3– Uma hora no Submarino Amarelo:

O único problema sobre encontrar o tal do Submarino Amarelo é que Harry não me explicou como chegar lá. Eu não tenho a mínima noção da Londres trouxa, e não entendi se Mione está no tal submarino, debaixo d'água ou num cais. E submarinos navegam em rios? Acho que nem Estudo dos Trouxas explicaria essa.

Acabei aparatando perto do Beco Diagonal e de lá me virei a pé. Demorei mais meia hora pra encontrar o endereço certo e fiquei feliz por não ser um submarino de verdade, seja lá o que isso fosse, era um restaurante comum.

Tinha um desenho muito estranho na entrada, uma figura comprida e meio oval, que tinha um pescoço comprido e fino e um olho ao invés da cabeça. Como ele era amarelo, deduzi que fosse o tal submarino. Será que eram pequenos assim?

Entro no local e o examino. Na minha opinião era tudo muito espalhafatoso, com objetos náuticos, como uma âncora servindo de suporte para pratos com réplicas de navios e um timão pendurado na parede. Os empregados estavam vestidos de marinheiro, algo que eu considerei muito brega e havia um tanque cheio de lagostas. Havia uma música de fundo, instrumental, que tornava o ambiente mais agradável, pelo menos tentava, eu mesmo não me sentia nem um pouco à vontade.

Hermione estava numa mesa nos fundos do restaurante e pude ver Malfoy conversando com ela. Os dois estavam sérios e a mesa era num lugar isolado demais pro meu gosto.

Agora era só respirar fundo, chegar perto devagar, nada de nervosismo ou escândalo, mantendo a compostura. Pelo menos é essa a minha intenção.

– Hermione! – e pelo meu tom de voz, falhei com meu autocontrole de novo.

Duas cabeças se viraram na minha direção. Quero dizer, duas que eu esteja olhando diretamente, porque tenho certeza de que todo o restaurante me olhou nessa hora.

Mione ficou rubra nessa hora, já Malfoy me olhou com desprezo, menos mal. Se fosse um olhar amigável eu ficaria preocupado.

– Weasley. – ele disse, como se fosse me afetar falando só o meu nome – Que foi, veio "filar a bóia"? Não vou pagar nada pra você comer.

– Não quero nada de você, quero falar com Hermione. – eu fui direto, perda de tempo implicar com o Malfoy, além do mais, estava tentando não fazer escândalo.

– Rony – Hermione se levantou – eu pedi para você esperar até à noite.

– Só que eu decidi não esperar – cruzei os braços. Eu sei que pareço um menino de cinco anos fazendo birra, e acho que estava fazendo mesmo, mas Hermione sabe o quanto eu sou teimoso.

– Então pelo menos se sente, Ronald, está dando vexame. – Mione ainda tinha o rosto vermelho, Malfoy parecia se divertir com o vexame, que era exagero por parte dela – estamos quase terminando e...

Mal me sentei e Malfoy se levantou, fechando um tipo de pasta, que continha alguns papéis.

– Já terminamos.

– O que? – agora sim estava sendo um vexame, ela começou a gritar – Mas você disse que não se decidiu!

– Não, mas eu levo essa papelada que você trouxe – ele indicou a pasta – Não é tão inútil, afinal.

– Preciso de um parecer o mais rápido possível, você disse que ia colaborar – Hermione estava perdendo o controle, melhor não me meter por enquanto.

– Eu disse que preciso examinar com cautela – Malfoy estava com pressa de sair. Sorte a minha. – Não fico nem mais um minuto aqui, Granger.

– Posso saber o motivo? Você disse que tinha os sábados livres! – ela gritou, exasperada.

– Porque já foi difícil ter que aturar você por mais de uma hora em um restaurante trouxa piegas, o ar ficou pesado e agora com a chegada do Weasley, ficou irrespirável. Além do mais, eu já presenciei o escândalo que você fez ao telefone, não quero ter que presenciar uma briga ao vivo. Passar bem.

E saiu antes de protestarmos, Hermione pelo desaforo de ter saído sem terminar seus negócios, eu pela ofensa a nós dois. Sorte dele. E azar o meu, pois Hermione me olhou com uma cara que assustava até trasgo. E trasgos são muito burros para ficarem assustados.

– Você viu o que fez? – ela falou em tom bem exaltado. Mais cabeças se voltaram para a nossa mesa, pelo que pude perceber – Agora ele não vai aceitar!

– Ele disse que ia levar os papéis, não disse? – Não entendo o motivo para ela brigar comigo, ele saiu porque quis! – Não tenho culpa se ele tem medo toda a vez que olha pra minha cara.

– Há-há! – ela foi irônica, tenho certeza que sim – Até parece que ele ia sentir medo de você! E ele só precisou uma desculpa para ir embora, agora vai achar qualquer defeito no projeto e recusar!

– Pois você fica melhor sem o dinheiro dele, é sujo Mione!

Ela se levantou e jogou algumas notas de dinheiro trouxa. Nunca vou entender dinheiro em papel. Eu a segui, vários rostos se viraram para nós.

– Hermione, espera. – eu a alcancei do lado de fora. Ela se virou bruscamente, os olhos faiscavam de raiva, o que fez com que eu recuasse um pouco discretamente.

– Ronald Weasley! – agora ela gritou em plenos pulmões, alguns pedestres pararam pra ver. Gente desocupada... – Como é que você ousa vir atrás de mim, com certeza para dar uma desculpa deslavada sobre... – ela olha em volta e percebe a movimentação, começa a falar baixo – sobre "aquilo" e ainda atrapalha o meu trabalho!

– Porque não é justo você me acusar de algo que eu não fiz, só porque "aquilo" estava na minha cama! E saiba que é preferível não ter patrocínio nenhum a ter o do Malfoy. O dinheiro dele não vale a pena. – eu tentei insistir, ela estava fazendo uma burrada e não sabia.

– Desde que seja para fins nobres, como o F.A.L.E., pouco me importa a procedência dele! – ela gritou. Isso me irritou muito, se há algo que eu não suporto é ter que me humilhar para o Malfoy, e Hermione pelo visto conseguia passar por cima disso por causa dos elfos que não queriam ser libertados.

– Já que pra você os fins justificam os meios, casa com ele de uma vez! – Senti meu rosto ficar quente mais uma vez – Ele pode te dar todo o dinheiro que quiser, o que eu não posso oferecer – Perdi o controle e agora não podia mais lamentar, estava feito.

– Eu não estou à venda! – ela avançou pra mim, na intenção de bater; agarrei seus pulsos que batiam no meu tórax.

A ofensa foi grande e me senti culpado. Idiota, burro! Eu tento me controlar, mas a raiva sempre fala mais alto. Hermione se debatia para se livrar de mim e quando conseguiu foi para gritar mais uma vez. O dia ainda estava longe de acabar.

– Fique sabendo que esse encontro foi tão ruim para ele quanto para mim! – ela afastou os cabelos do rosto, estava rubra de raiva, e eu também.

– Você teve que se humilhar pra pedir um favor ao Malfoy! – eu também gritei, a multidão em volta parecia fazer apostas. – Você tem inteligência para falar com os duendes, pra que falar com aquele crápula?

– Acontece, Rony, que quando se tem um sonho e quer vê-lo realizado, o ser humano é capaz de fazer sacrifícios e passar por cima de humilhações para alcançar seus objetivos! – ela fez cara de choro, pegando meu ponto fraco: odeio ver Hermione chorar, seja proposital ou não – E você sabe que tudo tem limite. Eu nunca me sujeitaria a sequer sair com o Malfoy para conseguir patrocínio...

– Droga, Mione... eu não queria ter dito aquilo... – eu devo ficar muito patético quando me desculpo, não consigo mudar e confesso que nem tento.

– Mas você disse – ela tentava segurar o choro, sabia que não ia agüentar por muito tempo então torci para ela terminar logo o que queria dizer. Eu não sou insensível, muito pelo contrário, não gosto de ver Mione chorando e se ela terminar de falar, talvez consiga se controlar – E droga, Rony! Eu te amo e não trocaria você por ninguém nem que me oferecessem um milhão de galeões! Esse tipo de sacrifício não vale a pena...

Não esperei ela terminar a frase. Agarrei Hermione e apesar dos protestos dela, a beijei, tentando calar toda a mágoa que acabei causando. Ela até resistiu um pouco e por fim correspondeu. Não paramos para agradecer os aplausos dos desocupados que ficaram assistindo nossa discussão, continuamos ali. Beijar Hermione é bom, uma das tais maravilhas do mundo. O beijo de reconciliação tende sempre a ser melhor. Porém aquele beijo não era de reconciliação.

– Vamos sair daqui – ela pediu, assim que nos afastamos. Ela continuava com o rosto vermelho, não sei se chegou a chorar, mas parecia triste – chega de shows no meio da rua.

Como não tinha mesmo mais o que fazer ali, eu a segui e caminhamos em silêncio por alguns quarteirões. Silêncio agourento, eu hein. Resolvi quebrar o gelo.

– Hermione, você não acredita em mim? – eu perguntei, pegando sua mão e fazendo-a parar.

Ela não me olhou no mesmo instante, preferia prestar atenção aos seus sapatos, ou qualquer coisa que estivesse sujando o chão. Tentei consertar o que havia feito há pouco tempo.

– Mione, me desculpa, não queria dizer o que eu disse sobre você e o Malfoy, só que eu fiquei com raiva, foi isso. Não suporto ver você com alguém como ele, ele te odeia!

– Eu sei, Rony, mas não é por mim... – ela desviou os olhos para a rua, evitando me encarar.

– E se ele usasse o patrocínio que você pediu para te prejudicar de alguma forma? – eu perguntei, exasperado.

– O contrato é enfeitiçado contra qualquer tipo de falcatrua, tem uma cláusula explicando – ela disse, de forma automática. Essa é a Hermione que conheço, pensa em tudo e é prática. – E não quero falar mais sobre o Malfoy.

Como ela se recusava a me olhar de frente, eu me aproximei e toquei em seu queixo, guiando-o com a minha mão para que pudesse me olhar nos olhos.

– Hermione, por favor... – seus olhos estavam frios e inexpressivos, o que me deu um aperto muito grande no peito – Eu te amo, não trocaria você por outra pessoa, mesmo que estivesse bêbado, eu só ia querer ficar com você. – tudo bem, não sei se isso ajudou, só que eu falei a verdade.

– Você está querendo dizer que há uma possibilidade de ter dormido com alguém que não fosse eu, mesmo que estivesse pensando em mim? – ela perguntou, séria. Que medo.

– Não! Eu... – fiquei confuso, acho que não era isso que eu quis dizer – Eu não dormi e nem dormiria com ninguém além de você, foi isso o que eu disse – eu acho – Hermione, acredite em mim.

– Eu quero acreditar, Rony – ela pega a minha mão e a tira delicadamente de seu rosto. Mantém as duas mãos unidas, sinal de que está se esforçando – só que encontrar um sutiã debaixo do seu travesseiro depois de você ter ido a uma despedida de solteiro não é o que eu chamo de "inocente". Você estava cantando quando fui acordá-lo, parecia estar sonhando.

Foi minha vez de suspirar. Eu ia ter que pagar o mico de contar o que aconteceu numa despedida de solteiro, segredo de estado que nunca deve ser revelado, além de contar o que eu sonhei. Claro que ela não acreditaria de qualquer forma, então tive uma idéia.

– Mione, vem comigo. – eu a puxei pelo braço e chamei um táxi. Antes que ela fazer perguntas, estávamos a caminho do centro da cidade. – Agora, vou contar o que sonhei e você com certeza entenderá melhor.

Sim, eu contei. Contei todos os detalhes, desde a macarena (e nesse ponto percebi o motorista rindo, bem que ele podia pelo menos fingir que não ouvia a nossa conversa) até as travesseiradas que Hermione me dava. Ela me interrompeu em alguns pontos.

– O que Carlinhos estava procurando?

– Sei lá – respondi, dando de ombros – Só sei que mamãe disse que ele quer falar comigo.

Ela passou a raciocinar. O que, exatamente, eu não faço idéia.

– Ele veio passar as férias na sua casa com a namorada, não foi? – ela perguntou, agora seus olhos brilhavam de expectativa.

– Sim, ela é da Romênia. – tentei lembrar a descrição da garota – Uma morena, cabelo liso... – eu ia a perguntar o por quê de tantas perguntas, mas fomos interrompidos mais uma vez.

– Chegamos. – era o motorista, que tentava rir discretamente e falhava de forma vergonhosa. Filho da... – São 30 libras.

Ops. Não tenho dinheiro trouxa. Minhas orelhas esquentaram de novo e Hermione deve ter percebido, pois ela tirava sua carteira da bolsa.

– Deixa comigo. – e quando saímos do táxi, ela cruzou os braços, não estava mais triste ou zangada, apenas curiosa – Agora me diz o que estamos fazendo aqui.

– Er... foi ali que estivemos ontem – apontei para a danceteria do outro lado da rua – Pensei que se você entrasse e visse os funcionários acreditaria que não tem nenhuma streaper ou algo do tipo...

Como ela não reagiu, apenas fitou o local séria, decidi explicar com mais detalhes.

– O Harry quem recomendou, ele mesmo disse que não teríamos problemas com você, Luna e Gina. Apenas bebemos e comemoramos, algumas dançarinas que ficam no balcão chamaram o Neville, que saiu de lá rapidinho. Bebemos mais um pouco e não estávamos bêbados, conseguimos aparatar normalmente lá em casa. Foi isso, Mione.

Hermione ficou sem expressão, olhava o local como quem olha o vazio.

– Eu não vou entrar aí – ela começou a andar rua abaixo.

– O que? Mas por que? – eu apressei o passo para alcançá-la. Mione me surpreende cada vez mais.

– Não preciso entrar, Rony – ela estava com o rosto rosado de novo – Não tenho que entrar num local no qual você esteve dançando e bebendo e olhando dançarinas num balcão. Ou vai dizer que não olhou para nenhuma? – ela pára e me encara, aguardando uma resposta.

O que ela quer que eu diga?

– Olha, Mione... elas não tiravam a roupa, apenas dançavam, entende? Era para animar o ambiente, homens e mulheres freqüentam o local; não tinha como ninguém ignorar a presença delas. – tentei colocar do modo mais delicado. Ela entendeu.

– Não quero entrar num local onde meu noivo esteve para celebrar uma despedida de solteiro e onde ele poderia ficar com qualquer garota que quisesse.

– A única que eu queria não estava lá – me defendi. Ponto pra mim, ela esboçou o primeiro sorriso do dia.

– Vamos embora, Rony... Você vai se atrasar para o casamento do Neville.

Eu concordei. Pelo menos ela viu aonde fomos. Não entendo... Eu tento sempre passar confiança para a Mione e a maioria das vezes em que falo a verdade ela não acredita. Vai entender as mulheres, desconfiam de tudo.

Ainda bem que não sou ciumento. E o dia estava acabando.