A expressão: "você não mudou nada" veio na mente de Amélia no momento em que ela viu Dallas na sua frente, com uma expressão chocada no rosto e segurando a maçaneta da porta com força. A velha mulher olhou a mais jovem de cima a baixo, a avaliando. Dentro de seus jeans desbotados, sua camisa e tênis, Dallas ainda poderia se passar pela menina que viu pela última vez. Porém, ela não era mais uma menina. E apesar da face ainda ser jovial, senhora Winford poderia ver dentro dos olhos azuis os traços de uma mulher madura e experiente, totalmente diferente – e se afastando completamente – da Dallas de vinte anos atrás.
-O que você está fazendo aqui? – perguntou como se estivesse recebendo a visita de Voldemort em pessoa em sua casa.
-Não vai me convidar para entrar? É rude deixar as pessoas paradas na porta. – a jovem olhou da mulher para a rua, onde não via nenhum carro. Ou ela viera de táxi, o que é pouco provável, ou dispensara a limusine, contando que ela a recebesse.
-Entre. – disse entre dentes, depois de um tempo de hesitação, e abriu mais a porta para ceder passagem.
Amélia, como sempre, entrou altiva no local e esperou por Dallas, que lhe acompanhou até a sala de estar.
-Não quer se sentar? – convidou a boticária, ainda com um pé atrás diante dessa visita repentina. –Aceita alguma coisa? Água? Chá?… Veneno? – murmurou a última palavra sob a respiração, a fazendo escapar dos ouvidos de Amélia, tentando ser polida enquanto ainda se recuperava do choque.
-Aceito um chá. – respondeu a senhora e Dallas sumiu por um corredor que provavelmente levava a cozinha.
Enquanto esperava, a mulher resolveu dar uma olhada ao seu redor. A sala era bem grande, na verdade parecia que a casa era bem grande por dentro, enquanto por fora ela aparentava ser uma casa normal de classe média. A mobília era de tons neutros, composta por sofás e cadeiras e uma mesa de centro. Nas paredes havia quadros, alguns enfeites, sendo que três deles consistiam no que parecia ser bandeiras de times. Uma era laranja vivo, e estava escrito Chuddley Cannons. A outra era verde escura e estava escrita Holyhead Harpies, enquanto a terceira era azul marinho com os dizeres Puddlemere United.
Continuou a sua observação, notando que encostado a um canto da sala estava um piano, a fazendo lembrar da época em que fez Dallas ter aulas do instrumento, pois considerava tocar piano algo de classe. Parece que certos hobbies ela não tinha abandonado. Em outro canto estava uma enorme lareira, adornada por molduras em cima dela. Aproximou-se do local, olhando as fotos. A primeira dela era uma foto preta e branca, com uma data que indicava o ano de 2007. Sua neta estava nela, sendo abraçada por trás por um rapaz alto e de cabelos negros. Na foto, a coisa que mais se destacava eram os olhos dos dois, que foram mantidos coloridos. Ambos estavam semi despidos, ao menos era o que parecia, pois apenas um tecido leve cruzava o corpo de Dallas, cobrindo os seios dela mas deixando a mostra o que a mulher achou ser o principal motivo de aquela foto existir. Era uma foto artística, mostrando um casal feliz com a chegada de seu primeiro filho, que repousava ainda dentro da enorme barriga da mãe. Observou ainda mais as fotografias, encontrando uma outra moldura de dois anos depois da que tinha acabado de ver. A estrutura da foto era a mesma, o que diferenciava era apenas a posição dos fotografados e o tamanho da barriga de Dallas, que parecia ser o dobro da primeira foto.
Olhou mais e achou o que queria, depois de ter visto as duas primeiras molduras. Era uma foto colorida de três crianças. Um menino mais velho, muito parecido com o rapaz da foto com Dallas, mas com olhos azuis escuros. Uma menina que era muito parecida com a sua neta, com olhos verdes vivos. E um terceiro garoto, que era uma mistura de Dallas com o rapaz das outras fotos, mas com os olhos de uma cor intensa de violeta.
-Cor estranha… - murmurou.
-Tem explicação. – Amélia virou-se para ver a jovem depositar uma bandeja com chá e biscoitos sobre a mesa. –Segundo o que o professor Dumbledore me disse, a magia correndo no sangue tende a alterar certos atributos nos bruxos. Cores peculiares de cabelo, olhos, e outras coisas. Eu tive uma professora que tinha olhos dourados e iguais aos de uma águia.
-Quais os nomes deles? – perguntou a senhora, caminhando até o sofá de três lugares e se acomodando nele. Dallas hesitou um pouco, mordendo o lábio inferior. Bem, não faria mal dizer os nomes.
-O mais velho se chama Evan…
-Quantos anos ele tem agora?
-Vai fazer dezessete. Os gêmeos se chamam Day e Hannah.
-Idade?
-Quatorze.
-Winford's. – disse a velha mulher.
-Potter's. – Dallas a corrigiu. Eles poderiam ser Winford's, mas apenas no sangue, porque no nome eles eram Potter's.
-E onde eles estão agora?
-Nesse momento? A caminho de Hogwarts.
-Então eles são…
-Todos os três. – Dallas respondeu calmamente, preparando um chá para si e sentando-se na cadeira em frente à Amélia.
-São lindas crianças. – comentou e a morena remexeu-se em sua cadeira.
-Okay… vou dizer isso de maneira clara e espero que você entenda. Corta essa sra. Winford, você não veio aqui para dizer que os meus filhos são uma gracinha.
-Pois bem. – Amélia bebeu um pouco de seu chá, o depositando logo em seguida sobre a mesa, silenciando-se por algum tempo.
-E então? Eu estou esperando, não tenho o dia todo. Tenho trabalho para fazer.
-Trabalho? – perguntou a mulher, com uma sobrancelha erguida. No que Dallas poderia trabalhar? Aquela menina nunca teve talento para nada, exceto para música e gerenciamento de negócios, coisas que lhe foram ensinadas desde pequena. E, como se adivinhasse o que a sua avó pensava, a jovem levantou-se e foi até uma das paredes da sala, trazendo com ela dois quadros que entregou a senhora.
-Mestrado em Poções. – leu Amélia.
-A primeira da turma. – respondeu Dallas, como se a desafiasse a dizer que ela não era boa em alguma coisa.
-Diploma de Boticário e Ministração de Ervas Mágicas.
-Sou mais especializada em Cosmetologia Mágica. Adoro misturar coisas. – deu um sorriso enviesado, notando com uma inspirada mais profunda no ar um cheiro familiar. –Hum… Fragrância n°19. – falou e Amélia piscou confusa.
-O quê?
-O seu perfume. Fragrância n°19.
-Como você sabe? Comprei em uma loja nova…
-Da Magia a Sedução.
-Conhece?
-É minha. – disse, dando de ombros, como se fosse a coisa mais simples do mundo de se entender.
-Como assim, sua?
-A loja me pertence. Assim como as outras cinco que eu tenho.
-Sua? Pensei que essa loja fosse de Clarisse. – respondeu, referindo-se a empregada que trabalhou consigo há dezoito anos atrás, até que um dia pediu demissão depois de ter arrumado um namorado e engravidado dele. Não a viu desde então, até que uma semana atrás a encontrou nessa loja.
-Clarisse trabalha para mim. É a gerente das minhas filiais no mundo trouxa.
-Hunf! No fim você acabou virando uma mulher de negócios, depois de protestar tanto que não queria essa vida.
-A diferença é que eu escolhi essa vida, ninguém a impôs a mim.
-Tanto faz. – resmungou a mulher e Dallas remexeu-se mais uma vez em sua cadeira.
-O que você quer Amélia? – perguntou aborrecida, já cansada da presença da senhora em sua casa. –Não deve ser para saber como eu estou, pois há vinte anos que você declara a imprensa que não está interessada no meu paradeiro. Segundo porque se quisesse saber sobre mim, a primeira coisa que teria dito seria: como vai você?
-Certo. Vou direto ao ponto. Estou velha, Dallas…
-Jura? Se não me dissesse eu nunca saberia.
-E apesar de seu pai ser meu herdeiro, você ainda é a minha principal herdeira, a que irá reger o império Winford. Bem, você e… - ela lançou um olhar para as fotos na lareira. -… era… pois agora tem os seus filhos também. Mas como eles são todos menores de idade, você que vai ter que dirigir o patrimônio deles.
-Eu já administro o patrimônio deles, sra. Winford.
-Mas eu me refiro à fortuna Winford, não os trocados que você deve ter conseguido vendendo perfume.
-Garanto que esses trocados, como à senhora diz, são o bastante para os meus filhos quando eu morrer. E assumir as empresas Winford não faz parte dos meus planos de vida.
-E você espera que aconteça o que com as empresas quando o seu pai e eu nos formos? – Amélia elevou um pouco a voz, não gostando do rumo que a conversa estava tomando.
-Venda as ações para os sócios minoritários, a desintegre, não morra, sei lá. Façam o que tiverem vontade.
-Mas de jeito nenhum! – Amélia levantou-se de seu assento, indignada. –Não vou deixar que uma fortuna e um nome de mais de um século de tradição seja jogado no lixo por sua causa. Não foi isso o que eu lhe ensinei, Dallas!
-Acontece, sra. Winford, que eu felizmente esqueci tudo o que a senhora me ensinou. E eu deveria saber que você aparecendo na minha porta boa coisa não poderia ser.
-Pois fique sabendo que, gostando ou não, você ainda é a herdeira dos Winford's, assim como os seus filhos. Se não gosta do fato de que será a futura administradora das empresas, com certeza os seus filhos serão.
Irritada, Dallas ergueu-se violentamente da cadeira, caminhou até a porta da sala e a escancarou abruptamente.
-A senhora não tem o direito de vir a minha casa e impor coisas como se ainda tivesse alguma influência na minha vida. E muito menos tentar manipular a vida da minha família.
-Dallas, espere, eu não queria…
-A porta da rua é serventia da casa, sra. Winford. – disse, segurando a maçaneta fortemente. Resignada, Amélia pegou a sua bolsa e, com postura arrogante, saiu da casa.
-Essa conversa ainda não terminou Dallas Winford. – disse da soleira.
-É Potter. – foi tudo o que Dallas respondeu antes de bater a porta na cara da mulher.
O expresso de Hogwarts foi diminuindo a velocidade enquanto alcançava a estação. Assim que chegou a Hogsmeade parou abruptamente com um solavanco e segundos depois seus passageiros começaram a desembarcar, apinhando a plataforma. Como sempre, se destacando de todos, Hagrid estava a um canto do local, empunhando uma lanterna e a sacudindo acima da cabeça dos alunos, chamando os estudantes do primeiro ano para irem com ele.
Day desceu do trem, olhando a sua volta como se esperando que algum animal feroz pulasse sobre si a qualquer momento. Na verdade, esperando mais que Alexei pulasse sobre si a qualquer momento. Quando não conseguiu divisar o rapaz alto entre os alunos, soltou um suspiro de alívio, para logo depois suprimir um grito quando alguém segurou em seu braço.
-Não fique parado aí atrapalhando o caminho. – Rory o chamou, o arrastando por entre a multidão para as carruagens, ganhando outro suspiro de Day, que se deixou levar.
Os alunos subiram nas carruagens, que logo os levaram para o castelo. Assim como no desembarque do trem, a descida dos coches também foi agitada e barulhenta, com conversas altas e risadas no retorno do ano letivo. Catharine desceu de seu coche, entrando no castelo e sendo cumprimentada pelo amontoado de alunos que se reuniam na entrada do Salão Principal, esperando para poderem ir jantar. Viu alguns professores na área e divisou as roupas negras e tão características do professor Snape. Abriu um grande sorriso maroto, pronta para fazer algo que com certeza lhe valeria um longo sermão.
-PAPAI! – gritou no meio dos alunos, que soltaram risadas ao ver Snape parar e dar um resmungo. Dentro dos domínios de Hogwarts ele era professor Snape, e não papai. Era uma regra, que Catharine insistia em descumprir.
-Srta. Snape. – Severo virou-se para a garota com uma expressão azeda no rosto. Às vezes ele ficava se perguntando a quem aquela garota havia puxado, pois a ele que não foi, com certeza. Porém, por mais que reclamasse, ela ainda era a sua garotinha e, embora não fosse de demonstrar muito, todos sabiam que o sisudo professor de Poções morria de amores e de ciúmes daquela menina.
-Papai! – Catharine aproximou-se dele, lhe dando um abraço apertado e Snape enrijeceu, não pela demonstração de afeto, mas sim pelo fato de que estavam na escola. Mas não poderia negar que cada vez que ela chegava com esses sorrisos e abraços seu coração amolecia.
Ainda se lembrava do dia em que soube da notícia de que seria pai. Não tinha nem se acostumado direito com a idéia de que namorava uma trouxa, coisa que iria contra todos os seus ensinamentos, mas Clarisse era teimosa. Ela o procurou, depois que se conheceram na festa de aniversário de dezoito anos de Dallas. Ela marcou os encontros e ele se deixou levar, tentando martelar em sua cabeça que não estava sucumbindo aos encantos da mulher, o que não era verdade. E depois de dois anos de namoro, brigas, separações e reconciliações, ela lhe vem anunciar que estava grávida. Quase teve um ataque do coração diante disso. Ele iria ser pai. Logo ele que era considerado por seus alunos o afilhado de Lúcifer, iria ser pai. E, diferente do que muitos poderiam pensar do rabugento professor, Snape se apavorou diante da perspectiva. E quando segurou Catharine pela primeira vez nos braços, se derreteu todo, virando motivo de piadas da criatura mais desprezível de todas: Sirius Black.
-Catharine... – Severo afastou a garota, com muito custo, de si. –O que eu lhe falei sobre me chamar de pai em Hogwarts? Aqui dentro eu sou...
-Eu sei, eu sei, professor Snape. Mas eu estava com saudades de você paizinho. – abriu outro sorriso inocente, o abraçando novamente e Snape desistiu de separar a garota de si.
-Saudades? Nós nos vimos ontem a noite, como você pode estar com saudades de mim?
-Para mim é uma eternidade. – ela abraçou-se mais forte a ele, enquanto via de rabo de olho os alunos se afastarem.
-Certo, certo, você já matou as saudades. – Severo murmurou, percebendo que o seu pior pesadelo em forma de gente estava vindo em sua direção. –Agora vá para o salão, você não vai querer perder a cerimônia, vai?
-Não. – disse sorridente, finalmente se afastando de Snape e com um último sorriso indo para o salão. Assim que ela sumiu entre as grandes portas de madeira, Sirius, professor de Defesa Contra as Artes das Trevas, parou ao seu lado.
-Uma palavra e eu texto todas as maldições imperdoáveis em você, Black. – resmungou.
-Mas eu nem disse nada. – Sirius disse com um sorriso escarninho dançando no canto de sua boca.
-Mas pensou. – e Snape saiu de perto do moreno, farfalhando a sua capa como de costume.
Angela estava chateada, chateada não, irritada. Estava parada observando o livro a sua frente e as letras que dançavam nele, resmungando uma coisa ou outra sob a respiração. Não estava com saco para estudar, mas ou era isso ou ficar pensando que o seu namorado estaria longe dela por longos meses até o Natal. Isso se ela conseguisse vê-lo até no Natal. Mas no que ela estava pensando? Se ela quisesse, era só marcar um encontro e aparatar em Hogsmeade e tudo estava resolvido. Mas, ir de Oxford até a Escócia ainda sim era cansativo, ainda mais agora que as aulas haviam recomeçado.
Isso mesmo, Angela Malfoy, a herdeira da fortuna e do nome Malfoy, uma das mais tradicionais famílias do mundo bruxo, estudava em uma universidade trouxa. E convencer o seu pai e o seu avô de que era isso que ela queria da vida não foi nada fácil. Precisou de muita ajuda de sua mãe Virgínia e de Padma para conseguir dobrar os dois homens Malfoy's. Seu avô dizia que era uma vergonha para a família, seu pai dizia que era um desperdício de talento. No entanto, enquanto de um lado eles resmungavam, de outro enchiam a boca para falar que sua neta e filha estava se tornando uma grande advogada.
-Pensando na morte da bezerra? – Julia, sua colega de quarto no apartamento em que dividiam em Oxford, perguntou da porta de seu quarto.
-Não, pensando na vida. – murmurou a ruiva.
-Deixe-me ver... o seu pensando na vida se resume a um rapaz alto, moreno e de olhos azuis?
-Há essa hora ele deve estar chegando na escola. – disse desolada.
-Êita! Você caiu mesmo por aquele moleque. – Julia entrou no quarto e sentou-se na beirada da cama da ruiva. –Não vai me dizer que está mesmo apaixonada por aquele fedelho? Pensei que fosse apenas por diversão.
-E é diversão, e agora a minha diversão se foi. Saco. – resmungou e Julia riu. Negação, negação, era a palavra que ela poderia usar para descrever Angela no momento. Talvez em um ponto ela estivesse certa. Talvez em um momento, no começo quem sabe, essa relação deles dois era apenas diversão. Mas, agora, duvidava muito disso. A diversão havia virado algo mais, algo mais sério, algo mais perigoso, e eles estavam envolvendo-se nessa teia de negações.
-Bem, ficar resmungando aí não vai resolver o seu problema. Por isso eu vim aqui propor uma saída. Para espairecer. Para você ter a sua diversão de volta, nem que seja por uma noite. – disse a garota, erguendo-se da cama.
-Acho que seria legal. Não vai me matar mesmo, e eu não vou aprender Direito Imobiliário em apenas uma noite. – respondeu, pegando seu casaco nas costas da cadeira onde estava e saindo com a amiga para a noite.
Suas mãos estavam tremendo e ela mal conseguia manter o copo preso entre os seus dedos. A visita daquela tarde havia mexido com todos os seus nervos. O que aquela mulher iria querer consigo depois de vinte anos? Ela, com certeza, não iria querer nada com ela. Poderia ser estranho pensar que Dallas tivesse tanto desprezo pela avó apenas porque essa dava desmandos em sua vida ao seu bel prazer. Mas essa não era toda a verdade, pois um pai sisudo trataria o filho do mesmo jeito, tentando moldá-lo ao seu modo. Não, seu desprezo ia além disso. Aquela mulher havia matado a sua mãe.
-Velha maldita! – bradou, lançando o copo pela cozinha, que se espatifou na parede com violência. Logo depois, a luz da cozinha se acendeu, iluminando todo o local e cegando a mulher por alguns segundos.
-Eu posso saber o que está acontecendo aqui? – Harry entrou no aposento, olhando a esposa que estava sentada sobre a mesa. Quando chegou em casa percebeu que algo estava estranho com ela, mas essa se esquivou do assunto com sorrisos e conversa fiada. Quando foram dormir, ela ficou por umas boas duas horas rolando na cama, até que se levantou de vez. E agora ele ouve esse barulho de algo quebrando e um grito. Definitivamente algo estava errado, e ele iria descobrir o que era.
-O copo caiu da minha mão. – respondeu calmamente, como se nada tivesse acontecido. Harry apenas virou-se para os cacos de vidro do outro lado da cozinha.
-Você tem um braço bem grande então, para ele ter caído tão longe. – disse sarcástico, cruzando os braços sobre o peito e recostando no batente da porta.
-Vai dormir Harry, está tarde.
-Ah não! Não me venha com essa conversa fiada, tentando me afastar. Eu te conheço muito bem Dallas. Algo está errado e eu quero saber o que é. – Harry entrou na cozinha, parando em frente a ela, ainda de braços cruzados.
-É problema meu, será que você se importa?
-Sim, eu me importo.
-Harry, vá dormir! – pontuou cada palavra entre dentes, com raiva, e um pote estourou no canto da cozinha. Harry olhou para ele e, antes mesmo que os cacos de vidro tocassem o chão, o pote foi restaurado e posto de volta no lugar, sem que nenhum dos dois se mexesse.
-Agora eu ficarei acordado, pois não quero correr o risco de encontrar a casa pela manhã toda destruída por causa… da sua magia descontrolada.
-Ela não está descontrolada, está perfeitamente estável. – retrucou e Harry recuou um passo, pois poderia sentir a energia emanando dela.
-Conte até dez, Dally. – aconselhou calmamente, vendo a mulher respirar fundo e começar a contar sob a respiração. –Agora me diga o que aconteceu? – Dallas soltou um suspiro, passando os dedos pelos fios castanhos de seu cabelo, desfazendo um nó aqui e acolá.
-Eu recebi uma visita um tanto quanto… inusitada, hoje.
-Verdade? Quem?
-Você não iria acreditar. – ela riu nervosamente, mordendo o lábio inferior.
-Quem? – insistiu Harry.
-Amélia Winford. – os braços do moreno se descruzaram, caindo como um peso morto ao lado de seu corpo.
-O que ela veio fazer aqui? – perguntou, estreitando os olhos.
-Veio com uma conversa de que está velha, de que eu preciso assumir as empresas Winford's e essas coisas.
-E você, o que disse?
-Bati a porta na cara dela. – respondeu exasperada, soltando um longo suspiro.
-Você tem consciência de que bater a porta na cara da sua avó não vai ser o suficiente para fazê-la desistir do que quer que ela queira de você?
-Não me lembre disso. – Dallas gemeu, enterrando o rosto nas mãos.
-Não está com medo dela, está? – Harry perguntou preocupado. Só lhe faltava essa, depois de anos aquela mulher aparecer novamente na vida de Dallas e causar nela as mesmas reações que causavam na menina que ele conheceu.
-Pelo amor de Deus, não! – Dallas jogou a cabeça para trás, dando uma risada sardônica. –Eu enfrentei uma horda de Comensais quando tinha dezessete anos, sobrevivi a uma guerra e, o mais importante, … - segurou Harry pelo colarinho da camiseta que ele usava. O menino-que-sobreviveu, e que não era mais tão menino assim, poderia estar na casa dos quarenta anos, mas estava em muito boa forma. Os cabelos ainda eram negros como a noite e os olhos vivamente verdes não estavam mais escondidos pelos óculos, anos no trabalho de Auror apenas o fez descobrir que aquilo somente incomodava. E Dallas tinha a sensação de que bruxos tinham um processo de envelhecimento muito mais lento do que os trouxas. Veja Dumbledore por exemplo, o homem tinha mais de cem anos, por Deus, e parecia que ainda viveria mais cem.
-O quê? – perguntou curioso, sentindo as pernas dela lhe envolverem pela cintura.
-Eu consegui algo que até hoje as mulheres morrem para ter… - murmurou, mordiscando o lóbulo da orelha dele. –Acha mesmo que eu teria medo daquela velha?
-E o que seria esse algo? – Harry soltou um pequeno gemido. Ela sabia exatamente onde provocar.
-Você.
-Hum… está me tratando como prêmio sra. Potter? – sentiu o corpo tremer quando a mão dela deslizou pela sua coxa. –E o que a senhora pensa que está fazendo com essa mão? O que o seu marido iria dizer se descobrisse?
-Meu marido? Hum, eu não sei. O que ele faria? – perguntou inocente, mirando seus olhos, que agora estavam tão escuros que estavam da cor dos olhos de Day, nos dele.
-Ele a pegaria… - passou um braço por debaixo das pernas dela, a erguendo no colo. -… e a levaria para o quarto, pois mesa de cozinha não é lugar para essas coisas.
-Como não? Se foi nessa mesma mesa que Evan foi feito.
-Se os nossos filhos descobrirem o que a gente faz na ausência deles…
-Ausência essa que durará até o Natal. E eles nunca vão saber mesmo. Além do mais não é da conta deles. – riu maliciosamente, dando um beijo na nuca dele e aconchegando-se mais ao moreno. –E é melhor nos apressarmos antes que o meu marido apareça. – disse com uma expressão assustada.
-E não iremos querer isso, não é? Pois creio que a nossa pequena conversa irá demorar a noite inteira. – Harry riu matreiro, a levando pela porta da cozinha e deixando todos os problemas para trás, enquanto as risadas da mulher invadiam a casa no meio da noite.
