairs
Secretário de Sua Graça"
"Não tem jeito, terei que resolver isso sozinha. Talvez se o tio Miuga conseguisse o emprego de volta... Havia a alternativa de se recorrer a chefia da igreja Anglicana. Mas isso levaria tempo, tempo que eles não tinham. Não, isso é impossível. Bem, a carta não foi escrita pela duquesa, mas por seu secretário, mesmo assim foi ela que instruiu-o a escrevê-la. Talvez se eu conseguisse convencer a duquesa, o titio pudesse voltar ao cargo. Seria uma das saídas mais fáceis, principalmente porque nessa sociedade é raro ver uma mulher trabalhando e também não é muito aceito, eu mesma tive muito trabalho em conseguir um emprego(e ainda por cima me pagam menos por ser mulher ��), e não acho que será fácil arranjar outro, e botar Souta para trabalhar está fora de questão. Falar com a duquesa é o único jeito."
Talvez o único jeito seja falar com a duquesa e pedir seu emprego de volta tio Miuga –disse Kagome sentada em um dos sofás da pequena casa em que moravam
Está louca Kagome? Você não vai fazer isso, nunca ouviu falar da fama da duquesa? – bradou com indignação Miuga.
Acho que há uma chance, uma probabilidade de ser bondosa conosco. Se souber da nossa situação, creio que...
Bondosa? Compreensiva? Deve estar brincando, sabemos como ela é. – bradou Souta
Proíbo-a de ir vê-la! – bradou Miuga.
Mas, tio Miuga, o que mais temos a perder? Se não pagarmos a dívida seremos obrigados a abandonar a casa e o que eu recebo é muito pouco, acabaremos passando fome se não fizermos nada. Pessoalmente, prefiro pedir compreensão de joelhos!
Se fizer isso, ela a enxotar�! – disse Souta
Ouvimos essas histórias desde que somos pequenos Souta, mas na verdade, nunca vimos a duquesa, nem podemos comprovar tudo isso. Sabe muito bem que o pessoal costuma exagerar em seus comentários, pois não tem o que fazer.
E o que me diz das festas que ela costuma dar no castelo? – disse Miuga.
Ouvi falar disso, sim. Mas francamente titio, não se pode acreditar em tudo o que dizem por aí. Para o povo dessa região, quem promove festas com bebidas e danças tem pacto com satã. Ainda são muitos atrasados nesta parte do mundo!
Está sendo muito convincente, Kagome, mas, mesmo assim, não posso deixar que v�!
E vamos deixar que nos joguem na rua como cães, sem protestar? Alguma coisa tem que ser feita, tio, e é o que quero tentar!
Tenho certeza que a mansão dos Stanton não é lugar para você – disse ele dando alguns passos pela sala, atormentado.
Como sabe? Nunca esteve l�! – Kagome estava começando a ficar nervosa, porque tanto protecionismo? Ela não era mais uma criança, já podia se cuidar sozinha.
Mas as coisas que ouvi...
As coisas que ouviu! Ora, tio, o senhor leva muito a sério os boatos que andam correndo pela cidade, nós não temos outra opção e não se faça de santo querendo pregar o bem, pois lembre que é por sua causa que estamos nessa situação... – pronto havia feito tinha despejado tudo que estava entalado na sua garganta desde que soubera do ocorrido, sabia que não era certo despejar suas frustrações em seu tio, mas não agüentava mas todo esse diálogo puritano de quem sabe o que é certo ou errado, esquecendo que ele próprio foi um pecador, pois se rendeu ao vício dos jogos e levando sua família a ruína.
Você está certa, a culpa é toda minha, tens a minha permissão para ir falar com a duquesa... – disse Miuga dando-se por vencido
Então amanhã mesmo irei falar com a duquesa!
Continua...
