Os dois pararam ao meio dia para descansarem em uma clareira na mata, próximo a um pequeno povoado. Inuyasha achou melhor não ir até lá e saiu a procura de algo para comer. Kagome se sentou numa pedra e ficou pensativa por uns instantes. Como ela, sendo filha de quem era, podia confiar em um youkai como aquele? Ainda não entendia bem o que se passava em seu coração naquela hora, mas por mais que ele se mostrasse digno de confiança, não abaixaria a guarda por um minuto sequer. Observando o povoado, resolveu ir até ele procurar uma coisa que julgava ser importante para a viagem que ela estava iniciando naquele momento.
Inuyasha não estava muito longe dali e quando voltou rosnou ao não vê-la onde havia deixado. Garota estúpida, vai me dar trabalho, pensou ele indignado. Como Sesshoumaru pôde lhe confiar missão mais detestável, andar por ai na companhia de uma humana imprestável. Desde que sua mãe morreu há muitos anos ele nunca mais esteve com uma humana, a não ser as vadias que ele encontrava nas tavernas pelo caminho. Ele passou a mão pelo kimono vermelho, ainda impregnado com o cheiro de Kagome. Maldição, ele pensou finalmente. Farejou o ar a procura de seu rastro e seguiu o caminho até o povoado.
A mocinha caminhava por entre as pobres casas, olhando com tristeza a miséria na qual o povo vivia por causa da guerra. Por onde passava via rostos tristes e cansados, na maioria mulheres e velhos, tudo o que restava dos tempos de abastança, quando Inutaisho ainda era o shogun. Ela jurou a si mesma que veria dias felizes novamente.
Seus olhos pousaram no entanto em um casebre com um estábulo na frente. Ali ela vislumbrou pendurados nas paredes de taipa diversos arcos, de diferentes tamanhos e ornados com variados tipos de coisas, alguns com fios de seda e outros com raízes retorcidas. Ela adentrou ao lugar e viu ao fundo um homem idoso, batendo com vigor numa bigorna um pedaço de aço fumegante. Ele sorriu ao ver o rosto juvenil, que lhe devolvia o sorriso amigável.
- Bom dia venerável senhor.
- Veio a procura dele não é mesmo?
Kagome olhou um tanto surpresa para o velho, que se levantou com dificuldade e foi até onde estavam os arcos. Apontou o dedo para um deles.
- É aquele que deve pegar minha menina!
O arco que ele lhe apontava era o maior deles, feito de uma madeira escura e enrolado em uma tira de seda verde. Estranhamente era o arco que mais lhe chamara a atenção assim que chegara ali. Ela o pegou e observou seus detalhes. O velho então lhe estendeu uma flecha. Ela sorriu e colocou a haste fina no lugar e retesou, sentindo a tensão perfeita entre a madeira e a corda.
- Como pensei este é perfeito! – o velho foi até um canto e pegou um alforje de flechas, que deu a Kagome. Ela ficou um tanto constrangida.
- Devo pagar ao venerável mestre por ele, mas não possuo dinheiro...
- Não se preocupe – ele sorriu – para a filha de Higurashi isto não é nada.
Kagome entendeu a atitude daquele senhor idoso e agradeceu em reverência. Colocou o alforje nas costas e caminhou em direção á rua. Andou algum tempo quando ouviu um tropel. Olhou para trás e viu um regimento do shogun que se aproximava. Seus olhos se arregalaram quando viram um rosto conhecido no comando da tropa. Imediatamente correu mas sabia que tinha sido vista e seria perseguida não importa quanto corresse. Se voltou para eles e pegando uma flecha retesou o arco, que disparou como um raio em direção ao líder do regimento. Ao redor da flecha se formou uma aura pura que parecia rasgar o ar. O homem que liderava a tropa saltou de cima do cavalo no momento em que seria atingido, e a flecha empalou o guarda que estava logo atrás. Houve muita confusão porque os soldados não esperavam ataque tão repentino e certeiro. Imediatamente atearam fogo nos casebres e logo as chamas tomavam conta de tudo, e a fumaça turvou a visão de Kagome, que apontava o arco retesado para onde visse movimento. De súbito em meio ao fogo que lambia uma casa ao lado surgiu uma figura conhecida, em direção a ela, empunhando uma espada pronta a cortá-la ao meio. Kagome no entanto saltou e desviou do ataque, sacando a espada para aparar o golpe seguinte, ficando cara a cara com o agressor.
- É uma pena, ter que matar alguém tão bonita como você... – ele lambeu os beiços e deu uma rasteira veloz nela, que caiu, mas rapidamente se levantou e lançou a espada, que atravessou a barriga do chefe do regimento. Ele sentiu a pontada e se afastou um pouco sorrindo.
- Se fosse fácil eu não estaria lutando com a filha de Higurashi não é mesmo? – ele gemeu um pouco, tirou a lamina do corpo e a jogou na direção de Kagome. Neste momento algo cortou a trajetória dela. Kagome viu apenas um clarão como um relâmpago e no segundo seguinte Inuyasha estava a sua frente, segurando a espada daimyo ensangüentada numa mão e a Tessaiga na outra, que estava apontada para o youkai a sua frente.
- Ora, se não é o lobo desprezível por essas terras.
- Inuyasha... – o homem rosnou ao reconhecer o hanyou – então você esta andando com uma humana, é típico de um bastardo meio youkai como você. Resolveu se unir aos humanos desprezíveis como sua mãe?
- Cale a boca lobo sarnento, nunca mais desonre minha mãe a colocando nessa boca suja entendeu? Suma daqui antes que eu termine o que ela começou!
- Acha que eu vou deixá-los fugir? Deve estar sonhando...
Ele uivou profundamente. Inuyasha se virou para Kagome e a pegou, jogando-a no colo brutamente. Ela protestou.
- Ei! Seu maldito! Largue-me agora mesmo!
Ele rosnou irritado enquanto corria feito um louco.
- Cale a boca sua idiota! Eu disse para ficar quieta lá, agora teremos que fugir porque senão viramos comida de lobo!
- O que? – ela gritou sem entender.
- Aquele é Kouga, um youkai que controla os lobos, daqui a pouco isto aqui vai estar infestado de lobos famintos, quer virar comida deles?
- Mas... e as pessoas do povoado...
Kagome pensou no pobre velho que lhe dera o arco.
- Esqueça. Eles vão servir de ração para os lobos. Eu não posso lutar direito porque tenho que te proteger sua inútil! Se eu não tivesse chegado você estaria empalada na sua própria espada agora.
Ela se irritou com as palavras grosseiras dele.
- Seu maldito! Me largue agora mesmo senão...
Inuyasha parou e a jogou no chão.
- Tola! Se continuar a me desobedecer vai ser difícil eu te proteger! Quem vai protegê-la de você ein?
Ela se levantou com ódio no olhar. Ele gostou disso.
- Escute aqui, quem quis me seguir foi você, eu não te pedi nada, alias, eu quero sinceramente que você suma da minha frente idiota! Idiota!
Ele riu ás gargalhadas. Ela se irritou mais e partiu pra cima dele e lhe deu um tapa na cara. Imediatamente ele parou de rir e ficou sério. Na verdade quem se irritou agora foi ele.
- Como ousa me bater no rosto sua humana atrevida?
Ela sorriu pois tinha ferido fundo aquele hanyou convencido. Ele no entanto ficou furioso e se lançou contra ela ferozmente. Ao ver que tinha provocado a ira dele seu rosto ficou sério também. O impulso a fez levantar as mãos para barrar a investida dele e uma energia emanou delas e jogou Inuyasha longe. Ele mal pôde acreditar. Ainda meio zonzo ele levantou a cabeça e arregalou os olhos. Kagome ainda mantinha as mãos levantadas e ele viu as emanações de energia pura. Ela abriu os olhos e ficou surpresa ao ver o hanyou no chão com cara de bobo.
- Ei... o que foi?
- Você é... uma miko?
Ela olhou para as próprias mãos ainda incrédula. Ele se levantou e a fitou profundamente. Por isso meu irmão a teme, pensou ele. Ela não é só uma mera humana. As mikos eram temidas por todos os youkais por causa de seu poder de purificação. Inuyasha inda sentia o poder dela em sua pele. Talvez se ele não fosse um hanyou teria sido purificado ali mesmo.
- Você... está bem? - ela se aproximou e perguntou a ele receosa. O hanyou no entanto sacudiu o pó do kimono e lhe devolveu a espada que ainda tinha nas mãos.
- Sim. Temos que continuar senão os lobos seguirão o nosso cheiro e nos acharão. Vamos pegar um cavalo para você seguir viagem, você é muito lenta e eles nos alcançarão logo.
- Ora – ela sorriu – não vai mais me carregar nas costas?
- Não – ele respondeu secamente – não quero acabar purificado, ainda mais pelas costas.
Kagome o seguiu quieta. Tinha ouvido algo sobre o poder das mikos mas achava que isso era somente uma lenda ou historia muito antiga pra ser verdadeira. Por que justo ela seria um miko, uma sacerdotisa? E porque mesmo sabendo disso Inuyasha ainda queria viajar com ela? Pelo menos ele se manteria afastado dela agora. Mas no fundo de seu coração tinha um leve pressentimento, de que aquele hanyou grosseiro e violento tinha um lado bom, pois apesar de ser um youkai tinha uma metade humana. Não sabia porque mas estava impelida a acreditar que ele queria se unir a causa de seu pai. Por isso seguiu-o até o próximo vilarejo, onde eles roubaram um cavalo de um soldado do shogun e seguiram viagem. Rumo ao leste.
