– CAPÍTULO OITAVO –
Lembranças
Estudou o molho de chaves em uma de suas mãos. Qual era mesmo...? pensava a mente fatigada de Parvati. Estava em frente ao portão do prédio trouxa que morava, no subúrbio de Londres, e todos os dias ela usava o método trouxa para adentrá-lo. O dia estava anoitecendo, por volta de seis e meia. Este era um daqueles dias em que ela tinha de conciliar o trabalho normal com as reuniões da Ordem da Fênix.
Há cerca de um ano atrás, Parvati fora aprovada nos testes que admitiam bruxos para se tornaram inomináveis do Departamento de Mistérios. E lá pelas proximidades do natal daquele ano – em que ela aproveitava a tão almejada folga que nunca vinha, devido a sua rotina mais do que intensa – ela e Lilá, que lanchavam no centro da cidade, avistaram com surpresa a figura descontraída de Harry Potter passeando entre as lojas e os andarilhos trouxas com a antiga namorada, Gina Weasley.
Como era de se esperar, devido a proximidade que se encontravam, Harry, mesmo que quisesse fingir, acabou esbarrando a vista com as duas amigas e – após trocar um olhar com Gina – permitiu-se um vago sorrisinho e foi até elas para cumprimentá-las:
"Lilá, Parvati, como vão?"
Lilá trocou um olhar estranho com Parvati. Em seguida, sorriu abertamente. "Tudo ótimo, Harry. Olá, Gina"
Gina ergueu as sobrancelhas e sorriu para Lilá. "Olá, meninas"
"Sentem-se, por favor" disse Parvati.
"Não se incomode, não, Parvati" respondeu Harry com um meio sorriso. "Estamos só de passagem"
"Ah, Harry, quê isso!" exclamou a morena. "Há mais de dois anos que a gente não se vê, fiquem com a gente, não é Lilá?"
Lilá ficou olhando para Parvati com uma expressão insossa, e a um olhar ameaçadoramente significativo da outra, Lilá acordou com um sorriso assustado e fez coro a amiga.
"E então, o que andam fazendo da vida?" perguntou ela, após mais uma resistência de Harry para sentar-se à mesa. "É verdade que você virou auror, Harry?"
A expressão do rapaz atenuou-se. "É. Vou começar no próximo ano"
"Ah, meus parabéns!" sorriu Parvati. "Puxa, então você ficou esse tempo todo estudando pra isso?"
"Pois é, os testes são muito carregados e longos, você precisa saber um monte de coisas, desde feitiços à poções. Bom, eu tive trabalho no último... mas o importante é que eu consegui, né?"
"É, você descobriu que não era uma negação em Poções pelo simples fato de que Snape não era mais seu professor" disse Gina, enfática. "No final das contas, ele apenas teve que ver Poções de 'outro jeito' para perder o trauma"
Gina sorriu e Harry olhou indignado para ela. "Quem falou que eu era traumatizado com Poções?"
"E não era? Eu o consideraria anormal não se fosse, depois de tudo o que passou"
Harry tirou o braço da cintura de Gina. Olhou-a divertidamente contrariado. "Como sabe?"
"Considerando o fato de que sou sua namorada há seis anos e a gente teve tempo suficiente para conversar esse tipo de coisa? Acho que respondi sua pergunta"
Lilá e Parvati riram gostosamente. Harry segurou o rosto da ruiva para calá-la com beijo rápido.
"Acho melhor a gente mudar o rumo da conversa..." disse Harry, sorrindo sem jeito.
"Também acho" animou-se Gina. "Me conte uma coisa, Parvati: eu ouvi dizer que você entrou para o Departamento de Mistérios. É verdade?"
"Ah" Parvati crispou os lábios num sorriso. Bebericou seu chá gelado e trocou mais um olhar com Lilá. "É sim, Gina" sorriu ela, satisfeita. "No começo desse ano, graças ao bom Merlim"
"Nossa... que bom" disse a ruiva, sinceramente impressionada. "Também não deve ser fácil entrar lá..."
"É, não foi... Mas eu vinha me preparando desde o sétimo ano. Eu usava o tempo livre para me informar de algumas coisas"
Ao ouvir da boca de Parvati a expressão Departamento de Mistérios o rosto de Harry tornou-se curiosamente atento. Ele lançou um olhar intenso a bruxa morena enquanto ela falava com Gina, ouvindo tudo atentamente, sério, absorto, fazendo com que Lilá lhe lançasse curtos olhares curiosos e ligeiramente maliciosos...
Até que chegou um momento em que Parvati finalmente reparou no rapaz, e mesmo que ela continuasse falando, Gina automaticamente olhou para o lado e disparou:
"Algum problema?"
Harry enrugou as sobrancelhas e encarou Gina naturalmente. "Que foi?"
"Eu é que pergunto" riu-se ela. "Por que está tão calado?"
Harry não respondeu de imediato, parecia um pouco avoado e sem jeito, até que disse baixinho. "Ah, nada... Lembrei-me que preciso ir... Desculpem, garotas, mas eu realmente preciso ir" agarrou a mão de Gina, praticamente a arrastando. "Vamos?"
Gina curvou o canto do lábio superior em estranhamento. Ela nem imaginava que compromisso era aquele... "Han... Até um dia, garotas"
Lilá e Parvati fixavam o semblante do casal com a mesmíssima expressão de confusão.
"Você viu?" disse Lilá. "O que será que deu no Harry?"
Parvati deu de ombros, mas ela sabia que estava pensando a mesma coisa que Lilá. E futuramente, descobriu que não estava enganada...
Foi numa tarde chuvosa, dois dias depois do encontro, que Harry Potter entrara em contato com a moça através de uma lareira e ela descobriu a existência da Ordem da Fênix...
Parvati sorriu com a lembrança... A nova geração da Ordem ainda estava se formando...
Finalmente abriu o portão, perguntando-se porque estava lembrando de uma coisa dessas naquele momento. A verdade –e ela ainda não tinha (ou não queria) se dado conta – era que andava miseravelmente distraída desde que sofrera um certo seqüestro...
Como se uma coisa puxasse outra, mal pusera os pés no carpete de sua sala, as lembranças de uma pele pálida, um rosto macilento e doentio, de feições singularmente belas, e um par de olhos gelados de um cinza profundo invadiram a mente de Parvati tal qual as torrentes de um mar revolto cobririam uma faixa de areia.
Esta noite ela tinha um encontro com Draco Malfoy. Parvati desencostou-se do batente da porta e levou as mãos à têmpora, esfregando-a e livrando-se do estupor.
Correu até o banheiro, livrando-se das vestes no meio do caminho. Ligou o chuveiro e enfiou-se em baixo dele com os cabelos ainda presos pela trança usual. Ela deixou-se encharcar totalmente, a face de olhos fechados coberta pela água corrente, e começou a desfazer os nós dos cabelos lentamente.
O relógio marcava sete e meia da noite quando Parvati estava sentada de pernas cruzadas em cima de sua cama, já totalmente vestida para o encontro, os cabelos úmidos estavam soltos para que secassem mais rapidamente, o que não acontecia facilmente devido ao seu intenso volume e tamanho.
Os minutos se arrastavam no relógio. Parvati tentou controlar o balanço frenético das próprias pernas tamanha era sua ansiedade. Até o cansaço do trabalho fora esquecido diante da iminência de estar frente a frente com Draco Malfoy pela segunda vez. Parvati seria capaz de rir dela mesma. Se Lilá soubesse que um rapaz chegara a provocar todas aquelas reações nela... Lilá ainda não sabia de Draco. E pelo visto, se dependesse da vontade de Parvati, não saberia tão cedo.
Apanhou sua bolsa. Eram quinze para as oito. Dane-se se chegasse mais cedo... Pouco importava a opinião de Malfoy, menos ainda se ele não gostasse disso.
Caminhou até a sala de visitar e escolheu um ponto para aparatar, concentrando-se o máximo possível para lembrar-se de Little Hangleton e o ponto onde ficava a Casa dos Riddle com exatidão, o que não foi muito fácil devido ao fato de que ela só esteve lá única uma vez.
Craque.
Estava nos jardins do fundo da casa. Apanhou a varinha de dentro da bolsa e espreitou em silêncio. Procurou algum sinal de Draco, mas havia ali apenas o silencio sepulcral.
Obviamente a porta de fundos estaria trancada. Parvati hesitou em bater... Besteira, a Sra. Malfoy fez a mesma coisa na noite anterior. Era verdade, ela havia batido na porta. Ergueu a mão no ar novamente, suspirou e socou a porta três vezes.
E ela se abriu...
Parvati tomou um susto. Inclinou a cabeça para espiar lá dentro, mas tudo era um mar de sombras a sua frente.
Ela ignorou os arrepios na própria pele e entrou de uma vez, fechando a porta atrás de si. Mas antes que o fizesse totalmente, a maçaneta – pasmem! – escorregou da sua mão violentamente e chocou-se sozinha com o batente, com um surpreendente silêncio. Parvati ouviu um ruído que indicou que a porta havia se trancado sozinha, magicamente.
Teve vontade de chamar por Draco, mas algo a impedia de fazer isso. Na verdade, ela tinha receio de fazer o menor ruído, até de andar, pois era uma situação delicada aquela. Quem garantia que Draco estivesse bem, estivesse sozinho, ou simplesmente estivesse ali?
"Você é pontual" ouviu uma voz arrastada.
Os passos vindos de uma escada do seu lado esquerdo fizeram Parvati virar a cabeça automaticamente para aquela direção. Quase não conseguiu enxergá-lo com tanta escuridão.
Fez-se uma ponta de luz flutuando no ar. E Parvati espreitou o rosto de Draco Malfoy assim que ele acendeu sua varinha.
"Você é uma espécie de vampiro? Ou é apenas gosto mesmo?" perguntou Parvati, assistindo-o acabar de descer os últimos degraus e caminhar até ela.
"Descrição, Patil. Ela é útil pra mim, sabe? Além disso, eu gosto do escuro. Me acostumei com ele na verdade. Não foi à toa que eu servi o Lorde das Trevas, não foi?"
Ele usava vestes negras. Vestes de comensal, reparou Parvati. Quantas vezes não se deparara com elas? Assim como os dela, os cabelos dele estavam úmidos.
"Como você está?" perguntou ela, após um breve silencio.
"O que você acha?"
"Não sei. Não consigo te ver direito" sorriu ela. Draco fitou-a mais intensamente neste momento.
"Então é melhor sairmos daqui, não?"
"Você manda"
"É melhor não dizer isto" Draco murmurou.
"Mas eu já disse"
"Eu levo a sério, sabia?"
"Eu não tenho medo de você" Parvati se aproximou. Ela sentia uma espécie de satisfação interior quando eles começavam com aquele joguinho.
"Então suba as escadas" Ele sorriu maliciosamente.
Parvati vergou as sobrancelhas. "Antes de você? Na sua frente?"
Draco fez que sim lentamente, os lábios entreabertos.
"E se eu não quiser?"
"Eu mando, esqueceu?"
Parvati fechou as expressões com um misto de divertimento e socou o peito de Malfoy com um punho. "Se eu lembrasse de como você é irritante nem tinha vindo"
Subiu rapidamente, fazendo barulho. Draco seguiu-a dando risadinhas zombeteiras, que Parvati fingiu ignorar. Quando chegaram ao patamar, Draco tomou o pulso da bruxa.
"Vem" ele disse.
"Draco, o que você queria quando..." começou, enquanto era "arrastada" pelo amante.
"Eu já te explico, Patil"
Entraram no último quarto do corredor, no canto direito. O ar era impregnado com um cheiro forte de mofo e tecidos velhos, certamente estava carregado de partículas de poeira. Parvati desejou que ao menos o quarto fosse mais arejado.
E era, felizmente. A única janela que havia estava aberta, ainda que com as cortinas na frente, mas o suficiente para que uma forte corrente de ar pudesse adentrar o recinto. Draco e Parvati puderam fitar-se melhor diante da claridade do ambiente.
Ele se aproximou, mantendo o contato visual com Parvati, e abraçou-a suavemente. Ela o apertou de volta, com força, e o abraço ganhara intensidade rapidamente. Sorriu contra os ombros dele. Não sabia que ele fizera o mesmo.
Nem porque se sentia tão bem. Descobriu que aquilo lhe fizera uma tremenda e dolorosa falta.
"Você não vai me dizer?" ela perguntou, contra seus ombros.
"Ainda não. Vamos esperar um pouco..." a voz dele soou rouca e murmurada contra seu ouvido. Ele inclinou mais a cabeça para baixo, suspirando. E quando falou de novo, foi a primeira vez que Parvati ouviu a voz de Draco Malfoy soar melancólica. "Eu não sei quando eu te verei assim de novo..."
Continua...
