Feliz Aniversário

Eu preparei cuidadosamente esse momento. No instante que Severus me falou do plano de Voldemort para usar o jovem Malfoy contra mim, e de seu juramente a Narcissa, eu comecei a preparar esse momento.

Fiz Severus assumir a cadeira de Defesa Contara as Artes das Trevas. Eu sabia que a maldição atuaria levando-o embora, levando-o para longe de mim, mas que esplendido professor de DCAT ele se mostrou.

Não que eu não soubesse que isso aconteceria. Ele nasceu para ensinar. Se não fossem seus ressentimentos e mágoas ele seria o melhor professor que aquela escola já viu. Para os que conseguem ver além de sua postura amarga ele é o melhor dos Mestres.

Severus tem tanta coisa dentro de si, tanta beleza e sabedoria mescladas à raiva e à dor que nortearam seus passos na juventude.

Quando ele soube que eu teria de morrer para que pudéssemos impedir Tom Riddle eu vi sua raiva eclodir novamente.

Raiva por ser esse o único caminho, raiva por ser ele quem deveria me matar e raiva de mim por ter a crueldade de pedir isso.

Eu o amo tanto, e tantas vezes o feri por causa dessa guerra maldita. Não importa que eu me ferisse também, eu só gostaria de ter protegido Severus melhor.

E novamente ele foi o mais sacrificado. Coube a Severus a pior parte. Coube a ele o assassinato.

Nunca vou esquecer a expressão dele enquanto erguia a varinha para me matar. Tão firme, tão corajoso e tão leal. Seu amor o tornando capaz desse sacrifício.

Agora, mais de um mês depois, eu tenho de fazer Harry entender o que Severus fez. Fazer essa criança magoada entender que Severus me matou por lealdade.

No momento que percebi que nossa única saída seria essa eu comecei a planejar. Eu sabia que no momento que eu morresse um quadro surgiria na sala dos diretores, uma pintura com livre trânsito entre todos os outros retratos meus que já tivessem sido pintados. Por isso escolhi esse, o menor deles, para dar a Harry seu no décimo sétimo aniversário. Um vínculo de comunicação. Um canal para eu lhe contar tudo o que eu sabia até o momento da minha morte. Um conforto que eu neguei a Severus.

Já fiz discursos antes. Já tive de convencer pessoas outras vezes. Mas nunca precisei tanto conseguir tocar a alma de alguém quanto hoje.

Preciso fazer Harry entender que ele pode e deve confiar em Severus. Eu tenho de fazer o garoto que já perdeu tanto confiar no homem que pôs o Demônio na forma de um bruxo no rastro de seus pais. Eu preciso fazer com que ele entenda que Severus nunca imaginou as conseqüências de contar a Voldemort sobre a profecia. Eu preciso fazer Harry entender que Severus não é mais um comensal da morte, e que foi ao ver o que Voldemort preparara para os pais de Harry que ele percebeu o seu erro. Que foi a idéia de ver o próprio Harry morto que fez Severus atingir seu próprio limite.

Eu me pergunto se entenderia isso no lugar de Harry. Se eu me arriscaria a confiar no homem que ele viu matar. Se eu conseguiria passar por cima de um ódio mais velho do que eu mesmo. Tudo isso baseado apenas nas palavras de um velho em um retrato.

Harry terá de ser muito maior que eu jamais fui para poder entender que nossa única chance é trabalharmos os três juntos.

Eu preciso fazer Harry entender que ele deve proteger Severus agora que eu não estou mais entre os vivos. Eu sei que Severus vai cuidar de Harry como eu pedi. Mas não há ninguém velando por Severus. No final é sempre ele quem tem de ser forte por todos nós.

Na tempestade que se aproxima ele vai precisar de Harry. Eles vão precisar muito um do outro.

Eu vou ter de fazer Harry ver porque eu fiz Severus, e não Draco, me matar. Eu preciso que Harry honre o sacrifício que Severus fez por mim.

Levei um ano preparando o que vou dizer agora, um ano escolhendo argumentos e não me sinto pronto para confrontar Harry. Eu tenho medo.

Eu tenho medo por Severus. Eu tenho medo que mais uma vez seja ele o sacrificado.

Deposito minhas esperanças que Harry, tantas vezes ele mesmo sacrificado, entenda. Que passe por cima de sua própria dor.

Hoje Harry torna-se um homem perante a lei. Não vou mais usar de subterfúgios com ele. Toda a minha fé está que eu tenha julgado corretamente o caráter de Harry.

Eu sei o que Severus fará. Por desespero ele vai arriscar confiar em Harry, vai me dar mais um voto de confiança supondo que eu pude convencer o garoto.

Se julguei Harry corretamente ele vai passar por cima de tudo e lutar lado a lado com Severus. No entanto, se eu julguei mal, será Severus quem pagará pelo meu erro.

O feitiço que pus no pacote do presente me avisa que Harry o recebeu e que está abrindo.

Não há mais tempo para espera, não há mais tempo para preparação. É hora de abrir meu coração para Harry e confiar que as coisas dêem certo.

Confiar é a única coisa que realmente podemos fazer, em alguns momentos.

Me transfiro para o quadro que deixei como último presente para Harry, ouço o barulho da caixa sendo aberta e me deparo com os olhos dele, arregalados de surpresa:

-Feliz aniversário, Harry.