CAPÍTULO NOVE
O resgate de Remo
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Durante muitas noites, Lily desejava ter aquele sonho novamente, porém nunca se lembrava de ter sonhado algo. Finalmente, na última noite de Lua Cheia ela sonhou novamente com o cervo. O mesmo andar que passava uma imagem de poder e beleza, o mesmo olhar intrigante, quase atrevido, mas ao mesmo tempo doce e reconfortante. Dessa vez, nada a impediria de tocá-lo. O animal aproximou-se o suficiente, abaixou a cabeça e deixou-se ser acariciado. Parecia tão real que ela quase podia sentir seu cheiro de liberdade. Enquanto alisava o pelo sedoso atrás da orelha do cervo, Lily reparava em cada detalhe. O brilho do luar refletido em seus olhos impediu-a de distinguir sua cor. Notou que ao redor deles havia discretíssimas marcas perfeitamente redondas e antes de poder observar mais alguma peculiaridade, o cervo mexeu-se inquieto, voltando a cabeça para trás, os sentidos em alerta. Segundos depois ela ouviu a respiração rápida de outro animal. Estreitou os olhos na direção em que o cervo olhava. O arbusto estremeceu novamente e uma pata peluda e negra surgiu ao mesmo tempo que o focinho e um par de olhos brilhantes. Um urso, não, um enorme cão peludo mostrou-se na clareira, resfolegando, deixando à mostra sua língua comprida e vermelha. Lily sentiu um aperto no peito. Era um Sinistro. Um agouro de morte.
Acordou com a respiração rápida e o coração batendo forte no peito. Ainda não amanhecera.
-- Oh! Céus! O que significa isso? - ela inquiriu o teto do dormitório num sussurro.
Era dia de visita à Hogsmeade. Totalmente desperta, Lily achou que seria melhor se levantar e tomar um banho. Quando terminou, já tinha amanhecido completamente e ela desceu para o café da manhã no Salão Principal com os cabelos molhados.
Não esperava encontrar ninguém no Salão à essa hora em pleno sábado, porém assim que entrou viu três garotos na mesa da Grifinória, além de um ou dois nas outras mesas. Ela suspirou resignada antes de se dirigir para os quatro garotos, que pareciam cochichar e nem notaram ela se aproximando.
-- Voc achaquia Magami Pomfvai dexa lesai? - alguns farelinhos de torrada escapavam da boca de Pedro.
-- Engole, Pedroca, por favor - pediu Tiago, antes de abocanhar uma bolacha de nata. Ele estava sentado ao lado de Pedro, de frente para Sirius.
O garoto engoliu com força antes de repetir:
-- Vocês acham que a Madame Pomfrey vai deixar ele sair?
-- Ah, ela TEM que deixar, onde já se viu? Perder um passeio a Hogsmeade! - indignou-se Sirius. - Nós iremos resgatá-lo daquela enfermaria.
Tiago tomou um gole de suco de abóbora para limpar a garganta antes de falar:
-- É, mas a gente tem que ver também se o Remo quer ser resgatado. Talvez ele não esteja disposto, vocês sabem, ele passou uma semana inteira de transformações, deve estar exausto!
-- Aquele lá é um guerreiro, vocês vão ver. Vai estar ligadão, doido pra deixar aquela enfermaria... - argumentou Sirius, levando o copo de suco até a boca.
-- Quem está na enfermaria? - Lily tinha acabado de chegar e sentava-se a seu lado.
Sirius cuspiu todo o suco na cara de Tiago, que parou uma torrada a meio caminho da boca.
-- Opa, foi mau - Sirius tentou concertar, mas já era tarde demais. Lily estava se dobrando de rir e Pedro tinha engasgado com um acesso de riso de boca cheia. Logo estavam todos rindo, inclusive Tiago.
-- Pombas! Limpa isso, seu pulguento - disse ele irritado, mas ainda sorrindo.
-- Tá limpo - com um único aceno todo o suco foi removido. Só os óculos do garoto faram um pouco embaçados e ele limpou-os na camisa.
-- Então - Lily enxugou uma lágrima do olho direito e virou-se para Sirius - quem está "ligadão" na enfermaria?
-- Sabia que é muito feio ficar ouvindo a conversa dos outros, Srta. Evans? - retrucou Tiago, tentando ganhar tempo.
-- Ora essa, está me chamando de enxerida, Potter?
-- Num tá mais aqui quem falou - Tiago levantou as mãos para o ar, levando um olhar gelado da garota.
-- Então, Black? - ela voltou a encarar Sirius.
-- Hum... na verdade... é o Remo - os outros arregalaram os olhos para ele, que continuou sem se importar. - Ele voltou agora pouco da casa da tia meio gripado, sabe, por causa da mudança brusca do clima e coisa e tal, com dores no corpo, mas nada de grave. Então ele caiu na besteira de ir até a enfermaria e agora a Madame Pomfrey vai querer que ele passe o resto da semana de cama.
-- Verdade? Bem, então eu vou com vocês para tentar convencer a Madame Pomfrey - disse a ruiva, antes de ocupar-se com uma torrada particularmente lotada de geléia. Estava mais para geléia com torrada do que o contrário.
Os garotos se entreolharam, apreensivos e engoliram em seco. Não seria nada agradável para o pobre Remo se a garota o visse cheio de arranhões pelo corpo.
-- Não precisa, Evans - tentou Sirius.
-- É, o Sirius estava exagerando, ela não vai tentar segurar o Remo, não.
-- Ah, eu aposto que vai. Eu vou junto, só pra garantir. Quanto mais gente enchendo ela, mais rápido ela libera o Remo.
-- Não precisa mesmo - Sirius disse se levantando. - Nós já acabamos, estamos indo...
Tiago também se levantou. Pedro, porém pareceu desapontado.
-- Esperem, Pettigrew ainda não acabou.
-- Ele acabou sim - Tiago puxou o garoto por um dos braços roliços, fazendo-o derrubar a torrada que segurava com a geléia virada para a mesa.
-- Não! Aaaaaaaaaaaaah minha torrada...
-- Como você é grosso, Potter! Deixa o garoto terminar de comer!
-- Ele já acabou, Evans. Anda logo, Pedro - rosnou Sirius, contornando a mesa e puxando o garoto relutante (que insistia em tentar alcançar mais alguma coisa na mesa) pelo outro braço, forçando-o a levantar-se. - A gente se vê, Evans.
Eles correram para fora do Salão Principal arrastando Pedro.
-- Seu mula! - Sirius deu um tapa estalado na nuca do rapaz, fazendo os fios curtos levantarem no ar. - Por que você tem que ser tão guloso, heim?
-- M-mas...
-- Não tem mas nem meio mas. Calem a boca e andem, vocês dois - Tiago tentou colocar ordem na casa, porém de nada adiantaria...
-- Esperem! - gritou Lily surgindo no Saguão de Entrada e subindo a escadaria de mármore em passos largos (ou tão largos quanto ela conseguia) para alcançá-los.
-- Ai, não... - gemeu Tiago. Sirius deu outro tapa na nuca de Pedro "Viu o que você fez?".
-- Eu... também já... terminei... ai - a garota segurou um lado do corpo tentando respirar. - Vamos.
Eles caminharam em silêncio até a Ala Hospitalar, parando na porta.
-- Hum... - começou Tiago. - Evans... eu acho melhor a gente entrar primeiro, porque...
-- Porque o Remo pode não estar vestido corretamente... - completou Sirius
-- Isso. Sabe, né, ele deve estar fazendo uns exames de rotina...
-- E o Remo é meio aluado, entende?
-- Às vezes ele esquece de abotoar a camisa direito...
-- Ou fechar as calças...
-- Enfim, é constrangedor, nem tente imaginar.
-- Portanto é melhor você esperar aqui fora.
-- Mas... - Lily ia tentar argumentar quando...
BAM
Sirius bateu a porta da enfermaria bem na sua cara.
-- Ora essa! - a garota bufou e encostou na parede ao lado da porta. Essa história estava muito mal contada. Lily não conseguia imaginar Remo Lupin esquecendo de fechar as calças. Mas, por via das dúvidas, seria melhor esperar.
Os três garotos atravessaram a enfermaria até o último dos leitos, parcialmente envolto pela cortina branca. Madame Pomfrey, que estava medicando Remo, assustou-se ao percebê-los.
-- O que...? Ah, são vocês - ela revirou os olhos. Sua vontade era de escorraçá-los para fora, porém quase quatro anos tinham-lhe ensinado que seria inútil tentar.
Remo encarou-os com um sorriso cansado no rosto pálido e abatido.
-- Bom dia! - cumprimentou Tiago.
-- B-bom diaaaaaaaaaaaaaaaa! - bocejou o lobisomem.
Sirius lançou um olhar avaliativo no amigo. Aparentemente ele tinha um único arranhão visível no pescoço, próximo à orelha. Nada que uma gola alta não escondesse.
-- Então, Aluado, vamos para Hogsmeade? - perguntou displicentemente.
Remo lançou um olhar de esguelha para a enfermeira, que preparava uma dose de poção cicatrizante.
-- Nem percam seu tempo - respondeu ela sem se virar. - Esse garoto não sai daqui antes do jantar. Ele precisa repor suas energias...
-- Com os maravilhosos doces da Dedosdemel - completou Tiago.
-- E um canecão de cerveja amanteigada - foi a vez de Sirius continuar.
Pedro concordou com a cabeça, salivando só de imaginar. Remo sorriu.
-- Não, não e não. Agora saiam para que o Sr. Lupin possa descansar.
-- Ora, vamos, Papoula... - Sirius tentou fazer sua melhor cara de cachorro abandonado.
-- Mais respeito, rapazinho. Essa sua conversa mole não funciona comigo.
-- Ok, ok, Madame Pomfrey, não é sempre que temos essa oportunidade. Vai fazer bem para ele um pouco de ar fresco.
-- Isso está fora de questão, fui clara? Ele não está em condições...
-- Eu estou bem, Madame Pomfrey - Remo finalmente manifestou-se, esforçando-se para que sua voz saísse firme, apesar de fraca. - Não agüento mais ficar de molho nessa cama.
A enfermeira ia ralhar novamente, porém Sirius desesperou-se:
-- Madame Pomfrey, ouça, por favor. Tem uma colega nossa que estucou uma de nossas conversas e soube que Remo estava aqui - Remo arregalou os olhos e ficou ainda mais branco. - Nós tivemos que inventar que ele só tinha passado mal por causa da viagem que fez e que não era nada, ou seja, ele não precisaria faltar ao passeio. De outro modo, ela iria querer ficar e fazer companhia para ele. Ela está lá na porta neste exato momento esperando, porque nós prometemos sair dessa enfermaria com o Remo. Se por acaso nós sairmos sem ele, ela vai entrar feito um furacão e vai descobrir tudo, fui claro? Se a senhora tiver alguma dúvida das minhas palavras, pode verificar com seus próprios olhos - ele terminou, cheio de sarcasmo ajeitando o cabelo atrás das orelhas.
A enfermeira parecia balançada, porém continuou com sua pose severa. Virou as costas para eles e dirigiu-se até a porta com passos firmes, sem dizer nada. Ao abrir a porta, encontrou os olhos verdes e preocupados de Lily, preparando-se para dizer alguma coisa. Porém não houve tempo.
BAM
Novamente a porta foi fechada bem no seu nariz.
-- Ora mais essa! - exclamou a ruiva furiosa, voltando a apoiar-se na parede, de braços cruzados.
-- Você - Madame Pomfrey apontou o dedo para Remo ameaçadoramente enquanto se aproximava. - Quero que me prometa que vai se comportar, que vai ficar quietinho e acima de tudo não vai fazer esforço algum - alcançou a poção que estivera preparando e meteu-a debaixo do nariz do rapaz. - Tome isto e suma da minha frente.
Ela afastou-se resmungando e bateu a porta de sua salinha.
-- Pelas escamas do dragão adormecido, Sirius! Eu te encheria de beijos se fosse uma garota - Tiago recebeu um olhar torto e divertido dos amigos diante do comentário. - Apresse-se Aluado. A Evans deve estar soltando fogo pelas ventas do lado de fora. Não vai resistir por muito mais tempo.
Remo quase engasgou-se com a poção ao confirmar suas suspeitas sobre a identidade da garota. Limpou a boca no pijama e levantou-se, ajudado por Sirius, enquanto Tiago acabava de fechar as cortinas. Remo ainda estava um pouco dolorido e movia-se com lentidão, por isso aceitou a ajuda dos amigos para vestir-se e em poucos minutos eles abriram a porta da enfermaria.
Lily já estava decidida a entrar feito um furacão quando a porta se escancarou, fazendo-a desequilibrar-se e ser amparada por Tiago antes de estatelar-se no chão.
-- Me solte, Potter - seus olhos faiscavam, porém tornaram-se extremamente doces no mesmo instante em que ela encarou Remo. - Aí está você. Como se sente, Remo?
Tiago torceu o nariz, mas permaneceu quieto.
-- Já estou bem, obrigado. Só um pouco cansado da viagem.
-- Será que não seria melhor mesmo você ficar e descansar...
-- Nem brinque com isso - cortou Sirius. - Depois do trabalhão que tivemos para ele ser liberado?
Remo sorriu marotamente para a garota, o que acabou convencendo-a de que talvez ele não precisasse tanto de descanso mesmo.
-- Humpt! - a garota lançou um último olhar de censura para os outros e virou-se, seguindo para a sala comunal.
-- Ufa! - Pedro suspirou aliviado.
-- Ufa mesmo - enfatizou Tiago. - Que ruivinha teimosa!
-- Essa exclamação ficou redundante, Tiago - Sirius fez cara de professor de gramática. - Se é ruiva, então é óbvio que é teimosa.
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N.A. Nenhuma review! Ok, eu entendo que todo mundo deve estar meio ocupado com o Half-Blood Prince (e com esse eu não consigo competir, não é mesmo?) então fico menos preocupada. Só espero que quem lê minha fic esteja realmente gostando.
Eu tenho postado nos dias que prometo, mas parece que esse site demora demais para atualizar. De qualquer forma, vou atualizar quinta-feira.
Bjos para todos. Não se esqueçam de mim!
