Capítulo 4- Escola
Foi com terrível pesar que eu acordei na manhã seguinte, e constatei que eu continuava a ter cabelo comprido. Apesar de tudo, eu ainda tinha esperanças de ter sido tudo um sonho terrível que acabaria quando eu despertasse.
Suspirei, e me levantei, para começar meu segundo dia como garota. Ainda meio dormindo, fui até o banheiro, escovei meus dentes, penteei meus cabelos longos, e saí, de pijama, para a cozinha. Ali encontrei Heero e Trowa tomando café da manhã. Instantaneamente notei que alguma coisa estava diferente: eles estavam começando a aplicar as coisas que Relena nos havia ensinado.
Olhei interrogativamente para eles, e Trowa rapidamente entendeu.
- O dr. G nos telefonou, dizendo que devíamos começar a missão hoje.
- A missão – começou Heero – consiste em nos tornarmos amigas íntimas da filha de um dos presidentes de uma companhia clandestina de Mobile Suits, para estarmos a par de todos os passos do sujeito. Para isso precisávamos estar.... "nesse estado".
Fiz que sim com a cabeça, e senti um peso enorme em minhas costas. Duo havia se pendurado em mim pelo pescoço, como costuma fazer. Com algum esforço consegui não ir ao chão.
- Tsc, tsc, tsc... esqueceu que não somos mais homens, Diana? – uma voz falou atrás de mim. Era Wufei. – O Quatre não agüenta mais o seu peso nas costas. Faça isso com Trowa, ou Heero.
Wufei e Duo começaram sua discussãozinha matinal, e eu fui pegar uma xícara de café. Encostei-me na pia da cozinha e tomei-o vagarosamente. Pelo visto, esse ia ser um longo dia. Maior que o anterior. Antes, só tínhamos que conviver com nós mesmos, mas hoje nós vamos para o meio das meninas mesmo. Tudo tem que dar certo, nossa atuação, nossos modos femininos e tudo o mais. Somos ótimos como pilotos, mas ninguém disse nada que deveríamos passar por situações constrangedoras como essas. Iria processá-los, se não fossem uma organização secreta.
- Uniformes? – perguntou Duo de repente
Todos instantaneamente o olhamos com cara de "ãhn?".
- Escola, uniformes, disfarces... Assimilaram?
Boa pergunta essa de Duo, eu nem tinha me tocado do detalhe. E como para respondê-la, a campainha soou. Nós nos entreolhamos por um instante, e fui, de pijama mesmo, atender a porta.
- Pois não? – perguntei ao rapaz de roupa amarela que estava a minha frente 1
- Encomenda para a srta.... Yuy.
- Espere em minutinho.
Eu ia berrar lá para dentro para que Heero aparecesse, mas achei que ia parecer deselegante demais. 2 Então fui até a cozinha, deixando o rapaz ali, e chamei o japonês, que voltou instantes depois com uma caixa em mãos.
Abriu-a com uma faca e pousou-a na mesa, permitindo que todas nós pudéssemos ver o que tinha lá dentro. Uniformes colegiais e um papel.
- "A aula começa as 9h. Segue abaixo o endereço da escola. Treize Kushrenada irá buscá-los as 16h. Ele não sabe quem são."
- Objetivo, como sempre, heim Heero?- comentou Duo alegremente, pegando as roupas.
Levamos algum tempo para achar que roupas eram de cada um, pois não tinha indicação. Uma roupa simples e típica de colegial. Saia de pregas azul clara, uma blusa branca com as mangas e gola azul clara (aquelas blusas tipo marinheiro, entendem?), meias brancas 5/8 e sapatos pretos tipo boneca.
- Que horas a aula começa mesmo?
- As 9. – respondeu Heero automaticamente.
- Entom.... faltam só 45min, e nós nem sabemos onde fica a escola. – comentei.
Pra quê eu fui dizer aquilo...? Uma balbúrdia tamanha se instalou em casa, que parecia o fim do mundo. Cada uma correu para um lado, vestindo uniformes, pegando o guia municipal, consultando relógios, procurando as maquiagens que Relena emprestou, arrumando o cabelo e várias coisas. Parecia que faltava tudo, e nem todo o tempo do mundo ia ser suficiente.
Depois de prontas, e sabendo mais ou menos onde ficava a escola, saímos de casa.
É engraçado como, mesmo vestindo a mesma roupa, cada uma de nós conseguiu manter o estilo. Não é porque estávamos todas com a mesma roupinha azul clara, que pareceríamos iguais. Talvez a tarde que passamos com Relena tenha ajudado com alguma coisa. Pelo menos as pessoas não nos olhavam estranho na rua. Isso era um bom sinal, e um ponto positivo para nós.
Pegamos o ônibus que passa a dois quarteirões de casa. Era uma coisa simples. Cinco pontos, e estaríamos na frente da escola. Pelos deuses, a quanto tempo eu não freqüento uma escola? Desde a última missão que envolvia uma escola? Possivelmente. Essa coisa de ser piloto gundam e salvar o mundo acaba com um futuro acadêmico de qualquer um, sabiam?
No caminho, nós repassamos várias e várias vezes nosso parentesco, o motivo de estarmos lá, alguns dados sobre a família de cada um e tudo o que provavelmente seria necessário combinarmos. Maiores detalhes sempre eram inventados na hora, mas a base tinha que ser combinada, para não cairmos em contradição mais tarde. Ainda mais porque a missão levaria tempo, tempo suficiente para conquistarmos a total confiança da menina. Recebemos algumas informações sobre ela que poderiam ser úteis, mas era muito pouca coisa, então estava tudo em nossas mãos.
Por sorte, chegamos em cima da hora. Um grande e majestoso portão de ferro marcava a entrada da escola. Depois dele, havia um extenso pátio cimentado, com um ou outro canteirinho de flores, e alguns metros a frente, o prédio principal da escola. Uma construção grande e imponente, e era para lá que deveríamos nos dirigir.
- Espero que os vovôs tenham cuidado da parte de matrícula. – comentou Duo.
- É bom mesmo! – disse Wufei.
Eu dei simplesmente uma risadinha. Era bom eu já ir tratando de entrar no meu papel. E pelo visto meus amigos resolveram fazer o mesmo.
Seguimos direto para a diretoria da escola.
- Entrem. – disse uma voz autoritária, quando Trowa bateu na porta
Ele abriu, e entramos todos. A sala era um tanto quando intimidadora, talvez pela decoração absolutamente impessoal, talvez pela austera mulher que estava sentada atrás de uma mesa de mogno. Parecia beirar os 50 anos, tinha a pele clara e levemente enrugada, olhos penetrantes e escuros, e os cabelos castanhos firmemente presos no alto da cabeça. Sem dúvida uma mulher que metia medo.
- Devem ser as alunas novas, certo? As meninas transferidas de um internato em Berna?
Berna? Os cientistas não tinham mencionado nada sobre internatos, mas achamos que a história podia ser válida, e, esperando fervorosamente que assim fosse, Heero assentiu.
- Como se chamam?
Nós nos apresentamos, e ela continuou.
- Yuy, Maxwell, Barton, Winner e Chang. Sejam bem-vindas a esta instituição. Seus horários foram escolhidos por mim, se tiver algo que queiram mudar ou acrescentar, procurem-me no final do período 3. Estou deixando um mapa do colégio com vocês, e se precisarem de mais alguma coisa, peçam ajuda a algum dos estudantes. O almoço é servido ao meio-dia no refeitório, e depois vocês voltam as aulas. Qualquer problema, estarei a disposição.
- Estamos muito agradecidas, senhora. – Duo respondeu, surpreendendo-nos por lembrar de usar o feminino.
- Podem se retirar agora, o sinal para a primeira aula vai tocar logo.
Fizemos uma reverência e saímos dali.
- Berna? – comentou Wufei assim que saímos da sala da diretora
- Vamos conferir isso agora.
Heero tira o celular da pasta que carregava e liga para os doutores. Algumas palavras sussurradas bastaram para ele descobrir. Nós quatro o olhávamos ansiosos, e ele simplesmente sorriu em resposta. Felizmente, tínhamos acertado na mosca.
Meio absolutamente perdidos, nós andávamos pelos corredores, procurando a sala 204. Como não encontrávamos, eu perguntei para uma estudante que estava conversando com suas amigas no meio do corredor.
- A sala 204? É aquela ali, a terceira porta a direita.
Eu agradeci, e seguimos para a direção indicada.
A sala já estava com quase todos os seus lugares do fundo ocupados, mas os da frente estavam quase todos livres. Os garotos bagunceiros ao fundo, e as garotas faladeiras ocupavam os cantos, sobrando o meio da sala para os "nerds". Sem outra opção, escolhemos lugares ali no meio mesmo, perto da mesa do professor.
Como iríamos fazer para nos aproximarmos da menina? E quando? Tantas dúvidas povoavam minha cabeça, que eu mal percebi quando uma professora gorducha entrou na sala.
- Muito bom dia, classe. Antes de iniciar a aula, eu gostaria de apresentar a vocês cinco alunas novas que foram transferidas para cá. Meninas, por favor, venham aqui na frente
Meio receoso, eu me levantei e fui até lá, e meus amigos fizeram o mesmo.
- Meus queridos alunos, essas são Karina Winner, Diana Maxwell, Jin Mei Chang, Trina Barton e Hina Yuy. Sejam bonzinhos com elas, e as façam se sentir em casa, por favor.
Nós nos sentamos, e ela pegou seu diário de classe para começar a chamada, mas antes virou-se para nós e disse:
- Eu sou sua professora de técnica de redação, e meu nome é Eleanor Kamiya. Eu dou aula nessa escola a anos, e caso seus pais tenham estudado aqui, eles devem se lembrar de mim.
Após a longa chamada, ela escreveu na lousa: "Redação Narrativa".
- Classe, hoje iniciaremos uma nova matéria. Diferentemente daquela que estávamos estudando, a redação narrativa pode ser feita em primeira, ou terceira pessoa. Sempre dêem destaque a descrição de lugares e de pessoas, e aos sentimentos delas. Entenderam? Vamos fazer uma experiência. Eu vou passar um tema na lousa, e vocês vão escrever sobre isso, certo?
Talvez isso seja divertido. Quando recebemos essa missão, eu me esqueci do detalhe que não é só fingir fazer as coisas. Teremos que realmente fazê-las. Já fazia tempo que eu não realizava tarefas tão simples como fazer uma redação. E o tema até que é legal! "Você está no seu quarto fazendo alguma coisa, e está tudo silencioso. De repente, você ouve uma música estranha vinda de algum lugar que você não sabe onde é. E antes que você se dê conta, a música o transporta para algum lugar. Dê um final criativo" 4
Bom, por onde eu começo... meu quarto. Até outro dia eu morava numa base de guerra. Com um quarto grande, cheio de camas simples de ferro e lençóis claros, dispostas em duas grandes fileiras. Mas não seria bom contar sobre isso. Atualmente eu moro numa casa de bom tamanho, não muito longe daqui. Mas ela é um esconderijo para cinco dos maiores pilotos de MS do mundo. 5 E só estamos morando lá porque os cientistas malucos resolveram ser perseguidos pelas autoridades e acharam melhor nos deixar morando num lugar seguro, perto de onde ia ser o próximo ataque, e perto da Relena. Aquela idiota! Ela sabe muito bem se proteger sozinha, mas nããão... a gente TEM que estar sempre por perto dela. Só porque o "senhor dos MSs clandestinos" resolveu morar aqui pelas redondezas. Talvez se eu ocultar a parte do esconderijo e dos cientistas, fique aceitável. Ah, sim, e tenho que mudar a decoração do quarto, que não é apropriado para uma garota.
Eu olhei para Trowa, que olhou para mim e sorriu levemente, antes de voltar a escrever. Então voltei a olhar para a minha folha em branco e pus minha mente pra trabalhar, e inventar algo útil para escrever a redação.
As duas aulas seguintes não demoraram tanto para passar. Apesar de que 1 hora de duração em cada aula é meio cansativo. Depois de redação nós tivemos aula de Química, e Matemática. Duo ficou reclamando de fome boa parte da aula de matemática. Acabadas essas três aulas, fomos para o refeitório. Por sorte, agora todos os alunos estavam indo para o mesmo lugar, então o risco de nos perdermos era menor.
- Até que estamos nos saindo bem. – comentou Wufei.
- Você quer dizer... quando só tivemos que ficar sentados e parados por três horas, ouvindo os professores falarem, ou fazendo o que eles nos mandavam?
- Duo! – ralhou o japonês entredentes – Quantas vezes eu já falei para tomar cuidado com o gênero das palavras. Imagina que desastre se alguém te ouve?
- Relaxa, relaxa....
Num gesto costumeiro e automático, Duo levou os braços atrás da cabeça, apoiando-os ali. Mas não ficou nessa posição nem por um segundo, porque Trowa discretamente abaixou os braços dele, enquanto Heero mexia nervosamente nos cabelos repicados e meneava a cabeça em sinal de desaprovação.
O refeitório era um lugar bem grande, bem parecido com o refeitório da base, mas com mais classe. Era um espaço amplo, com mesas que davam para 8 pessoas, e cadeiras individuais em cada mesa. Á nossa esquerda tinha a imensa fila de estudantes famintos com bandejas na mão, passando por um lugar onde ficavam as comidas. Era parecido com um restaurante por quilo, só que em maior escala.
Fomos carregados para a fila por um Duo de saia extremamente faminto. Menu de hoje: é difícil dizer. Tinham quatro tipos diferentes de salada, carne vermelha, frango, peixe, lasanha de quatro queijos, arroz integral, lentilha, pudim para a sobremesa e suco de morango. Era praticamente um restaurante.
- Ali tem uma mesa vaga! – disse Wufei apontando para uma mesa no canto esquerdo.
Quando chegamos lá, ao mesmo tempo que Heero depositou sua bandeja na mesa, um garoto moreno, de olhos muito escuros, fez o mesmo. Meu amigo lançou um olhar de ódio profundo, mas o outro não se abalou. Enquanto eles se encaravam com um ódio mútuo, eu, Duo, Trowa e Wufei nos acomodamos na mesa. Vendo que não caberiam todos os seus amigos naquela mesa, o outro rapaz pegou sua bandeja e foi embora.
- E então, Heero, como é não poder espancar um sujeito desses? – perguntou Duo, provocando-o
- Hn. – respondeu o japonês aparentemente mal-humorado
- Achei que o nome dela fosse Hina... – alfinetou Wufei com uma voz incrivelmente enjoada.
Duo ia avançar pra bater no chinês, mas Trowa, que estava ao lado dele, colocou a mão sobre seu ombro, fazendo com que o americano se acalmasse.
Conversamos animadamente sobre as primeiras aulas durante o almoço, e, quando tocou o sinal, nós nos levantamos e voltamos para a classe.
Aula de geografia. Ouvir um homem hiperativo falar sobre coisas que eu já sei muito bem. Adivinha o que estávamos estudando. Sim, o deserto. Nasci ali, sei tudo o que se há para saber sobre aquele clima, relevo, e vegetação. Quase dormi naquela aula.
Biologia. Pelo visto meus impulsos femininos andam fortes. Fiquei morrendo de nojo quando o professor começou a falar da possibilidade de virmos a dissecar sapos. Eca!
E por fim, Gramática. Foi até que legal. Não muito, mas um pouco. Agradável o bastante para me manter acordado.
Finalmente estávamos livres da escola. Não me lembrava de ser tão ruim assim. Talvez... porque antes eu podia agir como eu mesmo. Agora eu tenho que vigiar todos os meus movimentos e falas, fica chato. E complicado.
Assim que saímos da escola, Trowa disse:
- Olha, ali está Treize. Quem vai falar com ele? Quatre?
Assenti com a cabeça. Por algum motivo, acho ter tido a impressão de sentir meu coração bater mais rápido quando ouvi meu nome. Mas... é melhor deixar pra lá.
Nos encaminhamos até aquele conversível vermelho 6 parado na frente da escola.
- Você é Treize Kushrenada? – perguntei eu inocentemente. É óbvio que eu sabia que era ele.
- Sou. Vocês devem ser as garotas que o Dr. J me mandou buscar, certo? Netas de um conhecido?
- As próprias! – disse Duo pulando para dentro do carro.
Eu, Heero e Trowa pulamos atrás dele, deixando o lugar na frente, ao lado de Treize, para Wufei.
- Então.... – começou ele, enquanto deu uma olhada rápida para Wufei – como se chamam?
- Eu sou Jin Mei, e aquelas são Diana, Trina. Karina e Hina.
Eu é que estou ficando doido, ou o grande Wufei tinha corado com a pergunta de Treize? Não entendo o porquê... ele só perguntou nossos nomes!
- Bom, meninas, acho que chegamos! – disse ele estacionando na frente da nossa casa.
Agradecemos e saímos do carro de Treize. Ele deu um tchauzinho e desapareceu de vista no meio dos carros mais a frente.
1 pelo menos por aqui os caras do Sedex usam blusa amarela...
2 Ah, o Q-chan é meio exagerado. Eu vivo gritando pela casa... não quer dizer que seja educado, mas as meninas as vezes fazem isso mesmo assim.
3 Me inspirei no primeiro episódio da nova temporada de The OC
4 Eu fiz uma redação igualzinha no meio do ano. Coincidência, né?
5 Convencido! nnU
N/A: Nhai.... eu sei que eu demorei pra caramba. Sabe como é, preguiça, bloqueio.... e antes que a Goddess me mate, ou me pergunte, eu já vou responder. O próximo capítulo de Amnésia eu vou colocar na semana que vem. Eu queria agradecer os comentários que a Kasumi, o Jo-kun, a Elfa Ju Bloom e alguém com o nick "/". E repito que o próximo capítulo só vem com reviews, viu? Bjos para todos.
