Faye, este é meu presentinho de Natal para você. Foi uma honra atender um pedido vindo de você, uma das figuras que mais admiro no mundo virtual, como ficwriter e como pessoa.
Gravado em pedra
Ele custou a acreditar, mas o selo fora rompido. A responsável pelo feito era uma morena de olhar de azeviche e corpo tão delicado que à primeira vista ninguém diria ser ela uma hábil mercenária do bando Falcão Branco.
Hábil. Não haveria adjetivo melhor para uma mulher capaz de mexer com o coração de um berserk. Logo ele, o guerreiro sem eira nem beira que vivia de brandir a espada para exterminar os seres demoníacos que jamais lhe davam trégua. Gatts, o homem estigmatizado, frio, que vagava pelo mundo sem rumo e sem perspectiva de salvação.
Salvação... Há muito perdera a esperança de tê-la, mas ela fez-se palpável naquela mulher que ressonava tranqüilamente sobre seu peito. Caska era leve como a brisa daquela manhã de primavera recém-nascida, que Gatts aspirava tranqüilamente pela primeira vez em sua jornada de berserk. Leve como sua consciência jamais estivera.
E pela primeira vez ele pegou-se pensando em como Caska era especial. Certamente esse fascínio não era novo, mas Gatts ainda não se dera o prazer de senti-lo como nesse instante inédito. Contudo, desde sempre notara como sua agora amante era diferente das outras mulheres. Mulheres usadas e postas de lado, instrumentos de prazer desmerecedores do mínimo afago. Mas Caska era notável demais para ser tratada como uma qualquer. Que outra mulher conseguia ser tão delicada e forte, tão calada e intensa, tão doce e aguerrida? Que outra pessoa carregava em si tantos paradoxos como se isso fosse a coisa mais comum?
Agora, Gatts não pensava em nada além de permanecer com sua pequena guerreira sob aquela árvore e vê-la dormir pelo tempo necessário para fazê-la descansar de seus dias amargos. Tempo que ele queria parar, para nunca mais correr o risco de perdê-la em batalhas, para devotar-se a ela e tornar seus dias menos sofridos. Queria amá-la, se possível eternamente... Incondicionalmente.
– Eu poderia fazer amor com você eternamente...
– Hum?
Caska tinha o sono leve dos guerreiros acostumados a emboscadas, tocaias, armadilhas de todo tipo. A voz grave de Gatts, embora baixa, foi suficiente para despertá-la. Agora ela fitava o guerreiro com curiosidade, tentando espantar com os dedos delgados o resto de sono que embaçava seus olhos.
– Como?
Gatts tentou parecer desembaraçado, mas a voz saiu com um leve tremor, que deixou-o sem graça e arrancou um sorriso de Caska.
– Eu... Poderia fazer amor com você eternamente.
Ela meneou a cabeça, incrédula.
– Achei que jamais ouviria algo desse tipo vindo da sua boca.
Ele catou mais um pouco de sua coragem para transformá-la em palavras.
– Você mexeu comigo, morena.
Caska acariciou o queixo do amante, sem se importar com a barba que começava a crescer e espicaçava suas mãos.
– Gatts... Logo você, que parece ter uma pedra no lugar do coração.
A associação foi imediata. Gatts olhou para o outro lado do rio em busca de confirmação e tornou a fitar os olhos negros de Caska.
– Veja as marcas naqueles rochedos.
Ela olhou as rochas que se erguiam à margem direita. Seu semblante iluminou-se.
– Compreende, Caska?
– Compreendo.
Entrelaçou os artelhos magros nos dedos grosseiros de Gatts.
– Tão especial assim?
– Sim, morena. Está gravado aqui.
Conduziu a mão pequenina da amante ao seu peito. Ela sorriu ao sentir as batidas acelerando, à medida que acariciava a pele marcada por arranhões e cicatrizes.
– Sente?
– Sinto...
Colou a boca à orelha delicada de Caska e apenas murmurou:
– Duvido que algo apague isso.
Fim
