O origami em forma de cisne veio voando em sua direção, planando um pouco em volta de seu prato até que pousou entre as suas mãos. Os olhos dourados olharam com curiosidade para o pedaço de papel dobrado, voltando o seu olhar na direção da qual ele veio, cruzando com o olhar do moreno no final da mesa dos professores. Já sabendo do que se tratava o origami, a jovem o recolheu e sem a menor cerimônia o rasgou e fez os pedaços remanescentes sumirem no ar.

Do lado oposto da mesa Sirius fez a maior expressão de cachorro abandonado que alguém já tinha visto no ex-prisioneiro. Ele conhecia a fama de desastrada da Maya, mas nunca tinha pensado que aquela garota hiper ativa pudesse se magoar tão facilmente e ser tão difícil de se conseguir o perdão. E olha que ele estava há uma semana tentando, mas tudo o que ele fez falhou miseravelmente. Seus olhos acompanharam a jovem oriental quando ela levantou-se da mesa e saiu do salão principal. Rapidamente ele desculpou-se com Flitwick, que falava uma coisa ou outra ao seu lado, e a seguiu.

-Densetsu! – chamou quando ambos estavam no meio das escadas moventes que levavam as masmorras. Maya tentou apressar o passo para poder fugir do homem, mas justo naquele exato momento a escada resolveu mudar de lugar.

-Merda! – praguejou sob a respiração, segurando-se no corrimão enquanto a escada se movia. Tentando se equilibrar sobre as pernas, Sirius conseguiu alcançar o degrau onde a jovem estava, parando ao lado dela. Tudo que a morena deu em resposta a sua presença foi virar o rosto, o ignorando.

-Den… - o professor começou mas a mulher continuou olhando para os milhares de quadros que havia nas paredes, como se nunca os tivessem visto antes. –Den eu já pedi desculpas. Até quando você vai ficar assim comigo? Vamos… fale comigo. – a escada parou de se mover e Maya continuou o seu caminho, ainda sendo seguida de perto por Sirius e o ignorando veementemente. –Por favor Maya! – o homem segurou o pulso dela, a fazendo parar e se virar. Certo que normalmente ele não se humilharia tanto assim por causa de alguém. Orgulho e teimosia eram uma das maiores qualidades dele, assim como defeitos. Mas ainda sim a culpa pelo que ele tinha feito, apenas por vingança pelo que ela o fez passar, o estava corroendo. Até porque, tudo que ela fez a ele foi acidental, a questão do bicho papão foi algo feito de propósito. E até que ela o perdoasse ele não a deixaria em paz.

Maya olhou da mão dele em seu pulso para o rosto do homem, que quase estava se ajoelhando para pedir desculpas, e riu. Antes era ela que ficava atrás de Sirius pedindo um pouco de sua atenção. Agora que resolvia ignorá-lo, ele é que vinha correndo atrás de si? Era realmente hilário.

-Por quê, Sirius? Eu pensei que você estava feliz por finalmente se ver livre de mim.

-Sim… quero dizer, não! Maya, você é desastrada, um fim do mundo ambulante, mas isso não é desculpa para o que eu fiz. Eu sabia que você nunca foi boa em DCAT, não deveria tê-la usado assim. Foi uma brincadeira de mau gosto, eu confesso. Me perdoe, por favor… - só faltava ele choramingar como um cachorrinho abandonado e Maya estava começando a sentir as suas defesas quebrarem diante daquela expressão tão perdida, e isso a estava irritando. Como ela poderia ser tão fraca?

-Argh! – gritou frustrada, ainda mais quando viu o sorrisinho de vitória no belo rosto do homem. –Está bem. Está bem, está perdoado. – e soltou-se do aperto dele em seu pulso. –Mas fique sabendo senhor Black que isso vai ter volta. E dessa vez vai ser intencional. – bradou, rodando nos saltos e se aprofundando no castelo, em direção as masmorras. Quando ela sumiu no final do corredor, Sirius deu um grande sorriso traquinas.

-Mal posso esperar. – murmurou, dando meia volta e encaminhando-se para a sua sala.


Os pingos de chuva caíam grossos sobre os jogadores montados em suas vassouras, no meio do campo de Quadribol naquela tarde cinzenta de meio de outubro. E, mesmo com todos os seus esforços, os jovens não conseguiam se mover muito rápido atrás de balaços e goles, pois o vento estava sempre os tirando da rota prevista. Cansado de ver aquela luta de seus jogadores contra o vento, e o vento ganhando, o capitão do time da Grifinória os chamou e um a um eles foram pousando no gramado enlameado, rodeando o rapaz do quinto ano.

-Eu realmente espero… - o garoto passou a mão fria por entre os fios de cabelo negros que estavam arrepiados pela água e pela chuva. -… que não esteja chovendo assim quando jogarmos contra a Corvinal. Senão, teremos certos problemas em vencer. – murmurou desolado, rodando seus olhos azuis pelos seus colegas de time que tinham lama dos pés a cabeça e tremiam feito varas verdes, de frio. –Dispensados. – disse, fazendo um movimento leve com as mãos e ouvindo suspiros aliviados dos outros adolescentes que rapidamente se debandaram para algum lugar quente e seco. E, depois de alguns segundos ainda debaixo de chuva, ele decidiu fazer o mesmo quando um vento mais forte cruzou o seu corpo o fazendo tremer fortemente.

Alan entrou no castelo de Hogwarts, seco e aquecido, depois de voltar de mais um treino exaustivo de Quadribol. Precisavam vencer esse ano, ainda mais agora que tinham Day Potter no time como apanhador. Não que o apanhador antigo, que se formou no ano anterior, fosse ruim. Mas entre ele o garoto Potter, ele ficava com o Potter. Ainda devaneando sobre o início da temporada, ele deixou que os seus pés o levassem automaticamente em direção a torre da Grifinória, mal prestando atenção aos seus arredores e, quando estava prestes a subir mais um lance de escada, sentiu alguém o puxar com força pelas costas de suas vestes, o levando para um beco escurecido a um canto do corredor.

-Mas o quê...

-Tsc, tsc, tsc, senhor Longbottom, o que está fazendo há essa hora, tão perto do toque de recolher, vagando pelos corredores? – a voz sibilou perto do ouvido dele e Alan sorriu, divisando na semi-escuridão dois orbes negros e brilhantes.

-Srta. Snape… o mesmo eu digo sobre a senhorita. – falou em um rom sério, sentindo as mãos da garota deslizarem pela gola de sua jaqueta e envolvendo o seu pescoço. –Pode ser ruim para a sua fama se souberem que você anda atacando jovens indefesos pelos becos escuros da vida.

-Jovens indefesos? – Catharine quase gritou. Alan Longbotton estava longe de ser um jovem indefeso. Ele era tão prepotente às vezes. Afinal, foi ele que começou com essa história de ataques em becos escuros dos corredores, quando no final do último semestre ele lhe roubou um beijo do nada e perguntou se ela queria namorar com ele. Claro que a garota entrou em estado de choque por um certo tempo, pois o capitão do time da Grifinória, um dos meninos mais cobiçados da escola, estava a fim dela. Mataria qualquer menina de inveja. O problema é que ela não poderia ter esse gostinho de matar outras garotas de inveja, como seu caráter sonserino pedia para fazer. Pois se um certo ex-sonserino, diretor de sua casa, descobrisse que ela estava namorando, a defunta seria ela.

-Jovens indefesos. – ele repetiu divertido, enlaçando a cintura dela e a erguendo, fazendo as garota cruzar suas pernas pelo quadril dele, enquanto apoiava as suas costas na parede de pedra procurando um pouco de suporte. –Muito indefesos. Mas por que você se importa, não é mesmo, a sua fama já não é lá grande coisa.

-O que você quer dizer com isso? – perguntou, estreitando os olhos.

-Rola por aí que você é a causa de boa parte dos cabelos brancos do professor Snape. – acusou o garoto de maneira divertida e a menina abriu um grande sorriso traquinas.

-Eu sei. – disse orgulhosa. –Mas não foi para ficar falando da minha fama e do meu pai que eu te arrastei para cá.

-Não? Então por que me trouxe para cá? – perguntou inocente e a garota rolou os olhos.

-Argh! Cala a boca e me beija logo. – comandou e Alan soltou uma gargalhada, para depois fechar mais à distância entre os dois e arrebatá-la para um beijo.

Severo estava caminhando silenciosamente pelos corredores, com os seus olhos perscrutando o caminho atenciosamente a procura de algum aluno fora da cama. Seus passos mal ecoavam no piso de pedra e se não fosse pela luz na ponta de sua varinha, ninguém diria que ele estava lá.

Dobrou uma esquina, resolvendo dar uma pequena passada perto da área da grifinória. Conhecendo os integrantes dessa casa, não duvidava nada que pudesse encontrar algum de seus moradores vagando pelo castelo. Respeito às regras era algo que não estava incluído no vocabulário daqueles garotos. Deu mais um passo silencioso, terminando de subir as escadas que levava a área leste do castelo. Andou pelo corredor iluminado pela lua que lutava por entre as nuvens negras para poder aparecer, olhando de um lado para o outro a procura de qualquer movimento. Quando se viu em frente ao quadro da mulher gorda, que o olhou longamente antes de voltar a conversar com a mulher que estava consigo na moldura, percebeu que não havia ninguém por aquelas bandas. Pena, estava doido para descontar alguns pontos, só para livrar-se do estresse de mais um dia de aulas. Virou-se pronto para voltar às masmorras e dar o dia como encerrado, quando percebeu um certo movimento em um pequeno beco ao lado de uma velha armadura. Ah, alunos fora da cama, talvez seu dia não tivesse sido de todo perdido. Com um sorriso predador caminhou ainda mais silencioso em direção ao beco, notando com prazer que seja lá o que esses alunos estivessem fazendo na escuridão, ainda não tinham notado a sua presença. Parou na entrada do beco e com o sorriso alargando mais ainda acendeu a sua varinha. Segundos depois a luz não estava mais iluminando o local e os alunos pegos no flagra, mas também a face muito pálida de Snape que só conseguiu dizer uma coisa diante do choque:

-CATHARINE! – ao ouvir o seu nome ser gritado, Catharine largou-se rapidamente de Alan, pondo-se sobre os próprios pés e virando os seus olhos largos em direção a entrada do beco. Seu coração estava quase saindo pela boca assim como as suas mãos suavam frio.

-Pro-pro-professor Snape? – disse com a voz quase sumida. Mas o olhar de Severo sobre ela não era o olhar de um professor furioso, era o olhar de um pai furioso, e esse era bem pior. –Pa-pa-papai… - arriscou e jurou que quase pôde ver fogo dentro dos orbes negros de Snape.

Severo deu um passo à frente, segurando os dois jovens pelo braço e os puxando para o corredor para que pudesse vê-los melhor, o que provou ser um erro. Quando viu com quem a sua filha estava, seu sangue gelou.

-Longbottom! – rosnou entre dentes e Alan encolheu-se um pouco. Ouvira muitas histórias que seu pai havia lhe contado sobre o professor de poções na época em que estava na escola, mas não acreditou em boa parte delas. Afinal, segundo a sua bisavó, Neville quando era jovem era a criatura mais desastrada e tímida que existia. Claro que com os anos isso mudou, e muito. Ele poderia ser desajeitado às vezes, tímido em outras, mas não era mais de se amedrontar tão facilmente. Talvez tenha sido o casamento com a sua mãe, Cho Chang, que era considerada uma das meninas mais populares da escola na sua época, que tenha aumentado muito a confiança do homem em si mesmo. Afinal, ele tinha conseguido conquistar uma das garotas mais bonitas de Hogwarts. Porém, a questão agora era: se ele não tinha medo antes do mestre de poções por causa das histórias de seu pai, estava começando a reconsiderar agora tudo o que Neville havia dito.

-Professor Snape, eu… eu posso explicar.

-Setenta pontos a menos para a Grifinória! – bradou o homem, já vermelho de fúria. –E suma da minha frente antes que eu te mate! – Alan não precisou ouvir duas vezes, assim que foi solto sumiu das vistas do ex-Comensal da Morte.

-Papai! – agora de amedrontada, Catharine passou para irritada. –Aquilo foi injusto, não precisava ter descontado pontos da Grifinória.

-Claro que eu precisava, ele estava atacando você – respondeu o homem, azedo.

-Me atacando? Atacando? Você chama um beijo de atacar? – a garota colocou as mãos sobre a cintura esguia, mirando seus olhos negros naqueles que eram iguais aos seus.

-Eu não quero ouvir… não quero ouvir. A senhorita é muito nova para ficar beijando por aí. – resmungou enfurecido, apontando um dedo para o nariz arrebitado da garota.

-Eu farei quinze anos no final de janeiro, caso tenha se esquecido. – respondeu, igualmente irritada, deixando o tradicional mau humor da família Snape se sobrepor ao tradicional controle sonserino, e rebatendo o dedo para longe do seu rosto.

-Não me interessa! – rosnou o homem. –E, até segunda ordem, a mocinha está de castigo! – gritou mais uma vez, a segurando pelo braço e a arrastando pelos corredores até a sala comunal da Sonserina, com Catherine gritando obscenidades durante todo o caminho.


Clarisse estava sentada em frente à pequena mesinha de centro da sala, revirando os papéis das lojas que gerenciava e calculando uma coisa ou outra na maquininha ao seu lado, enquanto a xícara de café fumegava a sua frente. Lia os números com precisão, teclava as contas na calculadora e tomava um gole de sua bebida de maneira alternada. E estava tão concentrada no que fazia, que levou um grande susto quando a lareira estourou em chamas verdes e uma figura vestida de negro saiu de dentro dela. Pôs a mão sobre o coração palpitante e soltou um suspiro quando viu quem era o recém chegado. Bruxos! Nunca se acostumaria com os seus meios de locomoção. Da última vez que experimentou um quase virou do avesso de tão nauseada que ficou. Depois disso preferia optar pelo trânsito caótico de Londres a ter que aparatar novamente em algum lugar.

-Severo? O que faz em casa durante a semana? – perguntou a mulher, percebendo que a expressão do marido não era de muitos amigos. Porém, não ficou muito surpresa. Afinal, Severo nunca era de sorrir muito.

-Eu… ela… - o homem começou a murmurar entre dentes, com certeza tentando conter a raiva que emanava de seu ser. Quando depois de minutos a tensão já estava se tornando insuportável, ele finalmente explodiu. –UM GRIFIN"RIO! E NÃO É UM GRIFIN"RIO QUALQUER, ERA UM LONGBOTTOM. O QUE ELA ESTAVA FAZENDO COM AQUELE ABORTO DO LONGBOTTOM? – Clarisse piscou, totalmente confusa. A única parte que ela tinha entendido da explosão era o grifinório, que ela sabia era a denominação que os alunos pertencentes a casa Grifinória, em Hogwarts, ganhavam.

-Severo… - a mulher ergueu-se, colocando ambas as mãos sobre os ombros do marido e o guiando até o sofá, o fazendo se sentar. -… respire homem. O que houve? Do que você está falando?

-Isso é tudo culpa sua! – bradou o homem, apontando para a mulher trouxa na sua frente. Clarisse entendeu menos ainda e recuou um passo, sabendo que quando Severo perdia a compostura boa coisa não poderia se esperar disso.

-O que é culpa minha? – disse racional, como se estivesse tentando se aproximar de um animal ferido e acuado.

-Com certeza é o seu maldito sangue trouxa correndo nas veias dela, o que a fez simpatizar por aquele maldito grifinório. Argh! – o ex-Comensal rosnou, mal notando o traço de fúria que passou pelo rosto de sua esposa. –Primeiro a Dallas com aquele idiota do Potter. – lembrou-se, torcendo consideravelmente o nariz quando recebeu a notícia de que a sua mais brilhante aluna, aquela quê, mesmo que ele nunca tivesse admitido isso nem a ela mesma, ele a considerava como uma filha, se apaixonou e se casou com o Potter. De todas as pessoas, logo com o Potter! Era inconcebível. Agora Catharine, sangue do seu sangue, as voltas com aquele aborto do Longbottom! Deveria mandar prender aquele moleque por colocar as mãos imundas sobre a sua filha. Ela ainda era uma menina, por Deus!

-Como é? – Clarisse sibilou, cruzando os braços sob o peito. Não se incomodava de ser chamada de trouxa, mas o tom que Snape usou estava mais para uma ofensa do que para qualquer outra coisa.

-Isso mesmo que você ouviu! Minha vida virou de pernas para o ar desde que você entrou nela! – gritou o homem, ainda irritado e não conseguindo se controlar desde que presenciou a fatídica cena na ala da grifinória. –Eu! Eu, um sangue puro da Sonserina… com uma trouxa! Não é à toa que meus amigos riem de mim.

-Eu nem sabia que você tinha amigos, Snape. – comentou a mulher com desdém. –Mas se o problema é a sua estimada reputação, eu conheço uma palavra que pode resolver isso muito bem… divórcio. – disse entre dentes. Não sabia o que tinha irritado tanto o seu marido, mas isso não era desculpa para ele a ofender sem mais nem menos. Ao ouvir a palavra sair da boca de Clarisse, Snape pareceu finalmente ter se dado conta do que estava dizendo.

-De jeito nenhum. – levantou-se abruptamente do sofá, com os olhos flamejando em fúria, e segurou a mulher por um braço. –Deixar você livre para que algum trouxa idiota tenha você? Nem sonhando… você é minha, está entendendo? Minha!

-Então valorize o que tem e pare de me ofender por motivos que nem eu mesma sei! – gritou de volta, soltando-se das mãos dele e começando a recolher as suas coisas em cima da mesinha de centro.

-Eu… - ele suspirou profundamente. -… Me desculpe. – murmurou e Clarisse ergueu-se, o mirando nos olhos. Snape pedir desculpas era outro fato raro, que quando acontecia deveria ser levado a sério.

-O que, afinal, aconteceu? – tentou novamente, vendo que o homem parecia mais calmo.

-Catharine. Sinceramente, eu não sei a quem essa garota puxou. – começou a resmungar, andando de um lado para o outro na sala.

-Hunf… ela tem os seus olhos, o seu gênio, a sua inteligência, a sua arrogância… a quem você acha que ela puxou? – Snape nada respondeu diante do sarcasmo da esposa, detestava quando os outros estavam certos. –O que ela fez dessa vez? – Clarisse perguntou diante do silêncio do homem e observou com interesse o rosto pálido ficar vermelho de fúria.

-Eu a peguei fora da sala comunal depois do toque de recolher…

-O que não é nenhuma novidade para nós, não é verdade?

-Não me interrompa mulher! – o tom era rude mas dessa vez ela não se deixou abalar, apenas soltou um suspiro resignado.

-Certo, certo. Continue então.

-Ela estava… eles estavam… ela estava beijando um garoto! – falou como se fosse a coisa mais medonha e anormal do mundo. Clarisse apenas ergueu uma sobrancelha como se perguntasse: e? –Catharine é só uma menina! Não deveria estar beijando garotos por aí. – no que terminou, o que ele esperava ser um apoio da esposa diante da sua incredulidade, veio como uma risada alta e divertida.

-Você está com ciúmes Severo? O todo poderoso e orgulhoso Severo Snape está com ciúmes da própria filha? Deus, essa é muito boa para ser verdade! – e continuou rindo, de chegar a chorar, e sentou-se no chão pois não se agüentava mais em pé diante das gargalhadas. Quando essas finalmente cessaram, percebeu com um certo divertimento o olhar azedo do homem para cima de si.

-Terminou? – perguntou com o tom de voz que usava para amedrontar seus alunos mas quê, estranhamente, não afetava Clarisse e muito menos Catharine.

-Severo… Catharine já está se tornando uma mocinha… é normal que ela esteja começando a olhar para os garotos e vice-versa.

-Mas esse garoto tinha que ser um grifinório?

-Qual é o problema? Alan me parece ser um bom garoto.

-Como é? – Severo estreitou os olhos em direção a mulher. Ele tinha dito apenas o sobrenome do rapaz a ela, como ela sabia o primeiro nome dele? –Você conhece esse aborto que ousou tocar na Catharine?

-Só pelo que a Catharine me falou e pelo que eu perguntei a Dallas sobre a família dele. Me parecem boas pessoas. Então qual é o problema?

-Você sabia? – o homem parecia ter ignorado totalmente a explicação da mulher depois que essa admitiu que tinha conhecimento do relacionamento da sua filha com o capitão do time da Grifinória.

-Sim Severo, eu sabia. – suspirou, respondendo o que marido com certeza não gostaria de ouvir.

-E VOCÊ PERMITIU QUE ESSA POUCA VERGONHA CONTINUASSE? – Clarisse novamente soltou um suspiro frustrado. Por Merlin, como diria a sua filha, já era quase uma hora da manhã e ela não estava mais com disposição de ficar discutindo com o marido por uma coisa tão trivial. Rapidamente levantou-se, recolhendo as suas contas e calculadora.

-Boa noite Severo. – disse calmamente, passando por ele no sofá.

-Espere! – Snape chamou mas a mulher continuou andando, quase entrando no corredor que levava para os quartos.

-Boa noite Severo! – o ignorou e desapareceu de vista antes mesmo que ele pudesse dizer qualquer outra coisa.


Levantou-se rapidamente quando ouviu a porta do apartamento ser fechada ao longe. Duas semanas, estava nessa enrolação há duas semanas. E essa noite seria a noite decisiva, era agora ou nunca. Enrolou nervosamente a mecha do cabelo entre os dedos, depois alisou a sua roupa, bem casual, afinal, estava em sua casa. Ouviu a voz a chamar pelo apartamento e respirou fundo, pronta para o que estava por vir.

-Estou aqui. – disse com um sorriso, cumprimentando o homem que estava parado no meio da sala e tirava o seu jaleco branco, o depositando nas costas de uma cadeira. –Chegou cedo. – Andrômeda comentou, dando um leve beijo em Davon.

-Não cheguei cedo, só vim em casa pegar umas coisas e estarei voltando para o Hospital. E você?

-Consegui trocar o plantão no hospital, para ao menos conseguir uma sexta feira de folga. – comentou displicente e viu Davon sumir dentro do apartamento, voltando alguns minutos depois com alguns instrumentos mágicos.

-Eu realmente acho isso um desperdício. Se você trabalhasse no St. Mungos nunca estaria atolada dos pés a cabeça em trabalho. Depois do fim da guerra a única coisa que temos na maioria das vezes dentro daquele hospital são alguns feitiços e poções administrados de maneira errada.

-Não vamos discutir isso novamente, vamos? Desde que eu era pequena eu quis ser médica, mesmo antes de saber que era uma bruxa. Além do mais juntar os dois conhecimentos tem sido muito proveitoso. Não reclame, pois pelo que eu me lembre você me apoiou quando eu decidi fazer medicina trouxa.

-Eu sei. Só nunca pensei que os trouxas fosse trouxas o suficiente para poderem se machucar tanto. Com o perdão do trocadilho. – comentou com desdém e Andie rolou os olhos, exasperada.

-Não temos a mesma resistência dos bruxos… quero dizer, os trouxas não tem a mesma resistência dos bruxos.

-Eu sei… eu sei. Assim como eu também sei que esse trabalho está acabando com você. – colocou alguns de seus instrumentos na maleta e caminhou até a mulher, a envolvendo pela cintura e a abraçando. Em dezessete anos em que estavam juntos Andrômeda ainda continuava tão bela como a conheceu, no topo do prédio do St. Mungos, durante a guerra. E ele que pensava que depois dos dois primeiros anos a relação deles iria ficar totalmente desgastada diante da convivência diária, o que na verdade era mínima já que ambos eram médicos e bastante atarefados. Porém, depois de tanto tempo até mesmo ele estava se cansando um pouco dessa vida. Essa vida de eternos namorados que, mesmo morando juntos, pareciam que viviam sempre separados. Não eram casados, não tinham família, viviam como se fossem ainda solteiros e não comprometidos. E, estranhamente, Davon começou a perceber que queria mais. Já estava chegando aos quarenta e talvez já fosse hora de dar um passo adiante.

-Davon… - Andrômeda afastou-se dele. Era sempre assim, quando olhava nos olhos de Davon toda a sua coragem sumia. Poderiam estar juntos por anos, mas mesmo assim ainda era muito difícil ler o ex-sonserino. E às vezes sentia um ciúme imenso de Dallas por saber que ela deveria ser a única que compreendia bem o amigo.

-Diga? – o homem virou-se para fechar a maleta depois que ela se afastou. Estava sentindo Andie um pouco distante nas últimas semanas, como se quisesse lhe dizer algo mas não tivesse coragem o suficiente para isso.

-Eu… - a mulher colocou uma mecha solta do cabelo por detrás da orelha e nesse momento, apesar de já ter parado há anos, sentiu uma imensa vontade de fumar diante do nervosismo que estava sentindo.

-Você?

-Eu estou grávida… - murmurou com uma voz mínima, tentando ler as reações do homem de costas para si.

-Grávida? – Davon repetiu com um tom de voz como se estivesse comentando o tempo.

-Sim. – Andie sentiu um aperto no coração ao perceber a reação, ou a falta dela, do médico. O moreno endireitou-se e deu um longo suspiro, virando-se para ela com um pequeno e raro sorriso no rosto.

-Tem certeza de que é isso que você quer? – perguntou calmamente e a viu dar um aceno positivo. –Bem, então acho que teremos que nos mudar para uma casa maior. Apartamentos não são bons para se criar crianças.

-Davon! – Andrômeda gritou feliz e jogou-se sobre ele, o abraçando fortemente e se sentindo mais leve pela primeira vez em semanas.