CAPÍTULO SÉTIMO
Planos
(...)
"Muito bem, Sra. Malfoy, sou todo seu"
Narcisa ergueu o olhar das chamas na lareira. Havia despido a capa preta de chuva, e dobrado-a nas costas de uma das poltronas. As vestes da bruxa eram azuis intensamente escuras, de um tecido fosco e aveludado. O que era muito sensato de sua parte, já que queria se passar por discreta aos olhos dos eventuais andarilhos. Estava sentada à poltrona mais confortável e menos destruída que havia, tão elegantemente que aparentava nojo.
"Que história foi essa, Draco?"
A mulher havia enrijecido ainda mais sua postura, e seus dedos, que antes tamborilavam o braço da poltrona, se contorceram fortemente contra a palma da mão.
Draco apenas ergueu as sobrancelhas.
"Muito bem" continuou Narcisa. "Você disse que me contaria a história toda, não? Estou esperando. E espero não me decepcionar..."
Girou os olhos nas órbitas. Suspirando, Draco se acomodou na poltrona ao lado da mãe.
"Bom, o nome dela você já sabe"
Narcisa não esboçou nenhuma contração na face. Apenas seus olhos continuavam a devorar o filho em suas entranhas frias. Draco resolveu continuar depois do silêncio, ainda que não estivesse muito certo do que contaria a ela exatamente...
"A gente se encontrou por acaso. Bom, ela estava na..."
"Diga-me que não era uma auror." interpôs Narcisa com a voz cortante. Draco apoiou o queixo em uma das mãos para que a mãe não o visse engolir em seco.
"Se você não quiser ouvir a história," ele falou. "não me peça para contá-la"
Narcisa contraiu os lábios pálidos.
"Isso responde a minha pergunta, então?"
"Você quer mesmo continuar me ouvindo?"
E a máscara de frieza finalmente pareceu cair. Ela enterrou o rosto entre as mãos. "Por diabos!"
"Mãe" ele a chamou, ligeiramente entediado. "Mãe, poupe-se, está bem? Tá tudo sob controle. Patil não vai me denunciar, ela está tão encrencada nessa história tanto quanto eu e..."
"Encrencada? Encrencada como, Draco? Por acaso ela também está fugindo do ministério?" a voz de Narcisa era cortante e sarcástica.
Draco girou os olhos mais uma vez e bufou. "Não, mãe, mas ela pode se encrencar comigo, isso sim. Além do mais, o trabalho dela era ilegal, que eu sei... Ela não estava oficialmente autorizada para fazer investigações na minha casa, a Ordem age por conta própria, é uma agência secreta..."
"Ordem?"
"É, ainda existe. Coisa do Potter"
"Espere aí, Draco" ela inclinou-se para o lado, no braço da poltrona. "Essa menina... ela estava na nossa casa, é isso mesmo?"
"É. Foi lá que eu a encontrei"
"Mas... filho, por que... por que não tentou se livrar dela, ou então matá-la, ou... Mas deixá-la viva depois de ter visto você?"
Um sorriso de lado esboçou-se na face de Draco.
"Achei que ela pudesse ser útil para mim"
O lábio inferior de Narcisa pendeu.
"Draco, isso não é uma brincadeira"
"Eu nunca disse que era"
Mãe encarou filho. Os olhos azuis de Narcisa faiscaram por um segundo enquanto Draco ainda sorria.
"Você ainda não me disse por que deixou o seu confortável esconderijo, mamãe"
Algo na voz sarcástica de Draco fez Narcisa erguer o sobreolho.
Ela suspirou, e, surpreendentemente, cruzou as pernas e largou-se confortavelmente de costas na poltrona.
"Vejo que você não está tão mal como pensei que estivesse. Ou então não teria vindo aqui lhe oferecer ajuda"
"Como é?"
"Oras, meu filho, Tive um trabalho dos infernos para chegar até aqui, arriscando-me em Londres mais uma vez, saindo de onde eu estava especialmente para te ver. E é assim que você me recebe, com toda essa displicência."
Draco pareceu surpreso, esperou Narcisa encará-lo diretamente assim que ela silenciasse. Os olhos dela estavam ainda mais frios.
"Que tipo de ajuda..."
"É muito simples, Draco: vim buscá-lo para fugirmos da Inglaterra"
Não saíam palavras da boca entreaberta do rapaz louro. Ele coçou a nuca e tentou de novo:
"Mas..."
"Não quer ir?" ela perguntou com desdém.
"Não, não é que..."
"Você já parou para pensar no futuro, Draco Malfoy?" Narcisa descruzou as pernas. "O que acha? Que passará a vida se escondendo nos becos de Londres, ou caçando ratos para comer, porque não poderá mais freqüentar lugares públicos? Ou então, quem sabe, fazer esta espelunca virar o segundo lar dos Malfoy? Suponho que você e eu sabemos que esse método não é muito eficaz, não é mesmo? Veja só, temos até exemplos em nossa família..."
"Eu não vou acabar como Sirius Black, se é isso que você está dizendo!"
"Vai sim, se não sair do país!"
"Você está se esquecendo de que Black não era o único, mãe. Minha tia, Belatriz, ela também não está foragida?"
"Ora, francamente! Quer se espelhar numa desvairada como sua tia! Se ainda está solta foi por pura sorte, ou porque simplesmente é esperta. Mas quanto quer apostar que ela está em alguma floresta por aí sobrevivendo de animaizinhos rastejantes?"
Draco pareceu refletir por uns instantes.
"Além do que," continuou Narcisa. "mais dia menos dia irão pegá-la. Belatriz não é uma mulher que o ministério esqueceria facilmente."
"Você não tem idéia do paradeiro dela?"
Narcisa gesticulou com a mão. "Sinceramente... Apesar do contato indireto que tive com ela, eu não a vi desde que fugiu de Azkaban. Ela não tem muitos conhecidos em Londres, que eu saiba... Eram mais as famílias dos Comensais da Morte e eles próprios. Além, é claro, dos nossos próprios parentes, os Black. Por isso, não acredito que ela se salve. Não tem quem a ajude"
Draco sorriu de repente, como se lhe ocorresse uma lembrança engraçada. "Ela tem a você, na verdade"
"Bom, sim..." Narcisa torceu as mãos, olhou para suas próprias pernas. "Mas posso fazer nada por ela, no momento. Se estou me arriscando horrores vindo até aqui atrás de você, que dirá saindo em busca dela nas florestas por aí"
Eles ficaram em silêncio. Draco pensava, enquanto Narcisa parecia decidida em cutucar lasquinhas em suas unhas.
"Bom" fez Draco, de repente. "Você está merecendo um bom chá"
Levantou-se em direção à cozinha. Narcisa observou-o, e por algum motivo, dirigiu os olhos para o outro canto da sala, aonde havia uma capa negra amarrotada no chão. Era a capa de Draco. Presente dela, um dos poucos que o rapaz recebia apenas da mãe e não do pai, como era comum.
Um som distante de metal batendo em pedra fez Narcisa sorrir. Olhou em direção ao corredor por onde Draco sumira, imaginando que o filho estava delirando ao pensar que ela aceitaria o que quer que fosse vindo daquele antro que ele chamava de cozinha.
Continua...
