CAPÍTULO NOVE – Querido Diário

É interessante observar as peças que a vida nos prega. Se tivessem me dito há três meses que hoje eu estaria casada com Rony, seria mãe de dois filhos lindos e, principalmente, que estaria feliz com essa situação, eu não teria acreditado.

Não entendo como essa loucura aconteceu, e não há livro que possa me ajudar. Mas o mais impressionante é que não me importo muito com isso.

Estou aqui, com Rony e com as crianças, e eles são minha prioridade agora. Exatamente por isso, preciso tentar descobrir não o que aconteceu para que eu viesse parar aqui, mas como aconteceu. Como Rony e eu fizemos as pazes, e como chegamos a nos casar. Existia uma maneira de saber tudo isso. O diário que ficou esquecido na correria da viagem. Eu o guardei de volta no maleiro, e lá ficou até hoje, quando aproveitei que Rony estava ensinando as crianças a se equilibrarem em vassouras para pegá-lo novamente.

Peguei-o cuidadosamente e sentei-me na poltrona próxima à janela, de onde podia ver as crianças passando uma vez ou outra. Respirei fundo e o abri.

"Como pude deixar isso acontecer? Como pude realmente me apaixonar por Rony? Além de ser meu amigo, ele é um garoto chato, irritante, teimoso e insensível. Como poderíamos ficar juntos sendo tão diferentes?"

Sorri. Quarto ano, antes do baile de inverno. Quando descobri que Rony Weasley era mais do que um simples amigo para mim. Avancei mais algumas páginas.

"Harry está no Saint Mungus. Rony e eu pensamos que ele pudesse ter morrido, mas ele está aparentemente bem. Dumbledore não nos deixa vê-lo, mas garantiu que vai se recuperar. Rony e eu também nos machucamos, mas fomos mandados à enfermaria de Hogwarts, onde estamos agora. Ele está dormindo. Tive tanto medo de que algo acontecesse com ele. Felizmente tudo acabou bem."

Sétimo ano, quando Harry derrotou Lord Voldemort. Hoje não tenho mais medo de falar o nome dele, embora Rony não goste quando faço isso.

"Recebi uma carta de Vitor me convidando para passar as férias com ele na Bulgária. Acho que vou aceitar. Contei a Rony e Harry que talvez não ficasse na Toca com eles. Rony fez uma cena, insultando Vitor de tal maneira que eu mal acreditava no que ouvia. Se eu ainda tinha dúvidas de que iria passar o verão na Bulgária, Rony as fez desaparecer."

Eu me lembrava bem das férias na Bulgária. Foi o início do meu relacionamento com Vitor, e também o motivo da intensificação de minhas brigas com Rony. Quando voltei à Londres e contei a eles que estava namorando Vitor, qualquer conversa civilizada entre nós se tornou impossível.

"Rony não aceita meu relacionamento com Vitor. Tem me mandado corujas todos os dias dizendo que ele é um bruxo das trevas e que vai me provar isso. Não sei como pude gostar dele um dia. Rony é desprezível."

Mas ele estava certo. Vitor era um bruxo das trevas e só não me matou por causa de Rony. Por causa da noite em que o encontrei com este mesmo diário de capa vermelha e letra caprichada em suas mãos na casa de meus pais. Esse foi o principal motivo de nossa maior briga. Mas algo aconteceu de diferente. Algo me fez perceber que ele não queria bisbilhotar, queria apenas me proteger. Como sempre. E a resposta estava nas páginas seguintes, numa carta grudada com um clipe em uma das laudas.

"Hermione.
Sei que está brava comigo, e com razão. Eu não deveria ter feito o que fiz, invadido sua privacidade. Mas me preocupo com você. Não podia simplesmente deixar que aquele búlgaro fizesse o que planejava com você. Sei que você já é bem crescida para se cuidar sozinha, e por isso tentei te alertar várias vezes sobre o que eu havia descoberto no treinamento para aurores. Mas você realmente deve pensar que eu sou burro demais para saber algo que você desconhece, e por isso tive que agir, mesmo contra a sua vontade. E hoje vejo que valeu a pena, mesmo que você nunca mais queira olhar para mim. Você está bem, e é isso que importa. Aposto como já descobriu o que eu procurava no seu diário. Sempre o vi com ele, e sabia que era dentro desse livro de capa vermelha que você guardava suas cartas. Era atrás de uma carta do Krum que eu estava. Jamais imaginava que esse livro pudesse ser um diário. Mas não me arrependo, pois encontrei o que procurava. Vitor planejava te levar para um encontro em Hogsmeade, pelo que li na última carta dele. Era a informação que eu precisava. Uma fonte confiável disse que o que sobrou dos Comensais da Morte planejavam um ataque ao vilarejo em breve. Não preciso dizer mais nada, visto que você já deve ter ligado uma coisa com a outra. Era uma armadilha para chegarem até Harry. Se mesmo depois de ter esclarecido a situação, e Krum ter sido mandado para Azkaban, você não quiser falar comigo, eu vou tentar entender. Afinal, eu devo ser realmente muito burro para pensar que alguém inteligente e esperta como você pudesse algum dia vir a gostar de um idiota como eu. Se cuida.
R. Weasley"

Fechei o diário rapidamente. Não conseguia acreditar no que havia acabado de ler. Então foi por isso que ele mexeu nas minhas coisas. Simplesmente para evitar que eu servisse de isca para pegarem Harry. Como eu fui estúpida! Certamente Rony realmente escreveu essa carta... mas eu não a abri. Depois que Vitor foi para Azkaban, a última coisa que eu queria era falar com Rony. Estava com raiva por ele ter lido o que não podia e com medo por ele provavelmente ter descoberto meus sentimentos. Mas, mais do que tudo isso, eu não queria admitir que estava errada. Não queria admitir que Rony passara meses me alertando sobre Vitor e eu simplesmente não ouvi. Não queria admitir que Rony era quem tinha razão, e não eu.

Fiquei sentada ali não sei quanto tempo. Como as coisas poderiam ter sido diferentes se eu não tivesse sido tão orgulhosa. Seria diferente se eu tivesse acreditado em uma pessoa que sempre tentou me proteger, mesmo que fosse de uma provocação idiota do Malfoy ou alguma ofensa sutil de Snape.

— Ei, Mione. Quer dar uma volta?

Era Rony na janela, com Diana agarrada a ele, segurando a varinha de brinquedo que Mavvle mandara para mim. Respirei aliviada. Era bom ver o rosto dele. Sorri e fechei meu diário, indo em direção a eles.

— Vou preparar o jantar. Não vá muito alto com eles, Rony. É perigoso, você...

— Sim, eu sei. Não vou fazer besteiras, não se preocupe.

E saiu voando, enquanto eu descia em direção à cozinha. Enfeiticei algumas batatas, e estava preparando a panela para fazer o cozido quando ouvi uma voz. Era Mavvle.

— Chegou a hora, Hermione. Você já teve sua amostra.

— Do que está falando?

— Que você teve uma amostra de como sua vida poderia ter sido.

Me segurei na pia, me esforçando para não acreditar no que ele dizia.

— Então é isso? Você vem e bagunça toda a minha vida, e agora me diz que foi só uma amostra? Isso não é justo e você sabe disso!

— Nem tudo no mundo é justo, Hermione. Veja por você mesma. Agora eu preciso ir. Até breve.

Ele desaparatou. E eu decidi não acreditar em uma só palavra do que ele disse, embora elas insistissem em ecoar pela minha mente durante o jantar. Fui me deitar mais cedo. Rony veio logo em seguida, e sentou-se na cama a meu lado.

— Ei. O que houve?

— Nada... Por quê?

— Porque você estava estranha. Problemas na loja?

— Não. Só estou um pouco indisposta.

— Hmm... Erm, Mione... Você se importa se eu e as crianças jogarmos um pouco de quadribol amanhã? É domingo, Fred virá passar o dia conosco, e Eddie está louco para tentar capturar um pomo de ouro de verdade!

— Eu sabia que toda essa preocupação comigo tinha um fundamento... Rony, você sabe como isso é perigoso. E se Eddie cair da vassoura? Ah, não, por que acha que nem alunos do primeiro ano em Hogwarts podem jogar quadribol? Não, Rony, é muito perigoso.

— Hermione, eu também me importo com nossos filhos. E Eddie não vai cair da vassoura, ele já consegue se equilibrar muito bem.

— Por que não dá um livro pra ele ler? É bem mais produtivo! E então quando ele entrar em Hogwarts terá aulas de vôo com um professor competente e...

— Ah, então quer dizer que eu não sou bom o bastante pra ensinar meu filho a voar?

— Não, Ronald, não foi isso que eu quis dizer! Não coloque palavras em minha boca!

— Eu não sou burro, Hermione, apesar de você pensar o contrário.

— Eu não acho que você seja burro, Ronald.

— Então acha que eu sou um pai incompetente que não consegue nem ao menos ensinar o filho a voar.

— Não, eu não acho isso. Quer saber? Faça o que você acha melhor! Não me importa.

— Certo então.

— Certo.

Ele saiu do quarto, de cara fechada. Eu apaguei as velas e tentei dormir, mas foi em vão. Cerca de uma hora depois Rony voltou, e eu fechei os olhos. Não queria discutir com ele novamente. Ele se aproximou de mim, ajeitou o cobertor e me deu um beijo na testa. Deitou-se a meu lado e eu adormeci pouco tempo depois.