- CAPÍTULO QUARTO -

Velhos desconhecidos, ou quase.


Nunca se irá saber quanto tempo durou aquela contemplação mútua entre os dois bruxos no quarto escuro. É certo que não se passaram de breves segundos apenas, mas era como se o tempo também tivesse parado de vez. E o mundo parou mesmo para Parvati. Tanto que ela mal ouviu quando ele disse:

"Quem é você?"

Malfoy apontou a varinha para Parvati no mesmo instante em que lançara a pergunta, mas sua voz estava firme. E muito fria também.

Contudo a jovem bruxa finalmente caiu em si. Ainda sentada na cama dele, ela ergueu a varinha em silêncio.

"É uma auror?" Ele se aproximou lentamente.

Parvati se levantou de um salto.

"Parado!" gritou, no que ele deu um passo para trás automaticamente.

"Como ousa me ameaçar debaixo do meu teto?" sibilou ele, a voz ainda mais baixa e fria. "É bom que diga logo quem você é e o que quer aqui!"

"Não vim para perder tempo. Sr. Malfoy..." retrucou ela duramente, suas entranhas reviravam de expectativa e excitação. "E é bom que fique onde está ou não respondo por meus atos!"

"Expelliar..."

Mas ela já estava preparada.

"Protego!"

Ela esperou por mais ataques, mas ele parou. Fez-se um breve silêncio; até que ele começou a rir.

Aquilo a incomodou mais que os feitiços.

"Ah" fez ele. "Não me diga que está me caçando, ilustre dama?"

Parvati respirava fundo, e nada respondeu. Preparou-se com a varinha.

"Espere aí..." ele ainda ria, seus dentes brancos parcialmente revelados pela penumbra lunar. "Você não me é estranha, sabia? Hogwarts, suponho... Era grifinória, aposto que era..." E ele praticamente cuspiu a última frase com todo o desprezo que conseguiu reunir.

Parvati encarou o sorriso dele. Quanto mais radiante ele sorria – e isto era incrível – mais arrogância ele conseguia transmitir. Isso era tão repugnante para Parvati que ela desviou o olhar para manter a calma, segurando-se para não lançar um Avada Kedavra ali mesmo e estragar os seus planos (ainda que um Crucio fosse bem interessante...).

"Acha mesmo que vai me dobrar, Sr. Malfoy?" foi a vez dela sibilar em tom frio, ainda que sua voz soasse ligeiramente trêmula. "É melhor não tentar ganhar tempo"

"Ah, é? E o que vai fazer? Me lançar Imperdoáveis e me entregar sozinha para o ministério?"

"Não" Parvati estreitou os olhos. "Lembre-se que o Comensal aqui não sou eu"

Mas desta vez ela não pôde evitar.

Um jato de luz rascante voara da varinha de Draco Malfoy diretamente para o peito de Parvati. Ele a acertara com o feitiço do corpo preso.

O corpo da bruxa caíra no chão com um baque surdo. A varinha dela rolou pelo chão diretamente para os pés de Malfoy, que a recolheu.

"E você achava mesmo que poderia me vencer, não?" ele sorria triunfalmente. "Tss tss, vejo que ainda tem muito o que aprender..."

"Não!" foi o grito desesperado dela. "Dê minha varinha!"

"Calada, mocinha, calada!" gritou ele, mais para abafar os gritos da outra. "Quieta, ou eu lhe silencio também"

Parvati deixou o corpo pender e parou, cansada. Respirava fundo para se conter e pensar melhor no que fazer.

"Já chega, Malfoy" rosnou ela, baixo, virando o rosto. "Pare logo com isso e me de a varinha de volta"

"Por Merlim!" exclamou ele teatralmente. "E o que a faz pensar que eu faria isso?"

"Ótimo" disparou ela, começando a ficar exaltada. "Vai em frente, dê um fim logo nessa palhaçada toda!"

A jubilosa gargalhada do bruxo encheu todo o quarto. "Ora, ora, você deveria ser mais insistente! Se entregar os pontos assim, minha vitória óbvia não vai ter a mínima graça"

"Você" A voz de Parvati, a esta altura roxa de tanta raiva, não passava de um murmúrio cheio de veneno, e ela falou cada palavra pausadamente, como se cada uma lhe custasse um esforço prazerosamente doloroso de ser pronunciada. "é completamente desprezível. Eu realmente lamento que seja alguém como você a tirar minha vida"

As palavras resvalaram nele como brisas de uma praia. Ele manteve o sorriso no rosto. "Pois saiba que para mim" disse ele, dando passos delicados em direção a ela. "É sempre um gosto matar aurores. Cada morte melhor do que a outra" e os olhos dele cintilaram arrebatados, fulgurando doentios em meio à penumbra.

Parvati não sentia sua respiração. Ela esperou. Fechou os olhos, procurando manter-se calma, procurando não pensar, e mil pensamentos atravessavam sua mente desesperados para serem recordados. Nunca esteve tão próxima da morte em todos esses anos trabalhando para a Ordem. E o mais estranho, morreria por um velho conhecido seu, mas que era, na verdade, um desconhecido. Pelos Deuses! Os últimos segundos de sua vida e ela pensando em seu próprio homicida...

Foi então que Malfoy virou a cabeça para trás exaltado, após ouvirem um rumor próximo, um som que Parvati não distinguiu de imediato o que seria. Ele se dirigiu até a janela, atento e silencioso, e espreitou.

"Diabos!" foi o que ele resmungou, ainda voltado à janela. E aquela altura, Parvati percebeu do se tratava o barulho: trotes de cavalo. A cavalaria... A bruxa ficou em silêncio também, o coração retumbando na garganta, espreitando a figura de Draco. Ele estava inconfundivelmente tenso. Se não tivesse tido a vida ameaçada de extinção a instantes atrás, Parvati seria capaz de sorrir, ainda que talvez, muito provavelmente, o tenha feito internamente.

O bruxo deixou a janela e foi até o seu velho baú. Fora impossível saber o que ele fora fazer lá, porque, aparentemente, não tirara coisa alguma.

"O que está fazendo?" Parvati perguntou olhando para o escuro, a voz vacilante e fraca.

Secamente, Draco ignorou-a.

"Escuta aqui" gritou Parvati com renovada força, pouco se importando se o bruxo iria afrontá-la, o que era óbvio. "Sei muito bem que quer fugir de novo, mas não pense que vai me deixar assim. Ainda não acabamos, Sr. Malfoy"

Mas ele tampouco reagira.

"Ei" berrou ela. "Onde você está?"

Sentiu dedos gélidos pressionar sua boca.

"Cale essa maldita boca" sibilou ele agressivamente, demonstrando frieza aos bufos indignados de Parvati contra sua mão. "E você não está em condições de exigir coisa nenhuma, mas, num ponto concordo com você: ainda não acabamos" Ele deu mais uma olhada em volta, piscando nervosamente, e em seguida aproximou sua varinha do pescoço da bruxa. "Por isso você vem comigo"

Seus olhos negros saltaram das órbitas. Ela não saberia o que teria exclamado se estivesse com voz.

"Você não devia estar aqui" ele se ergueu, guardando a varinha nas vestes. "Mas está e isso muda tudo"

Parvati enrugou as sobrancelhas, francamente temerosa. Um arrepio agourento lhe percorreu a espinha.

"Não posso deixar uma testemunha"

Nada mais foi dito então. Parvati Patil, presa e indefesa, nada pôde fazer para impedir Draco de fazer o que pretendia fazer. Ele a levantou em seus braços e avançou com ela até a lareira do quarto. Numa coisa Parvati estava certa: ele fugiria de novo...

Ela sofreu um leve espasmo de susto quando a voz de Draco Malfoy pronunciou o destino da viagem deles, e logo em seguida, atirou o pó azul no chão. Muito distante, já se era possível distinguir os passos sobre o piso inferior da casa...

Bastou um segundo para que um redemoinho de sons e cores os envolvesse completamente, que de tão tumultuosos e esgotantes, deixavam parecer que aquela maldita viagem nunca iria ter fim.


CONTINUA...