CAPÍTULO 12
Audiência pela vida
–Gina, o que houve? – perguntou Hermione, ao abrir a porta de casa e se deparar com o estado da amiga.
–Feche a porta! Feche! – apontou Gina, recuando para um canto da sala. – Não deixe Harry entrar. Não deixe!
Hermione, aturdida, encostou a porta e a trancou. Virou-se para Gina, preocupada. Ela chorava num canto, encostada no armário. Levantou a mão para Mione e disse:
–Acabou.
Mione fitou o dedo sem a aliança. Foi até Gina e a abraçou, deixando que ela chorasse em paz. Do lado de fora, nem sinal de Harry. Hermione não estava entendendo nada. Por que aquela briga? Qual fora o motivo capaz de levar Gina a arrancar a aliança do dedo?
Mione, paciente, levou Gina até uma poltrona e a deixou lá, aos prantos. Foi até a janela da sala e espiou, para ver se via algum sinal de Harry.
Na frente da casa dele e de Gina, uma carruagem imponente estava parada. Era muito chique, o que fez com que Mione concluísse logo que era uma carruagem do Ministério da Magia. Ela percebeu porque Harry não seguiu Gina.
Naquele momento, na casa dos Potter, um porta-voz do Ministério devia estar cobrando a tão difícil decisão sobre o destino de Estelle.
O porta-voz era um bruxo mirrado, bem vestido, que trazia na mão um pergaminho oficial.
–Para fazer a leitura, preciso da presença de ambos os responsáveis. Sr Potter, poderia me responder onde se encontra sua esposa?
–Na casa ao lado... Mas... Eu não posso responder por mim e por ela?
–Negativo. Lei é lei. E, segundo a Lei, ambos devem concordar numa mesma opinião. E, já que a Lei não diz nada sobre ler primeiro para um e depois para o outro, farei a leitura primeiro para o senhor.
Ele leu em voz alta o conteúdo do pergaminho. Harry ouviu tudo o que já sabia. A leitura terminava numa pergunta.
–No caso de Estelle Weasley Potter, por decisão do responsável Harry Tiago Potter a Poção da Vida será...
–Cancelada.
O porta-voz fez a anotação e pediu a assinatura de Harry. Em seguida, perguntou em qual das casas vizinhas estava Gina. Harry indicou e o porta-voz saiu. Ele observou o bruxo mirrado caminhar até a casa de Rony e Hermione, bater na porta e ser atendido por Mione.
Gina levantou os olhos úmidos para o porta-voz. Hermione ouviu tudo ao lado dela, com a mão no ombro de Gina, oferecendo consolo.
–No caso de Estelle Weasley Potter, por decisão da responsável Gina Weasley Potter a Poção da Vida será...
–Mantida.
Os olhos miúdos do porta-voz dobraram de tamanho. O pergaminho oficial quase caiu no chão. Nervoso, ele olhou novamente para a decisão de Harry, conferindo se realmente estava certo. Ao conferir, olhou inconformado para Gina.
–Não é possível... Sra Potter... Acho que houve um engano, uma confusão de sua parte. Seu marido disse para a Poção ser cancelada...
–E eu para ser mantida... Não houve confusão alguma – respondeu Gina, decidida.
–Mas... Vocês deviam ter entrado num consenso, numa única opinião!
–Eu sei... Mas não deu. Nossas opiniões são distintas.
–Só para recordar, se vocês não entrarem num consenso, a decisão pula das mãos de vocês e vai parar no Ministério.
–Eu sei disso. Mas estou disposta a enfrentar uma audiência. Não vou concordar com a opinião do Harry. Nunca.
O porta-voz pareceu aturdido, mas fez a anotação da decisão de Gina, e pediu que ela assinasse. Em seguida, começou uma nova leitura: a conclusão.
–Nesse caso... Aqui! "Caso haja discordância, a audiência do Ministério da Magia ocorrerá três dias após a leitura oficial desse pergaminho". Então é isso... Três dias. Você e o seu marido apresentarão as opiniões diante do tribunal, e eles julgarão quem tem a maior razão. Certo?
–Sim – confirmou Gina. – Eu estarei lá.
O porta-voz saiu para ir à casa de Harry e dar o mesmo recado. Gina olhou para Hermione, que estava perplexa.
–Então não houve mesmo como vocês entrarem num acordo?
–Não...
–Mas assim não será pior, Gina?
–Sim, mas... É melhor assim. Desse modo, não sou eu nem o Harry quem vai decidir, e sim o Ministério.
–E se a sua opinião não prevalecer?
–Prefiro perder após uma batalha a ver a perda acontecer sem batalhar.
Os dois dias seguintes foram péssimos. A imprensa entrou em alvoroço com a notícia de que haveria uma audiência. Os manifestantes apoiaram e divulgaram uma nova manifestação no dia do julgamento a favor da vida de Estelle. A imagem de Harry continuava péssima, enquanto Gina era aclamada pelo povo pela sua "sábia decisão".
Como se não bastasse tudo isso, a vida pessoal do casal ia de mal a pior. Gina havia se mudado para a casa de Rony e Hermione, e nem ao menos fora buscar seus pertences em casa. Harry sofria, mas não foi atrás de Gina. Acreditava que ela sofria tanto quanto ele. Acreditava que ela ainda o amava.
No serviço, Harry não agüentava as perguntas dos aurores. Ele já tinha escutado até comentários maldosos a seu respeito.
Os dois fizeram visitas diárias a Estelle. Gina sempre no período da manhã, Harry sempre à noite.
Até que o dia da audiência chegou, no meio de toda essa turbulência. A rádio bruxa só falava nesse assunto, assim como todos os jornais.
Na sala dos Tribbes, onde conversava com Peterson, Harry apontou o Profeta Diário, deprimido.
–Um circo... Um verdadeiro circo. Foi isso que a vida de Estelle se transformou. Um circo para os jornais, para a rádio, para o mundo. Todos dão a sua opinião, condenam a minha posição... Não fazem idéia do que é passar por isso.
–Relaxe – tranqüilizou-o Pet. – Uma hora a poeira abaixa.
–Não vejo a hora de isso acontecer... Estou de saco cheio, Pet. Minha vida está desmoronando. Perdi minha filha, perdi minha esposa, perdi minha boa imagem perante os bruxos...
–Quanto a Estelle, após essa audiência a decisão será tomada e ponto final. Quanto aos bruxos, eles acabarão se esquecendo quando surgir um assunto mais interessante. E... Quanto a Gina... – Peterson sentiu o coração disparar. Queria condenar a si próprio por sentir uma pontada de esperança ao lembrar que Harry e Gina tinham rompido. – Ela deve voltar para você... O amor resiste a tudo.
–É o que espero... Sabe, Pet, está sendo uma tortura viver sem Gina. Sei que ela está perto, na casa ao lado, mas... Eu sinto um vazio tão grande. Acho que não sei mais viver sem ela.
Peterson apenas confirmou com a cabeça. Naquele instante, o relógio da sala badalou. Era a hora para a audiência. Harry ajeitou a roupa.
–Espero que dê tudo certo.
–Vai dar, meu amigo. Desejo-lhe boa sorte.
Os dois trocaram um aperto de mão. Harry desaparatou, deixando Peterson sozinho na sala.
Saído do corredor, Joey apareceu. Sabia direitinho o que devia falar, após muito ensaio na cozinha com Mark Tribbes. Tribbes o mandou aguardar a saída de Harry para que ele avançasse.
O rangido no piso chamou a atenção de Peterson que, ao voltar-se, encontrou o colega de banda, chegando com o seu andar descolado, com as mãos nos bolsos do jeans.
–Não sabia que estava aqui, Joey.
–Pois é. É que, por um descuido meu, acabei aparatando na cozinha – ele riu. – Acho que estou precisando de uns treinos... Percebi que você estava com visita, o Potter, se não me engano, aí resolvi esperar.
–Sim. Harry estava aqui... Coitado. Você, claro, sabe o que está acontecendo com ele...
–Brother, se eu não soubesse, não seria desse planeta. Não se fala em outra coisa. Hoje é a audiência decisiva, não é?
–É sim. Ainda bem. Harry e Gina não estavam agüentando mais esse circo todo...
–Falando no casal... Houve um boato de que eles não estão mais juntos. É verdade?
–Sim. Eles romperam. Gina saiu de casa. Está morando com uns amigos, Rony e Hermione, na casa aqui perto.
–Nossa não sei não – Joey esfregou o piercing do queixo, como se estivesse desconfiado. – Esses rompimentos sérios... Quando um sai de casa, não volta mais.
–Você acha? – perguntou Pet, com a testa franzida. – Eu não acho não. Harry e Gina se amam muito, pode acreditar. Foram feitos um para o outro. É um casamento perfeito... Era um casamento perfeito, até toda essa avalanche... Podem estar estremecidos, mas eles irão reatar.
–Se houvesse amor de verdade, não teriam chegado tão longe por tão pouco...
–Tão pouco? Pirou, Joey? Eles são assunto de dez entre dez rodinhas. Todo mundo só fala nisso.
Joey levou uns segundos para tentar encontrar outra forma de dobrar Peterson...
–Mas, você sabia, brother, que é nesses momentos de briga que o casamento pode realmente terminar? No tempo em que um casal se separa, podem ocorrer várias coisas, como, por exemplo, aparecer outra pessoa na vida de um deles.
Finalmente, as palavras foram certeiras. Peterson pareceu considerar a questão, pois emudeceu e ficou pensativo por cerca de um minuto. Porém, após a breve reflexão, o efeito surtido não foi o esperado.
–Não... Eles não se trocariam por outras pessoas.
–Por que não, brother? – insistiu Joey. – Nesse momento, as pessoas ficam frágeis. Tentam refletir sobre qual será o rumo certo para as suas vidas. Se o casamento ou uma vida nova ao lado de outra pessoa.
Peterson ficou um pouco pensativo, mas logo balançou a cabeça, em sinal de discordância.
–Pode ocorrer com outros casais... Mas com Harry e Gina, não... Agora chega, Joey. Vamos mudar de assunto. Que tal... O futuro do Magic?
Eles começaram a conversar. No entanto, secretamente, Joey concluía que ele e o Sr Tribbes teriam que dar uma forcinha para empurrar Peterson para Gina.
A primeira coisa que Harry percebeu ao entrar no tribunal foi que ele parecia muito mais movimentado do que quando ele estivera lá antes.
As arquibancadas vazias de outrora estavam totalmente ocupadas. Os vultos escuros continuavam nas mais altas. Ao contrário da outra vez, a entrada dele não cessou o falatório, e sim o aumentou. Harry sentou-se na cadeira com correntes. Lançou um breve olhar para a cadeira ao lado; Gina estava sentada nela, olhando temerosa para todos os lados do tribunal.
Fudge estava na primeira fila. Antes de iniciar, pediu silêncio e fez o tradicional discurso sobre o dia da audiência, o motivo, entre outras coisas.
Em seguida, apontou para a cadeira de Harry.
–Harry Tiago Potter. Segundo nosso documento oficial, o senhor é a favor do cancelamento da Poção da Vida em sua filha, Estelle. Esse júri deseja ouvir o porque dessa sua opinião.
Harry respirou fundo e começou:
–Eu sou a favor porque o curandeiro responsável por Estelle, George Bright, garantiu, não só para mim, como também para a minha esposa, que Estelle não tem mais consciência. Que ela não entende mais nada que está ao redor dela, não escuta, não tem mais emoções. Ela se movimenta, é verdade, mas seus olhos transmitem o vazio. É como se a alma dela tivesse saído do corpo. Ela não tem como voltar ao normal. Para mim, acho um crime deixa-la naquela enfermaria por anos, prolongando o nosso sofrimento por algo que, sabemos, nunca terá solução. Até Bright concorda comigo...
–Essa testemunha será ouvida daqui a pouco, Sr Potter. Concentre-se no seu ponto de vista.
–Acho que termino meu ponto de vista aqui mesmo... Não tenho mais nada importante para dizer. Só acho que devemos deixar que o destino siga seu percurso.
–Dando o depoimento do Sr. Potter como encerrado, agora vamos ouvir Gina Weasley Potter. A senhora é a favor de que a Poção da Vida seja mantida. Esse júri deseja ouvir o porque de sua opinião.
Gina também suspirou, empertigando-se na cadeira.
–Sim. Acho que, se houver uma mãe aqui dentro desse tribunal, já deve saber o porque. Eu carreguei Estelle no meu ventre por meses... Só uma bruxa que foi mãe poderá descrever a sensação de trazer um ser dentro de si. Um ser que permanece em segurança lá dentro, crescendo, se desenvolvendo, dando chutes... E, de repente, ele sai para o mundo. Para esse mundo torpe, perigoso. Mas aquele laço de união, selado entre mãe e filho nos meses de gestação, continua lá... Sentimos uma necessidade tão grande de proteger o nosso filho. É uma parte de nós andando sozinha por aí... E, de repente, uma fatalidade. Estelle na enfermaria – Gina começou a chorar. – Pessoas dizendo no meu ouvido que minha filha nunca mais vai voltar... Que todo o futuro que sonhei para ela não vai acontecer... E sugerem que eu cancele a única forma de deixa-la viva... Como? – ela olhou para as pessoas sentadas ao redor. – Digam-me! Que mãe tiraria o único elo de ligação com a vida que seu filho tem? Eu tenho esperança dentro do meu peito... Pode ser que Estelle nunca volte. Mas quem garante que não volte? Quem?
Gina escondeu o rosto com as mãos, mergulhando num choro desesperador. Harry a observou calado. Um burburinho nas arquibancadas. Fudge convidou a testemunha para entrar.
George Bright entrou, com seus olhos ainda maiores do que o comum, aumentado pelas lentes dos óculos. Sentou-se na cadeira indicada pelo Ministro.
–O senhor é o curandeiro responsável pelo caso...
–Isso mesmo.
–É muito respeitado, Sr Bright. Têm anos de experiência. Por isso, gostaríamos que seu ponto de vista fosse apresentado perante esse tribunal.
–Posso levantar-me, senhor? – perguntou Bright ao Ministro.
–Faça como quiser – respondeu Fudge, abrangendo, com um gesto da mão, todo o espaço do tribunal.
Bright começou a caminhar lentamente ao redor das cadeiras de Harry e Gina, com as mãos cruzadas nas costas.
–Estamos diante de uma batalha ética. Uma batalha que tomou proporções assustadoras. Todos possuem uma opinião sobre o caso. E a explicação é simples: todos se perguntam a mesma coisa. Como se pode traçar um limite entre corpo e mente? Ao perder-se a consciência, perde-se a vida? Retirar a Poção da Vida é um assassinato? Ou uma misericórdia? Estarão matando Estelle ou deixando que a vida siga seu curso natural? O que deve pesar mais: o direito de viver a qualquer custo, mesmo na situação da garotinha, ou morrer, quando a consciência, que nos separa de um vegetal, não existe mais?
"Perguntas complicadas de serem respondidas... Afinal, Estelle está lá, possui movimentos... Aparentemente viva para alguns, com um certo nível de consciência para outros. Nesse caso, sempre houve e haverá opiniões opostas. O que alguns acham, outros não acham. Mas, cabe a mim, dar o veredicto de todos os Curandeiros em casos como esse".
"Estelle se movimenta, diriam alguns. Sim, mas não são movimentos voluntários. Ela responde a estímulos físicos, mas não entende o que vê, nem o que ouve. Ela se movimenta, como a folha que é balançada pelo vento... Mas a folha não possui lembranças, pensamentos, tampouco consciência. Estelle está assim. O feitiço destruiu a consciência. Eu posso garantir, como qualquer outro Curandeiro, que Estelle é incapaz de pensar, de lembrar de qualquer coisa e de ter emoções".
"Acredito que o melhor para a menina seria que a Poção da Vida fosse cancelada...".
–Nunca! – revoltou-se Gina. – Não pode dizer uma coisa dessas!
–Sra Potter – pediu o Ministro. – Por favor, fique...
–Esse curandeiro só diz bobagens! Usa termos técnicos para falar da vida de minha filha. Meu lado mãe diz que ele está errado!
–Sra Potter, por favor! – pediu novamente Cornélio Fudge, impaciente. – Ou vou ter que pedir que a senhora se retire do tribunal.
–Nem todo curandeiro concorda com ele – insistiu Gina, enquanto bruxos a empurravam de volta para a cadeira. – Perguntem a Alexander... – mas o Ministro a ignorou.
Gina sentou-se novamente, inconformada, aos prantos. Harry permaneceu calado, com lágrimas silenciosas rolando pelo rosto. Bright retirou-se, dando por encerrado seu depoimento, guardando na mente o nome pronunciado por Gina.
Fudge começou a conversar com as pessoas às suas costas.
–Após ouvirmos a opinião da mãe e do pai de Estelle Weasley Potter, e após a opinião curandeirísta sobre o assunto, esse tribunal decidiu que a Poção da Vida será...
Harry e Gina sentiram o coração sair pela boca.
–...Cancelada.
NA: Novas reviews serão bem-vindas... Ah e se quiserem palpitar sobre o que vocês decidiriam, sobre qual ponto de vista concordam, também seria bacana... Valeu!
