O ar frio da noite a fazia bater um pouco o queixo, mas Kagome se mantinha firme como uma rocha em cima do cavalo. Não pediria nada a aquele idiota grosseiro do Inuyasha, mesmo que congelasse. Ele seguia logo atrás, sério. Podia ouvir o ranger dos dentes dela. Abruptamente ele tirou o manto vermelho e colocou sobre as costas da mocinha, que se virou surpresa.
- Por que fez isso? – ela perguntou incrédula no gesto de cavalheirismo dele.
- Por que o barulho de seus dentes batendo de frio me incomodam. – ele respondeu asperamente.
Kagome se virou para frente irritada. Idiota estúpido! Ela não sabia porque ainda seguia com ele. Depois novamente lhe dirigiu a palavra mas sem olhá-lo.
- O que você tem contra o Shogun afinal? Você me parece ser do clã dele...
- Já disse – ele retrucou seco – tenho meus motivos para não simpatizar com ele. Além do mais eu não sou do seu clã. Você acha que eles aceitariam um mestiço entre os nobres e puros membros do clã?
As palavras de Inuyasha soaram amargas como fel. Ela suspirou.
- Eu entendo.
- Não, não entende – ele começou – você nunca vai saber o que é crescer rejeitado e sem família. Você nunca vai saber o que é isso senhorita Higurashi.
O tom que ele usou no final era de ironia e deboche. Kagome parou o cavalo e se virou para encará-lo.
- Você tem razão, eu nunca entenderia. – o olhar dela se tornou doce e isso o incomodou. Inuyasha abaixou o olhar e falou mais calmamente.
- Vamos passar a noite aqui. Acho que os lobos não poderão nos farejar a essa distancia.
Ela sorriu, pois estava exausta e faminta. Desceu do cavalo e caiu na relva macia e bocejou deliciada. Seus músculos estavam todos doloridos pela cavalgada e pela luta com o youkai lobo. Ela subitamente se flagrou pensando nos pobres aldeões daquele vilarejo e tocou o arco que o velho mestre armeiro lhe dera. Inuyasha se sentou a alguma distancia e colocou a Tessaiga a seu lado.
- Por que diabos foi aquele vilarejo? Só por causa de um arco idiota?
- Não é um arco idiota.
Kagome pegou uma flecha e retesou o arco apontando para ele.
- Este é meu salvo conduto por esse pais em guerra.
- Acha que isso pode protegê-la do Shogun? – ele indagou com desprezo.
Mas Inuyasha arrepiou-se todo ao sentir a energia que passava das mãos de Kagome para a flecha que ela segurava. Tinha se esquecido que ela era uma miko. Ouvira falar dos poderes espirituais das sacerdotisas mas nunca passou pela sua cabeça que esse poder era tão intenso.
- Ei, não aponte essa droga pra mim – ele rosnou irritado.
Ela riu da expressão do hanyou. Guardou a flecha no alforje e tocou sua barriga.
- Estou com fome – ela sussurrou delicada. Soltou os cabelos presos e a cascata de madeixas castanhas caiu sobre os ombros dela. Deixou cair o manto de Inuyasha e a manga do casaco branco que ele lhe dera, fazendo com que o colo branco aparecesse parcialmente.
Ele não perdeu a oportunidade.
- Eu também. – sua face tomou um ar diferente. Ele se levantou e se aproximou dela sentando-se a seu lado. Kagome se arrepiou ante a proximidade dele e disse gaguejando.
- Ei... q...que idéia é... essa...?
- Não me sai da cabeça o jeito que dançou naquela casa de chás. Apesar de ser uma humana você é...
Kagome engoliu em seco ao ouvir as palavras do hanyou. Ela fora treinada para resistir ás fraquezas femininas mas aquele meio youkai a deixava tonta. Ela levantou a manga caída e fechou o manto vermelho violentamente. Ele no entanto sorriu.
- Ei, quero meu manto de volta. – Inuyasha ergueu a mão para tirar o manto dela, mas um som o fez parar e se levantar sério. Ufa, pensou Kagome suspirando. Ele a pegou pelo braço violentamente e Kagome gemeu e protestou zangada. Inuyasha a jogou no colo e saiu a correr.
- Mas que droga, quando você vai parar de me pegar dessa maneira seu idiota!
- Cale-se! Se quiser eu te deixo lá para que te matem sua garota reclamona!
Ela se calou pois percebeu que estavam sendo seguidos por youkais.
- Maldição! Eu não posso enfrenta-los direito porque tenho que proteger você!
Kagome se desvencilhou do colo do hanyou que ficou embasbacado com a atitude dela. A mocinha tirou uma flecha e resetou o arco, e a seta partiu feito um raio em direção aos youkais que os perseguiam. Uma luz vinha em direção a eles e pararam surpresos, para no instante seguinte serem atingidos pela flecha e se despedaçarem. Nada restou de seus corpos. Eles foram purificados.
Inuyasha olhou aquilo incrédulo. Kagome se ergueu altivamente e olhou para o hanyou ainda parado. Ela se aproximou dele e o fitou no fundo dos olhos. Nesse instante ele sentiu a força do olhar dela, o olhar de uma miko.
- Kagome...
Pela primeira vez ele tinha a chamado pelo nome. Ela tocou os cabelos prateados de Inuyasha, que voavam ao sabor da brisa. As folhas caiam fugazes e se misturavam aos cabelos dela, como ornamentos de uma princesa. Os olhos dourados dele a fitavam intensamente e isso a deixava mole e sem ação.
- Você me subestima Inuyasha – ela sussurrou – como você pode ver eu posso me defender sozinha.
- Eu posso ver. – ele sorriu.
Ela se aproximou para tocar os lábios nos dele. O hanyou estava paralisado ante o iminente toque entre eles mas algo o fez tomar uma atitude.
- Pare... – ele a segurou pelos ombros e a afastou. Uma imagem veio á sua mente, a imagem de seu pai, que sempre protegeu os humanos da fúria dos membros do clã. O dia em que ele tombou sob as mãos de uma mulher... uma miko. Durante a batalha em que ele fora ferido e recuara, uma sacerdotisa lhe dera o golpe final. Inutaisho era exemplo de sabedoria e força para Inuyasha e ele morrera pelas mãos de uma miko como aquela mulher que estava frente á ele. Inuyasha se controlou e se virou.
- Você está enganada. Eu estou te acompanhando nessa viagem para me aliar a seu pai, e não viver um romance com uma garota humana. O exemplo de meu pai já me basta para saber que isso não dá certo.
Ele escondeu o rosto para não mostrar o ressentimento. Tinha que cumprir a missão que seu irmão lhe dera, não por gostar dele, mas em respeito á memória de seu pai. Kagome corou ante o ato impensado dela.
- Você tem razão. Eu também não quero me envolver com um youkai com você, somos de mundos totalmente diferentes. Você é uma fera e eu sou uma mulher.
O tom de desprezo que ela usou o feriu. Ele se virou e a agarrou, beijando-a violentamente e com paixão. Kagome se surpreendeu com a atitude de Inuyasha mas não resistiu ante o beijo dele. Uma sensação estranha tomou conta do corpo dela, algo que jamais sentira antes. Seus sentidos se tornaram turvos e ela amoleceu nos braços dele.
A mente de Kagome no entanto foi retornando do estado de êxtase. Ela o empurrou com todas as forças e saiu correndo dele, do sentimento que surgia em seu coração. Inuyasha no entanto com um salto caiu frente a ela e voltou a agarrá-la e novamente a beijou. Depois a soltou e sorriu com desdém.
- Você é uma humana muito atrevida mas... sabe que seu gosto é muito bom... – disse enquanto lambia os beiços e os olhos dourados faiscavam. Isso a deixou furiosa.
- Maldito... o seu sangue sujo aflorou no final das contas... nunca mais me toque senão você irá conhecer os pilares do inferno...
Seus olhos transbordavam ódio. Sua face branca ficou rubra com a força da raiva que naquele momento sentia do meio youkai a sua frente, rindo maliciosamente. Inuyasha por fim disse.
- Agora que matei a sua vontade de mim, podemos seguir adiante.
Ele devia estar de brincadeira. Ela jamais o seguiria de tudo. Mas o desejo de vingar-se daquela humilhação surgiu em sua cabeça feito um estalo. Decidiu seguir com ele. Inuyasha não perderia por esperar.
