A Invasão

Nota:

Tudo que estiver entre     significa que o personagem esta falando a língua Kdar ou pensando em Kdariano.

K medida de tempo Kdariana:

§ 1 kx equivale a 1 segundo

§ 1 kr equivale a 1 minuto

§ 1 k equivale à 1 hora

Capítulo III – Aprendendo com o Inimigo

Dxmaell olhou para o humano, enquanto se perguntava se haveria um meio real de salvar as duas raças. Talvez, mas para isso ele deveria explicar ao humano como era os Kdarianos e como funcionava sua sociedade.

- O que seu povo sabe sobre minha raça?

Heero pensou por um momento. Eles não sabiam muito, apenas que os Kdarianos deixavam que soubesse, quando chegaram e o que eles descobriram sozinhos.

- Não muito. Sabemos que se alimentam da energia de nossos corpos, mas não sabemos nada sobre vocês. Não temos idéia do porquê escolheram nosso planeta, o que fazem com a energia absorvida e como a absorvem.

- Eu vou dizer a você como a absorvemos, o que fazemos com ela, o porquê de precisarmos dela para sobreviver e o que aconteceu com nosso mundo. O que quer saber primeiro?

- Por que quer nos ajudar?

- Por que acha que quero ajuda-los?

- Acho que perguntei primeiro.

- Verdade, mas minha pergunta é tão relevante quanto a sua. Faz alguma diferença do motivo de querer ajuda-los?

- Faz para mim. por que se você procura absolvição pelo que sua raça esta fazendo com a minha...

Dxmaell olhou para o humano de maneira fria e deu um sorriso cínico. Absolvição? O humano parecia tão tolo dizendo isso. Ele não tinha a mínima idéia do que sua raça já havia feito, a quantidade de vidas absorvidas, a quantidade de raças dizimadas. Absolvição? Não... ele não a procurava, pois sabia que não era digno dela.

- Não Heero, eu não procuro absolvição pelo que os Kdarianos estão fazendo com os humanos. Minha raça não merece a absolvição, não pelo que ela faz com vocês, mas pelo que ela já vez a outras raças. Você não tem idéia do que já fizemos.

- O que pretende então?

- Parar com a destruição de outras formas de vida. Nenhuma raça deve morrer para que outra sobreviva. Não acredito que existamos apenas para destruir outras raças, não há sentido nisso.

- Quantos sua raça já destruiu? Quantos tiveram que morrer para que você decidisse que era hora de parar?

Heero olhou para Dxmaell com raiva, quantos ele poderia ter salvado se tivesse decidido antes que era hora de sua raça parar. Talvez a Terra não tivesse sido invadida, talvez ele não tivesse nascido em uma base, e não tivesse sido treinado como um soldado. Eram tantos talvez, eram tantas as perguntas. Dxmaell sabia que não tinha uma resposta adequada ao humano; o que ele deveria dizer? Que havia tentado e fracassado com as outras raças, que muitas se resignaram e se deixaram absorver?

- Muitos...muitos morreram antes que eu começasse a achar que o que fazíamos era errado.

Dxmaell virou de costas para Heero e começou a andar, sendo seguido pelo humano. Heero notou que a voz de Dxmaell, embora continuasse fria, veio carregada de tristeza. Ele não esperava ouvir uma confissão do que a raça Kdar havia feito antes de chegarem a terra.

- Perdi a conta de quantos matamos com nossa busca por sobrevivência. Não, isso é uma grande mentira... eu me lembro de cada uma delas, os Nebrins, os Kohoords, os Narbut [1] e muitos outros... eu me lembro delas, Heero, cada vez que fecho meus olhos. E por isso não quero que o mesmo aconteça novamente.

- Por que não tentou salva-los?

- Tentei salvar alguns, mas não tive sucesso. Muitas das raças que encontramos eram pacíficas, nunca haviam entrado em uma guerra, não tinham com o que se defender e nem sabiam como faze-lo. Eu e meus oficiais Aleng e Tzen tentamos ensina-los, mas eles se recusavam a lutar. Não posso salvar uma raça que não deseja ser salva.

- Mas algumas das raças que encontrou, alguma delas deveriam ter meios para se defender.

- Sim tinham, mas suas armas eram tão primitivas quanto à de vocês, mas seus espíritos não eram combativos como vocês.

Dxmaell se virou e sorriu, com seu olhar se tornando menos frio. Heero teve uma sensação estranha, que tomou conta de si, ao vê-lo sorrir; o Kdariano ficava ainda mais belo quando sorria, seus olhos pareciam criar vida. De repente seu olhar voltou a ficar frio e triste, como se o brilho em seus olhos tivesse se extinguido.

- Mas não eram fortes os suficientes para nos derrotar e acabaram sucumbindo. Outros se resignaram ao seu destino, quando descobriram que não tinham meios para sobreviver. Até agora sua raça tem resistido, Heero, foi por isso que resolvi tentar novamente, apesar de estarem em desvantagem, sua raça ainda não desistiu. Vocês continuam lutando. Uma raça que luta para sobreviver, não deve perecer.

- Obrigado.

- Não, eu é que agradeço, pois sua raça me fez ver que eu deveria continuar tentando. Se eu conseguir impedir minha raça de exterminar pelo menos a sua, já terá valido a pena minha decisão.

Dxmaell começou a sentir uma dor forte enquanto conversava com o humano. Ele sabia o que essa dor significava: sua energia estava baixando novamente. Heero viu o Kdariano fechar os olhos e tencionar as mãos como, se sentisse dor, e parecia respirar com dificuldade.

- Você está bem?

Dxmaell abriu os olhos ao ouvir a voz do humano. Não, ele não estava bem. Sua energia estava baixando novamente e ele não tinha como repô-la. Ele precisava normalizar seu padrão energético antes que ela baixasse a um nível crítico. Ele respirou profundamente tentando normalizar sua energia, conseguindo assim pensar mais claramente. A primeira atitude seria voltar a nave imediatamente, pois não conseguiria manter a dor sobre controle por muito tempo. Heero viu Dxmaell respirar profundamente, seu rosto parecia cansado e ele procurava se controlar.  O humano não sabia o que estava acontecendo, mas tinha plena certeza de que o que quer que fosse, estava causando dor ao Kdariano.

- Dxmaell?

- Eu vou ficar bem, não se preocupe. É apenas uma queda de energia.

- Você não me parece bem. Pareceu-me que você estava sentindo dor.

- Não é nada, mas eu tenho que ir agora. Eu preciso chegar a nave mãe antes... Por Kdrya

Heero ouviu o Kdariano falar algo em sua língua, mas não compreendeu o significado. O Kdariano se curvou no chão e seu rosto estava banhado por uma fina camada de suor. Ele mentira ao dizer que não era nada. Dxmaell sentiu seu corpo perdendo energia novamente e não pode impedir que uma dor alucinante transpassasse cada célula de seu corpo. Dxmaell curvou-se sobre o próprio corpo, caindo de joelhos no chão. Ele sentiu então, Heero se ajoelhar a sua frente e pousar a mão em seu ombro olhando em seus olhos.

- Diga-me em que posso ajuda-lo.

- Eu... não preciso de ajuda... isso vai passar.

- Antes ou depois de você desmaiar de dor?

- ....

- Eu tenho uma dívida com você, por isso me deixe ajuda-lo.

- Não...não  me... deve nada...Heero.

- Talvez não, mas ainda assim quero ajuda-lo.

Dxmaell olhou por alguns instantes a íris azul cobalto do humano. Ele precisava de ajuda, pois não conseguiria chegar à nave sem restabelecer seu padrão de energia, e isso seria impossível se não absorvesse um pouco da força vital do humano.

- Meu...meu corpo está...perdendo energia. Eu preciso absorver um pouco de energia para reorganizar meu padrão energético. Isso...não deveria estar...acontecendo...de...novo.

- Você já sentiu isso antes?

- Pouco antes de vir...mas...Aleng me deu...um pouco de....sua energia... Droga

- Se eu der um pouco de minha energia...você acha que poderia...

- Sim...mas você não precisa...fazer isso.

- Se você não absorver a energia necessária o que acontece?

Dxmaell desviou os olhos do humano. Sabia que deveria aceitar a ajuda dele; morreria se não absorvesse pelo menos um pouco, mas ele não queria tocar no humano, não queria absorver a energia dele. Ele nunca absorvera energia humana diretamente, ela era sempre repassada pelo Conselho, através de máquinas de absorção, que distribuíam a energia absorvida para a raça, Heero sabia o que aconteceria caso o Kdariano não aceitasse sua oferta. Ele viu isso nos olhos de Dxmaell, antes que ele desviasse o olhar, e, por algum motivo, não queria que o Kdariano morresse. Ele precisava salvá-lo, mas não queria ter sua energia absorvida por nenhum deles, porém não poderia deixa-lo morrer na sua frente.

- Se você morrer, como vai ajudar a minha e a sua raça? Pegue minha energia, sei que não deseja fazer isso, posso ver em seus olhos, mas você precisa dela. E sei que não vai retirar mais que o necessário.

Dxmaell olhou novamente para o humano. Ele tinha razão, não poderia morrer, não agora. Era imprescindível que sobrevivesse. Ele retirou a luva que cobria sua mão direita. E olhou para ela, os dedos longos e finos, bastaria um toque para começar a absorve-lo. Ele levantou a cabeça e olhou nos olhos do humano.

- Eu não vou machuca-lo.

- Eu sei que não.

Não muito longe dali um grupo de quatro humanos observava a cena. Wu-Fei olhou exasperado para Heero e o Kdariano.

- Que diabos o Yuy pensa que tá fazendo.

- Não sei, Wu-Fei, mas acho melhor esperarmos.

- Esperar o quê? Ele esta deixando o Kdariano absorver a energia dele.

- Ele deve ter um motivo para fazer isso.

- Que motivo?

- Não sei, mas vamos esperar. Se Heero achar que precisa de nossa ajuda ele nos avisa.

- Está bem, mas não gosto nada disso.

Dxmaell se aproximou do rosto de Heero. Para que absorvesse energia de forma rápida, teria que fazer o mesmo que fizera com Aleng. Heero podia sentir a respiração do Kdariano próxima a seu rosto, e visualizou melhor a íris ametista, que continuava presa a ele, os traços do belo rosto. Desviando o olhar para a boca do Kdariano, percebeu os lábios cheios e vermelhos. E imaginou se seriam tão macios quanto aparentavam . Dxmaell sentiu seu coração bater descompassado ao notar o cheiro almiscarado do humano e, pela primeira vez depois de se tornar comandante das tropas Kdar, sentiu medo. No fim, abaixou a cabeça, percebendo que não poderia beija-lo. Dxmaell poderia jurar ter ouvido o humano soltar o ar profundamente. O Kdariano levou sua mão direita ao rosto do humano, parando a poucos centímetros da pele dele.

- Eu vou tocar o seu rosto. Depois você vai sentir um formigamento na região que meus dedos tocarem. Não será doloroso eu prometo.

Heero sacudiu a cabeça, pois não confiava em sua voz no momento; por um instante ele achou que o Kdariano fosse beija-lo e se sentiu desejando o toque de seus lábios. Cortando sua vertente de pensamentos, sentiu os dedos frios tocarem seu rosto e um formigamento, então se sentiu leve, um calor estranho pareceu aquecer o seu corpo e fechou os olhos. Dxmaell sentiu a pele quente em seus dedos e se concentrou para absorver energia suficiente para controlar seu padrão energético. A energia do humano começou a fluir por seu corpo, o aquecendo e ele sentiu-se estranho. Temendo perder o controle, se afastou do humano, assustado e com uma sensação que nunca estivera presente antes. 

Heero abriu os olhos assim que sentiu o Kdariano se afastar. Ele olhou para ele e seus olhos se encontraram, mas Dxmaell desviou-os quando sentiu seu rosto ficar quente. Heero achou encantador quando o rosto de Dxmaell ficou vermelho, como se estivesse envergonhado. O Kdariano sentiu a energia do humano em seu corpo e se ficou bem com ela. Uma sensação de conforto percorreu cada uma de suas células e ele percebeu sua energia estabilizar. Havia sido o suficiente, ele conseguiria chegar até a nave mãe sem problemas.

- Você está bem?

- Sim, obrigado. Consegui estabilizar minha energia o suficiente para que terminemos de conversar e eu chegue até a nave mãe. Seus amigos não vão gostar de saber que deixou eu absorver sua energia.

- Como sabe?

- Nós podemos sentir energia em qualquer parte, Heero. Não é difícil pra eu saber onde seus amigos estão. Por que não diz a eles para se aproximarem, já que estão aqui.

- Desculpe-me.

- Não se preocupe, imagino que eles disseram que não deveria confiar em mim, que era uma armadilha, que estaria se arriscando vindo sozinho.

- É verdade. Wu-Fei achou melhor que outros viessem.

Heero sinalizou para os outros para que se aproximassem. Trowa olhou para Wu-Fei que bufou e se levantou. Ele e os outros dois humanos, que estavam do outro lado, saíram de suas posições e caminharam em direção ao Kdariano e a Heero. Eles esperaram que os outros se aproximassem. Wu-Fei olhou desconfiado para o Kdariano, que era o líder das tropas de invasão do império Kdar, mas não pode deixar de se sentir intimidado com o olhar frio dele. Ele era sem dúvida belo, como todos da sua raça, mas sua beleza era tão marcante que era difícil não admira-lo, mesmo sendo ele o inimigo.

Heero notou o olhar de Wu-Fei e dois outros dois humanos para o Kdariano. A raiva transparecia em seus olhos, assim como uma disfarçada admiração. Ele podia imaginar o porquê, já que ele tivera a mesma reação diante de tamanha beleza. Dxmaell exalava beleza e força, era quase impossível não admira-lo, embora o Kdariano não parecesse notar o quão belo era. Heero resolveu apresentar Dxmaell aos outros, antes que o clima ficasse ainda mais tenso.

- Wu-Fei, Andrew, Michael, este é Dxmaell.

- Dxmaell, estes são alguns dos membros da resistência, Trowa você já conhece.

- É um prazer conhece-los.

- Infelizmente não podemos dizer o mesmo.

- Andrew.

Heero olhou para o ruivo que tinha falado, sabia que os outros pensavam o mesmo, mas nenhum deles disse nada. O olhar de Heero era frio e sua voz soou baixa e perigosa, e isso fez com que Andrew recuasse e abaixasse a cabeça. Dxmaell olhou para Heero e depois para o humano que o recuou um passo. E sentiu, novamente, a sensação estranha de quando tocou o rosto do humano. Ele sentiu-se bem com isso, sentiu-se em paz e seguro.

- Não se preocupe, Heero, não me ofendi com isso. Andrew tem o direito de não gostar de minha presença. Não apenas direito, mas também razão em me odiar.

- Mesmo assim, Dxmaell, se nós vamos estar do mesmo lado, temos que esquecer nossas diferenças.

Dxmaell sorriu, sim é verdade eles tinham que esquecer suas diferenças para trabalharem juntos. Dxmaell colocou sua luva no lugar e estendeu sua mão ao humano como um gesto de paz. Andrew olhou para o Kdariano, seu olhar transmitia um voto de confiança de ambos os lados, ele estendeu seu braço e apertou a mão do Kdariano.

- Desculpe-me pelo que disse.

- Está bem.

Wu-Fei olhou para o Kdariano e depois para Andrew, voltando seu olhar, por último, para Heero. Ele ainda não confiava em Dxmaell, mas estava disposto a aceitar a aliança entre eles, porém ainda queria saber o motivo de Heero deixar o Kdariano absorver sua energia.

- Então, Yuy, não vai nos dizer por que o deixou absorver sua energia?

- Não.

- Não?

- Não creio que seja relevante dizer-lhe agora, Wu-Fei.

- Não vejo problema em contar a ele se quiser, Heero.

- Contarei mais tarde, agora temos que discutir outros fatos antes que volte.

- O que quer saber agora?

- Como vocês fazem para absorver a energia?

De repente o rosto de Dxmaell ficou lívido, o que não passou despercebido por nenhum deles. Dxmaell não via problemas em dizer a Heero, mas isso o faria confessar que ele quase havia beijado, há poucos instantes, o humano. Entre sua raça não havia uma restrição em relação a relacionamentos ou contatos físicos entre o mesmo sexo. Mas não sabia qual era a opinião do humano a respeito de relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo.

- Absorvemos energia através das câmaras de energia. Não a absorvemos diretamente, como fiz com você a pouco, apenas o Conselho faz isso. Eles absorvem a energia e a repassam para as máquinas de distribuição, que por sua fez repassam para as câmaras.

- Então como você a absorveu de mim?

- Existem três formas de absorvermos energia diretamente, sendo que cada uma delas é feita de acordo com a quantidade de energia a ser absorvido e a necessidade pelo qual se está absorvendo. Cada uma delas leva um certo tempo, ou seja, se você precisa absorver energia de forma rápida há uma maneira, se for de uma forma lenta ou de outra, a forma varia.

- A forma como absorveu a energia de Yuy, qual delas seria?

- A primeira, sendo que ela é diferente da forma que trocamos a energia uns com os outros.

- Vocês trocam suas energias?

- Sim, a cada período de tempo, trocamos nossas energias um com os outros de forma a passar nossos conhecimentos uns aos outros e fortalecer nossa raça.

- Interessante, então o que um sabe todos sabem.

- Depende, podemos manipular o que vamos passar aos outros, pelo menos no que diz respeito a nossos pensamentos, mas não há como esconder nada do Conselho.

- O que é o Conselho?

- O Conselho é a base de nossa sociedade, Trowa, eles é que ditam o caminho que nossa raça deve seguir.

- Então cada um dos planetas invadidos...

- Foram sob as ordens do Conselho.

- Eles não têm como descobrir que vocês estão nos ajudando?

- Apenas se formos colocados em frente ao Conselho. Eles unirão sua energia a nossa e terão acesso ao que sabemos e fazemos. Quando existia a coletividade, todos da raça compartilhavam os pensamentos, mas ela foi abolida há séculos pelo Conselho, agora apenas o eles tem o conhecimento de tudo. 

- Eles trocam a energia da mesma forma que vocês?

- Sim, da mesma forma, mas apenas entre eles mesmos.

- Quantos pertencem ao Conselho?

- O Conselho é formado por 7 Kdarianos em sua forma evoluída.

- Forma evoluída?

- Sim, somos feitos de energia, sendo que o Conselho alcançou um estágio de evolução onde eles não necessitam de um corpo físico como o meu. Eles são apenas energia, em sua forma simples e pura, cada um de cor distinta. Minha forma e a dos outros é de um estágio primitivo da raça.

- Então quando vocês evoluírem todos serão como o Conselho.

- Não, apenas os que forem especiais. Apenas alguns podem alcançar esse tipo de evolução.

- E o que acontece com o corpo físico quando evoluem?

- Não sei, acho que se torna parte da energia. Eu não sei muito sobre o Conselho, nós nos acostumamos a obedece-los sem contestar.

- Então sua sociedade gira em torno do Conselho?

- Sim. Eles dizem o que devemos fazer, quando e onde.

- E se alguém não obedece o Conselho?

- Então ele é levado à câmara de Kexdra e absorvido.

- Câmara de Kexdra?

- Seria como lugar de execução, onde o kdariano é despido de suas roupas e presos a um suporte de energia, tendo as pernas e braços presos perpendicularmente. Sendo sugado até que deixe de existir.

Heero notou que o Kdariano não se sentia a vontade ao falar sobre o Conselho e ficou imaginando se era o aconteceria a Dxmaell se o Conselho soubesse o que ele estava fazendo. Dxmaell sabia que esse seria seu destino  - a câmara de Kexdra - assim que o Conselho descobrisse o que ele é os outros estavam fazendo. Aleng e Tzen não seriam responsabilizados, não diretamente, uma vez que eles apenas seguiam suas ordens. E pelas leis de sua raça, um comandante é responsável pelos atos de seus oficiais, estejam eles corretos ou não. Dxmaell olhou para seu pulso e viu que já estava na hora de retornar ao espaço.

- Eu tenho que ir agora.

- Está bem.

- Eu vou voltar daqui a dois dias com meus oficiais. Há uma maneira de nos encontramos próximo ao campo de contenção L2?

- Wu-Fei?

- Sim, há um caminho que nos deixará próximos de lá.

- Estaremos lá.

- Eu enviarei um sinal, pelo comunicador, o avisando do encontro.

- Estarei esperando.

Dxmaell sacudiu a cabeça e começou a caminhar em direção a sua nave. Os demais humanos apenas o olharam ir e depois se viraram para ir embora, no entanto Heero ainda ficou o observando o Kdariano, a trança longa caindo pelo meio de suas costas até um pouco abaixo da cintura. Havia uma pergunta que estava martelando sua cabeça e que ele precisava saber a resposta, Heero correu até o Kdariano o chamando. Dxmaell ouviu Heero chamando seu nome e por algum motivo sentiu seu coração bater mais forte. Ele parou e aguardou que o humano se aproximasse. Os outros ficaram vendo Heero correr atrás do Kdariano. Wu-Fei se virou para Trowa que ergueu os ombros em sinal de que não sabia o que Heero estava fazendo.

- O que houve, Heero?

- Eu queria lhe fazer uma pergunta.

- E qual seria?

- Quais são as outras duas formas de absorção de energia?

- Por que...quer saber?

- Curiosidade.

Dxmaell olhou para o humano. Ele não parecia o tipo de pessoa que tivesse curiosidade.

- Através dos lábios e do ato sexual.

- A forma que você utilizou para absorver minha energia, não era a mais rápida, não é?

- Não, leva um certo tempo para a energia começar a fluir e começar a ser absorvida...

- Para absorver energia de forma mais rápida...

- Eu teria que beija-lo.

O rosto de Dxmaell ficou vermelho e Heero ficou com as faces coradas.

"Então naquele momento ele realmente ia me beijar, mas por que ele não o fez?"

- Por que não o fez?

Antes que pensasse, Heero deixou que a pergunta escorresse de seus lábios, curioso por saber o motivo do Kdariano  não o ter feito. Dxmaell olhou para Heero, sem saber  o que dizer. Heero notou pela primeira vez a confusão nos olhos ametistas.

- Eu...eu...não achei que devia. Minha raça não faz distinção entre homens ou mulheres. Mas em sua sociedade contatos entre pessoas do mesmo sexo não são bem vistos. Não sabia qual seria sua opinião a respeito e não queria que se sentisse enojado.

- Ah!

Heero olhava para o Kdariano, que olhava em direção aos outros humanos afastados. Ele não via problemas em relacionamentos entre pessoas do mesmo sexo, não que ele já tivesse tido algum, mas Heero sabia que não se sentiria enojado se o Kdariano o tivesse beijado.

- Eu não me sentiria, se o tivesse feito.

Dxmaell olhou para Heero e sentiu seu corpo tremer, ao ouvir o que humano dizia. Ele sentiu seu corpo se aquecer e uma necessidade estranha de tocar os lábios do humano assolou seus pensamentos. Antes que ele sucumbisse a essa vontade, decidiu que era hora de partir. Heero notou que o Kdariano tremeu ligeiramente ao ouvir suas palavras, embora não soube identificar se era um bom sinal. Ele parecia um pouco assustado e não ficou surpreso ao ouvi-lo dizer que precisava voltar.

- Eu tenho que ir, antes que sintam minha falta.

- Nos veremos novamente então em dois dias.

- Sim, eu devo vir a Terra com meus oficiais em dois dias. Tenho que controlar uma rebelião no campo de contenção L2 e encontrar um traidor.

- Controlar uma rebelião?

- Não se preocupe, não pretendo ferir os humanos responsáveis, mas rebeliões não são permitidas, e se eu não cuidar do caso, outro o fará e não será tão condescendente com sua espécie. Eu o aviso sobre nosso próximo encontro.

- Estarei esperando.

Heero estendeu a mão para Dxmaell que aceitou o cumprimento. Suas mãos se tocaram e Dxmaell sentiu um formigamento. Rapidamente encarou os olhos do humano, e alguma coisa estava acontecendo. Ele abriu a boca para dizer alguma coisa, mas não sabia o que dizer. Ele umedeceu os lábios, com a língua, e mordeu o lábio inferior. Heero sabia que era loucura, mas ele desejava beijar o Kdariano, desejava provar os lábios vermelhos e cheios. Mas  não seria o momento, portanto, ele soltou a mão de Dxmaell, que virou de costas. O Kdariano pressionou um ponto em seu braço direito e a nave abriu a porta, ele se virou mais uma vez para o humano e entrou na nave.

Heero observou o Kdariano entrar na espaçonave e partir. Só aí ele voltou para junto dos outros, para seguirem em direção as cavernas. Em dois dias eles se veriam novamente e em seu coração, Heero mal podia esperar que o momento chegasse. Mesmo sem querer admitir, ele se sentia encantado com o Kdariano.

Uma nave Kdariana se aproximou da nave mãe e solicitou permissão para aterrissar.

- Ponte, soldado Imaginihs, da nave PX789, vindo da Terra, solicitando autorização para acoplar.

O oficial da ponte balançou a cabeça concordando. O soldado de serviço achou estranho um oficial graduado como ele estar na ponte a quase três K, monitorando a entrada e saída de naves. Mas não era sua função imaginar o porquê dele estar ali, mas obedecer a suas ordens.

- Permissão concedida PX789 dirigisse para o setor 141

- Entendido ponte

O tripulante manobrou sua nave para o setor indicado, o local estava vazio como o previsto. Na ponte o oficial acessou o banco de entrada e saída de naves. Segundo o registro atual a nave PX789 jamais deixou sua posição no setor 141.

O oficial ainda permaneceu por alguns krs na ponte, até que foi convocado a ir para outro setor. Outro Kdariano assumiu seu posto e ele seguiu em direção a área de treinamento, onde era aguardado. Ao chegar encontrou um Kdariano de cabelo longo, preso em uma trança. Ele estava sentado no chão aguardando-o, assim que viu o oficial ele se levantou e caminhou em sua direção.

- Vamos até minha estação

- Está bem

Ambos caminharam em direção a ala das estações de descanso. Dxmaell tocou o lado esquerdo da porta com as mãos e ela se abriu. Uma luz clara e suave inundou o aposento, Aleng entrou logo após Dxmaell. O comandante pressionou um ponto na parede e a coluna de energia azul emergiu do chão até a altura de sua perna. Aleng tocou na parede em outro ponto do quarto e uma outra coluna de energia de tamanho fixo e inferior a primeira surgiu, na área direita do quarto, próximo a coluna maior. Aleng sentou-se e aguardou que Dxmaell falasse como havia sido o encontro. Dxmaell fez um resumo do encontro com os humanos, omitindo a parte em que sua energia havia diminuído novamente e ele foi obrigado a tocar o humano; no entanto, lembrar do ocorrido fez Dxmaell ficar vermelho, o que não passou despercebido pelo seu terceiro oficial.

- Dxmaell o que mais aconteceu enquanto estava na Terra?

Dxmaell olhou para Aleng, com as faces coradas, ele levou a mão ao rosto sentindo a quentura da pele.

- Por que acha que aconteceu mais alguma coisa?

- Porque você está com o rosto vermelho. E segundo os costumes desse planeta, geralmente isso acontece quando lembramos de algo ou alguém que mexe com nossos sentidos ou sentimentos.

- Eu...eu não sei do que fala.

- Então por que gaguejou?

- Eu não fiz isso

- Fez sim

Dxmaell olhou friamente para Aleng, que não se deixou abalar com o olhar do amigo, alguma coisa havia perturbado Dxmaell a ponto de faze-lo enrubescer e ele pretendia saber o quê. Seu amigo não costumava ser tão emotivo a esse ponto, ele tinha sempre suas emoções sobre controle, sempre frio e direto. E agora, como diziam os humanos, corava como um adolescente apaixonado. Mas seria isso possível, em tão pouco tempo? Dxmaell sabia que não estava bem, algo havia mudado dentro de si desde que encontrara o humano. O olhar dele o havia afetado, o azul de seus olhos o fascinara por algum motivo e quando tocou o seu rosto, ele se sentiu completo e seguro.

- É que minha energia baixou novamente enquanto estava na Terra

- E como você conseguiu voltar?

- Heero me deu um pouco da energia dele

- O humano!

- Eu toquei o rosto dele

Dxmaell se levantou e ficou andando de um lado para o outro, enquanto contava a Aleng o que havia acontecido, o que havia sentido e o que o humano havia dito. Aleng ficou surpreso, embora seus olhos não transparecessem isso. Seria verdade? Dxmaell havia mesmo pensado em beijar outro ser.

- Dxmaell, me diga...você sente algo pelo humano?

- Sentir algo?! Por Heero!? Eu... mal o conheço, Aleng, como poderia sentir algo por ele. Além do mais, isso não faz parte de minhas prioridades.

- Mas você poderia aprender com ele, Dxmaell.

- O que Heero poderia me ensinar?

- Ele poderia ensina-lo a sentir, a descobrir o que é ser tocado por prazer e não por dever.

- Toca-lo?

- Sim, mesmo que não admita isso, você deseja isso, assim como qualquer um de nós...você também deseja alguém para tocar ou alguém para... toca-lo, Dxmaell. Como você descreveria o que sentiu quando tocou o rosto de Heero?

Dxmaell olhou para Aleng, pensando o que poderia dizer. Ele se sentiu bem com o contato breve e isso o assustou mais do que gostaria de admitir. Aleng podia perceber o conflito que Dxmaell parecia sentir dentro de si. Caminhou até o amigo e sentou-se ao seu lado, se aproximou de seu ouvido e sussurrou suavemente três palavras e depois saiu o deixando sozinho.

- Não tenha medo.

Medo... sim era o que sentia. Medo de se aproximar demais do humano. Medo de toca-lo e desejar ser tocado por ele. Medo de se importar. Medo de falhar novamente. Medo de que sua crença, em que os Kdarianos podiam sobreviver pacificamente com outras raças, fosse infundada. Ele temia tantas coisas que se achava incapaz de continuar a lutar sozinho. Dxmaell deitou-se e fechou os olhos, enquanto um nome deixava seus lábios suavemente.

- Heero.

Na Terra, Heero estava em seu alojamento, tentando, em vão, dormir, mas não conseguia tirar o Kdariano da cabeça: seu olhar assustado, seus cabelos presos em uma trança, os lábios vermelhos e cheios. Pensar em Dxmaell o estava tirando do sério! Ele sentiu seu baixo ventre doer em resposta.

"Como você fez isso. Como você me enfeitiçou, me fazendo deseja-lo? Um ser de tamanha beleza, que inspira o desejo. O que era aquilo que vi em seus olhos. Seria medo? Mas o que teme? Gostaria que me deixasse descobrir o que esconde."

Heero fechou os olhos procurando dormir; daqui a dois dias ele encontraria novamente o Kdariano.

Dois dias depois campo L2 de contenção de humanos 

Arcom viu a nave de Dxmaell pousar. Ele não sabia o que o comandante estava fazendo ali, ele não havia sido comunicado disso. Dxmaell e seus oficiais desceram da nave, sendo acompanhados de outros três soldados Kdarianos. Arcom se aproximou de Dxmaell para cumprimenta-lo. Dxmaell notou o desconforto do tenente a sua presença; sabia que Arcom não havia sido informado sobre sua vinda.

- Comandante Dxmaell, não o esperava.

- Eu sei, Arcom.

- Se tivesse me avisado teria preparado uma recepção a altura.

- Não é necessário. Além do mais não vim a passeio, Arcom. Chegou a meu conhecimento que está tendo problemas para lidar com alguns humanos e o Conselho me pediu para verificar.

A um gesto de cabeça de Dxmaell, Aleng, Tzen e os soldados que vieram com ele, se espalharam pelo campo. Arcom olhou para Dxmaell que começou a caminhar, sob o olhar de alguns humanos que estavam por perto. Muitos estavam admirados, pois jamais haviam visto um Kdariano tão belo. Não muito longe dali outros humanos observavam com atenção os Kdarianos que tinham chegado ao campo.

- Parece que ele veio, como disse.

- Sim, no horário combinado. 

- Não me parece que o outro goste da presença dele.

- É o que parece.

- Heero?

- Vamos para o local combinado.

Heero e os outros se levantaram e foram para o local que Dxmaell havia dito, pela manhã, que o encontraria. Heero ainda se lembrava de como se sentiu ao ouvir e ver a imagem holográfica de Dxmaell pela manhã.

06h da manhã, horário terrestre, esconderijo da resistência humana.

Heero não tinha conseguido dormir muito bem, e hoje seria o dia em que o comandante das tropas Kdar, Dxmaell, havia dito que se encontrariam novamente. Heero levantou se espreguiçando, seria um longo dia. Ele trocou de roupa colocando um spandex verde; em seguida, deitou-se no chão e começou a se exercitar. Ele colocou as mãos cruzadas sobre o peito, flexionou as pernas as mantendo juntas e ergueu o tronco, trabalhando o abdômen.

6k e 30kr da manhã, horário Kdariano, estação de descanso 376

Dxmaell levantou-se. Seria hoje o dia em que ele se encontraria com o humano novamente. Ele não havia deixado de pensar em Heero nesses dias. Pensar no rosto do humano o deixava mais tranqüilo, mas precisava informa-lo onde se encontrariam e a que horas. Dxmaell se aproximou da parede e uma coluna de energia transparente começou a escorrer pela superfície, quando se condensou, formou um espelho. Dxmaell prendeu os cabelos na trança, vestiu uma calça preta, que se moldava ao seu corpo, e uma camisa sem mangas, que vestia por baixo do uniforme. Ele se colocou em pé novamente, em frente ao espelho de energia, e se concentrou para falar com Heero, projetando sua imagem através do comunicador que estava com o humano.

O corpo de Heero já estava todo coberto por suor, ele estava erguendo alguns pesos, sentado na cama trabalhando os braços, quando uma voz o fez olhar para o lado e ele viu o Kdariano Dxmaell em pé o observando.

- Bom dia, Heero, espero não estar atrapalhando.

Dxmaell teve que usar todo o seu controle para que sua voz soasse firme. Ele não esperava encontrar Heero sem camisa e se exercitando. Ele ficara quase 10kr observando o humano levantar os pesos, cada músculo do braço flexionando devido ao esforço. De repente, se sentiu com calor e ofegante, acompanhando os movimentos de subida e descida do braço humano.  Heero ficou surpreso em ver a imagem de Dxmaell a sua frente, apesar de translúcida, ele notou que o Kdariano parecia um tanto ofegante e ruborizado. Ele abaixou os pesos no chão e pegou uma toalha, enxugando o suor do peito e do rosto. Seu olhar encontrou-se com o de Dxmaell, que parecia vidrado por alguma coisa em seu peito. Dxmaell percebeu que estava observando demais o humano e desviou o olhar. Heero sorriu e vestiu uma camisa preta, cobrindo o corpo. Quando Heero falou, Dxmaell levantou a cabeça e notou que o humano havia colocado uma camisa, o que o deixou um tanto desapontado.

- Não me atrapalha, Dxmaell.

- Eu vim avisar que estarei no campo L2 ás 14h terrestre. Vocês devem me encontrar ás 15h45min a 15km ao leste do campo, existem algumas formas rochosas no local, assim como túneis. Será o melhor lugar para nos encontrarmos.

- Estaremos lá.

- Eu devo ir agora, é arriscado permanecer muito tempo conectado ao comunicador, o Conselho pode rastear meu padrão de energia.

- Está bem. Nos veremos no horário e local combinado.

Dxmaell sorriu e cortou o chamado, ele tinha algumas coisas a providenciar antes de descer a Terra. Precisava encontrar Tzen e saber o que ele descobriu. Vestindo o restante de seu uniforme, Dxmaell deixou sua estação e se encaminhou para uma unidade de alimentação, conforme o costume. Heero ficou olhando ainda alguns minutos para o local onde a imagem de Dxmaell havia surgido. Depois se levantou e foi tomar banho, ele precisava falar com Wu-Fei e os outros sobre o encontro.

Dxmaell havia deixado Arcom falando sozinho, enquanto caminhava pelo campo, sabia que estava sendo vigiado pelos oficiais de Arcom, uma vez que eles não disfarçavam que o estavam seguindo. Um grito humano chamou sua atenção e ele correu em direção a ele. Encontrou uma menina humana, que não deveria ter mais do que seis anos, e dois rapazes humanos que deveriam ter entre 24 e 26 anos. A menina estava acuada em um canto, enquanto os rapazes tentavam chegar até ela.

Os rapazes usavam um uniforme Kdariano. Alguns humanos aceitavam trabalhar para sua raça vigiando outros de sua espécie, impedindo que fugissem ou criassem problemas, em troca eles não eram absorvidos. No entanto muitos dos humanos utilizam de suas posições, junto aos Kdarianos, para oprimir e aterrorizar outros de sua própria espécie. Às vezes faziam coisas muito piores, e Dxmaell não via nenhum motivo para não absorve-los ou simplesmente mata-los. Um deles conseguiu pegar a menina que começou a se debater tentando se soltar. Ele segurou o cabelo da menina, a fazendo chorar, enquanto lhe dizia cruelmente o que faria.

- Muito bem menina, você vai ver o que a gente faz com garotinhas respondonas como você.

- É, nós vamos dar você para os Kdarianos absorverem.

- Não!

- Sim, e isso é para você aprender a não nos desobedecer.

- Posso saber o que a menina fez?

Os rapazes olharam para trás ao ouvir a voz fria. Eles se viram frente a um Kdariano que nunca haviam visto. Notaram que ele era belo, mas seu olhar era tão frio que começaram a tremer ligeiramente. A menina aproveitou a distração para chutar o calcanhar do rapaz, que a segurava pelos cabelos, o fazendo solta-la. Assim que se viu livre, correu para trás do Kdariano e se agarrou em uma de suas pernas, mostrando a língua para os dois rapazes. Dxmaell olhou para a menina agarrada a sua perna direita; ela levantou os olhos úmidos, e apesar de assustada, ela sorriu para o Kdariano. Dxmaell voltou seu olhar frio para os dois rapazes.

- Ainda estou esperando uma resposta.

Os rapazes olharam um para o outro. Eles não sabiam quem era o Kdariano, e pelas roupas que usava, poderia ser um soldado comum que havia sido transferido para o campo. O rapaz mais velho decidiu saber primeiro quem era o Kdariano, pois se fosse um simples soldado sabiam que nada tinham a temer, já que Arcom lhes tinha dado liberdade para tratar os humanos do campo com quisessem. O rapaz de cabelos pretos se aproximou de Dxmaell, o olhando com altivez e cinismo, e quando falou, sua voz estava carregada de sarcasmo. O outro, o loiro, ficou afastado apenas observando.

- E eu posso saber quem é você, Kdariano?

Dxmaell bateu de leve na cabeça da menina, para que ela o soltasse. A menina o soltou e Dxmaell olhou para o humano, o agarrando pelo pescoço antes que ele percebesse. O outro fez menção de ajudar o moreno, mas o olhar que o Kdariano lhe dirigiu o fez recuar. Dxmaell suspendeu o corpo do humano do chão e o trouxe para mais perto. Seus olhos estavam escuro e sua voz soou fria e cortante.

- Por que não pergunta aos Kdarianos atrás de mim? Tenho certeza que eles dirão a você.

- Eu....eu...

- Dê-me apenas um motivo para não mata-lo, humano.

- Dxmaell.

Dxmaell não precisou se virar para saber quem o havia chamado, reconheceria a sua voz de olhos fechados. Ele continuou segurando o humano com a mão e olhando para o outro, que estava tão assustado quanto o que segurava.

- Comandante....

- Me diga, Arcom, esses humanos trabalham para você?

- Er... sim senhor

Dxmaell soltou o humano, que caiu no chão segurando o pescoço marcado com os dedos de Dxmaell. O comandante se virou para Arcom que tremia levemente.

- Posso sabe por quê deu a esses humanos tamanha liberdade? Que eles se acham melhores que nós.

- Eu jamais....

- Jamais? Não foi o que me pareceu, Arcom. Não me surpreende o fato de haver rebeliões em L2, uma vez que esses humanos são responsáveis por criar contenda entre os humanos do campo.

- Eles trabalham para manter os humanos sobre controle.

- Controle? Assustar uma menina de seis anos é chamado de controle agora. Que tipo de rebelião ela está promovendo, Arcom? Que plano malévolo ela teria desenvolvido para nos atacar?

- Senhor eu...

- Você é tão culpado por essas rebeliões, quanto eles são culpados por se acharem alguma coisa. Discipline seu pessoal, Arcom, não quero ter que resolver seus problemas.

- Será feito senhor.

Dxmaell começou a caminhar sendo acompanhado pelo olhar da menina. Ele olhou para a menina e gesticulou, a chamando com a mão. Ela se aproximou e ele se agachou em frente a ela. Muitos humanos ficaram observando o Kdariano, que passava a mão sobre os fios loiros da criança. Arcom estava vermelho de raiva, por causa dos idiotas humanos ele havia se indisposto com Dxmaell novamente e isso não era bom. Ele precisava retirar o comandante do campo e já tinha uma idéia de como faze-lo. O tenente sinalizou para os outros dois Kdariano, que ele havia mandado seguirem Dxmaell, levarem os dois humanos dali, depois ele veriam o que faria com eles. Pelo canto do olho Dxmaell viu os Kdarianos levarem os humanos. Por mais que desejasse acabar com aqueles dois inúteis não poderia deixar Arcom mata-los, afinal era por todos os humanos que estava lutando.

- Vá para junto de seus pais criança.

A menina correu e Dxmaell se encaminhou para onde eram levados os humanos que causavam problemas. Ele encontrou-se com Aleng e Tzen para explicar a a situação. Os humanos foram levados às celas de controle, onde seriam mantidos até que se decidissem o que seria feito deles; geralmente os humanos que eram trazidos até ali eram absorvidos.Dxmaell pediu a Aleng que falasse com os humanos presos sobre como era o comando de Arcom no campo, enquanto Tzen falava com os demais que viviam em L2. Dxmaell se encaminhou a sala de comando do campo, onde Arcom deveria estar. Ele pode ouvir Arcom conversando com o Conselho, assim que entrou na sala. Arcom se virou assustado ao notar que Dxmaell havia entrado; quanto da conversa o comandante havia escutado? Os olhos de Dxmaell se estreitaram e se tornaram mais escuros, mas ele procurou controlar-se, porém já sabia que teria de retornar a nave mãe.

- Comandante, eu não percebi que estava presente.

- Tenho certeza que não, Arcom. O que o Conselho queria?

- Eles pedem que retorne a nave mãe, mas eles não explicaram o motivo.

- Hn. Não mate os humanos, eles ainda podem ser úteis.

Dxmaell se virou e saiu. Precisava falar com seus oficiais.

Alguns minutos depois:

- O que eles querem com você novamente?

- Não sei, mas sei que isso é obra de Arcom. Não posso me recusar a ir.

- E quanto o encontro com os humanos?

- Vocês deveram encontra-los, conforme o combinado. Ensine a eles como se defenderem de nossas armas e os pontos fracos de nossos corpos. Ensinem apenas o necessário para que eles possam combater.

- Você vai retornar?

- Vou tentar, mas não sei o que o Conselho deseja de mim. Por isso não vou prometer. Apenas para constar, vocês retornaram comigo, no entanto vou deixa-los próximo ao local de encontro e depois sigo para me encontrar com o Conselho.

- Não gosto disso comandante.

- Eu também não, Tzen, mas eu tenho que ir. Vou querer um relatório sobre a situação dos humanos no campo quando voltar.

- Sim, comandante.

Dxmaell e seus oficiais entraram na espaçonave. Ele assumiu os controles da nave e acionou a camuflagem, para que Arcom não visse sua trajetória.

Arcom viu a nave Dxmaell partir e seus oficiais irem com ele. Um sorriso iluminou o seu rosto, ele havia sugerido ao Conselho provar a fidelidade de Dxmaell. Notando que o comandante estava se importando demais com os humanos, ele explicou as reações de Dxmaell ao Conselho: como ele protegeu a menina dos outros humanos e como não os matou quando eles o desrespeitaram. O Conselho achou justa a aplicação da prova e ordenou que Dxmaell retornasse imediatamente.

- Vamos ver, Comandante, se você será capaz de passar pela prova.

A nave desceu 15 km depois do campo, no local que se daria o encontro com os humanos, e Dxmaell achou melhor manter a camuflagem acionada. Ele acompanhou seus oficiais até a entrada da nave, mas não a deixou. Seu olhar se encontrou com o de Heero e ele sentiu seu corpo tremer ligeiramente. Heero achou estranho o fato de Dxmaell não descer da nave, então caminhou em sua direção, parando a poucos metros dele.

- Olá, Heero. Aleng e Tzen vão ajuda-los...infelizmente...eu não poderei ficar. Tenho que retornar a nave mãe.

- Por quê?

- Meus oficiais explicaram o que devem saber.

Dxmaell se virou e entrou na nave. Os Kdarianos e Heero se afastaram, um nuvem de poeira foi erguida envolvendo-os. Heero se voltou para os dois kdarianos que haviam trazido ele e Trowa de volta a Terra. Aleng se aproximou e informou Heero sobre o que havia acontecido.

- O Conselho o chamou de volta.

- E por quê?

- Não sabemos, mas Arcom deve ter dito algo sobre o fato de Dxmaell ter ajudado a menina humana.

- Entendo. Ele ficará bem?

Aleng e Tzen olharam um para o outro. Eles não tinham a menor idéia do que o Conselho queria com Dxmaell. Eles esperavam que tudo desse certo, mas não tinham como garantir isso. Heero soube, pela demora dos Kdarianos em responder, que Dxmaell não estaria nada bem. O fato do Conselho tê-lo chamado parecia ter surpreendido os kdarianos, no entanto ele ouviu Tzen responder a pergunta, tentando parecer mais confiante do que realmente estava, apesar de não saber exatamente como os dois Kdarianos estavam realmente se sentindo.

A espaçonave de Dxmaell aterrissou na nave mãe 15kr após ter deixado Aleng e Tzen com Heero e os outros. Ele caminhou em direção ao salão onde ficava o Conselho. Assim que entrou ele se ajoelhou em frente as sete formas de energia que o aguardavam.

- Dxmaell sabe o motivo de ter sido convocado?

- Não, mas presumo que Arcom deve tê-los informado sobre meus atos.

- De fato ele o fez.

- Ele sugeriu que você tem simpatia pelos humanos.

- A ponto de se importar com eles.

- Você nega isso, comandante Dxmaell?

- Nego.

- Nega também que ajudou uma criança humana?

- Ajudou-a de sua própria espécie?

- Nega que você a tocou sem a menor intenção de absorve-la?

- Não, eu não nego.

- Então você afirma que a ajudou?

- A tocou?

- E se importou pela segurança dela?

- Sim, mas não porque me importe com a segurança da criança. Mas porque se ela se ferisse, os humanos responsáveis por ela, poderia desejar se vingar dos outros humanos. Ela possui o sinal dos procriadores, os humanos não possuem tantas crianças. Quanto mais humanos se perderem, menos energia existira para ser absorvida. Eu a ajudei pensando em nossa sobrevivência. Apenas isso.

- Você estaria disposto a passar pela prova.

- Provar sua fidelidade.

- Para com o Conselho?

Dxmaell respirou fundo se levantou e ergueu seus olhos para o Conselho.

- Sim, eu aceito passar pela prova.

- Que assim seja.

O corpo de Dxmaell foi erguido do chão por uma coluna de energia, o elevando a uma altura de quase 5 metros. Sete outras colunas de energia que mais se assemelhavam a tentáculos tocaram a coluna que sustentava o corpo de Dxmaell. Sete energias distintas, tão fortes que Dxmaell sentia seu corpo sendo espremido. A prova de fidelidade começou; ela que se constituía de um questionamento mental, onde o Conselho se unia a energia do Kdariano a passar pela prova, retirando dele toda a verdade. Dxmaell procurou se concentrar em responder apenas o perguntado e evitando que assim o Conselho entrasse completamente em sua mente.

- Quem você é?

- Dxmaell, filho da casa de Klaryos, primeiro comandante das tropas Kdar

- Por quem você luta?

- Pelo povo de Kdra

- A quem você serve?

- Ao povo de Kdra

- A quem você segue?

- Ao Conselho

- Em que você acredita?

- ....

Dxmaell não poderia dizer a verdade sobre em que acreditava. Ele teria que mentir, mesmo que a verdade transparecesse em seus olhos. Havia apenas uma verdade em que acreditava, mas sabia que se dissesse ela seria sua execução e ele ainda não estava pronto para morrer. Não antes de tentar ajudar os humanos o máximo que pudesse. Havia apenas uma pequena chance de que o Conselho aceitasse a resposta, ele precisava apenas ser verdadeiro, mesmo que ela não fosse a verdade. O Conselho estranhou o fato de seu comandante ainda não ter respondido a pergunta, a resposta possível era uma apenas, não deveria haver dúvida quanto a ela.

- Dxmaell, em que você acredita?

- Que devemos sobreviver

O Conselho o observou por alguns minutos, sim, era a resposta que queriam, mas não a que estava escrita nos olhos de Dxmaell, a verdade que o comandante de suas tropas acreditava era outra. Mas eles não tinham como sabe-la, a menos que entrassem em contato com o padrão de energia mental dele e isso poderia vir a mata-lo. Por agora a resposta era aceitável.

- A que preço?

- ...

Novamente o silêncio, o Conselho aguardava uma resposta de seu comandante, não havia um preço. O que fosse necessário fazer, eles fariam, essas eram as leis do Conselho. Sobreviver acima de tudo, sem se importar com o que tivesse que fazer para conseguir isso. Apenas os Kdar são importantes, todas as outras raças eram descartáveis.

Não havia um preço justo para a sobrevivência de seu povo, não quando a sobrevivência de seu povo dependia do exterminio de outra raça.

- Dxmaell?

- Ao que o Conselho achar necessário.

- As ordens de quem você obedece?

- As do Conselho

- A quem você deve sua lealdade?

- A Kdra.

- Kdra?

- Por que a Kdra?

- Kdra está morta.

- Deixe-o responder.

- Diga, Dxmaell, por que sua lealdade é para com Kdra.

- Porque o Conselho é Kdra

O Conselho ficou em silêncio por alguns krs. As sete colunas de energia se afastaram da coluna central, onde Dxmaell estava. O corpo de Dxmaell tocou-o novamente o chão e ele se ajoelhou. Seu corpo doía, assim como sua mente, devido ao esforço que havia feito para encobrir a verdade. Um dos membros tentara sonda-lo mentalmente, mas ele conseguira bloqueá-lo. 

- Levante-se, Dxmaell

- Você passou pela prova

- Como imaginamos que o faria

- Sua lealdade para com a sua raça foi provada

- Volte a Terra e encontre o traidor de nosso povo

- Será feito

Dxmaell se levantou e deixou o salão do Conselho. Ele havia passado. Mas sabia que havia sido por pouco. O tempo estava correndo e ele não tinha mais tempo a perder. Ele retornou a sua espaçonave e se encaminhou a Terra, novos planos tinham que começar a serem elaborados.

Continua....

[1] Narbut nome de um asteróide

Agradeço a todos os comentários enviados.