- Mãe.. – eu pisco meus olhos duas vezes sem acreditar no que eu estava vendo.

- Hum.. – eu murmuro alguma coisa e a sinto entrar por baixo dos lençóis me abraçando forte subindo por cima do meu corpo.

- Mãe.. – ela insiste. – onde esta o meu pai?

Eu abro os meus olhos, olho par ao relógio, cinco da manha. Definitivamente.. minha filha tinha algum problema com horários. Me ajeito na cama e envolvo o meu braço trazendo-a para mais perto de mim.

- Papai? – eu repito olhando para ela. – Deve estar chegando do trabalho..

- Ahhh.. – ela reclama me abraçando mais forte – eu queria tanto falar com ele...

- Falar? – eu tiro os cabelos que teimava em cair nos seus olhos.

- Sim... coisas.. se é que você me entende...

Eu sorrio para minha filha. Nossa... definitivamente, eu acho que nasci para ser mãe. Minha filha era a mais linda, mais doce, mais engraçada de todas. Ela tinha quase quatro anos e era incrivelmente inteligente. Julie começou a engatinha quando ainda ia completar seis meses. Com dez ela já estava andando de um lado para o outro. Assim que fez um ano e um mês pronunciou a sua primeira palavra. "Mamá". John ficou morrendo de ciúmes e passava horas e horas com ela tentando com que ela aprendesse a também chama-lo.

E quando ela o fez foi a maior felicidade do mundo. Só faltou estampar nos jornais como noticia do ano. Hoje eu olho para ela. Como o tempo passa voando. A pouco tempo atrás ela mal parava deitada e hoje fica correndo de um lado pro outro atrás do Carby (tive que me acostumar com o nome do cachorro.. não teve jeito de mudar isso).

- Mãe...- eu a escuto chamar de novo. Ela olhava pro teto e balançava as pernas assim como eu o fazia na idade dela. E diga-se de passagem, continuo fazendo até hoje.

Mas quando ela falava "mãe" desse jeito nos últimos tempos, eu nem precisava perguntar o que ela queria.

- Não precisa nem dizer, Julienne...- eu disse, me apoiado no cotovelo esquerdo para olhava de frente- "quanto falta para o meu aniversário?"- eu imitei a voz dela, fazendo-a rir imediatamente. Ela sorria quase todo o tempo. Poderia jurar que nunca vi criança tão feliz em toda a minha vida...

- Como você adivinhou?- ela diz, toda empolgada, se jogando por cima de mim.

- Mágica...- eu sorrio e ela me mostra a lingua.

- Mentira! - ela começa a rir e a fazer cócegas em mim, me trazendo o mesmo efeito - papai disse que você não faz mágica...- ela baixou a cabeça um pouco e completou a frase, que eu pude ouvir em alto e bom som- apesar de algumas vezes ser bruxa- ela ainda soltou um risinho e eu não me dei por vencida.

- Que foi que você disse?- eu disse o mais "brava" possível - eu escutei, hein?- eu já me preparava pra revidar as cócegas, quando vejo um vulto na porta. Meu maridinho havia chegado.

Viro para Julie e falo para ela fingir que estávamos dormindo. Logo ela fecha os olhos (que não enganavam ninguém, mas o que valia era a intenção) e eu faço o mesmo.

- Mulheres.. cheguei.. – eu o ouço falar da porta do quarto e espero ele se aproximar para dar um susto nele junto com Julie. – Mulheres? – ele insiste e vem se aproximando.

Antes que eu pudesse fazer qualquer coisa Julie começa a rir desesperadamente alto e eu sinto John pulando por cima de nós tentando se aproveitar daquele momento para faze-la rir ainda mais.

- Bom dia.. – ele se aproxima me dando um beijo breve. Nós no afastamos e eu percebi o cansaço nos seus olhos. Já era hora de Julie dar adeus ao nosso quarto para deixar o seu pai descansar.

- Bom dia.. como foi o trabalho?

Ele se levanta da cama ainda sorrindo e se senta na ponta tirando fora os seus sapatos.

- Correria como sempre.. final de turno sempre aparece alguma surpresa...

- Paaaaaaaaaai – de repente Julie se manifesta de novo e pula nas costas de John se agarrando ao seu pescoço. – o que você trouxe de presente pra mim hoje!

- Papai hoje não teve tempo de comprar nada... mas eu prometo que amanhã eu trago algo bem legal pra você.

Ele nem se virou quando prometeu isso a ela. Já sabia a cara de reprovação que iria enfrentar. A nossa vida financeira não era a mil maravilhas. Eu não me sentia bem tirando dinheiro da Fundação Carter. Mandei ele guardar o que fosse gastar agora com besteira para os estudos de Julie e dos outros herdeiros (ainda estávamos estudando essa possibilidade para quem sabe daqui a alguns anos).

- Julie - bom, já que ela tava de cara feia, piorar não faria mal - você quer dormir mais um pouquinho ou já quer tomar banho?- ela fez bico e não respondeu nem uma coisa nem outra. Desceu da cama e foi para o quarto. - Mimada demais... - eu disse em voz alta. Não era perfeita, como ninguém. Teimosa que só ela... Me lembrava "alguém".

- Nem vem falar que a culpa é minha... - ele finalmente deita na cama, com aquele risinho cínico. Bom, melhor esquecer.

- Vai tomar banho ou quer dormir?- eu pergunto, arrumando a cama pra ele descansar.

- To louco por um banho... mas essa caminha tá tão gostosa- ele alisa o lençol...- tão quentinha...com seu cheiro...

Ixi! Devia estar querendo alguma coisa. Esses dias nós não estávamos tãaao bem assim. Tudo era perfeito, mas atritos entre marido e mulher acontecem em qualquer lugar do mundo e não seria diferente aqui.

- Ok, durma primeiro então...vou arrumar Julie e levá-la pra escola- nisso eu já estava vestida, colocando o tênis e pegando o casaco. Ia saindo pela porta, quando ele me chamou de volta.

- Ei...não ganho um beijo não?- ele disse, quando chegou o rosto perto do meu- eu beijei -o de leve e sai em seguida, deixando o quarto escuro para que ele pudesse dormir até quando tivesse vontade.

Andei ate o quarto de Julie e bati na porta que estava recostada. Fui entrando devagar e a vi sentada na cama penteando o cabelo da boneca.

- Eu não vou dormir mais.. – ela fala sem me encara enquanto mexia na boneca.

- Nem vai dar tempo.. você vai ter que se arrumar.. você tem aula. E daqui que tome banho, coma e se vista chegou a hora de ir.

Ela faz uma careta e eu me aproximo sentando ao seu lado na cama. Ela logo se vira me encarando e dando um sorriso grande. Eu já sabia o que ela queria.

- Ela pode tomar banho comigo!

- Mas de novo? – eu pego a boneca vendo que era a mesma que tomava banho sempre com ela.

- Dei de comer e ela se sujou toda... parece um bebê.. - ela falou entregando a boneca para mim para que eu averiguasse se ela estava suja. - Pode? - ela pergunta de novo quando percebe que ja tinha dado temtpo de decidir aquilo.

- Se você prometer não demorar nadinha eu deixo..

Ela sorri e pula para me dar um abraço. Eu tiro o tenis que havia calçado e a ajudo a toma banho. Ela tirou a camisola, colocou por cima do travesseiro e ficou desfilando de calcinha de um lado para o outro enquanto eu ajeitava as coisas no banheiro para ela.

- Julie.. - eu a chamo e logo ela corre com a boneca nos braços e se agarra em uma das minhas pernas.

- Banho quente né?

Eu aceno sorrindo e ela senta a boneca em cima de um móvel enquanto tirava a calcinha. Sentou para fazer xixi e logo pegou a boneca de novo e foi entrando no box esperando que eu ligasse a água para ela.

Eu a puxei um pouco pra trás para que a primeira leva de água, que era gelada, não caísse nela. Quando senti a água já quente, a pus pra debaixo da água. Lavei a cabeça dela, porque isso ela não fazia direito nem com reza. Sempre deixava resto de condicionador ou xampu mesmo. Terminei e dei o sabonete a ela. Como ela mesma dizia, já era um "mocinha" e sabia tomar banho sozinha.

- Cuidado aí, hein? E não fica brincando demais que temos hora...- eu disse antes de sair do banheiro. Fui até o quarto e separei a roupa da escola. A calcinha nova e a meia branca, junto com o tênis de velcro. Olhei o criado-mudo, que tinha uma fotos de nós três em um parque, há uns meses atrás. Eu não podia reclamar, éramos realmente felizes.

- Mãaaae!- escutei ela berrar do chuveiro. Ainda bem que eu tinha fechado as portas dos dois quartos. Caso contrário, ela já teria acordado Carter. Fui para o banheiro e ela já havia saído. estava sobre o tapete, em frente ao vaso sem poder agarrar a toalha ou fechar o chuveiro. Sorri a imagem dela toda encolhidinha de frio.

Peguei logo a toalha e a enrolei. Fechei o chuveiro e ela foi andando correndo para o quarto e pulou em cima da cama, para ficar da minha altura. Passei a toalha pelo corpo todo rapidamente enquanto ela tremia os dentes de frio. Eu abri a calcinha e ela pos as perninhas dentro. Subi a peça e abri agora a camiseta, que ela colocou rapidamente também.

Eu nem precisei pedir, e ela já deitou na cama e esticou o pé para que eu pudesse colocar a meia. Em seguida pus a calça e ela sentou par eu poder pentear o cabelo enxarcado.

- Faz trança? – ela se vira quando eu havia pegado a liga de cabelo para fazer um rabo-de-cavalo.

- Então esperamos secar um pouco... – eu termino de pentear o seu cabelo e logo coloquei o tênis no seu pé.

- Posso comer panqueca? – ela pula da cama e vai andando ate o banheiro provavelmente atrás de sua boneca.

- Vamos ver Julie... o que você esta fazendo ai! – eu tento me esticar todinha para ver o que ela aprontava e logo ela apareceu segurado a boneca que molhava o chão inteiro. Eu respirei três vezes antes de brigar com ela.

- Ela vai ficar doente.. você deixar eu dar remédio pra ela?

Mas era impossível brigar com ela. A cara de preocupação dela com a boneca era tão seria que me dava vontade de rir.

- Se ela ficar com febre nós aplicamos uma injeção nela...

Logo ela sorri e envolve sua "filha" em uma toalha deixando-a na cama.

- Mamãe vai comer e volta já... a vovó vai fazer o meu café.. depois trago o seu.. durma um pouco.. – ela termina de ajeita-la e vai me seguindo para descer as escadas. Esses degraus eram um perigo. Eu evitava ao Maximo deixa-la descer sozinhas as escadas. Sempre a acompanhava evitando que algum acidente acontecesse.

- Leite com chocolate ou cereal? – eu tiro o leite da geladeira e deixo na mesa. Enquanto isso ela ia se sentando e observando o que eu fazia.

- Com chocolate... – ela sorri – e pra comer tem o que?

- Pode ser sanduíche de queijo... ou de requeijão... torrada com o que você quiser... você decide..

- Hum.. – ela coloca a mão no queixo, faz uma cara de pensativa e sorri sem saber o que responder. Eu já sabia que o que eu desse ela iria adorar.

- Quero panqueca!- ela gargalha e eu me desespero. Todo mundo naquela casa sabia o quão ruim eram as minhas panquecas, até o cachorro.

- Julie, deixa pra amanhã, vai? Ai o papai faz pra você...- eu pedia quase de joelhos. Além de não saber, eu não tinha a menor paciência para fazer as tais panquecas.

- Ah, mãe - ela me lança aqueles olhos de cor de jabuticaba e eu quase tenho um treco.

- Tá! Tá bom!- eu digo indo pegar os ingredientes. Fosse o que Deus quisesse - mas aí vai ter que comer, hein? Não adianta falar que tá ruim...- ela riu pra mim e se acomodou melhor na cadeira, assistindo eu me atrapalhar toda ali na cozinha.

Dez a zero para a panqueca, finalmente consegui finaliza-la. A aparência não estava lá muito boa, mas talvez estivesse "comível". Pus no prato e o pus n frente de Julie. A feição dela logo murchou, mas olhou pra mim, e manteve o sorriso e a empolgação de experimentar.

Eu cortei pra ela e dei um pedaço na boca. A cara dela foi, literalmente, de quem "comeu e não gostou".

- Ok, eu disse... eu avisei...- eu sorri, vendo o esforço dela em engolir. Comi um pedaço e confirmei quão ruim tinha ficado - desculpa...mamãe tentou... - ela sorriu, engolindo quase meio copo de leite por cima.

Logo um outro café estava posto a ela e esse ela comeu com gosto.

Ela me ajudou a levar as coisas para a pia e tornamos a subir as escadas para pegas suas coisas e para que ela escovasse seus dentes. Ajeitei a pasta na escova e ela se apoiou na pia enquanto abria a boca para que eu escovasse os seus dentes.

- Abre mais a boca Julie..

Ela teimava em morder a escova sempre que eu começava a fazer aquilo. Logo havia terminado e ela cuspiu a pasta na pia e bocejou com água jogando o resto fora. Ela sorriu quando havíamos terminado tudo e saiu correndo para o seu quarto, provavelmente atrás de sua filha.

- Ela pode ir estudar hoje mãe!

- Não.. hoje ela fica..

- Mas.. – ela já ia reclamar e eu fiz minha cara de "poucos amigos" que ela deveria já estar familiarizada. Ela sentou na cama, ajeitou a boneca bem sentada e deu um beijo nela voltando para pega sua mochilinha, colocando-a nas costas. - Ajudaaaa – eu a vi ficar toda embaralhada com que estava fazendo e me abaixei ajeitando-a nas suas costas.

- Vamos? – eu sorrio vendo-a pegar sua pasta e ela sorriu na minha direção.

- Cadê a minha trança?

Olhei para baixo e logo meu sorriso sumiu. Eu ainda tinha que fazer a trança qu eu sei que não voltaria viva ate o resto do dia.

- So se você prometer não desmancha-la... – eu já fui pegando um pente e uma liga para prender o seu cabelo.

Fiz a trança sem maiores dificuldades antes de prender a ponta com o lacinho.

- Pronto...- ela levanta prontamente- vamos, vamos...- eu digo, apressando-a para baixo.

Enfim estávamos prontas no carro. Iria deixá-la na escola e voltar para casa. Daria tempo de conversar com Carter sobre algums detalhes da festinha dela antes de entrar no plantão das duas da tarde.

Desci do carro e fui até o bandio de tras, tirar Julie para sair.

- Vamos...- eu disse, vendo a manha começar a chegar. Ela geralmente fazia isso na hora de entrar na escola, ms depois não queria sair mais - vamos, filha. Mamãe vai se atrasar...- ela continuava bicuda com os bracinhos cruzados.

- Nãaaao - ela olha pra mim com os olhinhos pesados.

Certo, o jeito ia ser o mesmo de sempre. Coloquei meio corpo pra dentro do carro e fui colocando a mão por debaixo dos seus braços. Tirei-a com cuidado. Manhosa desse jeito, só ficava no colo. Ela não era tão levinha.

Às vezes eu achava que não agüentaria. Minhas costas doíam num ponto...Mas eu sempre arrumava forças não sei de onde. Levei Julie até a professora, que a pos no chão imediatamente. Eu me ajoelhei no chão e dei um beijo na testa dela, enquanto ela me dava um de seus abraços apertados.

Eu nem olho para trás para não ter que encara aqueles olhinhos tristes. Sai direto para casa. Iria preparar um almoço bem gostoso para que meu maridinho comesse. Quem diria, eu cozinhando? Fora as panquecas, até que algumas coisas minhas davam para o gasto. Passei primeiro no supermercado e procurei pelas coisas que estavam faltando em casa. Fui ao açougue, comprei filés de frangos temperados e cortados e voltei para o carro indo diretamente para casa.

Continua...