Anime: Saint Seiya
Casal: Mu e Shaka
Classificação: Yaoi, Angst, Romance, Lemon
Status: Andamento
Iniciada: Maio 2005.

DisclamerSaint Seiya pertence a Kurumada e cia. Este fic é sem fins lucrativos. O nome Carlo di Angelis, que se se refere a Máscara da Morte, foi criado pela escritora Pipe, assim como o sobrenome do Afrodite, Afrodite Thorsson.


- Chance de amar -

Cap IV

Estações...


"Alguém me disse que não voltarias para casa.
As palavras suspenderam-se no tempo e o ar de repente ficou frio.
O sol ainda está brilhante, mas tudo me faz sentir como se estivesse a chover!
E se eu tivesse um desejo, seria ver-te de novo...


Nada é justo quando perdemos
Sem um momento para dizer adeus...
Como podem as estações continuar a mudar
Desde que desapareceste
Diz-me como pode o mundo não parar de girar...".

..:oOo:..

"Como ele está?". Shura perguntava para Aldebaran enquanto sentava na arquibancada da arena de treinamento.

"Nada bem, Shura, nada bem. Ele só sai de casa para ir visitar Mireia e mais nada. De resto fica o tempo todo treinando exaustivamente dentro da saleta de treinamento da casa de Áries". A voz do cavaleiro de touro era bastante preocupada.

"Ele não vai fazer nada? Digo, ele não pretende... ir aterás dele?". Shura estava preocupado realmente com o comportamento de Mu. Não era o melhor amigo do ariano, mas nem por isto não deixaria de se preocupar.

"Não sei lhe dizer Shura. Mu não deixa ninguém se aproximar a exatos cinco dias. Ele somente tem conversado com Mireia, e pelo que soube dela ontem, ele não está com um dos seus melhores humores". Olhava os treinamentos na arena enquanto falava.

"E falando nela, quando será que ela irá embora levando o pequeno Amal? Isto vai destruir Mu!". Lembrou-se de uma conversa que tivera com o ariano há um tempo atrás, em que este lhe contara que após alguns dias de dar a luz, Mireia teria que se preparar para retornar a sua aldeia levando assim seu pequeno filho.

"Ela não vai...". A voz de Aldebaran soou séria.

"Como assim não vai?". O espanhol virou seu corpo na direção do amigo maior, no intuito de lhe fitar os olhos em busca de alguma explicação.

"Não vai. Mu decidiu isto. Ela e Amal vão ficar aqui no Santuário junto com ele. Ela na vila com o filho, e ele aqui". O taurino fitava o rosto surpreso de Shura.

..:.. Uns dias antes ..:..

O ariano estava sentado no sofá da pequena sala da casa de Mireia, com um pequeno embrulho nos braços. No calor de seus braços, Amal, dormia tranqüilamente, sentindo a proteção de seu pai, mesmo que este no momento estivesse com os pensamentos em um lugar longínquo.

Uma das servas que fôra cedida para auxiliar Mireia nos primeiros dias, viera buscar o pequeno ariano para repousar no quarto, em seu pequeno berço que fôra trabalhado pelas habilidosas mãos de seu pai. Enquanto a serva seguia para o quarto, Mireia adentrava a pequena sala sentando-se ao lado de Mu.

"Você está muito calmo para o meu gosto. Ande, fale... libere o que está lhe ferindo". Sua mão pousou sobre a coxa do ariano, causando uma leve pressão como se encorajasse.

"Eu... estou bem...". Falou sem muita convicção enquanto seus olhos tristes olhavam na direção da janela da sala. 'Um vaso quebrado encontra-se melhor do que eu!'. Pensava olhando a movimentação por detrás da janela.

"Não tente me enganar. Convivi um bom tempo com você para saber quando você está bem ou não. Não vou lhe repreender por extravasar o que lhe doe, mas vou brigar feio com você se não o fizer". Parecia uma mãe a dar bronca em seu filho. Bem, a verdade não estava tão longe. Mireia agora era mãe, não de Mu, mas o seu instinto materno estava ali misturado ao seu gênio forte.

O ariano suspirou pesadamente suprimindo a vontade que de chorar. Desde que escutara a conversa de Shura e Kamus no dia em que Amal nascera, não havia conseguido chorar. Não se permitira a tal ato. Procurava treinar em sua saleta, tentava meditar, fazia qualquer coisa para não cair, mas agora ali, tendo aquela conversa com Mireia, seu peito doía a cada golfada de ar que aspirava.

"Mu, fale comigo... você sabe que estou aqui para tentar lhe ajudar". A voz era calma e acolhedora.

"Porquê ele fôra embora Mireia? Porquê? Eu... Eu tentei fazer contato com ele esses dois dias e ele... ele me bloqueou. Sinto-me tão perdido, fraco...". Lágrimas começavam a banhar lhe a face alva.

Mireia apenas segurou na mão direita do ariano como se assim pudesse ser uma âncora de apoio para ele.

"Será que ele não entende? Droga, eu... eu não queria que as coisas fossem assim, mas elas são assim. Você bem sabe o quão difícil foi na época. E aquela cabeça dura não entende. Eu queria que ele estivesse aqui comigo... Ele... Amal...". As palavras não saiam mais, apenas pequenos soluços eram ouvidos.

Mireia se afastou um pouco no sofa e puxou o corpo de Mu fazendo-o deitar-se em seu colo. Suas mãos acariciavam os fios lavanda, enquanto o ariano fechava fortemente as mãos próximas ao seu rosto.

"Deixe sair Mu. Chore, deixe a dor sair, meu querido. Ela não vai resolver seus problemas, mas vai aliviar um pouco a dor que está em sua alma". Olhava o corpo tremulo do cavaleiro. Que pela primeira vez mais se aparentava a uma criança do que a um homem com responsabilidades.

Ficaram ali por um bom tempo. O silêncio não era algo que irritava, mas apenas dava uma sensação de paz.

Paz? Por pouco tempo...

Mireia suspirou ruidosamente preocupada com o que teria que falar, mas era necessário. Péssima hora? Talvez, mas...

"Mu?". Chamou calmamente notando este esconder o rosto um pouco. "Temos que conversar e acho que esta parte não será nada boa". A voz ainda era calma.

O ariano levantou-se se sentando corretamente. Sua posição era virada para Mireia, com uma das pernas sobre o sofá. Seu rosto avermelhado pelo choro estava levemente abaixado evitando fitá-la.

"Mu, você sabe que não é um assunto que eu gostaria de tocar em um momento como este, mas... em alguns dias, eu e Amal deveremos retornar para a aldeia. Você conhece as regras". Colocou uma mexa dos fartos cabelos para trás da orelha e acabou se assustando com a reação do ariano.

O ariano quando escutou as palavras de Mireia, apenas deu um pulo do sofá ficando em pé fitando o rosto dela. Os olhos que antes demonstravam a dor da perda de Shaka, agora estavam queimando de raiva. Suas mãos estavam crispadas ao lado do corpo e sua voz em nada lembrava aquela chorosa de momentos antes.

"NÃO!". Em seu peito uma nova dor se instalava. "Não... você não vai voltar. Nem você e nem meu filho. Eu não vou tolerar perder mais alguém que eu ame, ta ouvindo? Ninguém... nem regra, nem ancião, nada e nem ninguém mudará isto. VOCÊS NÃO VÃO VOLTAR". Andava de um lado ao outro como um filhote de animal selvagem encurralado.

Mireia olhava um pouco assustada com aquela reação. Nunca havia presenciado este descontrole de Mu.

"Mas você sabe que...". Não pode terminar a frase.

"Quem ousar tirar meu filho de perto de mim... pelos Deuses... eu juro que mato!". O semblante do ariano estava sério. Mireia pode perceber que ele não estava brincando. Aquelas palavras eram de um verdadeiro animal defendendo sua cria.

Mu não conseguia se controlar. Quando Mireia pensou em falar algo, acabou se encontrando sozinha na pequena sala. Mu simplesmente usara seu poder, sumindo dali em um simples piscar de olhos.

"Se você assim decidiu, eu não pretendo contestar, até porque um filho nunca deveria ser afastado de seus pais. Regra estúpida!". Levantou-se já escutando um pequeno choro vindo do quarto. "Hora de cuidar de meu outro homem da casa". Sorriu ternamente já se direcionando ao quarto vendo a porta ser aberta pela serva.

Em uma determinada sala de treinamento na primeira casa zodiacal...

O cavaleiro de Áries simplesmente lançava contra a parede todos os objetos que encontrava pela frente. No início havia levitado todos eles, mas isto não teria o mesmo efeito de lança-los a parede como desejava. Queria arremessá-los com suas próprias mãos.

A cada peça que jogava, um grito de raiva era ecoado pelas paredes da sala. Seus olhos verdes, atualmente estavam lilases de tamanha fúria que sentia. Sim, seus olhos mudavam de tonalidade de acordo com os seus sentimentos.

Olhou para um saco de areia instalado ali por Ikki. Fôra presente de Carlo há alguns meses e nunca tinha usado. Um sorriso maldoso apareceu em seus lábios, e quando notou, encontrava-se espancando o objeto, descontando assim sua fúria.

A força empregada era tanta que após alguns socos o saco acabou estourando liberando todo o seu conteúdo fazendo com que Mu ficasse completamente sujo de areia.

"Droga...". Falou entre dentes notando seu atual estado e principalmente a sujeira em que se encontrava a sala. Caos. Tudo quebrado.

Seus joelhos falharam e acabou desabando no chão. Mesmo sentindo vontade de chorar, as lágrimas não conseguiam ser vertidas. A raiva não estava deixando seu pranto ser libertado.

Respirando lentamente tentava colocar um pouco de seu raciocínio para trabalhar. Teria que fazer algo teria que, agora mais do que nunca, lutar. Lutar para que seu filho não lhe fosse tirado, mas... Teria que tentar uma última vez. Por bem ou por mal, teria que falar com Shaka.

..:oOo:..

"Então ele decidiu que eles não voltarão? Pobre homem... Perder a pessoa que ama e depois ser afastado de seu sangue... Se fosse comigo, eu teria a mesma reação em não deixar". Shura concluiu após ter escutado as palavras de Aldebaran.

"Pois é espanhol. Eu até mesmo tentei falar com ele, mas ao sentir o cosmos dele, decidi não aborrecê-lo. Eu que não sou louco de levar uma cabeçada de um carneiro furioso". Seria engraçado se não fosse trágico, mas a comparação fazia sentido até mesmo para o espanhol.

Ambos se fitaram em alguns segundos. Era uma aproximação estranha, mas até mesmo confortável. Calaram-se e permaneceram fitando agora a arena com os demais cavaleiros em seus treinamentos.

..:oOo:..

Andava descalço sentindo a terra das margens do Rio Nairanjana. Onde Siddhartha começara seus estudos com práticas rigorosas, com os astecas, em um período radical de jejum que o deixaram debilitado. Shaka estava disposto a enfrentar tal jejum. Não o mesmo passado pelo 'Iluminado' naquele período, pois não foi desta forma que Siddhartha alcançara a iluminação, mas tal jejum era necessário para iniciar a sua purificação.

Fôra difícil. Ao chegar na Índia, seu peito doía, sua alma mais parecia um quebra-cabeça espalhado, sentia a alma desorganizada, incompleta. Faltavam peças, peças estas que eram parte de seu coração.

Nos dois primeiros dias, após a surpresa dos monges em vê-lo de volta a Índia sem nenhuma prévia comunicação, Shaka não estava conseguindo se desprender. Não conseguia dormir e nem muito menos meditar. Sentia o cosmos de Mu tentando lhe fazer contato. Podia sentir o desespero de Mu. Era palpável demais e isto não estava lhe ajudando em nada. O que o ariano queria? Ele estava lá, com mulher e provavelmente o filho, e agora ele desejava ele também? Não queria e nem pensava fazer parte de um trio.

Cortou qualquer contato que por ventura poderia vir a surgir.

Agora se encontrava ali. Prestes a iniciar uma viagem. Uma longa viagem para encontrar a si mesmo. Para encontrar a paz que havia perdido com um sentimento que não deveria ter conhecido. O amor. O amor dos homens.

Sentou-se as margens do rio em posição de lótus, respirando fundo antes de cerrar seus belos olhos. Há tempos deixara de mantê-los fechados, mas estava mais do que na hora de voltar a cerra-los para as coisas externas.

Permaneceu sentado naquela posição pelo restante do dia. Sem comer ou sentir fome ou sede. Buscando em seus treinamentos iniciais em sua mente em seu interior.

Um dos monges que decidira acompanha-lo, se aproximou quando a noite já estava caindo. Sabia que não deveria interromper a meditação, mas a segurança da reencarnação do Iluminado era necessária, mesmo este sendo forte, apenas temia por ele. Interrompeu a meditação apenas c m leve toque no ombro de Shaka.

Não eram necessárias palavras. Mesmo de olhos cerrados Shaka sabia que passara um longo tempo ali sentado e que já era hora de se retirar das margens do rio. Sua jornada seria longa. Sua busca seria um desafio. Teria que ainda passar por vários lugares. Uma peregrinação por onde Siddhartha havia passado antes de ser denominado Buda aos 35 anos.

Virou o rosto com os olhos cerrados, notando ao seu redor que várias pessoas se encontravam ali. Podia sentir a emoção emanando de cada um. Não estava se achando digno, ele não era mais tão puro de ter tanta devoção. Ele não era santo, era homem, com defeitos, medos, frustrações. Uma lágrima escorreu pela bela face, única, solitária.

Ao caminhar para se retirar, percebia as pessoas curvando as cabeças em respeito. Algumas se ajoelhavam e outras tentavam lhe tocar. Mas antes menos de que tudo pudesse se dar prosseguimento, Shaka apenas alcançou uma das pessoas. Tocou lhe os braços evitando que a mesma se ajoelha-se.

"Somos todos iguais. Se me reverenciar, farei o mesmo por ti". Apenas estas palavras foram o suficiente para deixar o rosto do humilde homem banhado de lágrimas.

Continuou seu caminho em direção ao simples templo próximo as margens do rio Nairanjana.

..:oOo:..

"Você tem certeza que deseja fazer isto Mu?". Aldebaran perguntava o amigo.

Faziam-se exatos 6 dias desde que tudo acontecera. A ausência de Shaka, o nascimento de Amal, o descontrole do amigo, o qual ficara sabendo por Kiki que encontrara a saleta de treinamento toda destruída, e agora, a decisão que estava escutando do amigo.

"Tenho sim Aldebaran. Não mudarei minha decisão por nada, somente se meu filho estivesse doente, mas sei que isto não irá ocorrer em apenas poucos dias de minha ausência. Preciso tentar amigo". O ariano encontrava-se com feições preocupadas.

"Tudo bem. Não se preocupe com Mireia e nem com o meu afilhado". Deu um pequeno sorriso ao falar isto.

"Afilhado? Como assim?". Mesmo preocupado a curiosidade fazia parte de si. Deveria ser algo relacionado aos costumes brasileiros de seu amigo taurino.

"Sim, afilhado. No Brasil quando uma criança nasce, e se ela for batizada pelo catolicismo, ela possui um padrinho e uma madrinha. Uma espécie de... como posso resumir... um segundo pai e uma segunda mãe, entende? Na falta de um dos dois, os padrinhos dão uma pequena auxiliada. Ta eu sei, não me olhe com esta cara Mu, não vou substituir ninguém, mas o que posso fazer se me aperfeiçoei ao moleque mesmo ele sendo tão pequeno?". O rosto de Aldebaran estava um pouco corado.

Mu fitava o rosto do brasileiro vendo que o amigo sentia-se um pouco constrangido com o que acabara de falar.

"Ah, entendi. Não se preocupe Deba, não estou pensando que você deseje substituir ninguém. Agradeço de coração sua preocupação para com meu filho. Bom, não sou católico, portanto, creio que não se aplicaria a Amal, mas, não me importo de você olha-lo por mim. Sei que por debaixo deste grande homem existe um molenga de coração puro". Riu vendo a cara do taurino por ter sido chamado de 'molenga'.

"Molenga? Molenga? Ora seu... cabeça dura chifrudo". Socou de leve o ombro do ariano vendo este sorrir um pouco.

"Obrigado Deba, eu estava precisando rir um pouco antes de me afundar de vez". Seu rosto perdera o brilho do sorriso, agora só aparecia um sorriso triste.

Levantou-se ajeitando a roupa toda preta. Calça social preta e uma blusa de corte em 'V' de mangas longas também da mesma cor. Os sapatos sociais não poderiam deixar de acompanhar. Aquela roupa fôra presente de Kamus, mas sabia que ao chegar onde deveria, somente roupas simples poderiam ser usadas.

Despediu-se do amigo que estava sentado na escadaria posterior da Casa de Áries e foi caminhando até sua sacola de viagem. Ao voltar-se para trás e fitando o rosto preocupado de Aldebaran, apenas acenou-lhe e sumiu. Poderia muito bem usar um avião, mas para que demorar se poderia usar seu dom? Tempo era coisa que ele não tinha e não queria ter.

Iria até Shaka e por todos os Deuses, o loiro teria que escuta-lo pelo menos uma vez na vida. Seria sua última tentativa.

..:oOo:..

Tudo parecia tão calmo.

Mais um dia calmo se iniciava. Este, desta vez seria para sentir. Apenas isto. Sentir a sua volta.

Shaka e os dois monges que lhe acompanhavam, passavam pelas ruelas da pequena cidade as beiras do rio Nairanjana.

Nada seria tão confortante do que ajudar as pessoas e era isto que Shaka estava fazendo. Ouvia cada um, parava no meio do caminho quando era abordado e apenas escutava. Sentia.

Seria perfeito se ele não sentisse uma presença que desejava ignorar. Seus lábios se curvaram esboçando um pequeno desagrado. E seu coração. Aquele que ele tentava acalmar parecia lhe pregar uma peça ao começar a bater rapidamente.

Virou aos monges falando calmamente:

"Estou para receber alguém. Aconteça o que acontecer, por favor, não intercedam. Vou me afastar agora, mas retorno ao templo ao entardecer". Não deixou brechas para que os monges contestassem sobre sua decisão. Apenas curvou a cabeça com as mãos unidas tanto para os monges, quanto para a senhora que lhe abordava, e sem muito se demorar, saiu de perto indo em direção as árvores próximas ao rio.

Não demorou muito. Após se sentar em posição de meditação, suspirou deixando sua voz aparentemente calma ser ouvida.

"Por favor, Áries, apareça. Não precisa ficar me seguindo ou manter-se escondido". Procurava manter sua respiração lenta, ao contrário de seu interior.

Mu que estava a alguns passos atrás de Shaka, suspirou e foi em direção ao loiro. Sentando-se ao lado dele, olhando agora as águas do rio Nairanjana.

"Como?".

"Como não senti-lo?".

"Você me bloqueou, achei que não me sentiria".

Silêncio. Eram poucas palavras, mas pelo menos Mu sentia-se um pouco aliviado por não ter sido escorraçado.

"Sim". Vago.

"Sim? Pelos Deuses Shaka, fale algo que eu possa... sei lá, apenas fale!". Uma ponta de desespero poderia ser sentida nas palavras do ariano.

"Sim, eu lhe bloqueei. Era necessário para que pudesse encontrar a paz. Só não entendo o que lhe trouxe até aqui, longe do Santuário, longe de... seu filho, quando eu mesmo não desejei o seu contato". Segurava-se. Doía.

"Shaka... eu vim porquê eu precisava me entender com você. Por favor me escute. Uma única vez me escute". A voz era tão baixa, um pedido baixo e triste. Mu fitava o rosto aparentemente sereno de Shaka.

"Você pode falar 'Áries'. Se isto te fará sentir-se bem, então apenas fale".

O ariano sentiu o peito doer. Pelo visto apenas estaria ali se desabafando.

"Sabe, quando tive que conceber Amal, não deixei de pensar em você nem por um segundo. Desculpe comentar, mas não foi em Mireia que eu desejei estar tocando Shaka, era você ali comigo, e acredito que possa ter gerado algum problema. Eu deveria me liberar de tudo, mas na consegui me liberar de você". Suspirou.

Mu olhava para o rio e não pode ver o leve rubor que surgira na face de Shaka com o que acabara de falar.

'Por Buda, ele pensou em mim em uma hora destas?'. Pensou sentindo o rosto esquentar e logo se repreendeu por acompanhar um pensamento impuro como aquele.

"As regras de meu povo são bem antigas Shaka. Desde que nós os lêmures fomos designados para, pelo menos, termos um guerreiro servindo a alguns Deuses, esta tradição tem se seguido por anos, séculos e eu sendo um destes guerreiros, não poderia deixar de cumpri-la. O problema todo se encontra justamente nisto. Desde cedo minha união com Mireia já era prevista para o nascimento de um novo guerreiro. Ela não é minha esposa ou mulher ou quaisquer coisas que você possa vir a pensar. Pelo menos não vejo desta forma e nem ela vê assim". Parou e olhou o rosto do loiro que permanecia de olhos fechados e com respiração calma.

Levou uma de suas mãos para retirar uma mexa loira que se encontrava atravessada pelo belo rosto e pode notar o leve arrepio que surgiu na pele alva. Mas teve sua atenção voltada as palavras de Shaka.

"Entendo que em cada cultura, cada povo tem suas tradições. Não se preocupe com isto, já fui informado de seus deveres e obrigações". Uma voz desprovida de emoções. Era assim a voz de Shaka.

Mas um suspiro deixou os lábios de Mu antes dele continuar a falar. Seus olhos voltaram-se para o rio buscando encontrar alguma segurança naquelas águas tranqüilas.

"Shaka, eu quero você. Quero você ao meu lado, quero você em minha vida. Não somente como um amigo, mas como... como alguém que eu possa me abrir, beijar, trocar carinhos, dormir... amar. Preciso de você Shaka". Falara. A voz era baixa, contendo as emoções.

O virginiano que tentava manter-se sereno, inatingível, apenas deixou um sorriso sair por seus lábios. Não era um sorriso de alegria, pelo contraio, era de dor, de escárnio.

"Perdeu seu tempo em vir aqui 'Áries' para me dizer todas estas belas palavras. Não mais acredito em uma só sílaba do que tenha saído de sua boca. Aquele Shaka que você conhecerá, aquele homem que se apaixonara por você não existe mais. Vim para Índia, justamente para encontrar-me, para voltar a ser digno de ser um representante de Buda nesta terra tão maculada de sentimentos destrutivos. É melhor você voltar para o Santuário Cavaleiro de Áries. Tens obrigações tanto para com seu povo, quanto para com a Deusa Athena. E eu... eu tenho o meu caminho a seguir".

Despejou tudo. Não queria e não deveria cair naquelas garras. Doía, estava doendo demais, mas não poderia se deixar levar. Pensou em se levantar, mas teve seus pensamentos bruscamente interrompidos ao sentir as mãos do ariano lhe segurarem. Enquanto uma lhe envolvia a nuca, a outra lhe segurava no braço direito fazendo pressão puxando-o contra si.

Um beijo.

Podia sentir os lábios quentes e úmidos de Mu a tocar lhe os seus. Sentiu seu corpo reagir, sua pele esquentar a medida que seus pêlos se eriçavam ao notar a língua sinuosa do ariano a lhe forçar passagem.

Deixou-se levar pelo desejo e entreabriu os lábios recebendo aquela carícia.

Lágrimas podiam ser saboreadas entre o beijo. Lágrimas de Mu, lágrimas de Shaka. Apesar de ter se iniciado de forma bruta, o beijo se seguiu tenro.

'Como eu desejei tanto sentir seus lábios de novo, e de novo, e de novo... Quentes, macios como na primeira vez...'. Os pensamentos do loiro não paravam em sua mente. Não queria, mas teria que cortar aquilo. Não deixaria continuar.

Mu queria que aquele momento não acabasse. Amava tanto Shaka que daria sua vida por ele, mas estava ali e sabia que por mais que tentasse, aquilo tinha um sabor que não desejava... o gosto da despedida. Um adeus.

O beijo fôra cortado. Mesmo assim permaneceram com as testas coladas. Ambos em silêncio, pensando, mas fôra Shaka que quebrara o momento buscando forças para não deixar sua voz fraquejar mais do que já se encontrava.

"De mim apenas levará este último carinho. Por algo que não fôra, por algo que não acontecera. Apenas isto Mu de Áries, apenas isto".

Levantou-se apressado, temendo ser engolfado pelo desejo de se jogar nos braços do ariano e ficar ali com ele. Quanto mais cedo acabasse, melhor seria a recuperação de um coração partido.

Não se despediu, apenas se foi deixando mais uma vez um atordoado ariano para trás com lágrimas nos olhos verdes que se encontravam opacos.

"Porquê você tem que ser tão cabeça dura Shaka? PORQUÊ?". Gritou a última parte não segurando a voz carregada de choro.

..:oOoOoOo:..

Cinco anos depois...

"O senhor já vai?". Era um dos monges que lhe acompanhava durante toda a sua viagem em busca da iluminação perdida, que lhe falava.

"Devo ir-me, já me ausentei por tempo demais, e devo voltar para cumprir meus outros deveres, Srila". Falava serenamente com um sorriso cálido nos lábios.

"Sentiremos falta de sua iluminação". Disse o monge com o olhar baixo em respeito.

"A iluminação poder ser alcançada sem a minha presença Srila. Você bem sabe disto. Agradeço a sua companhia e a de Dilgo por estes longos cinco anos".

Nada mais era necessário ser dito. Shaka prendera a ponta do manto de seu sari vermelho, enrolando-o no braço esquerdo, e com a outra mão apenas segurou a mala.

Encontrava-se no aeroporto de Kãnpur, próximo a Vãranasi. Fariam ainda uma escala em Nova Déli para depois prosseguir viagem.

Nestes cinco anos em que ficara andando por toda a Índia, pode re-aprender muitas coisas, lembra-se de ensinamentos esquecidos, praticar ações que antes não praticara. Uma certa áurea de paz e tranqüilidade envolvia-o agora. Suas feições em nada lembravam as de quando chegara a Índia.

Durante todo o trajeto mais permanecia em silêncio do que realmente mediando. Algumas aeromoças olhavam com admiração. Não era sempre que poderiam ver um rapaz com longos cabelos loiros, preso em uma trança frouxa, vestido como um monge, e que emanava uma tranqüilidade ao se aproximar.

Shaka ao notar-se sendo olhado, apenas virou o rosto na direção das moças e lhes sorriu cumprimentando-as com as mãos unidas e um respeitoso abaixar de cabeça.

Estava desprovido de todos os desejos mundanos. Não sabia o quanto mudara externamente em cinco anos, uma vez que não possuía espelhos e também por que não abrira mais os olhos.

As horas passaram-se e quando se deu conta, encontrava-se desembarcando no aeroporto da Grécia. Shura era o único que fôra recebe-lo, até porquê nem todos sabiam quem ele estaria retornando.

"Bem vindo Shaka. Athena não se encontra no Santuário, mas daqui a dois dias estará de volta. Como você está, meu amigo?". O espanhol encontrava-se feliz, mas não ousaria dar um vexame abraçando o loiro em pleno aeroporto.

"Estou muito bem, meu amigo. Quando a Deusa retornar irei ter com ela algumas palavras".

Ambos foram conversando ao longo do caminho até a Sexta Casa de Virgem. Teriam tempo para conversar mais depois. Agora Shaka teria que cuidar da casa.

"Tomei a liberdade de mandar as servas de minha casa, limparem a sua esta manhã. Aproveite para descansar da viagem, limpar o corpo com um banho seria uma boa opção". Shura sorria amigavelmente para o loiro.

"Sim meu amigo, pretendo pelo menos tomar um banho, mas antes devo fazer algumas coisas". Falava entrando na casa notando que esta realmente encontrava-se limpa.

"Tudo bem, qualquer coisa estou lá na Décima Casa, sabe o caminho ainda né?". Riu ao ver Shaka balançar a cabeça com um sorriso nos lábios, mas logo foi se retirando deixando o amigo sozinho em sua casa.

Shaka voltou toda a sua atenção para aquelas paredes. Sem muito ficar parado, abriu a mala e retirou de lá um pano vermelho que envolvia uma farta coleção de incensos. Pegou o de mirra que serviria para a ocasião e acendeu-o colocando-o próximo a sua esteira de meditação.

Tomaria banho e se alimentaria depois, agora queria meditar e fazer a casa de Virgem ressoar com sua energia límpida. Sua armadura parecia entrar em sintonia e um brilho intenso começou a envolve-la. Logo, ela se encontrava ao lado de fora da caixa, em sua posição suplicante, brilhando.

..:oOo:..

"Amal... isto não vale. Pare de usar seu poder". Gritava uma das crianças que brincava de com o pequenino.

A brincadeira tinha sido ensinada pelo cavaleiro de ouro Aldebaran. Pique esconde era uma das brincadeiras mais favoritas de Amal, afinal, nunca conseguiam pegá-lo, já que este sempre usava seu poder para fugir dos locais a qual se escondia.

"Vale sim. Você é lerdo, não me acompanha". Uma vozinha infantil e brincalhona pode ser ouvida, mas quando o menino pensou que descobrira o esconderijo do pequeno ariano, era tarde, este havia mudado de lugar mais uma vez.

"Ah... desisto de brincar com você hoje Amal. Você não tem jeito mesmo". Falava o pequeno Kirian de seis anos, filho de um dos cavaleiros de prata.

"Tudo bem, você é chato de brincar, nunca me acha mesmo". Falava rindo enquanto implicava.

"Ora seu tampinha...". Ficou vermelho de raiva. Sempre caia na implicância daquele ariano.

Por um momento o pequeno Amal, deixou de sorrir. Algo parecia ter mudado, podia sentir uma energia diferente no Santuário. Voltou seu rosto para o outro menino.

"Tenho que ir Kriran. Se Kiki aparecer já fui para... apenas já fui". Falou sério e logo desapareceu.

"Eu ainda vou descobrir como ele faz isto tudo. Não olhar, desaparecer do nada, sentir coisas... Arreee... tampinha mais esquisito este!". Sai das ruínas indo para casa. Sua barriga roncava de fome.

..:oOo:..

"Mu, devemos voltar. Amal deve estar deixando os meninos de cabelos brancos". Mireia ria do próprio comentário.

"Devemos, Kiki já deve estar querendo esganar Amal a esta altura. Não sei como ainda não se mataram". Comentou colocando uma das mãos sobre a testa.

Encontravam-se no centro de Atenas, comprando alguns tecidos, mantimentos e coisas tanto para o ariano levar para seu templo, quanto para Mireia levar para casa.

Longe dali, o pequeno Amal se aproximava de uma das casas zodiacais. Como não era permitido se teletransportar por entre as casas, somente com autorização da Deusa, Amal subia pela passagem lateral das casas.

Era tão pequeno que facilmente não era notado, até mesmo porquê aprendera a camuflar seu cosmos, e com isto tinha facilidade até mesmo de enganar Kiki.

Encontrava-se já no seu destino. A Sexta Casa, a Casa de Virgem.

Sabia que era ousadia sua e uma grande falta de ética, mas não solicitou autorização para entrar, apenas o fez.

Seus pequenos pés levaram-no até o cavaleiro responsável da casa.

Permaneceu parado por alguns minutos em frente a figura imponente que o cavaleiro. Podia sentir o poder dele ressoando por toda a casa. Sentia armadura vibrando juntamente com tudo a sua volta.

Sorriu como uma criança sorri e sentou-se imitando a mesma posição que Shaka se encontrava com tanta facilidade que, quem visse, diria que o pequeno estava habituado a fazer aquilo constantemente. E realmente estava.

Shaka podia sentir uma presença diferente sentado a sua frente. Não conseguiu determinar quem poderia ser. Não era nenhum dos outros cavaleiros, nem de ouro, nem de prata, mas possuía um cosmo até mesmo marcante. Saiu de sua meditação, mas nada falou ou demonstrou já ter terminado de meditar. Mas teve seus momentos de silêncio interrompidos.

"Quem bom que retornou cavaleiro Shaka de Virgem". A voz extremamente infantil, mas bem distinta de Amal pode ser ouvida.

Shaka pela primeira vez em cinco anos estava curioso, e por não achar que uma criança poderia lhe trazer problemas, abriu seus olhos azuis pela primeira vez desde q os fechara. Assustou-se ao fitar o pequeno a sua frente.

Seus olhos viam uma criança de longos cabelos negros soltos, duas pintas negras na testa, sentada a sua frente na mesma posição que se encontrava, com as mãos também na mesma posição. A criança ainda encontrava-se de olhos cerrados. Seu coração deu um pulsar mais forte ao constatar que aquele ali só poderia ser filho de uma única pessoa.

"Desculpe invadir sua casa cavaleiro, mas não desejava atrapalhar sua meditação. Acabei por me juntar a você. Meu nome é Amal Ialad, sou filho do Cavaleiro de Áries". O pequeno apenas descerrou as pálpebras deixando os seus olhos azuis serem vistos. Eram tão azuis quanto os olhos do próprio Shaka.

Suspirou acalmando seu coração. Depois de anos de treinamento, não poderia se deixar abalar. Olhou para o menino mais uma vez, vendo a imagem de Mu naqueles traços. Só não entendia algumas características que o menino possuía que não lembrava em nada o pai ou a mãe.

Saiu de seus pensamentos ao notar o pequeno se levantar e ajeitar sua túnica. Pôde observar corretamente que duas fitas erram entrelaçadas a pequenas tranças laterais que se prendiam atrás, mas era somente isto naqueles cabelos tão negros.

"Por favor, me acompanhe, papai esteve lhe esperando todo este tempo... venha, ele já deve estar retornando da cidade, posso senti-lo". Um sorriso puro adornava os pequenos lábios de Amal que lhe estendia a mão em um convite.

Shaka apenas se viu levantando e segurando a mãozinha que lhe era estendida.

Continua...


Comentários sobre o capítulo anterior, questões desta fic, estarão sendo respondidos amanhã dia 22 de Setembro no meu blog de reviews.

Agradeço a todos por terem comentado.

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