CAPÍTULO 3:
Laura entrou correndo pela porta da lanchonete, dando um oi rápido a todos que ali estavam e deixando uma menina de cabelos castanhos esperando por ela.
"Já volto, Rebeca!"-disse rápido.
Subiu as escadas, jogou a mochila em um canto e se troca rapidamente, colocando uma calça comprida, botas e um moletom. Desce em seguida com um caderno de anotações e uma boina preta na cabeça.
"Tô...pronta!"-ela disse ofegante a Isabella.-"O Isaak não apareceu ainda?"
A menina olhou apreensiva para a porta.
"Ele já vai chegar. Cadê a máquina fotográfica?"-disse Isabella, acabando de arrumar a cesta com os lanches.-"Coloque outro casaco, está frio!"
No Canadá sempre está frio! Mesmo no verão, a ilha de Turtle Bay era fria, afinal a pequena ilha ficava perto do Círculo Polar Ártico, a principal fonte de renda da ilha era o Eco turismo e a pesca e o acesso ao continente, para quem não tinha barco, era através de uma balsa que fazia apenas duas viagens por dia...mas mesmo assim, as pessoas que lá residiam não reclamavam.
Adoravam a vida pacata na ilha, e mesmo depois dela ter quase afundado por causa de um evento meteorológico confuso, os moradores a reergueram.
Laura voltava do quarto com um casaco e uma máquina fotográfica e fala para a coleguinha.
"Com o Isaak nos ajudando, nosso trabalho da feira da escola vai tirar Dez!"-disse a menina animada.-"Ele tá demorando!"
"Ele já vai aparecer."-e se ele não aparecer?
A possibilidade de isso acontecer poderia fazer com que Laura tivesse uma grande decepção. E queria dizer a si mesma, que era essa a única razão de seu nervosismo.
"Cheguei!"
Isabella olhou para a porta e Isaak estava lá. Usando um jeans e um moletom vermelho. Laura correu e parou na sua frente exibindo o seu melhor sorriso.
"Que bom que chegou!"-disse a menina.-"Essa é minha amiga Rebeca. Vamos fazer o trabalho juntas!"
"Muito prazer, senhorita Rebeca."-ele estendeu a mão para a menina e deu um sorriso encantador. Isabella notou o sorriso e sentiu um frio no estômago.
"Por que usa tapa-olho É pirata?"-perguntou a menina séria e com inocência.
Isaak colocou a mão sobre o olho perdido, por um momento Isabella notou que esse assunto não era de seu agrado, mas voltou a sorrir e disse a menina.
"Não sou um pirata! Mas vivo praticamente no mar, como eles! Mas, talvez meus antepassados tenham sido piratas."
"Legal!"-a menina de cabelos e olhos castanhos sorriu.
"Vamos antes que fique tarde."-disse Isabella pegando a cesta de pic-nic, e virou-se para os funcionários da lanchonete.-"Cuidem de tudo na minha ausência."
"Vai se divertir."-disse Pansey, dando uma piscada maliciosa.-"A gente fecha a lanchonete pra você!"
Isabella ia retrucar o gesto sugestivo de Pansey, mas uma mão quente tocou a sua, segurando a cesta.
"Eu levo para você!"-Isaak se ofereceu, pegando a cesta.-"Vamos meninas?"
"Sim!"-disseram as duas ao mesmo tempo.
"Divirtam-se!"-falou o cozinheiro da lanchonete.
"Acompanhado por tão belas damas, como não me divertiria?"-disse Isaak, abrindo a porta para que as garotas passassem.-"E tendo um encontro com uma bela mulher, a tarde promete."
As pessoas na lanchonete riram do comentário dele. Todos menos Isabella que permanecia séria. Isabella parou diante dele e falou com uma voz baixa:
"Isso não é um encontro."
"Como quiser."-ele deu um sorriso que a deixou sem jeito.-"Vamos antes que a tarde acabe?"
Foram até uma praia, que ficava a poucos quilômetros da pequena cidade. Lá havia um mirante de pedras, as ondas batiam agitadas na areia e nas pedras. Era possível ver o velho farol logo adiante, imponente sobre um morro. Seria uma tarde maravilhosa, seria ainda mais se estivessem no verão e pudessem nadar!
Enquanto Isabella colocou a cesta sobre uma pedra, observou Isaak e as meninas coletando conchas, ele apontava para cada um delas e falava algo que as deixavam surpresas e interessadas.
Realmente parecia conhecer bem o mar e suas criaturas. Isaak colocou a não na água fria e tirou de lá um pequeno crustáceo. Rebeca tirava fotos e Laura anotava tudo o que ele falava.
Isabella segurou a vontade de se juntar a eles e se envolver, mas percebeu pelo jeito de Laura que ela queria estabelecer uma relação quase paternal com Isaak. E isso não estava certo!
Sentia que Isaak não era uma pessoa de fincar raízes, e a qualquer momento ele poderia partir da mesma maneira que chegou na ilha, sem vínculos, sem nada a dizer.
Parecia se alguém que procurava seu lugar nesse mundo. Em seu olhar, ele carregava um fardo, um segredo. Alo que aconteceu em seu passado e que não queria mencionar. Ela sabia exatamente como ele se sentia. Ela também carregava esse mesmo olhar, esse mesmo fardo.
O fato era que precisa e iria proteger Laura de qualquer desilusão. Por mais dolorosa que possa ser as ações que iria cometer para fazer isso. E isso também a fazia sofrer.
Depois devolveram o animalzinho para a água. E então, foram até Isabella pra lancharem.
"Não se incomodou com a água fria? Essa temperatura podia congelar seus dedos!"-Isabella perguntou curiosa.
"Não. Estou acostumado ao frio."-ele respondeu olhando a mão.
"Tia, o Isaak disse que conhece um lugar muito legal pra pescar! A gente pode pescar um dia lá? A senhora vai, não é?"
"É mesmo? Um dia desses vamos."-ela o olhou seriamente.-"Sentem e comam, meninas. Preciso conversar com Isaak."
Com um gesto com a cabeça ela o chamou, e começaram a caminhar pela orla da praia. Isabella olhou para trás e viu as meninas sentadas na pedra comendo.
"Aonde quer ir?"-Isaak perguntou.
Em algum lugar longe o suficiente para que elas não escutassem nada se caso brigarem.
"Vamos até o farol."-ela disse.
Pearam um atalho que levava ao farol, como o caminho era um pouco difícil de ser feito, Isaak na sua frente lhe oferece a mão para ajuda-la a subir. Com um puxão, ela subiu e ficou com o rosto a poucos centímetros do dele.
"Oh, que adorável!"-disse uma senhora idosa acompanhada pelo marido.-"Me desculpem, atrapalhei o beijo entre vocês. Continuem de onde pararam, não ligue pra nós!"
"Também vínhamos muito aqui namorar, se lembra Margareth?"-o velho piscou para a esposa.-"Sempre que seu pai e seus irmão saiam pra pescar, corríamos para o farol e namorar!"
"Oh, Clyde! É claro que sim!"-ela deu uma risadinha corando.
"Sr. e Srª Gibs! Nós não somos namorados!"-Isabella se defendeu, vermelha de vergonha.-"Somos amigos apenas!"
Olhou furiosa para Isaak, que não dizia nada, apenas sorria e piscou para o casal.
O velho casal sorriu e saiu comentando.
"Isabella é tão tímida! É melhor guardar segredo desse namoro, Margareth!"
"Tem razão, Clyde!"
"Você podia ao menos desmentir!"-ela disse furiosa.
"Não achei necessário. Não estávamos fazendo nada de errado."-ele deu os ombros e enfiou as mãos nos bolsos da calça.-"Já que estamos aqui, o que queria me falar de tão secreto que precisávamos nos afastar das meninas?"
"De onde você é, Isaak?"-ela perguntou de repente.
"Por que?"
"É apenas uma pergunta simples. Não pode me responder?"
"Finlândia. Mas cresci na Sibéria!"
"Sibéria!"-ela espantou-se.-"Naquele lugar gelado?"
"Sou órfão."-ele respondeu olhando para o mar.-"Fui criado por um homem muito bom. Um professor e um verdadeiro pai para mim."-depois baixou o olhar e deu um sorriso triste.-"Se ele estivesse vivo hoje, com certeza teria vergonha de mim e das coisas que..."
Percebendo que havia falado demais, ele se cala e a encara.
"Vamos voltar?"-pediu.
"Porque seu pai adotivo teria vergonha de você?"-ela insistiu-"Não te conheço muito bem, apesar de morarmos na mesmo cidade pequena há três anos, mas sinto que é um homem bom!"
"Não me conhece bem porque perdíamos tempo demais brigando e nos ignorando. E se me conhecesse, certamente não olharia sequer para mim."
"Fala como se tivesse cometido um grande pecado!"
"Ajudei um deus a matar milhares de pessoas por todo mundo, inclusive os pais de Laura."-Isaak pensou e teve vontade de dizer isso a ela, mas certamente o acharia louco.
"Todos merecem uma segunda chance."-ela disse, caminhando até o farol.-"Meu irmão me disse isso várias vezes. A primeira foi quando eu briguei com minha melhor amiga na quinta série por causa de um garoto que paquerávamos, ela mentiu pra mim e saiu com ele, depois disse que estava arrependida. A perdoei e somos amigas até hoje. A segunda vez foi quando um motorista de caminhão bêbado matou meus pais...eu queria muito que ele apodrecesse na cadeia, isso quando eu tinha treze anos."
"Isabella..."
"Mas depois de conversar com meu irmão, não conseguia sentir mais ódio pelo assassino dos meus pais...apenas piedade. A última vez em que ele me disse essas palavras, foi há algum tempo atrás, três anos depois de mudarmos para cá. Alguém em que amei e confiei cegamente, mentiu para mim e me abandonou...mas aquelas palavras do meu irmão foram para mim, que não conseguia me perdoar por ser tão burra!"
"Por que está me dizendo isso?"
"Por duas razões. Primeiro, não sei o que realmente você fez para se sentir tão culpado...mas devia tentar se perdoar e seguir em frente. Confronte seus fantasmas se isso for necessário.Devia se dar uma segunda chance, Isaak."
Ele ouvia em silêncio.
"A segunda razão: Laura e eu. Eu quero que se afaste dela."-ela disse por fim.-"E de mim também."
"Como?"-ele percorre o espaço que os separavam.-"O que tem você e Laura com isso?"
"Você me lembra o rapaz que me abandonou...que me magoou anos atrás. Não me refiro a aparência física, mas seus jeitos. Você me parece ser uma pessoa que não pretende criar raízes em lugar nenhum, um dia irá embora e deixará Laura muito triste e magoada."
"E você? Ficaria triste se eu partisse?"
Isso a pegou desprevenida, Isabella desviou o olhar e falou:
"Eu teria que lidar com a tristeza de Laura, e não quero vê-la mais sofrer com perdas."
"Não me respondeu."-ela o encara.-"Você ficaria triste se eu partisse?"
"Sim."
"Então...Preciso de motivos muito fortes para ficar!"-ele pegou em sua mão.-"E eu tenho motivos de sobra para ficar para sempre aqui, e nenhum para voltar a minha antiga vida. Eu mereço uma segunda chance?"
"Acho...que todos merecem..."
Ele não soltou sua mão. Era bom segura-la, dizia a si mesmo, sua mão era macia e delicada, ficaram em silêncio por um tempo. Então, ele se inclinou e depositou um suave beijo nos lábios de Isabella.
Quando a boca quente de Isaak tocou a dela, convencendo-a, abrindo-a, o corpo de Isabella reagiu. Não era beijada assim há muito tempo.
O beijo se intensificou e Isaak a estreitou em seus braços. O beijo tornou-se mais forte, possessivo. O sangue aqueceu-se em suas veias, o coração bateu acelerado. Ela entreabriu os lábios para ele saboreando-o, recebendo-o, retribuindo-o.
Isaak gemeu. Demorou a descobrir que a desejava. Talvez desde a primeira vez em que a vira, andando pelo cais, segurando a mão de Laura, tão pequenina ainda e de olhos curiosos. Ela estava linda de saia branca e blusa azul clara, destacando a pele morena e os cabelos presos em um rabo de cavalo. Ele a achara linda!
Ele a segurou com mais força, puxando-a para mais perto de si. Em vez de assusta-la, a pressão da excitação de Isaak encorajou-a. Seu desejo, há anos adormecido, contido, despertou.
Eles se afastaram, encarando-se surpresos por descobrirem o quanto se queriam. Apesar do frio ambiente, sentiam muito calor.
"Eu...me desculpe."-ele estava corado e ofegante.
"Pelo que"-perguntou aturdida.
"Por isso."
E voltou a beija-la, com mais ardor ainda. Suas mãos percorreram as costas esguias de Isabella e desciam até os quadris, pressionando-a, fazendo-a sentir o quanto ela o excitava.
Reunindo as poucas forças que tinha, Isabella conseguiu afasta-lo e o encarou assustada.
"Estou fazendo o mesmo de nove anos atrás! Eu estou bancando a tola de novo!"-falava, mas era pra si mesma.
"Isabella?"
"Isaak...é melhor eu ir!"-ela se afastou, passando a mão num gesto nervoso pelos cabelos.
"Está bem."-ele concordou desapontado, depois sorriu como se nada tivesse acontecido.-"Depois de amanhã é o baile."
"O que?"-parecia que não o escutou direito.
"O baile...Vamos juntos, esqueceu?"-ele passou por ela e foi andando na frente.
Isabella teve um mal pressentimento em relação ao baile.
"Quer que eu me afaste de Laura?"-Isaak perguntou ainda de costa para ela, e caminhando.
"Não."-ela respondeu.
Continuaram a caminhar, mantendo uma certa distância, então ele parou e se virou para olha-la.
"Não sei o que aconteceu em seu passado, Isabella...mas realmente devia se dar uma segunda chance."
Continua...
