Não demorou para que chegássemos a escola de Julie. Ele mesmo desceu do carro, a colocou no chão e a levou até a sala de aula. Enquanto isso, aproveito para ver se havia pego todos os papeis que iria ter que entregar hoje no hospital.

Logo ele volta para o carro em silencio, não fala nada e torna a tomar um rumo ate o hospital.

No meio do caminho, quando paramos em um sinal. Ele desliga o som e vira o seu olhar pra mim como se estivesse esperando algum pedido de desculpas ou qualquer palavra.

- Vai falar comigo mesmo não?

- Como? – eu tiro meus olhos dos relatórios e o encaro enquanto ele tornava a seguir com o carro.

Ele novamente não me responde e eu não puxo assunto. Chegamos ao hospital, estacionamos o carro e fomos andando até a SDM deixar as nossas coisas. Feito isso, visto o meu jaleco e saio andando atrás de começar o meu plantão. Se ele quer manter esse clima o problema é dele. Eu que não vou "babar o ovo" de ninguém.

Pego as fichas e começo o longo plantão que teria hoje. Pra começar uma mulher com dor de cabeça? Bico! Se bem que acho que absorvi um pouco da dor da paciente. Um pouco não. Toda, eu diria. Parto para a segunda do dia, com um garotinho com um corte na mão? Difícil? É, talvez o plantão não fosse tão duro quanto pensei que seria.

Ok, tudo muda. O casos foram progressivamente se complicando. E, a propósito, minha cabeça começando a latejar cada vez mais. Atendi um Trauma duplo...Além de morta de cansaço, aquela dor e mal-estar. Jurario que nuunca havia trablhando tanto na minha vida. E só de pensar que teria de ir pra casa e aguentar aquele clima, já até fazia com que tudo piorasse.

Por falar nele, quase não o vi em todo o plantão. Trabalhei mais com Luka, que por sua vez estava animadíssimo com a idéia de ter um filho. Ele e Sam tinham decidido e agora tentavam,pelo terceiro mês consecutivo, "engraidarem".

Quando dei por mim e olhei no relógio, já tinha passado hora do almoço, "break" e o diabo à quatro. Não sei se o que doía mais era meu estômago de fome, a minha cabeça ou o corpo todo, principalmente as costas. Estava quase na hora de pegar Julie na escola e eu já estava cega de dor.

Atendi meu ultimo paciente e fui tomar algum remédio para dor generalizada. Me sento no sofá tentando preencher um ultimo relatório mas minha vista já estava embaçando. Deixo-o de lado, penso em um café, mas me contento com um copo d´água. Olho par ao relógio e vejo que ele estava atrasado e Julie já estava saindo de aula. Reuni minhas forças e consegui me levantar do sofá. Coloquei minha bolsa no ombro e quando vou saindo da sala ele esbarra comigo na porta.

- Estamos atrasados.. – eu falo vendo-o tirar o jaleco, joga-lo no armário e pegar as chaves do carro saindo correndo na minha frente sem ao menos me esperar.

Tudo bem. Eu ainda sou a pessoa mais calma e paciente do mundo. Caminho lentamente ate o estacionamento e encontro um Carter ainda com cara de poucos amigos encarando os meus passos lentos.

- Vai demorar mais quanto tempo?

Ele fala mais eu nem dou trela. Entro no carro e logo ele começa a correr para chegar a tempo na escola de Julie.

Felizmente ele se levanta e toma a iniciativa de ir buscá-la. Enquanto isso fecho os meus olhos e tento fazer com que aquela dor de cabeça passasse. Não via a hora de chegar em casa para poder me deitar pelo menos um pouco, antes que tivesse que ajudar Julie nas suas tarefas escolares.

- Boa tarde mamãe.. – eu abro meus olhos e vejo que eles já estavam no carro.

- Como foi a aula bebe? – ela se apóia para me beijar e logo John da "aquele" olhar para que ela voltasse e se sentasse direito. Ela volta ao banco e ele nem se dá ao trabalho de por o cinto nela. Eu até poria se conseguisse enxergar algo. A minha dor estava literalmente me cegando. Estrelinhas e escuridão por toda a parte. Pra falar a verdade, até o meu cinto tinha esquecido de colocar.

Logo senti o carro começar a andar e Julie começar a falar pelos cotovelos. Ela sempre vinha super empolgada da aula e fazia questão de contar todos os detalhes da aula, amiguinhos e professores.

- Legal né, mãe?- ela me faz abrir os olhos e virar um pouco pra trás. Eu não poderia nem imaginar de dizer que não estava escutando.

- Muito, Julie. Muito legal...- eu me limito a dizer, não tendo idéia do que ela estava falando. Carter olha pra mim com aquela cara de reprovação, muito provavelmente percebendo minha situação.

- E o...- ele para um pouco pra pensar e me olha- Josh...é esse o nome do seu amigo, né?- ele pergunta e Julie afirma com a cabeça - ele disse isso na frente da Sra. Kelons, sua professora? - ele diz com aquele risinho cínico, me dando um banho na matéria "escutar Julie com atenção".

- Foi.. – ela recomeça a tagarelar atrás de mim e eu decido prestar atenção no movimento das ruas e ficar calada. Hoje eu não devia ter levantado da cama.

Não sei bem quanto tempo depois chegamos em casa. Subi imediatamente para o meu quarto e tratei de tomar um banho e trocar de roupa para ver se pelo menos o elefante que estava em cima da minha cabeça havia desaparecido.

Assim que estava tirando a minha roupa, John aparece na porta do banheiro encarando o que eu estava fazendo.

- Julie quer que você dê o banho nela.. – ele se recosta a porta dando acesso para que ela entrasse no banheiro.

- O que? – eu jogo minhas roupas no cesto e ainda de calcinha me sento no sanitário vendo Julie que vinha atrás de Carter, toda descabelada agarrada a sua toalha.

Otimo.. só me faltava essa.. porque tudo tinha que ser eu?

Passo as mãos no cabelo e olho para John na esperança que ele reparasse que eu não estava lá muito bem. Ainda mais para ter paciência para dar banho em uma criança.

- Julie.. você não prefere tomar banho com papai? – eu olho para ela que nem esperou que eu falasse e pulou debaixo do chuveiro esperando que eu o ligasse - legal. .- eu disse a mim mesma levantando e colocando pelo menos uma camiseta. Não ia ficar desfilando de calcinha e soutien na frente dele nessa situação.

Lavei o cabelo de Julie que mais jogava sabão no box do que outra coisa.

- Pára, Julie - eu peço com calma para não ser grossa com quem não tinha nada a ver com o pato. Continuo com o banho e a minha cabeça explodindo. Ouço a T.V do quarto ser ligada e olho pelo box de vidro, vendo que ele deitava na cama, já só de cueca, belo e formoso. Puta merda. Será que ninguém notava que eu precisava de um pouquinho de calmaria?

Termino o banho e faço Julie sair. Penso em pedir que ela mande o pai ajudá-la a se trocar, mas é melhor deixar quieto. Creio que acabaria me aborrecendo mais ainda. Poxa, Carter sempre foi de me ajudar em tudo, principalmente com Julie. Mas eu o conhecia. Quando cisma com algo é fogo. Faz de tudo pra me provocar... E consegue.

Atravesso o quarto em direção ao corredor e nem dou ao trabalho de olhar pra ele. Entramos no quarto dela, que logo sobe na cama enquanto eu abaixo na gaveta pra pegar sua roupa. Minhas costas doíam não sei se mais nos rins, no meio, dos lados. Bem, a dor era por toda parte.

- Brigou com o papai?- a escuto dizer enquanto eu aidna estava de costas. Sorrio. Estava demorando demais...

Eu aceno com a cabeça e ela faz bico sentando na cama.

- Mas porque? - ela estende a escova e para que eu penteasse seus cabelos.

- Nada de importante.. - eu logo termino aquilo e ela pula da cama provavelmente indo perguntar o mesmo ao pai - Você tem lição pra fazer? - eu pego sua agenda procurando algum serviço pro pai dela fazer.

- Tem.. - ela volta e mostra o caderno. Perfeito.. momentos de paz para mim. De alguma forma hoje eu teria meus "dez minutos" de paz.

- Vá la.. mostre ao seu pai.. hoje ele que vai te ajudar..

Ela saiu correndo com o caderno na mão e eu me preparei para correr para o meu banho. Era agora ou nunca. Enquanto ela pulava em cima dele na cama, aproveitei para me trancar no banheiro e tomar um longo banho.

Eu realmente esperava que eu melhorasse depois de lavar a alma. Mas parece que fez tudo piorar. Alem de a dor de cabeça não ter passado, meu estomago começou a ficar embrulhado. Deve ter sido a porcaria que eu comi no lugar do almoço. Visto um camisão e vou diretamente pegar na minha gaveta qualquer remédio que me apagasse. Talvez dormindo tudo melhorasse.

Graças a Carter, ainda havia um copo de água lá em cima e eu não precisei descer até a cozinha. Atravessei o quarto e senti que ele me seguia com os olhos. Peguei a água no criado-mudo dele e tomei o comprimido. Vi que eles estavam conversando e olhando o caderno e aproveitei essa deixa para conseguir um lugar pra dormir.

- Julie, vai fazer lição na mesa. Aqui não é lugar...- eu disse, o encarando.

- Ah, mãe...- ela reclamou. Pensei em ir dormir no quarto dela, mas não. Eu precisava da minha cama, do meu colchão dos Deuses.

- Não me faça repetir...- eu disse, indo até o banheiro pra pegar a toalha para colocar debaixo do travesseiro. Quando voltei, nem sinal deles. Ótimo, vamos ver se agora eu consigo. Deitei na cama esperando que o mundo saísse das minhas costas. Eu precisava melhorar. O estomago reclamava e eu me fiz dormir antes que eu não agüentasse mais.

Continua...