Capítulo Cinco
"O tempo"
(Wanda Scarlet)
Até hoje nunca soubera porque alguém como ela havia sido mandada para treinar em uma região tão ao norte, onde as temperaturas são baixas e o gelo domina completamente o lugar. Logo ela que nascera com uma estranha habilidade para o fogo.
Sua mestra logo percebeu esse detalhe e baseou boa parte do treinamento de Aska no controle sobre altas temperaturas. Claro que fora sempre um desafio duplo para a moça, acostumada a climas quentes como da ilha de onde viera. Viver em meio ao frio enquanto expandia seu domínio do fogo fora difícil! Quantas vezes não passara o dia inteiro com dificuldades para se movimentar devido às descargas elétricas que a neve produzia em seu corpo por causa do choque de temperaturas? Em tanto tempo de treinamento até já havia se acostumado com o choque do vento gelado em seu rosto, mas jamais se adaptara àquele lugar, embora um dia fora capaz de tudo para assegurar sua paz.
Resolvera ser uma amazona porque acreditava que sua habilidade existia por algum motivo. Tinha o poder de ajudar as pessoas, protegê-las. E era isso que pretendia ao iniciar a jornada rumo a esse destino que escolhera para si.
Mas 'o destino aos deuses pertence', não era assim que haviam lhe ensinado? O dela também pertenceria a um deus, pertenceria à Athena!
A deusa da justiça pela qual decidira tornar-se guerreira a fim de assegurar o bem estar e a felicidade de quem ela amava. Essa era a coisa mais importante em sua vida, era o sentimento mais especial em seu coração desde pequena. Morreria por isso.
Se fechasse os olhos por um instante ainda seria capaz de sentir o calor absurdo emanado pela casa em chamas e ouvir os gritos desesperados de sua mestra implorando que Aska parasse. Mas já era tarde, muito tarde para ela voltar atrás...
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- Cinco horas. – a voz ecoou séria pelo quarto despertando-o por completo.
Na cama, o rapaz acabava de abrir os olhos e sentar-se. Ao ouvi-la virou-se imediatamente para a direção de onde aquela voz suave e fria vinha. Deparou-se com a moça sentada numa cadeira ao lado da mesa com os braços cruzados e um olhar estranhamente profundo.
- Dormi por cinco horas? – perguntou ainda um pouco atordoado.
- Não. Passaram-se três dias desde que você quase morreu. – a lembrança dele desacordado dando uma pequena pontada em seu coração, mas sufocou o sentimento e continuou de modo frio com os olhos fixos no rosto dele – Me refiro a outro tempo...
Ele pareceu não perceber a insinuação por trás das palavras.
- Três dias! – passou a mão pelo rosto, não pensava que o esforço havia sido tanto, olhou para ela – Obrigado por cuidar de mim. – e sorriu de modo gentil e sinceramente agradecido.
Mesmo diante daquele sorriso lindo, ela não podia deixar-se abalar. Desviou o olhar, não ia cair nos encantos daquele anjo novamente!
- 'Fiz o que qualquer pessoa teria feito', não foi assim que você respondeu quando lhe agradeci?
- É verdade... Mas mesmo assim, obrigado.
- Apenas estamos quites. – disse com frieza e voltando a olhá-lo – Mas isso não muda o fato de que se leva cinco horas para chegar nessa cabana a partir do lugar onde eu desmaiei no meio da tempestade. Uma distância muito grande para ser vencida numa mesma noite, ainda mais quando uma nevasca muito forte dificulta a viagem.
O rosto dele adquiriu uma expressão séria de impassibilidade que em nada condizia com a genuína surpresa que experimentava pela revelação dela. "Então ela já sabe disso..." Mas não demonstrou nada do que se passava por sua cabeça. Ele nada dizia, apenas a encarava sem qualquer indício de algum sentimento no rosto ou nos olhos.
Ela continuou:
- A princípio eu não havia me dado conta do tempo da viagem, mas quando tive que ir à vila notei a... 'pequena distância' que separa essa cabana daquele vilarejo que deixei. Esse detalhe somado àquela tempestade deixa óbvio que não tem como completar o trajeto em tão pouco tempo quanto me disse. – os olhos negros estavam agora mais escuros ainda, ao passo que os azuis continuavam calmos e impassíveis – A menos que não seja uma pessoa comum...
- Onde quer chegar? – perguntou ele por fim.
- Onde você acha que quero?
- Está falando por enigmas, por que não é mais clara?
- Mais clara? – levantou-se da cadeira e aproximou-se da cama onde ele encontrava-se sentado, olhou-o significativamente por alguns instantes e enfim disse – Hyoga, cavaleiro de bronze de Cisne. Por que não disse que é o enviado de Athena para me matar?
Era impressão sua ou aquele pequeno brilho nos olhos dela seriam lágrimas?
O rapaz suspirou e fechou os olhos por um instante, tornando a abri-los para lançar um olhar frio para a moça.
- Então você já descobriu. – concluiu suavemente.
- Um pouco tarde demais, mas descobri. – estava confusa com a dor que sentia, ao mesmo tempo que sentia a morte perto e temia isso, algo novo para ela. Sabia que não poderia confiar em ninguém, mas por que saber que jamais poderia ter confiado nele abalava-a tanto? – Por que você deixou que demorasse todo esse tempo?
Quando descobrira a armadilha em que havia caído, desejara estar sonhando, aquilo não podia ser verdade! Mas era, e não havia nada que podia fazer quanto a isso.
Queria ajudá-lo enquanto ele se recuperava na cama. Resolvera ir até a vila buscar as rosas das quais havia lhe falado, aquelas que usava para presentear a falecida mãe.
A distância não fora um problema para ela, devido ao treinamento que tivera soubera percorrer todo o caminho em algumas horas. Teria feito em bem menos tempo se não tivesse que enfrentar a estranha tempestade que caía forte sobre um raio de dois quilômetros à partir da cabana.
Isso a intrigou. Como alguém seria capaz de resgatá-la daquele ponto onde havia desmaiado e na mesma noite levado para aquele abrigo que se encontrava tão longe? Nem sequer na orla da floresta havia entrado, e disso tinha certeza! E que tipo de nevasca cai incessantemente numa pequena área como aquela? Alguma coisa estava errada, alguma coisa estava muito errada!
Então o enigma se resolveu quando perguntou para o dono da única loja que vendia rosas naquela vila sobre o rapaz que morava numa cabana na floresta.
- Ahhh... o cavaleiro! Sim, eu o conheço. Sempre compra rosas de mim. – respondeu animado o velho comerciante.
- Cavaleiro?
- Sim. Hyoga de Cisne! É assim que é conhecido pelas pessoas da região.
- E... quando foi a última vez que o viu?
- Hum... – o velho pensou por alguns instantes e depois respondeu – Não tenho muita certeza do dia... mas acho que foi na semana passada. Isso! Semana passada. Voltou da Grécia e veio aqui para pegar as rosas de costume. – olhou intrigado para a moça – Você é amiga dele?
- Ah... eu... não, não sou amiga dele. – pelo menos isso era verdade – Sou nova aqui e não sabia quem morava na floresta.
Com um pouco de paciência e sorte conseguira descobrir qual tipo de rosa o cavaleiro sempre procurava e comprou muitas. Ao voltar para a cabana, no caminho deixou lágrimas surgirem no canto dos olhos que congelaram assim que entrou na área castigada pela tempestade. Não havia dúvidas, ela fora encontrada!
Após alguns instantes encarando-a, desviou o olhar e se levantou da cama. Andou até a porta devagar e abriu-a, parou e disse sem fitá-la:
- Peço que não saia daqui até eu voltar.
- E o que te faz pensar que faria algo tão estúpido, cavaleiro? Meu tempo de fugir já passou...
Ele saiu fechando a porta firmemente atrás de si. Sabia que ela não tentaria partir, se quisesse já o teria feito assim que soube quem ele era.
(Wanda Scarlet)
Nota da autora: Tah, eu sei que prometia algo mais quente e em vez disso agora eu entrego algo muuuuito frio e ainda por cima curto demais. Mas realmente não teve jeito! Eu não podia atropelar as coisas. Só os deuses sabem como eu toh querendo que os dois se beijem novamente, mas está muito difícil! T.T O próximo capítulo vai estar bem fofo, vou mostrar o loirinho na sua melhor forma 'anjo' de ser. E finalmente dará pra saber exatamente quem a Aska é. Espero que não faça vcs esperarem muito.
Beijos
Obrigada por ler!
