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"O retorno a Kisangani"

Dr Lockhart

Parte I

Em algum lugar na África, momentos antes

Onde estou?, perguntou-se Carter, olhando em volta. Ele estava no início de uma planície, que se extendia para o norte até onde a vista alcançava. Ou seria para o sul? Carter não tinha mais certeza da direção, há dias se sentia desnorteado. Totalmente desnorteado... Ele olhou para o céu nublado e não encontrou o sol entre as nuvens. A única certeza que tinha era de que ia chover forte, e mais uma vez em mais de 30 dias o dia se tornaria noite mais cedo..

Carter seguiu caminhando pela planície rude, na esperança de encontrar uma estrada ou qualquer coisa parecida. O exército guerrilheiro estava rondando aquelas terras e se o encontrassem, ele estaria morto. Precisava chegar à fronteira, seja lá qual fosse. E se não o fizesse nas próximas horas provavelmente não o faria mais, pois a fome e a sede não permitiriam. Carter nem conseguia se lembrar da última vez em que comera realmente. Pensar na América nessas horas era uma tortura. Um cookie caía bem agora, com um café decente..

Carter ainda pensava nisso quando achou ter visto algo ao longe. Ele tentou acelerar os passos tanto quanto suas forças lhe permitiram e foi então que viu, apenas alguns metros a sua frente, um homem caído de bruços entre as folhagens. Carter caminhou até ele com cuidado e, apesar de ver uma entrada de bala em suas costas, procurou por qualquer sinal de vida.

Sem pulso.. pra variar.

Carter virou o corpo do robusto homem branco e percebeu se tratar de um soldado estrangeiro. Pela forma como estava caído, provavelmente fora caçado pelos guerrilheiros até tombar com um tiro de rifle. Carter deveria se sentir enojado e abalado com tal visão, mas depois de tanto tempo vivendo a realidade da guerrilha, ele já não sentia mais nada. Assim como todas as vítimas da guerra, ele só queria que tudo aquilo tivesse um fim.

Revistando o corpo, Carter encontrou o que procurava há algum tempo. Escondido entre as roupas do soldado, um pequeno cantil de água. Carter balançou e, ao ouvir o barulho de líquido, abriu-o imediatamente, tomando-o em goles vigorosos. Beber água havia se tornado sinônimo de sexo, era sempre um prazer intenso. Ao sentir sua sede parcialmente saciada, Carter fechou o cantil. Ainda havia um pouco de água e ele sabia que deveria guardá-la como o seu bem mais precioso.

Carter se levantou para seguir caminho, mas algo chamou sua atenção de volta para o corpo do homem. Carter se agachou novamente para pegar o estranho aparelho caído sob o cadáver e mal pôde acreditar quando o reconheceu:

Um telefone satélite!

Aquilo era mais do que um cookie, era a passagem de Carter de volta para a vida. Ele ligou o aparelho com cuidado e quase gritou quando viu o sinal. A bateria estava muito fraca, mas provavelemnte aguentaria uma última ligação. Carter começou a discar para a embaixada americana, mas um ruído ao longe fez com que ele escondesse o telefone em suas calças e se deitasse no mato.

O barulho estava ao leste de Carter, e se aproximava. Logo Carter pôde ver que se tratava de uma caminhonete. A primeira intenção era se levantar e correr até o carro, mas Carter reconhecia os homens que estavam na carroceria: eram guerrilheiros Mai-Mai, armados de rifles e granadas. Os mesmos homens de quem Carter estava fugindo há algum tempo. E agora eles estavam a menos de 1km de distância de Carter, mas com sorte seguiriam sem vê-lo entre as folhagens. Seu coração quase parou ao ver a caminhonete reduzir a velocidade e virar na direção em que ele se escondera

Estou morto.., pensou Carter, Totalmente morto

Os homens começaram a gritar ao avistar Carter, e este apenas se ajoelhou no mato e colocou as mãos na cabeça. Um dos homens desceu do carro e apontou um rifle para a cabeça de Carter, que fechou os olhos.

"O que faz aqui?", perguntou o homem em tom hostil

"Eu sou médico da aliança internacional..", Carter disse sabendo que não conveceria o homem.

"Cadê o crachá?"

"Eu perdi...", Carter disse quase para si, resignado.

Um outro homem desceu do carro e olhou para Carter, dirigindo-se ao que estava apontando a arma. Os dois começaram a conversar em um dialeto próprio, o qual Carter ainda não aprendera muito bem. Foi então que um deles disse em françês, de forma clara e precisa,

"Pra que levá-lo, vamos matá-lo aqui mesmo"

O homem engatilhou o rifle, mas algo chamou sua atenção. Um carro do exército se aproximava ao longe

"Droga, malditos!", gritou o guerrilheiro abrindo fogo contra o carro. Os soldados fizeraa o mesmo, e os outros homens Mai-Mai na carroceria começaram a se posicionar para o combate. Carter se viu esquecido e sem pensar muito, começou a correr na direção da floresta de onde viera

Um dos homens Mai-Mai percebeu o movimento e atirou em sua direção. Carter sentiu uma dor aguda no braço, mas não caiu. Continuou correndo desesperadamente até alcançar a mata. Os tiros ficavam cada vez mais distantes, mas Carter não tinha mais esperança. Desabou junto a uma árvore ao fim de suas forças, com sangue escorrendo pelo seu corpo. Ele tentou sentir o lugar do tiro, e pelo tamanho do ferimento não havia sido um rifle, talvez uma pequena pistola. Mesmo assim Carter se sentia morto. E morreria ali, no meio do nada, sozinho..

Foi então que ele se lembrou do telefone. Tirou-o do lugar escondido e o olhou por um instante. Havia bateria para uma última ligação, poderia ligar para Kisangani, ou para a embaixada. Mas de que adiantaria, se ele estaria morto em algumas horas? Pensou bem no que poderia fazer com aquela última dádiva que lhe fora concebida.. Até que decidiu.

Um pouco receoso, Carter começou a discar o número, que estava claro em sua mente. Discou e esperou até atendesse, mas nada. Depois de algum tempo, a ligação foi encaminhada para a caixa de mensagens, e ele teve enfim o seu último desejo realizado.

"Hei, aqui é a Abby, mas eu não posso atender agora.. Deixe a sua mensagem"

Carter ficou um tempo em silêncio, receoso de devia ou não falar alguma coisa. A dor em seu braço o fez dar um pequeno suspiro, e ele achou melhor dizer algumas palavras.

"Hei... Seu número continua o mesmo...", Carter disse sem saber realmente o que dizer. Ele tentou respirar com mais calma, mas a dor em seu braço mal o deixava pensar direito. Ele se esforçou para continuar.

"Eu nem sei porque estou fazendo isso, mas.. Eu nem tenho esse direito.."

Respingos entre as folhas indicavam que a prometida chuva enfim cairia. Carter olhou para o céu entre as árvores, estava mais escuro do que nunca. O barulho dos tiros ainda era intenso, e ele sentiu as lágrimas descerem pelo seu rosto. Não pela chuva, não pela guerra, mas por saber que não veria Abby nunca mais.

"Eu não devia ter fugido de você... Eu te liguei porque eu precisava ouvir a sua voz uma última vez, eu... Eu não tenho muito tempo, acabou tudo..."

Carter estava entre o limite da dor física e do sofrimento emocional. Suas mãos tremiam, assim como seus lábios. Ele estava morrendo.

"Eu só queria que você soubesse que eu sinto sua falta... Eu.. ugh, eu sinto tanto a sua falta... Eu não voltarei mais pra casa então... Se despede do pessoal por mim, ugh, da Susan, Frank, Chen, Luka, Weaver... Eu queria que tivesse sido diferente, Abby... Eu sinto muito... Adeus..."

Continua..