Stage 4 - O Poder da Copy Elf

Sob os últimos raios de sol de uma violenta tarde, centenas de robôs se posicionam sobre os restos de tristeza da cidade abandonada. Eles analisam um ponto fixo na densa nuvem de poeira que flutua sobre os destroços, pacientemente esperando que algo saia. E a espera não é longa: Não demora mais do que alguns segundos para que a figura de um herói lendário comece a lentamente ganhar forma, até parar frente a frente com a horda de inimigos. Ao fulgor esverdeado de seu novo traje, os olhos de Zero, até então fechados em rara serenidade, se abrem com o estrondo de um brilho de violência. Tomado por uma aura energética misteriosa, enquanto as longas mechas douradas flutuam agressivas ao sopro do vento, ele puxa as Twin Blades próximas ao peito, formando um X reluzindo na mais poderosa incandescência purpúrea. Abrindo os braços em um rápido movimento, a aura que lhe cobria se desenha na forma de duas enormes e majestosas asas, que se dissipam ao ar. Coberto por energia elétrica, Zero avança contra os inimigos, tão veloz quanto o brilhar do trovão.
Os robôs do Onipresente não têm tempo de puxarem os punhos ou erguerem seus canhões. O guerreiro, com enorme velocidade sobrepujando o tempo de reação dos oponentes, vai atravessando a multidão, enquanto maneja as lâminas gêmeas com a perfeição do mais longo vento espiral. Um a um, os corpos dos inimigos vão sendo rasgados sem qualquer piedade, até que Zero transpasse o aglomerado. Por fim vira-se, jogando os cabelos por cima do ombro, e ergue as armas, atacando a temerosa figura dos oponentes com a concentração do profundo de seus olhos azuis. As lâminas descem e golpeiam o ar, várias e várias vezes, arremessando cortes na forma de belos arcos luzentes que atravessam tudo que está no caminho e colocam mais dezenas de inimigos a desabar em fragmentos. E então pára, fechando os olhos e esperando, ao som da ventania que lhe puxa os loiros cabelos esvoaçantes, a aproximação dos últimos inimigos.
À linha do momento, ele agacha e salta, atingindo como um pássaro o ápice dos céus. As asas novamente se brotam das costas do herói lendário, abrindo-se ao fulgor que supera o brilho das estrelas, e outra vez desaparecem. Ele desce com toda vontade, envolto por um verdadeiro cometa de trovões, e colide com o solo. Ao nascimento de um longo rugido de destruição, o cenário é consumido em nome da fome de uma gigantesca redoma de energia, cujo abraço dizima qualquer coisa que lhe dê a graça do toque. Ao retorno do silêncio, só resta Zero sobre as pilhas de destroços, de costas para a despedida do sol. A noite cai, seu traje volta ao escarlate e as asas se erguem ao firmamento uma última vez, com todo seu esplendor.

Paralelamente, na base da Resistência, tudo que se passa na cidade abandonada é exibido no monitor da sala de comando. Rouge e Jaune, as duas operadoras, mal conseguem acreditar no que acabam de ver. Seus dedos se paralisam sobre as teclas dos terminais, o brilho dos olhos fica estático, sequer podem piscar, tamanha a surpresa que se acomoda em suas faces.
- Esse é o... O poder daquela elf...? – Jaune comenta com certa incerteza, deixando uma levíssima gota de suor escorrer pelo canto do rosto.
- Eu nunca vi uma com um efeito tão extenso! – Exclama Rouge, aproximando o rosto ao telão.
Ciel se aproxima lentamente do grande monitor, deixando ao ar, com o som baixo e vagaroso de seus saltos, a leveza dos delicados passos, e junta as mãos, levando-as até o peito. Enquanto sente as batidas incansáveis de seu pequeno coração, os brandos olhos azuis brilham em certa preocupação, mas então uma reviravolta: uma expressão alegre nasce no rosto, um leve sorriso.
- Zero... Você conseguiu. – A jovem se alivia, suspirando.

A missão de Zero ainda não acabou. Ele volta a caminhar, se retirando da monstruosa cratera que criara no local, e segue pelas ruas que saíram ilesas da fúria do trovão. Enquanto anda, lado a lado com os prédios que não resistiram ao estrondo e desabaram a imponência, seus olhos, firmes e atentos a qualquer detalhe, procuram por sinais do novo inimigo, o Onipresente. A procura, porém, é inútil: não há mais nada que se mova, apenas o silêncio e a branda tristeza que paira pelas lágrimas daqueles que já perderam as vidas.
O reploid desiste. No entanto, quando está prestes a abrir comunicação com a base, o calmo toque do silêncio se transforma: correntes afiadas de ar surgem e passam a rasgar por todo lugar, rastejando pelo maltratado asfalto em longos sopros agudos. Sabendo que não se trata de uma simples brisa, Zero pára e espera, até parecendo estar desprotegido. De repente todas as ondas se unem e dão origem a um único raio, que, guiado por um vulto assustadoramente veloz, segue furioso rumo ao herói. Zero puxa o sabre de raios, o misterioso reploid sua espada metálica, e um segundo decide tudo.
Quando se dissipa o extenso ruído do estalar entre lâminas, os guerreiros ganham nitidez, parados, se encarando com as armas cruzadas, fazendo força um contra o outro. As faíscas esverdeadas que voam do choque das espadas flutuam confusas, até serem levadas ao alto pelo gentil turbilhão de ar que nasce aos pés dos dois lutadores, local onde surge um forte contraste, tanto em espírito quanto no físico. De um lado, o guerreiro escarlate, Zero, com os cabelos dourados espalhando-se ao alto em companhia do doce vento, mirando o oponente com a seriedade dos brandos espelhos azulados que ficam aos olhos. No oposto, um reploid de trajes azuis, com um vistoso tecido avermelhado amarrado ao pescoço voando com tanta vida quanto os fios amarelados do adversário, e possuidor de uma rígida mascara prateada que lhe realça o elmo e dá abrigo aos seus pequenos e tímidos olhos vermelhos, que, no entanto, refletem um leve sorriso oculto.
- Quem é você? – Zero cerra os dentes, não pretendendo ceder à força do inimigo.
- Eu sou um fantasma do passado. – O sujeito permanece impassível, até aparentando estar no controle da situação, mas, na verdade, está fazendo um esforço violento para não ser arremessado longe. – Sempre tive muita curiosidade para te conhecer. Mas não é isso que me trouxe aqui. – Ele desvia a espada para o lado, desequilibrando Zero, e salta para longe, completando a frase, ainda no ar. – Estou à procura dos dados do Onipresente, que estão bem nessa cidade. – Pousa, por alguns segundos agachado e ainda olhando o herói, e some dali, correndo tão veloz quanto um trovão jogando seu brilho ao horizonte, mas suave como o flutuar de uma pluma.

Na base da Resistência, Ciel, com os olhos pregados no monitor, fica boquiaberta, suas cordas vocais perdem todo o poder necessário para libertar aquela voz das mais doces. Com certeza deve ter mesmo visto um fantasma do passado, tamanha a imobilidade que lhe aprisiona o corpo. Jaune e Rouge, sem entenderem, apenas fitam-na, com olhares confusos sob os visores.
- N-Não pode ser... T-Theras...? – Balbucia a cientista de longos cabelos dourados, sobre uma tênue linha que a coloca entre felicidade e tristeza.

O misterioso reploid azul continua atravessando as ruas da cidade, correndo despreocupado e confiante na velocidade que lhe faz irmão do vento. Os pequenos olhos vermelhos ficam amplos e vigorosos, excitados pelo frescor do ar que vai sendo atravessado por seu corpo frágil, esboçando um pequeno sorriso por detrás da mascara.
- Esse Zero é um sujeito interessante. Meus braços doem... – Comenta, massageando os membros enquanto firmemente continua a atravessar o labirinto de edifícios.
Porém, não leva mais do que alguns segundos para uma agradável solidão se desmanchar. Quando parece que não há mais nada capaz de alcançar o reploid, começam a estalar pelo chão, cada vez mais fortes e audíveis, sons de passos extremamente velozes. O guerreiro azulado, curioso, volta seu rosto para trás, para enxergar uma leve surpresa: É Zero que se aproxima, tomado por um temível olhar de seriedade e determinação, arrastando com delicadeza suas longas mechas loiras que flutuam gostosas ao alto.
- Mais veloz do que eu pensava... – O misterioso guerreiro comenta a si mesmo, enquanto vira-se, passando a correr de costas, e empunha a espada.
Finalmente, quando se alcançam, Zero puxa o cabo do sabre e, sem cerimônias, desenha um corte rumo ao abdômen do reploid azulado. Ao tinir do contato entre as armas, inicia-se a mais devastadora das trocas de golpes. Enquanto rasgam pelas ruas sem fim, seus braços continuam guiando as lâminas incansavelmente, um bloqueando os ataques do outro, em uma tensão tão forte que chega a poder ser tocada. Nem mesmo os prédios ficam livres da dança: De minuto a minuto, ambos os guerreiros se jogam para suas paredes, correndo por elas com tamanha rapidez que os desabamentos sequer os alcançam.
A violenta onda de cortes se recusa a cessar, pelo contrário, a cada minuto se torna mais e mais intensa, enquanto que, a cada segundo, os orbes dos reploids vão também mudando de feições. A cada minuto, a cada golpe, suas almas se sentem cada vez mais livres, até finalmente entrarem em contato e aprenderem um pouco mais. Eles começam a se entender, notando, ao simples tom das faíscas que voam, que eles não são tão diferentes. E então terminam outra vez de lâminas encostadas, um outro jogo de forças. Encarando-se dessa vez com um mútuo olhar de seriedade, correm de lateral, terminando a encontrar uma imensa torre de luzes apagadas. Com a energia de um feroz grito, os dois se jogam contra a mesma, atravessando para dentro como se tratando de uma folha de papel.
Eles se levantam, lentamente, e olham aos lados. O cenário agora é um amplo salão, tão destruído quanto todo o resto da cidade: paredes demolidas, piso desgastado e repleto de rachaduras, fragmentos de concreto e metal espalhados ao tudo, luzes quebradas. Zero e o outro reploid se encaram com frieza, brandindo suas espadas uma última vez e sinalizando, com raios de olhares, o ataque final. Uma lâmpada solitária desaba do teto, e eles partem, praticamente borrões, para de novo explodirem o impacto de um entrelaço de cortes. Ao nascer de um verdadeiro trovão de tensão, o clarão se desdobra para a torre, limpando toda a violência.
Quando a luz desce, em meio à rebeldia das nuvens de poeira que se empurram, os dois guerreiros continuam firmes, de pé, se encarando com um interminável vigor. Eles parecem estar ilesos, impenetráveis, mas, sob o efeito de um único som, um único tilintar agudo que ecoa para todas as paredes, esta imagem cai. O elmo de Zero se parte em dois pedaços e cai ao chão, soltando à brisa a imensidão de mechas douradas que agora são seus cabelos. A mascara prateada do outro se despedaça, revelando o quão amplos, vívidos e cristalinos seus olhos escarlates realmente são, apesar de carregarem nos cílios o peso de culpas, tristezas e arrependimentos.
- Essa é a força daquele que derrotou Omega... A força que vem do coração... – O amargo personagem comenta, cerrando os olhos.
- Um fantasma do passado... – Zero pausa, descansando os orbes. – Quem é você?
- Uma alma atormentada pela dor daqueles que já se foram... Buscando uma solução... Buscando um descanso... Eu sou... Theras.
- Um inimigo... Ou um aliado?
- Não sou um inimigo... Tampouco um aliado.
- Então na próxima vez que nos encontrarmos... Irei te destruir.
- Lhe digo o mesmo...
Theras dá as costas, mirando o rosto em direção ao buraco feito na parede. Ele inclina levemente o semblante para o alto, recebendo com alegria o vento que adentra justamente para lhe amaciar a pele da face e, em um piscar de olhos, parte de mãos dadas a um onipotente raio de ar. Zero, mais uma vez disposto à solidão, se coloca a caminhar lentamente até a saída, inalterado, já planejando entrar em contato com Ciel. Mas não há tempo: Quando firma um dos últimos passos, o chão passa a gritar tremendos estalos, ruindo ao tom de uma ponte velha. Em companhia das dezenas de fragmentos de piso, Zero cai inerte por um enorme poço de sombras.
No entanto, uma queda como essa é longe do suficiente para condenar o herói lendário. Deixando-se carregar pelas extensas mãos da gravidade, ele apenas continua rasgando ar abaixo, até aterrissar, em companhia às rochas, ao subsolo, um terreno rígido e irregular. A chuva de pedras bate seca contra chão, levantando uma leve nuvem de poeira ao mesmo tempo em que é arremessado um enorme estalo de atrito. Quando o ar se silencia, Zero ergue-se imponente, observando com profunda atenção o local onde se encontra. Trata-se de um laboratório abandonado, tomado pela escuridão que leva conforto aos pobres painéis quebrados que se estiram pelo chão pedregoso que se desenvolvera. No meio de tanta destruição, um item em especial consegue chamar a atenção, justamente por ofuscar o escuro com seu suave reluzir metálico. Um secret disc, convenientemente colocado sobre um dos computadores. Semi-cerrando os olhos, curioso e talvez com um pouco de surpresa, Zero tenta se conectar à base da Resistência, mas logo vê que é em vão, quando não recebe qualquer resposta. Algo muito poderoso está interferindo na comunicação.
- Tch! Sem resposta! A base pode estar com problemas...

De volta à base, as operadoras estão perplexas, encarando sem reação o vazio de seus terminais, nada perto de entenderem a fonte dessa interferência. A esse ponto Ciel já se encontra mergulhada em preocupação, de braços encolhidos pelos pensamentos que só tem olhos para Zero. Um intenso brilho de preocupação treme suas pesarosas pupilas, mas ela não se importa, continua encarando de cabeça erguida o monitor, combatendo a fragilidade com um incrível olhar de determinação. Em seus próprios meios, ela também é uma lutadora.
E então, despedaçando o clima silencioso e instável que se apoderara da sala, uma das portas abre-se confortável, ao fundo de um suave jato de som. Adentra ali um soldado desajeitado, que corre desesperado até as três e pára, ofegante e apoiando-se aos joelhos.
- Senhorita Ciel! Você não vai acreditar... Mas nós temos uma visita! É o Fefnir!
- Fefnir? Aqui? – A jovem franze o cenho, sem saber se fica aliviada ou temerosa com a notícia.
Não há opções. Ela cerra os frágeis punhos e coloca-se a caminhar, firme, até a saída, carregando em sua postura a silhueta de um eterno líder. Acompanhada de quatros reploids da Resistência, Ciel sobe ao largo elevador, em sua ansiedade nem conseguindo baixar a cabeça para tirar os olhos do céu que a aguarda, e segue ao seu destino. Em minutos, o topo é alcançado e ela desce calmamente, na esperança de encontrar a presença de sempre, quente e agressiva, como Fefnir sempre fora. No entanto, o que seus olhos fitam é justamente o contrário: uma figura fria e imóvel, não possuindo no rosto nada capaz de luzir em resposta ao belíssimo céu estrelado. Por momentos a cientista fixa seus lindos orbes azulados naqueles do reploid, negros e vazios, encarando-o, apenas para constatar o óbvio. Eles piscam, e a desgraça se inicia. Dois canhões enormes se formam aos braços do guardião, que sem remorso os aponta contra Ciel, apenas mantendo em face uma expressão gélida e apavorante.
- V-Você... N-Não pode... S-ser o Fefnir! – A jovem balbucia recuando em pânico, antes de tropeçar e cair sentada, arregalando os olhos ao terror das armas que almejam uma vida.