Subi até o nosso quarto e dei uma conferida para ver se ele havia dormido. Oras se não. Dava para ouvir o ronco do corredor. Entrei no quarto e me troquei rapidamente com cuidado para não acorda-lo. Fui ao quarto de Julie, limpei a bagunça, enxuguei o chão do banheiro e desci as escadas.

Aproveitei aquela manhã para fazer uma boa faxina. Nem sei quando eu teria tempo para fazer outra. A faxineira que vinha toda semana era mesmo que nada. Parecia que espanava tudo ao redor dos objetos.

No estado que eu fique (toda suada, suja e o que mais fosse) fui a cozinha começar o almoço. Coloquei arroz pra cozinhar, fiz alguma salada ajeitei o frango para fritar depois e preparei um suco de laranja para beber. Julie vivia gripando e o jeito era enche-la de vitamina C para evitar essas crises.

Sentei no sofá da sala e olhei para o relógio. Ainda eram onze horas e eu não tinha mais nada a fazer. John devia estar no quinto sono, Julie não estava aqui para eu brincar com ela e o que me restava era assistir um pouco de televisão.

Passei pelos canais até achar um filme. Ação...a essa hora da manha? Não, obrigada. Comédia? Não tinha força nem de chorar nem de rir, portanto dramas também estavam excluídos. Se fosse pela minha seleção, terminaria a manhã vendo a Sessão "Sex Time".

Desligo a TV, procurando outra distração. Ligo o rádio... Só aquela bateção... "tecno". Não já faz mais rock, não! Rock dos bons, que nem os da minha época... Desligo esse também. Vago pela sala até achar o caderno que estava fazendo as anotações para o aniversário de Julie.

Olhei o valor que fechamos primeiramente.

De jeito maneira! Muita grana...Queria tudo do bom e do melhor pra pequena, mas esse dinheiro seria muito melhor investido em roupas, calçado e besteiras pra ela comer, do que alimentar pessoas que há anos não víamos e muitas eu nem ao menos conhecia. Fui olhando o papel e cortando tudo o que eu poderia. Carter que me desculpasse, mas teríamos que cortar a grana pela metade.

Fiz a nova conta, um preço bem mais acessível. Pus a folha na mesa e voltei para a cozinha, terminando de fazer o meu almoço. Ainda tinha de tomar banho e passar no banco pagar umas contas antes de ir trabalhar.

Subi as escadas e voltei diretamente para o meu quarto. Olhei para a cama e ainda o vi dormindo. Eu iria tomar banho para depois acorda-lo. De qualquer forma ele que iria pegar Julie na escola.

Recostei a porta do banheiro e joguei a roupa que vestia dentro do cesto de roupa suja. Liguei o chuveiro e logo tomei um banho demorado. Não saberia que horas iria tomar um outro desses hoje. Saí do banheiro, me enrolei na toalha e fui ate o quarto pegar uma lingerie para vestir.

Abri a gaveta e peguei a primeira calcinha que vi. Logo estava quase toda vestida e John nem se movia. Vesti minha calça e sentei na cama para me calçar. Quando vi que o processo de acordá-lo iria demorar, logo tratei de começar com aquilo, afinal já eram quase uma hora e eu ainda precisava almoçar.

Me sentei na cama e coloquei uma mão no seu ombro balançando-o de leve. Me doía ter que fazer aquilo. Eu sabia como era chegar cansado de um plantão noturno, mas o jeito era fazer isso. Agora tínhamos responsabilidades, e quando não era mamãe, tinha que ser papai.

- John.. o almoço esta pronto... – eu comecei com um sussurro que foi aumentando conforme aumentava os meus "apelos" para acorda-lo. – John.. John.. JOHN CARTER!

- Quê?- ele finalmente acordou e me olhou com o canto dos olhos, assustado como se o mundo estivesse acabando.

- A hora John...- eu digo, já indo para o outro lado do quarto pegar a pasta de papéis que teria de levar pro trabalho. Malditos relatórios- vamos almoçar?

- Já?- ele volta a deitar a cabeça no traveseiro e dá um longo bocejo..

- Tenho hora, John- eu comecei a ficar nervosa com aquela moleza, afinal de contas, ele sabia que eu ia trabalhar e sabia o quanto eu iria escutar se chegasse atrasada...Mais uma vez- vai almoçar comigo ou não?- eu perguntei, já com metade da paciência perdida. Alguns dizem que paciência é um brinde que você ganha no casamento... No meu caso, acho que descontaram, isso sim.

- Vai descendo...- ele disse, notando mo meu tom de voz "ligeiramente" alterado.

Ok, se ele pensou que eu ficaria com dó, realmente. COITADO. Não me fiz de rogada e dei meia volta, descendo rapidamente pelas escadas. Às vezes eu tinha a impressão de que ele me provocava.

Cheguei a cozinha, e a fome evaporou. Olhei para aquela comida e nada me apetecia. Olhei para o relógio: 13:40. Eu não daria sorte ao azar. Peguei a bolsa na sala, dei uma olhada no espelho pra ajeitar o cabelo. Pensei em sair do nada, ou apenas eixar um bilhete, já que não via nenhuma movimentação no andar de cima da casa, mas eu não queria comprar essa briga.

Subi as escadas de volta e entrei no quarto e ele ainda se espreguiçava, já de pé, do lado da cama.

- To indo...- eu disse, apenas com meio corpo aparecendo na porta.

- Já comeu?- ele pergunto surpreso.

- Depois eu como qualquer coisa...- eu disse, passando mão no olho- não vai esquecer a menina na escola, hein?

Ele me deu o olhar mortal tipo "eu não sou idiota"...ou seria aquele "que tipo de pai você acha que eu sou?". Ele passou as duas mãos no rosto e quando viu que eu não estava de brincadeira tratou de correr atrás de mim nas escadas.

- Eu posso te deixar no trabalho.. isto é.. caso você queira... – eu parei em frente a porta da sala e o encarei ainda de pijama, com cabelo assanhado e com os olhos os olhos ainda cerrados de sono.

- Eu dirigindo chego mais rápido.. obrigada de qualquer forma... – eu abro a porta da rua e ele se aproxima se escorando na mesma.

- Esquecendo de nada não? – ele grita quando eu já estou no meio caminho até o carro.

- Mais tarde John.. – eu sorrio e entro no carro dando a partida. Ele não tinha jeito mesmo. Não importa o quão brava eu ficava com algumas coisas que ele fazia, no final ele sabia a forma certa de me arrancar um sorriso e fazer o meu humor melhorar.

Cheguei sem demora ao County. Estacionei meu carro, comprei um "bagulho" pra comer no Jumbo Mart e entrei correndo no hospital. Cinco minutos de atraso de vez em quando não matava ninguém. Guardei as coisas na SDm e dei um tempo para engolir tudo aquilo. Trabalhar de barriga vazia não era nada agradável.. ainda amais quando começavam a vir aqueles casos que embrulhavam o nosso estomago.

- Atrasada.. – eu olho para a porta e vejo Susan cantarolando na porta. – como eu sou uma boa chefe.. vou deixar você engolir isso.

Ah.. tem outra coisa que tenho que agradecer na minha vida. A minha chefe é minha melhor amiga.. portanto.. tudo ficava mais fácil para o meu lado

- Culpa do John...

- Sempre a mesma desculpa né Abby! Eu sei muito bem essa culpa do John.. – ela piscou e eu não me contive e comecei a rir da insinuação.

- Quem dera fosse.. – eu terminei de comer e joguei o papel no lixo. – esses dias enm tempo direito pra fazer isso nós temos.. esses plantões trocados quebra as pernas de qualquer um

- Não é minha culpa...- ela se defende.

- Ah, não! Magina! É culpa de quem?- eu a encurralo.

- " Do John"- ela ironiza e nós duas caímos na risada. Não poderia ter trabalho melhor, creio eu. Aqui eu estava a tanto tempo, conhecia, bem ou mal, a todos. Gostava, muito ou pouco, de todos. Ali eu me divertia muito, apesar de tudo.

Convivia com pessoas maravilhosas e ainda podia trabalhar ao lado do meu marido (se é que permitissem isso de vez em quando).

Susan logo saiu, alegando um trauma a visa. Eu terminei de comer e fui pegar minhas coisas para trabalhar. Algo me dizia que iria ser um plantão cheio e conturbado.

...E foi. Oito horas depois pego o meu carro e tomo o meu rumo pra casa. Provavelmente Julie ainda estaria acordada mês esperando. Não entendia bem o "porquê" dela só conseguir dormir quando eu estava em casa. Talvez ela tivesse medo de mim, mas alguém tinha que ser o "homem" da casa. John babava muito em cima dela, fazia muito as suas vontades. Cabia a mim sempre cortá-las e deixar o essencial

Chego em casa vendo somente a luz da cozinha e do meu quarto acesa. Entro sem fazer barulho, deixo as coisas na mesa da sala e subo as escadas procurando pela minha família.

- Mãeeee! - eu mal adentro o quarto e logo sou surpreendida com aquele pingo de gente pulando no meu colo.

- Mamãe ta toda suja.. espera tomar banho que jájá fico com você...

Olho para cama e vejo John sorrindo segurando o controle remoto. Ele me chama com "seu olhar" e eu me aproximo beijando-o.

- Comeu alguma coisa?

- Enrolei qualquer coisa... - eu me afasto dele, Julie senta no seu colo e enquanto isso ia tirando minha roupa para tomar um banho.

- Estávamos esperando por você.. - Julie fala e eu me viro vendo John sorrindo.

- Julie ainda não Jantou? – imediatamente ela olha pra ele, olha pra mim e trata de vir correndo na minha direção impedindo que eu brigasse com ele.

- Eu pedi, mãe...- ela olha para cima, me encarando- queria te esperar-ela me joga aquele sorriso lindo que de mim ela não tinha herdado.

- Ok, então vamos jantar primeiro...você não pode ficar sem comer até uma horas dessas- eu peguei uma camiseta qualquer e vesti de novo, já que já tinha tirado toda a roupa. Eu não agüentava ficar com aquele cheiro de hospital em casa, mas ela não ficaria sem comer, não.

John levantou e ela pulou da cama, descendo as escadas rapidamente.

- Devagar, Julienne...- eu disse, mas ela já estava lá embaixo. Carter pegou minha mãe e nós descemos mais devagar, chegando a cozinha sem demora.

Fiz um prato de salada pra mim, enquanto esquentava o frango deles. Julie não era muito fã de carne vermelha, o que eu e John achávamos até bom. Fiz os pratos e Julie pediu para ligar a TV da sala enquanto comíamos. "Meninas Super Poderosas" a uma horas dessas? Ok, talvez crianças dormissem mais tarde agora.

Comemos lentamente. Eu estava azul de fome. Aquela droga que eu usei pra "tapar o buraco do estômago" do almoço deve ter feito é um buraco nele. Nada como comida... A minha comida que com o passar do tempo ficou cada dia menos ruim. Como dispensamos a diarista, eu comecei a fazer a comida da semana. Eles tiveram de se acostumar, e eu, me aprimorar.

- Quero mais não.. - Julie logo afasta o prato e antes que eu pudesse reclamar ela sai correndo para terminar de ver seu desenho na sala.

- Não toma jeito mesmo.. - Carter fala colocando o ultimo pedaço de frango na boca - as vezes parece tanto com alguém que conheço..

- Vou fingir que não ouvi isso e vou terminar meu jantar...

Ele sorri e se levanta da mesa levando as coisas para a pia. Antes que eu falasse qualquer coisa, ele toma a iniciativa e começa a limpar as coisas. Ainda bem que o meu maridinho me entendia.

- Quer mais alguma coisa Abby? - ele se aproxima vendo meu prato limpo e eu aceno pegando o copo de suco.

- Mais tarde.. - eu torno a relembra-lo e ele sorri balançando a cabeça e puxando a cadeira para sentar ao meu lado. - Como foi o seu dia?

- O de sempre.. sem novidades.. você viu o que eu deixei pra você analisar?

- Analisar? - ele me encara sem saber ao certo do que se tratava.

- Contas de aniversario - eu sussurro evitando com que Julie ouvisse. Porque caso acontecesse, ela viria correndo pedir tudo e estragaria meus planos.

- Ah...- a expressão desanimada toma conta dele- não. Mas você vai insistir nisso?

- Nisso o que?- eu me pergunto- evitar desperdício de dinheiro?- eu arqueio as sobrancelhas.

- Privar Julie do que ela merece e precisa...- ele diz, todo certo de si.

- Não venha com essa Carter...Podemos muito bem dar um festa bonita e perfeita sem ter que encher o estomago de meio Chicago.

Ele olha pra cima como eu sempre faço. É, talvez o casamento realmente faça com que um peque algumas manias do outro.

- Não vou discutir isso...- ele disse, já todo magoado. Ótimo, já vi que seria mais uma noite que pararíamos no "boa noite".

- Não, não vai mesmo. Quantas vezes já falamos sobre isso?- eu perguntei, levantando da mesa e indo até o armário. O jeito era se contentar com chocolate.

- E quantas vezes eu já disse que isso tá errado...- ele disse, no tom calmo usual.

- "Isso" quer dizer "eu", né?- eu perguntei, percebendo o recado implícito.

- Não deturpe as coisas, Abby... Por Deus, não começa...- como ele mantinha sempre o mesmo tom de voz? Eu já tinha aumentado e depois abaixo, por perceber a presença de Julie inúmeras vezes e ele lá na maior calma do mundo.

- Olha, quer saber?- eu perco as estribeiras com aquela discussão inútil- FAZ O QUE VOCÊ QUISER! O dinheiro é seu mesmo, não é?- eu o vejo olhar pra sala, mas Julie ainda estava concentrada em Florzinha, Docinho e... Ah, sei lá o nome da outra!

- Para com essa criancisse, Abby...- ele disse, num tom mais calmo, se fosse possível, ainda sentando na messa.

- Criancisse?- eu me segurei para não brigar mais na frente dela- olha, eu vou tomar meu banho!- eu sai batendo o pé. Subi as escadas...Eu só queria o meu banho! Era só o que me faltava!

Entrei no quarto, me tranquei no meu banheiro e tomei o banho mais demorado dos últimos tempo. Sai, me enxuguei, sequei o cabelo e so assim que eu decidi sair de novo pro quarto.

Olho ao redor e não o vejo. Talvez seja melhor assim. Quem sabe ele esteja refletindo sobre o que falamos e deixe de ser tão cabeça dura e aprenda a meu ouvir. Visto minha camisola e vou direto a cama. Dormir antes dele voltar seria o melhor.

Seria melhor evitar uma reconciliação agora. Porque eu sei que se eu cedesse ele iria achar que eu estava voltando atrás e que não tinha razão em nada do que eu disse.

Passei meus cremes, me ajeitei na cama e apaguei as luzes. Com certeza dormir seria a melhor solução.

Continua...