Epílogo
Quando a gente conversa
Contando casos, besteiras
Tanta coisa em comum
Deixando escapar segredos
E eu não sei que hora dizer
Me dá um medo, que medo
Eu preciso dizer que eu te amo
Te ganhar ou perder sem engano
Eu preciso dizer que eu te amo
Tanto
E até o tempo passa arrastado
Só pr'eu ficar do teu lado
Você me chora dores de outro amor
Se abre e acaba comigo
E nessa novela eu não quero
Ser seu amigo
É que eu preciso dizer que eu te amo
Te ganhar ou perder sem engano
Eu preciso dizer que eu te amo, tanto
Eu já nem sei se eu tô misturando
Eu perco o sono
Lembrando cada gesto teu
Qualquer bandeira
Fechando e abrindo a geladeira
A noite inteira
Eu preciso dizer que eu te amo
Te ganhar ou perder sem engano
Eu preciso dizer que eu te amo, tanto
Era muito cedo...um feixe claro de raio solar penetrava pelas cortinas que se balançavam ao vento numa dança macia. O céu do lado de fora estava límpido, bocejando e se sacolejando com a chegada de um novo dia; a brisa, a mesma brisa brincalhona que chamava as cortinas para dançar era como um sopro sonolento e curioso- deleitando-se numa congestão de sentimentos e arrepios inexplicáveis.
E era exatamente assim que Sirius se sentia. Sentado em sua cama, os olhos fixos no nada, a mente fervilhando, o calor do ambiente traduzindo seu fastio frente aos dias - tão iguais!- lhe davam ímpetos de se levantar, ímpetos que não eram nem de perto suficientes para que ele obedecesse. O ar parecia se adensar ao redor, sufocante, e, tal como éter, penetrava lhe os pulmões, castigava-lhe os olhos secos, a garganta seca, raspando, chiando, silenciando.
Os poucos metros de espaço vazio que o apartava de Remo aparentavam-se à milhas, e, ainda assim, ele podia ouvir aquele coração batendo junto ao seu: batiam os dois, desesperadamente juntos, cruéis.
Retrocediam-lhe à mente seus últimos atos, em flashes de uma memória recente que então ruía, transtornada pela imagem de sua própria perdição- que ele mal podia tragar para dentro de seu subconsciente, assustado com a mudança ou, ainda, desnorteado.
Mudança, diga-se de passagem, mental, carnal, ideológica, sentimental. Mudança inconcebível; uma mudança que Sirius não conseguia digerir, muito menos reconhecer com exatidão onde, como e porque havia acontecido. Ela simplesmente aconteceu, e drasticamente. Num repente, seu mundo desvinculou se dele, para sempre.
O vento adocicava o ar enquanto o rapaz, atônito, alheio, perdia as palavras. Que valiam elas, afinal? Extinguiram-se imediatamente. Extinguiram-se quando ele derreteu, junto ao ar. Algumas delas retornaram após certo tempo, poucas, apenas suficientes para um epitáfio. Vãs, porém. Vãs como as idéias que perambulavam feito fantasmas diante dele.
Aquele sentimento era novo, e o assustava. Tudo que é diferente, realmente, nunca causa uma boa primeira impressão; sempre acaba atraindo desconfiança, preconceito, insegurança, sendo que Sirius identificava-se especialmente com o último, o que era humilhante para ele. Raios, tudo deveria ter sido diferente!
Ergueu-se irritado, como se constatando que a raiz do problema- se é que havia algum- devia estar impregnada naquele quarto maligno, por onde Sirius arrastou um olhar viscoso que se acorrentou finalmente à porta. Suas pernas andaram, desandaram, estancaram trêmulas e crentes de abarcar o mundo. Ele nunca mais se esqueceu desse primeiro palpitar, nem dessa revelação da consciência a si própria; além do que, não conseguia comparar a ela qualquer outra sensação da mesma espécie. Naturalmente por ser sua. Naturalmente, também, por ser a primeira.
E foi-se a manhã, como tudo se vai - dessa vez, no entanto, foi-se em marcha lenta. Sem seus amigos, sempre fugindo, esquivando-se de seus risos e de suas vozes quentes, Remo sentia-se enfastiado, mas seguro, e era essa segurança que o mantinha exilado em si mesmo. O vento dos jardins lembrava uma música triste; o sol que se escondia por detrás da floresta queimava o cenário e congelava sua alma. O dia estava acabando, e com ele iam também suas últimas horas de humanidade, o que lhe trazia uma súbita e irremediável compreensão da sua insignificância. As nuvens no céu aquarelado eram ralas como sua alma, o que significava que a lua não estaria encoberta aquela noite, apressando seu sofrimento.
Remo sentiu raiva de si mesmo. Queria destruir-se, violentar-se, desintegrar-se, ou somente se entregar às vozes ébrias de dentro de seu corpo. Seu coração era sombra e vazio, uma válvula que operava para o nada.
Seus ossos entravam em atrito de uma maneira desconfortável contra o carvalho atrás dele, mas Remo não mudou de posição. Naquele momento ele ignorava tudo o que podia, exceto sua lancinante solidão, que era inegável. É fato que ele se afastara por conta própria para os confins dos terrenos de Hogwarts, no entanto, que diferença faria? O isolamento era interno, era pegajoso: Remo podia estar metido no meio de uma alegre multidão e continuaria tendo a sensação de estar perdido num inóspito deserto. Todos podiam gritar, mas ele não ouvia. Podiam chacoalhá-lo, mas ele não sentia. Seu corpo era um calvário, nada mais.
Fitou quase com tédio a última pontinha do sol esconder-se no horizonte. Os galhos do Salgueiro Lutador já se balançavam ao vento, chamando-o. Nenhuma nuvem. O frio crescia, mas não foi ele quem provocou um repentino estremecimento no corpo do rapaz...foram passos. O som de alguém que se aproximava.
"Madame Pomfrey?".
-Você está aqui há muito tempo? Estávamos todos te procurando!
E enfim, a tortura. Remo empalideceu, emudeceu, ficou hermético. Para sua completa desgraça, não era a enfermeira de Hogwarts.
-Está fugindo de mim, não é?-disse Sirius amargo, aproximando-se com uma hesitação perceptível.
-Sirius, eu não...eu...por favor...- palavras aleatórias escapavam em sussurros. A mobilidade de seu corpo retornara, permitindo que ele se espremesse contra a árvore como se quisesse se fundir a ela.
O moreno o assistia de uma maneira inexpressiva, mas profunda. Também ele parecia incerto, cauteloso, pensativo. Remo notou a insegurança de Sirius, e aproveitando-se dela, abriu a boca para falar algo que o afugentasse por definitivo, porém, foi calado a meio caminho:
-Minha vez. - disse Sirius enigmático, mas decidido, o dedo pousado autoritariamente sobre os lábios de Remo.
A fala podia se considerar inútil; o gesto era auto-explicativo. Por isso, todo o corpo de Remo preparou-se para sobreviver a mais uma prova de fogo; os olhos se fecharam, os músculos enrijeceram, o coração acelerou o ritmo de batimento; no entanto, o que veio a seguir provou para o lobisomem que nada no mundo inteiro havia o preparado para aquilo.
Sirius deslizou a mão que cobria a boca do amigo para encaixá-la na nuca deste, puxando-o para si. O repentino contato de seus lábios foi contido, graças à incerteza de ambos; era como se eles nunca tivessem experimentado nenhuma experiência parecia. No instante seguinte, visto que Remo não havia recuado, Sirius reforçou a pressão nos lábios, reforçando suas intenções. Vacilante, receoso de que estivesse sendo vítima de mais um joguinho do maroto, Lupin entreabriu a boca, permitindo a entrada daquela língua cálida que sempre assolava seus insanos pensamentos. Uma vez aprovado, Sirius laçou a cintura de Remo, apertando-o contra a própria virilha calorosamente. Agora estavam untados um ao outro, novamente entregues a um ciclo de sensações que os faziam transpirar, ganir, gemer, perder o raciocínio e se dedicarem inteiramente a um mundo animal, onde regras não existiam, onde as convenções eram suas, e onde o prazer era sua única lei.
E os beijos somavam-se; o segundo, o terceiro, o quarto, o quinto, todos eles seguindo quase como numa rotina, em movimentos automáticos: o que era inicialmente um afago tímido foi se transmutando para amassos urgentes, viscerais, à medida que o descontrole se apoderava de ambos. Remo sentia seu coração escorrer, espalhando todos os seus sentimentos pelo chão e aliviando sua dor. Enquanto, para Sirius, tudo o que ele não conseguia dizer era agora traduzido por seu corpo; já não pensava em mais nada. Havia conseguido esvair de sua cabeça os pensamentos que lhe causavam aquela enxaqueca lancinante; era como se sua mente tivesse ordenado, altiva: "Esqueça o que você vê e se preocupe com o que você sente" obrigando-o, enfim, a decidir-se. E agora sua alma flutuava, afogando suas dúvida... Afinal, se aquilo era bom, se aquilo era de certa maneira gratificante, deveria ser o certo a se fazer.
Mordidas, puxões, lambidas, e finalmente os lábios do cão soltaram os do lobo. Então os olhos cinzentos de Sirius deitaram-se sobre os de Remo, que sorriu, corado.
- Eu tenho que ir...-disse ele após mirrar o sorriso, débil. Sirius acariciou os cabelos do rapaz, passando os dedos afilados por sua nuca em movimentos circulares. Remo fechou os olhos, o sorriso retornando.
-Nós vamos estar lá com você. Eu vou estar lá pra você.- assegurou-lhe o animago, inclinando a bela fronte para depositar um beijo protetor na testa de Aluado, que num impulso abraçou-se a ele, escondendo-se em seu peito forte. Parecia querer se esconder da lua dentro dos braços de Sirius para só na manhã seguinte retornar, manhoso.
Mas a voz aveludada do jovem Black o chamou de volta; seus dedos morenos ergueram seu queixo, e Lupin o encarou, os olhos úmidos.
- Eu sempre estarei lá pra você...entende?-questionou, urgente.
Foi com um júbilo afogado em emoção que Remo alargou seu sorriso, assentindo. Sim, ele entendia. Pela primeira vez em toda a sua vida, ele não apenas entendia como também sentia prazer em entender. Ele estava completo, para sempre. Estava infinitamente realizado, e lua alguma, por mais cheia que fosse, iria alcançá-lo em seu contentamento. Ele estava no pico, no limite, no cume, tocando céu e estrelas com toda a sua alma e coração. Seus olhos transbordavam enquanto seu companheiro novamente o puxava para um abraço ardente, gesto simples, mas verdadeiro. Não era mais amizade. Não era apenas mais nada. Era amor, violento. Era amor, finalmente. Eterno amor.
Fim.
Notas da autora: Minha nossa, eu nunca imaginei que iria demorar tanto assim pra terminar essa fanfic! Deus do céu O.o ! Tenho que dizer, no entanto, que adorei escrever essa novela mexicana. Tive que ler muitos poemas dramáticos pra buscar inspiração, enrolei demais na busca das palavras exatas que expressassem os sentimentos dos personagens, desdobrei meu cérebro em mil, li, reli e trêslios parágrafos várias vezes, até que enfim me rendi. Pronto, podem partir pra outras fics agora enquanto eu descanso aqui no meu cantinho ;)
Notas da autrora2: Ops! Esqueci de agradecer ao Ale! Ok, aí vai: OBRIGADA Ale, muito obrigada por ter lido,comentado, chorado,suspirado e acompanhado a fic e, er, obrigado por ter servido de inspiração involuntário para mim- tanto para o Remo quanto para o Sirius! Hehe, agora já foi, falei XD
