Capítulo 9

Kamus passou a mão pelos cabelos, jogando-os para trás. O sol entrava fraco pela janela da sala do Grêmio e Kamus observava distraidamente as sombras que se formavam na mesa. O ano ainda estava na metade e Kamus já se sentia cansado. Também pudera! Depois da semana de suspensão que ganhara de presentinho após aquela droga de acampamento, as coisas só pareciam piorar, os deveres aumentavam e ele parecia nem ter mais tempo para si.

- Ôôôô, Terra para Kamus, Terra para Kamus, responda, criatura infeliz!

Kamus balançou a cabeça algumas vezes, acordando do seu transe momentâneo.

- Desculpe, Dite, me perdi na minha cabeça... - Sorriu. - O que é que você estava dizendo mesmo?

Afrodite suspirou, jogando os papéis que estava lendo de canto e escorregando na cadeira.

- É melhor deixar para lá, senhor presidente, ao menos por hoje. - Consultou o relógio do celular. - Já são cinco da tarde e eu estou tão cansado quanto você.

- Não, nós temos que terminar o nosso trabalho de hoje, não podemos sair assim! - Kamus pegou os papéis e começou a folheá-los.

- Nem eu e nem você estamos em clima para terminar isso, então é melhor deixar para depois e fazer bem feito do que fazer tudo correndo e ficar uma droga! E, aliás, hoje é sexta-feira, e o Kanon e o Saga chamaram a gente para ir ao shopping e depois ir dormir na casa deles. - Fez uma pausa, mas Kamus não se pronunciou. - Não sei quanto a você, mas eu vou!

- Eles já superaram o trauma?

- Do acampamento?

- É.

- Bom, acho que depois de xingarem-se de todos os nomes obscenos conhecidos, xingarem você com estes e mais um monte de outros, terem chorado a noite toda... é, se conformaram com a idéia de não serem os melhores do mundo. - Contou Dite, rindo levemente. - Mas eles foram muito bem, não? Ganharam todos os jogos!

As lembranças daquele acampamento voltaram a sua mente. O mala do garoto do primeiro ano, a menina com a qual ficara, as competições...

Aquele lugar lindo que curtira com Miro. O próprio Miro. Aquele rolo todo depois...

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- E Então, quem começa a me explicar?

Miro fez a cara mais inocente do mundo.

- Explicar o quê, professor? Eles já não explicaram tudo?

- Engraçadinho você, não, Miro? - O professor estava visivelmente irritado.

Kamus suava frio, embora sua expressão estivesse impassível. As mãos atrás do corpo seguravam firmemente o cabelo.

Não pergunte o que eu penso que você vai perguntar, não pergunte..., implorava a mente de Kamus.

- O que é que vocês dois estavam fazendo enfiados aí dentro a noite toda?

Aiii, perguntou!

- Bom, é que... er, veja bem...- Miro começou a tentar explicar, mas nenhuma idéia vinha a sua mente. Gesticulava, movia os lábios e nada. Pense, cérebro, pense, uma vez na vida, só uma vez...

- Eu e Miro não estávamos nos dando muito bem, professor. Então, depois do que aconteceu, pensei que seria melhor se conversássemos e resolvêssemos essas nossas diferenças. - Kamus falou sério, olhando fixamente nos olhos do professor. Não era tão bom ator quanto Shaka, mas agora teria que servir.

- E precisavam atravessar o lugar inteiro para isso, sendo que vocês estão na mesma barraca?

Miro já via seu futuro: Expulso da escola, enforcado pela família e esquartejado por Kamus, que certamente teria uma marca negra bem feia em seu histórico escolar depois daquilo.

Kamus engoliu em seco, tomando força para falar.

- Sim!

Todos olharam para ele, um tanto desconsertados.

- Sim?

- É! - Disse, e mesmo tenso, sua voz soou naturalmente. - Depois do rolo que aconteceu, não daria para conversarmos aqui! Todo mundo iria ficar importunando! E também, quando fomos para lá, planejávamos voltar antes da hora de entrar... mas aí a gente embalou na conversa e quando percebemos já estava amanhecendo!

Pensando bem, a desculpa até era bem convincente. Nem Kamus conseguia acreditar que havia criado aquilo tudo em segundos! E ainda havia conseguido soar convincente.

Miro teve que lutar contra sua boca, que teimava em ficar aberta.

- Isso é verdade, Kamus? - Lógico que o professor desconfiou

- Professor, você acha que eu, sendo o presidente do Grêmio Estudantil e um dos melhores alunos da escola, teria por que mentir para você? - Fez-se de ofendido. - Afinal, se o senhor descobrisse mais tarde que eu havia mentido, isso não traria muito mais problemas para mim? - Apertou ainda mais o cabelo contra o corpo, apreensivo.

A frase "Kamus, meu herói!" piscou na cabeça de Miro.

- É, você tem razão quanto a isso... – Disse o professor depois de raciocinar um pouco. - portanto vou fingir que esse sumiço de vocês não aconteceu. - Disse finalmente.

Aquilo parecia definitivamente encerrado, ao menos para Kamus. Para Miro era apenas uma preocupação a menos. Os dois já estavam na metade de um suspiro de alívio, quando o professor tornou a falar.

- Mas, ao que parece, Kamus, você sabia da existência da vodka.

Pausa momentânea.

- Ahn, e como não haveria de saber, né, afinal, ele estava na minha barraca e é claro que eu a vi uma ou duas vezes... - Falou simplesmente.

A frase "Kamus, sua anta!" piscou na cabeça de Miro.

- Ou seja, você sabia e não se pronunciou?

- Ahn., eu posso explicar...

- Então você foi cúmplice deles?

- Não, não tem nada a ver, eu só... eu só...

- Até entendo você não querer prejudicá-lo, Kamus, mas infelizmente você já escapou de ser punido por ter sumido, não vou poder fazer nada em relação a isso.

A cor do rosto de Kamus evaporou-se.

- O... o que vai acontecer comigo...? - Temendo a resposta. A palavra "Expulsão" brilhava como um imenso letreiro de neon em sua mente.

- Provavelmente o mesmo que com esses outros alunos. - Referindo-se a Miro e sua turma.

- Expulsão... ? - Se fosse, Miro e seus amiguinhos conheceriam o lado mais negro da mente de Kamus.

- Não, acho que não precisamos pegar tão pesado assim, afinal, todos confessaram. E, como você bem sabe, a escola jamais expulsaria você! As suas notas e o número de prêmios que a escola ganhou por sua causa não permitiriam isso! Vocês pegam uma advertência, talvez até uma suspensão, nada assim tão grave.

Beeeeeeeem... não era exatamente uma boa notícia... mas Kamus não estava em posição de reclamar.

Respirou, parcialmente aliviado.

- Bem, podem voltar para a barraca agora. - Disse o professor.

- Ahhh, claro! - Os dois meninos sorriram, mas não saíram do lugar.

- Ahn... - O professor não entendeu porque Miro e Kamus ainda estavam ali. - já falei que vocês podem ir...

Miro sabia exatamente porque Kamus não se movera. Se alguém visse a camiseta dele teriam ainda mais problemas.

- É, a gente sabe! - Kamus deu um sorriso idiota.

- E...?

O monitor tentava pensar em alguma história tão plausível quanto a outra, mas sua criatividade estava deixando-o na mão dessa vez. Se andasse, todos veriam a mancha marrom em sua camiseta e perceberiam que era sangue. Como explicar o que ele e Miro fizeram? Por outro lado, se ficasse ali parado, levantaria ainda mais suspeitas.

Era hora de o calouro provar que também podia ter idéias brilhantes. Sairiam livres dessa e... e Miro tiraria um proveito básico da situação.

- AHHH, É ISSO AE, AMIGÃO! - Miro gritou, assustando todos. Olhou para Kamus e, sem avisar, pulou sobre suas costas, envolvendo a cintura dele com as pernas e segurando firme em seu pescoço. Kamus quase desequilibrou, segurando Miro pelas coxas como conseguiu. - AGORA VAMO'NESSA! - Miro apontou para frente.

Kamus começou a andar com dificuldade, carregando Miro nas costas, com dez olhos assustados colados ns costas do calouro.

Quando já estavam a uma distância segura, Kamus se pronunciou.

- Pronto, já escondeu bem! Agora desce das minhas costas!

- Ahh, que nada, deixa eu aqui mais um pouco, vaieee! - Pediu Miro, enterrando o rosto nos cabelos de Kamus.

- Você é mesmo um folgado, hein, Miro! - Reclamou. - Não tinha nenhuma idéia melhorzinha, não?

- Booom, eu poderia ter te emprestado a minha jaqueta...

Kamus bufou.

- E por que é que você não me emprestou?

- Por que você não pediu! - Riu, dando um beijinho na orelha dele.

Os pêlos da nuca de Kamus se eriçaram, mas ele fez que nada aconteceu.

- Espera só até chegarmos na barraca... - Disse entre dentes.

- Huhuhuhu, mal posso esperar! - Mil coisas deli(mali)ciosas passaram pela cabeça de Miro.

- Não é nada disso, seu pervertido!

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- É, mas mesmo assim não conseguimos ganhar. - Kamus sorriu, apoiando o cotovelo na mesa e o rosto na mão. - Quem diria que só por causa do fantástico desempenho de Mu na natação, a equipe Aquário ficaria em segundo lugar, não? - Sorriu.

- Hahahaha, é mesmo! Fiquei feliz por ele! - Dite deu um sorrisinho esperto e desviou o olhar para fora da janela. - Mas acho que quem ficou mais feliz com isso foi o Shaka...

Kamus franziu as sobrancelhas.

- O que quer dizer?

- Nada não! - Afrodite apressou-se em dizer. Às vezes se esquecia de que ele era o único com olhos ali. - E então, vai ou fica?

Quando Kamus foi responder, alguém bateu na porta. Os dois se entreolharam, estranhando.

- Chamou alguém? - Afrodite.

- Não! - Kamus. - E as atividades da tarde já acabaram, não?

- Aham, só a gente que ficou aqui depois do horário.

Bateram mais uma vez.

- Entre! - Anunciou Kamus.

A porta abriu lentamente. Um jovem de cabelos azuis enfiou a cabeça para dentro da sala, espiando o lugar. Era a primeira vez que ia à sala do Grêmio.

- Miro? - Kamus franziu as sobrancelhas.

- Ahh, o calouro! - Afrodite sorriu. - E então, garotinho, o que veio fazer aqui?

Miro entrou, encostando a porta atrás de si, o rosto contraído por causa do "garotinho".

- "Garotinho", meu bem, é o que eu carrego dentro da cueca. - Disse com má-criação.

- Huuu, está ficando interessante! - Afrodite sorriu safado.

- Er... querem parar com essa discussão idiota? - Kamus estava constrangido com aquela conversa toda. Constrangido e... com um pinguinho de ciúme.

- Oh, desculpe. - Pediu Afrodite, sorrindo.

- E então, o que quer aqui?

- Ah, eu vim para... para conversar, oras! Preciso de motivo para visitar o Grêmio agora?

- Quando foi a última vez que você veio aqui?

- Ahn... pois é, eu queria conhecer...

- HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA! - Afrodite caiu na risada.

Os dois olharam para ele.

- Afrodite, porque você tá rindo?

- Ahhh... é que... sabe, é o seguinte... - Parando de rir gradualmente. - Vocês mudaram muito desde a primeira vez que se encontraram!

Miro e Kamus franziram o cenho e disseram ao mesmo tempo:

- Mudamos é?

- Sim! - Afrodite se permitiu mais um risinho. - Vocês discutiam e se xingavam, lembram-se? Hihihihi, agora vocês só discutem! Uma evolução, não?

Coraram violentamente.

- Cala essa boca, Afrodite - Kamus reclamou, envergonhado. Tinha a ligeira impressão de que os olhos do amigo mostravam que ele sabia de alguma coisa a respeito de seu namoro secreto com o calouro, mas decidiu não comentar nada. Se fosse só impressão, daria motivos para Afrodite desconfiar... e Afrodite não desconfia, sabe; E se não sabe, não sossega até descobrir.

- Ok, Kamus. - Afrodite revirou os olhos. Estava na hora de deixá-los a sós. Consultou mais uma vez o relógio do celular. - Bom, meus fofinhos, eu vou indo que ainda tenho muito o que fazer antes de ir para a casa dos gêmeos! - Levantou-se e agarrou a alça da mochila, colocando-a nas costas.

- Certo... - Disse simplesmente, Kamus.

- Vê se aparece, viu? - Afrodite sorriu. - Isto é, se você não tiver que ficar aqui até mais tarde, né? - Piscou.

Kamus até iria perguntar a que ele estava se referindo ao falar aquilo, mas Dite saiu correndo da sala, fechando a porta com um estrondo.

Os passos de Afrodite foram ouvidos por alguns segundos, depois tudo ficou em silêncio.

Miro encarou Kamus com um sorriso de luxúria. Vendo que estavam sozinhos, avançou para cima do mais velho, prensando-o contra a mesa e atacando sem piedade sua boca.

Kamus retribuiu na mesma intensidade, passando os braços em torno do pescoço dele e roçando as unhas em sua nuca.

Eram dois extremos: o assanhado e o bom moço. Kamus, sempre de forma inocente, acariciava as costas dele. Já Miro, louquinho para passar para a próxima etapa, colocou uma das mãos no ombro de Kamus para forçá-lo a deitar-se na mesa, enquanto a outra se encaixou perfeitamente na concavidade entre as pernas dele.

- EEEEI! - Kamus empurrou-o, totalmente vermelho.

- Ué, que foi? - Miro não entendeu. - Não somos namorados, oras?

- Sim, somos... - Kamus arrumava o cabelo. - mas estamos na escola, oras! E se alguém entrar?

- Corta essa, Kamus, todo mundo já foi embora, só sobrou a gente! - Impaciente.

- Ahh, mas apaga esse fogo, Miro! A última vez que fizemos nem faz tanto tempo assim...

- A ÚLTIMA e ÚNICA vez que fizemos foi há quase um mês, amorzinho!

- Bom, não tivemos mais oportunidade, né... - Tentou desviar-se.

- Na verdade tivemos uma semana inteira de oportunidades, mas você se recusou a sair comigo na semana da suspensão!

- Estávamos os dois de castigo, lembra-se?

- Mas nossos pais trabalham o dia todo, você poderia ter escapulido e ido em casa para gente aproveitar!

- Eu sei, mas e se os seus pais chegassem? Como iríamos explicar?

Miro suspirou, se jogando de lado numa das cadeiras, apoiando um braço no encosto e o outro na mesa.

- Eu entendo o seu medo... - Disse, fitando o chão. - Acontece que, se somos namorados, temos o direito de fazer tudo o que os outros namorados fazem. Sair junto, assistir filme na sala, beijar na paraça... transar também, oras!

- Eu sei, eu sei... - Kamus encostou-se na mesa e focou o mesmo ponto no chão que Miro. - Mas, pro nosso azar, isso tudo ainda é proibido para gente...

- Não é proibido...

- Você pretende contar a seus pais?

Miro abriu a boca, mas a resposta só saiu segundos depois, baixa e frustrada.

- Não...

- E deixar a escola toda saber disso?

- Não também...

Silêncio.

- Eu também não... - Falou, igualmente frustrado.

- Por que tudo tem que ser mais difícil para quem se ama? - Comentou Miro, olhando pela janela o horizonte lentamente tornar-se azul.

- Não é difícil para quem ama... - Suspirou. - É só que... a gente ama errado, né...

- Não existe amor errado, Kamus... existem pessoas que não entendem esse amor... - Sua voz soou naturalmente.

Kamus arregalou os olhos, erguendo-os e pousando-os no rosto sereno de Miro voltado para a janela. Sua boca esticou-se num sorriso...

- HAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA! - ...Que logo virou uma gargalhada.

- Que foi? - Miro piscou.

Kamus demorou alguns segundos para parar de rir.

- Nada, nada... - Conservou um lindo sorriso. - É que não estou acostumado a ouvir você falar coisas úteis!

O calouro ficou indignado com o comentário.

- Não está porque ficou me evitando esse tempo todo! - Mostrou a língua. - Se andasse mais com o SEU NAMORADO, saberia que ele fala um monte de coisas úteis o tempo todo!

Foi a vez de Kamus lançar um sorrisinho malicioso.

- Se eu andasse mais com o MEU NAMORADO... - Ele avançou para cima de Miro, dando-lhe um selinho. - ele não teria chance de falar nada... - Mais um beijo apaixonado.

E mais uma vez, quando Miro tentou avançar o sinal, Kamus e repeliu com delicadeza.

- Ahh, se não vai ir até o fim, então não me deixa com vontade!

- Hahaha, e por que não, se a maior graça é te ver assim, com essa carinha de quem tá com fome longe da hora do almoço? - Disse Kamus, divertido.

- Você se diverte judiando de mim, né?

- Ahh, só um pouquinho, chéri!

Mais silêncio. Miro voltou a admirar a paisagem fora da janela, o céu já estava inteirinho azul e não demoraria até ficar preto.

- Kamus...

- Diga.

- Não podemos contar aos nossos pais, né?

- Até podemos, mas eu ainda tenho amor ao meu pescoço...

- Cala boca! - Repreendeu Miro, em tom sério. - O que eu tenho para falar é sério.

- Milagre!

- Kamus, dá para cooperar?

- Desculpe...

- Certo... - Suspiro. - E se contássemos a seus amigos?

Kamus franziu o cenho.

- E qual benefício isso traria?

- Eles nos acobertariam... tipo, você diria para sua mãe que ia dormir na casa de um deles e a gente saía para passar a noite juntos...

- Brilhante, gênio. - Disse com ironia. - Agora, como você vai explicar para a sua mãe que vai passar a noite com os meus amigos?

- O que sugere?

- Vamos contar para os seus amigos também.

- Eles já sabem. - Disse com pouco caso.

Os olhos de Kamus se esbugalharam até ficarem como bolas de tênis.

- C-como assim?

- Se tivesse me procurado você saberia. - No mesmo tom. - Eles descobriram.

- Como?

- Eles suspeitaram da sua história, porque sabem que eu jamais atravessaria um bosque só para conversar com alguém com quem eu cismei. E sacaram no momento em que eu montei de cavalinho em você.

- Ahn?

- É que eu nunca fiz isso com nenhum deles, por outro lado já montei de cavalinho em duas ex minhas...

Kamus passou a mão pelos cabelos, agora ainda mais assustado.

- Cara, tô abismado com a sua falta de noção... pobres garotas...

- Bom, o importante é que elas são ex e os meus amigos já sabem. - Miro levantou-se, ficando frente a frente com Kamus. - Agora é sua vez de contar aos seus...

Respirou fundo antes de falar:

- Eu não sei...

Pela primeira vez, Kamus mostrava-se inseguro diante de alguma coisa. Miro compreendia e não o culpava. Também não se sentia totalmente seguro ainda. O ambiente escolar pode ser muito cruel às vezes. Sabia o que aconteceria aos dois se aquela história vazasse. Não era estranho ter medo de contar aos amigos e ser traído mais tarde.

Talvez, porém, o maior medo fosse os amigos se afastarem. Isso seria um golpe duro para qualquer um. Numa situação dessas, quando não se pode contar muito com a família, a saída são os amigos... mas não havia certeza de que eles apoiariam. E, caso não apoiassem, não adiantaria nada aquela frase romântica "se estivermos juntos, nada poderá nos deter". O mundo não era um livro. E ambos sabiam muito bem disso.

- É arriscado, eu sei... - Miro apoiou as mãos nos ombros de Kamus. - Mas precisams tentar...

Kamus olhou-o nos olhos.

- O que foi que eles disseram?

- Que era estranho... - Miro falava baixinho. - Mas que se era isso que eu queria, eles não iriam fazer nada contra... e iriam guardar segredo...

Pausa.

- Você acha que os meus também vão encarar assim?

Antes de responder, Miro permitiu-se lembrar do acampamento. De quando fora conversar com Afrodite, de como este lhe incentivara a conquistar Kamus. Lembrou-se também do lourinho e do outro observando as estrelas, visivelmente apaixonados. Sorriu.

- Eles vão encarar melhor ainda, acredite em mim!

Diante daquele lindo sorriso, Kamus sentiu-se mais seguro. Sorriu levemente e envolveu o corpo de Miro num abraço de amor e alívio.

- Vou contar na segunda... - sussurrou no ouvido dele.

Miro apoiou as mãos nos ombros dele.

- Quer ir embora agora? Eu vou até sua casa com você se quiser...

Kamus apenas meneou a cabeça num "sim".

- Mas... a sua casa é longe da minha, não é? - Lembrando-se de quando trocaram endereços.

- Ah, tô sem o que fazer mesmo! Aproveito para ver a sua casa!

Trancaram a sala e saíram da escola. Na rua não caminharam de mãos dadas, mas mantiveram-se sempre um bem próximo do outro, os ombros quase grudados.

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Na segunda-feira de manhã, Miro procurou Kamus no intervalo para que ele contasse, mas o rapaz insistia que queria esperar um pouco mais. O dia acabou e nada. Na terça, a mesma coisa. E na quarta, e na quinta...

Foi na sexta-feira que Miro perdeu a paciência.

- Que droga, Kamus, quando é que você vai resolver contar, hein? – Falou alto. - Você enrolou a semana inteira! - Deu um longo gole no refrigerante.

- Shiu, Miro! - Fuzilou-o com o olhar. - Não é para ficar anunciando isso por aí!

Só então Miro rodou os olhos pela classe do segundo ano. Todos os presentes olhavam para os dois, tentando entender o que acontecia.

- Aiai, foi mal... - Disse baixinho, voltando para o namorado.

- Você é muito indiscreto! - Reclamou. - Aliás, o que ainda tá fazendo aqui?

- Hm? - deu uma mordida no lanche. - Tô lanchando com você!

- Você veio lanchar comigo todos os dias, ninguém tá entendendo nada. - Apontou para as pessoas da classe, que cochichavam olhando de esguelha para os dois.

- Acha que eles suspeitam?

- Estão estranhando o fato de que no começo do acampamento a gente queria se matar e agora estamos comendo o lanche juntos. - Deu de ombros. - Mas suspeitar? Duvido muito!

- Ah tá... E onde é que estão os seus amigos que eu não vi a semana toda?

- O Shaka está correndo atrás de umas coisas para o teatro, o Mu tá ajudando ele, os gêmeos estão caçando mulher e o Afrodite... - Não se lembrava de Afrodite ter dito alguma coisa. - Ah, ele simplesmente some quando bate o sinal.

- Hm... Mas então, Kamus, quando é que você vai resolver falar?

- Bem... pode ser na segunda?

- Não, Kamus, não pode! - Miro falou duro. - Ou fala hoje ou...

- Ou...?

Miro inclinou-se um pouco na direção de Kamus e murmurou.

- Ou a gente termina o namoro agora mesmo.

Kamus arregalou os olhos.

- C-como assim? Por quê?

- Porque você enrola demais, Kamus! Francamente, eu não tenho mais paciência para esperar você criar coragem! Ou é hoje ou acabou!

O sinal de entrada tocou. Miro se levantou e olhou fixamente nos olhos de Kamus.

- Hoje eu vou matar o treino de Handebol. Te espero na saída às 4 da tarde. Dê um jeito de reunir os seus amigos e me encontre lá, ok? - E sem esperar resposta, Miro foi embora.

Kamus enterrou a mão nos cabelos, apoiando o cotovelo na mesa. Não havia muito o que fazer agora... se queria continuar com Miro, teria que contar. Sabia que os amigos não o deixariam de lado e nem sairiam contando, mas... isso não animava tanto assim. E se estivesse errado? E se os amigos se distanciassem dele?

Respirou fundo quando viu os gêmeos entrarem. Não tinha muitas opções...

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Kamus consultou o celular pela enésima vez naquela tarde. Eram 03h45min.

Ele e Afrodite estavam sozinhos na sala do grêmio. Kamus havia dispensado os outros membros não fazia muito tempo.

- Afrodite.

- Diga, Kamus.- Afrodite parou de escrever e olhou para ele.

- Onde estão o Shaka, o Mu e os gêmeos? - Perguntou como quem não quer nada, olhando pela janela. O treino de Handebol estava acontecendo, mas ele não via os cabelos azulados em ponto nenhum da quadra.

- Hmmm, deixa eu ver... - Afrodite apoiou a caneta no queixo e olhou para cima. - O Shaka tá no ensaio do teatro, o Mu na aula de astronomia e os gêmeos, de certo, vendo site de pornografia na sala dos computadores.

- Aqueles dois não prestam mesmo! - Riu Kamus, tentando se distrair do próprio nervosismo.

- Ah, o Mu e o Shaka fazem coisas úteis para compensar as inúteis daqueles dois!- Afrodite riu junto. - Mas por que quer saber?

Kamus parou instantaneamente de rir.

- Dite, posso te pedir uma coisa? - Afrodite fez que sim com a cabeça, então Kamus continuou. - Poderia reunir todo mundo para mim?

Afrodite franziu as sobrancelhas.

- Para quê?

Kamus fitou o tampo da mesa e respirou fundo, tomando coragem. Seu cérebro e coração pareciam ferver de tanto nervosismo.

- Eu tenho uma coisa para conversar com vocês. - Passou as mãos pelos cabelos, levantando-se em seguida. - Mas precisam estar todos juntos.

Afrodite demorou um instante para entender, mas quando o fez, um pequeno sorrisinho brotou no canto da sua boca. Será que era o que estava pensando? Será que Kamus finalmente iria revelar o que realmente acontecera naquele acampamento? Será que Kamus iria explicar o porquê de Miro e ele estarem tão grudados nos últimos tempos?

- Claro, eu posso reuni-los. - Afrodite se desfez do sorriso e caprichou na expressão de inocência, levantando-se. - Mas você não quer ir comigo? Vai ser mais fácil arrancá-los de lá!

- Er... é que eu tenho que fazer uma outra coisa antes! - Apressou-se em dizer.

Afrodite sorriu levemente, confirmando suas suspeitas.

- Certo! Então a gente vai te esperar na ante-sala do teatro, tudo bem?

- Tá bom, me esperem que eu já estou indo... - Disse hesitante.

Afrodite despediu-se e saiu pela porta. Kamus apoiou as mãos na mesa e curvou o corpo. Suspirou longamente.

- Agora não dá mais para voltar atrás, Kamus... - Falava baixinho para si mesmo. - Você tinha duas opções: Ficar com Miro e correr o risco de ficar sem os amigos ou ficar sem Miro e continuar na mesma com os amigos. - Sorriu nervosamente. - Pelo jeito o Miro é algo bem importante para você...

No celular, 03h55min. Chega de enrolação, estava na hora de decidir aquela história toda. Ergueu o rosto e pegou sua mochila. Saiu da sala a passos apressados, com as pernas tremendo levemente.

Chegou no horário exato ao portão de saída. Miro já esperava, sentado no chão, as costas apoiadas no muro, os braços seguravam os joelhos enquanto ele olhava concentrado para o chão à frente. Não pôde deixar de achar aquela cena digna de um quadro. Miro era lindo e ficava ainda mais quando estava concentrado em seus pensamentos.

- Me esperou muito? - Ele estendeu a mão para ajudar o outro a se levantar.

O garoto levantou o rosto, fitando Kamus e abrindo um leve sorriso.

- Estava com medo de você não aparecer e eu ter que cumprir a promessa que fiz. - Miro pareceu respirar aliviado quando agarrou a mão do namorado e içou o corpo.

- Eu estava com medo de você cumprir a promessa. - Kamus, no entanto, não parecia tão aliviado assim. - Vamos então, eles estão esperando lá no prédio do teatro.

- Ok... - Miro espanava a poeira da bermuda, seguindo Kamus de perto.

Ficaram em silêncio o caminho todo. Kamus estava tão nervoso que não queria falar nada, enquanto Miro estava com medo de falar algo que atrapalhasse a concentração do outro.

Chegaram ao prédio da sala de teatro. No momento em que Kamus cruzou a porta de entrada, suas pernas vacilaram e por pouco ele não tropeçou. Da cintura para baixo, tudo tremia sem parar;da cintura para cima, seu corpo parecia adormecido. Seu coração batia tão acelerado que parecia a ponto de estourar a caixa torácica.

Miro suspirou. Começava a se sentir culpado por forçá-lo a contar. Mas não via outra solução. Precisavam de um lugar onde pudessem se curtir em paz, onde não fossem apontados. Os amigos surgem nessas horas, para apoiar e acobertar. Senão, poderiam se considerar uma versãodistorcida de Romeu e Julieta, onde as famílias não se conhecem, não se odeiam e mesmo assim eles estão proibidos de se amarem como querem. Suspirou. A vida pode ser muito difícil às vezes.

Kamus abriu uma das portas, a que dava para a ante-sala do teatro. Pôde ouvir as vozes de Afrodite, Mu, Saga e Kanon. Segurou a mão de Miro inconscientemente e adentrou a sala, afastando as cortinas negras que pendiam do teto e desviando dos objetos cênicos espalhados por ali.

- Ahh, aí está ele! - Afrodite sorriu quando viu Kamus afastando a última cortina. Seu sorriso se alargou ainda mais quando viu Miro logo atrás.

Estavam todos sentados em um semicírculo no chão.

- Ah, você trouxe aquele encosto junto! - Comentou Saga com desdém.

Miro torceu o nariz. Kamus soltou sua mão e passou-a pelos cabelos, aproximando-se.

- Não enche, Saga. - Passeou os olhos pela sala. - Onde está o Shaka?

- Já fomos chamá-lo, ele disse que já estava vindo! - Mu disse com sua típica voz doce, sorrindo.

- Tá, você queria falar com a gente, mas o que é que essa criança tá fazendo aqui? - Kanon apontou para Miro.

- Ei, quem você chamou de criança? - Miro fez menção de ir para cima de Kanon, mas Kamus colocou a mão em seu ombro e censurou-o com o olhar, fazendo-o parar instantaneamente.

- Ele tem a ver com o que eu tenho para falar. - Kamus anunciou e suas pernas quase vacilaram novamente.

Afrodite só faltou dançar de alegria. Era exatamente o que pensara.

- Tô aqui!

Todos se viraram para a porta dupla que separava o teatro daquele cômodo. Shaka encostava a porta.

- Mas que roupinha, hein, Shaka? - Kanon deu um sorrisinho de sarcasmo.

Mu havia reparado bem nas roupas do amigo. Shorts pretos curtos deixavam suas compridas e torneadas pernas à vista de todos, a camiseta regata branca, mesmo sendo larga, delineava seu corpo, além de deixar seus braços firmes bem visíveis.

- Roupas compridas prendem os movimentos do corpo e impedem o ator de encarnar o personagem. - Disse categórico, sentando-se ao lado de Mu, que desviou o olhar do loiro imediatamente.

- Tá, metido, agora fica quieto que o Kamus quer falar! - Saga riu, voltando-se para Kamus. - Ok, o que é que você tem para falar para gente que envolve o encosto?

Havia chegado a hora. Não tinha mais como escapar. Todos o encaravam, esperando que ele começasse a falar. Abaixou o rosto e entreabriu os lábios, mas sua voz não queria sair. Sentiu-se terrivelmente mal naquele momento, sua maior vontade era sair dali correndo. Não sabia por onde começar, só sabia que teria que contar de alguma forma. Por que seus amigos não descobriram sozinhos, da mesma forma que os de Miro? Daí só teria que dar as explicações, não precisaria começar pelo começo. Droga! As pernas tremiam e os dentes batiam, ele estava nervoso demais, mais nervoso do que jamais estivera.

Quando seus olhos encheram de lágrimas, uma mão agarrou firmemente a sua. Espiou pelo canto dos olhos. Miro segurava sua mão com força e seus olhos o fitavam, cheios de confiança. Apenas uma forma de dizer "Estou aqui com você, não tenha medo". Kamus assentiu com a cabeça uma última vez. As lágrimas não escorreram, mas mesmo assim ele passou a mão pelo rosto. Tinha tudo para sair bem daquela situação e, como já sabia, não havia mais para onde correr. Ergueu o rosto e encarou demoradamente cada um dos amigos, que o olhavam com cara de interrogação. Respirou fundo.

- Gente, eu... - sua voz saiu baixa, mesmo ele se esforçando muito. - eu só quero dizer que... bom...

- Kamus, não faça rodeios, por favor... - Afrodite pediu com a voz igualmente baixa. Entendia perfeitamente o que ele sentia, apesar de nunca ter passado por nada do tipo.

Kamus respirou fundo mais uma vez.

- Eu e o Miro estamos namorando.

Foi um choque, todos arregalaram os olhos. Nenhum comentário estúpido dos gêmeos. Nenhuma ironia por parte de Shaka. Sem o sorriso calmo de Mu. Sem palmas por parte de Afrodite. Nada. Mu, Shaka e os irmãos certamente não esperavam por aquilo. Já Afrodite achou que não era uma situação comemorável. Pensou que estouraria até champanha quando aqueles dois se assumissem, mas percebeu que não era assim, que eles não estavam muito felizes em fazer isso.

- Nossa... - Shaka foi o primeiro a se pronunciar, pegando a ponta da trança loura e passando-a pelo rosto, encarando o chão. - Isso é um tanto inesperado...

Mu não se pronunciou, mas também olhou para o chão. Sentiu-se estranho diante daquilo. Aquilo o pegara de surpresa, é verdade, mas não lhe pareceu nada de mau. Colocou-se no lugar de Kamus e... e estranhamente, Shaka apareceu no lugar de Miro, lhe dando força, segurando sua mão...

Balançou a cabeça, a fim de afastar aquilo de sua mente.

- Mas não tem problema... - comentou Mu baixinho.

Kamus esbugalhou os olhos e piscou várias vezes.

- Como disse, Mu?

- Eu disse que não há problema. - Com o indicador começou a desenhar no chão. - Por que haveria problema em duas pessoas que se gostam ficarem juntas?

- É, eu também penso assim, mas não é todo mundo que tem essa opinião... - Kamus, sentindo-se um pouco melhor para falar.

- Nós sabemos bem disso, mas para nós não há problemas, não é mesmo, Kanon? - Saga sorriu.

- Claro, o importante é que você seja feliz! - Kanon também sorriu.

Era a primeira vez que os gêmeos se comportavam como "pessoas normais", sem dar escândalo ou fazer piadinhas estúpidas.

Kamus soltou um suspiro de alívio.

- Foi mal ter demorado tanto tempo para contar a vocês... - Kamus sorriu sem graça.

- Ah, nem esquenta! - Shaka levantou-se e ajudou Mu a se levantar, sorrindo. - O importante é que você contou e provou que confia na gente!

- Não se preocupem! - Saga também se levantou, sendo seguido por Kanon. - Guardaremos segredo até quando vocês acharem que deve!

- Para sempre? - Miro e Kamus ao mesmo tempo.

- Se quiserem... - Kanon.

- Ahhhh, que ótimo! - Afrodite escancarou um sorriso que ia de orelha a orelha, levantando-se também. - Não precisam ter vergonha de si por causa disso, entenderam bem? - Os dois assentiram. - E quem sabe a coragem de vocês dois não estimulem outras pessoas a se declararem? - Olhou de canto para Mu e Shaka por um instante.

Mu corou um pouco e fingiu estar examinando o móvel antigo em que estivera encostado até aquele momento. Shaka parecia concentrado em espanar as roupas com as mãos.

- O que você quer dizer com isso, Dite? - Kamus franziu o cenho, assim como Miro, Saga e Kanon.

Pelo que parecia, Kamus continuaria cego aos acontecimentos ao seu redor.

- Esquece! - Riu.

- Ei, Saga... Lembrei de uma coisa agora...

- Do que, Kanon?

Todos olharam para os gêmeos. Coisa boa não havia de ser...

- KAMUS! - Saga avançou para cima do garoto, colocando o dedo na ponta do nariz dele. -QUANDO É QUE VOCÊS COMEÇARAM A NAMORAR?

- Shhhh, sua ameba, não grite ou o professor de teatro vai brigar comigo depois! - Shaka repreendeu-o.

- Você ouviu, sua ameba, responda baixo senão o Shaka toma bronca! - Saga apertou a ponta do nariz dele.

- Ele não entendeu, né? - Shaka.

- Não, só para variar. - Afrodite.

- Ahhh, foi... foi... – Kamus olhava fixamente para o dedo apoiado em seu nariz.

- No último dia do acampamento, por quê? - Miro respondeu meio mal humorado, afastando a mão de Saga do rosto de Kamus.

- Então você voltou enrabichado do acampamento! - Kanon quase pulava de alegria.

- Foi... - Kamus tentava entender o que isso tinha demais.

- YUPIIII YEAAAAAAH, MANO, NÓS SOMOS OS MELHORES DO MUNDOOOOO! - Kanon berrou, pulando sobre os ombros do irmão. - NÃO FOI A GENTE QUE ARRANJOU, MAS, QUEM SE IMPORTA?

- É ISSO AEEEE, O CUBO DE GELO COM FOBIA DE RELACIONAMENTO SÉRIO TÁ NAMORANDOOOOOOOO!

- VOCÊS DOIS QUEREM CALAR A BOCA? - Kamus corou violentamente e berrou a plenos pulmões.

- VOCÊS AÍ FORA FAÇAM SILÊNCIO, ESTAMOS TENTANDO ENSAIAR! - O professor de teatro estava na porta e parecia prestes a esganar todos aqueles meninos. - SHAKA, POSSO SABER O QUE SIGNIFICA ISSO?

- Desculpe, professor, eu não tenho culpa... - Shaka estava corado de vergonha pela falta de noção dos gêmeos.

- Conversamos depois, Shaka, para dentro agora, já devia ter entrado faz tempo. - Shaka despediu-se com um aceno e passou correndo pela porta. - Quanto a vocês, para fora agora! Já!

E sem perder tempo, todos os restantes saíram dali.

- Desculpa, perdemos a noção... - Saga, visivelmente arrependido.

- A noção de vocês vive perdida, por isso eu vou desculpar. - Kamus sorriu. Foi apenas empolgação de momento dos irmãos, sabia que isso não aconteceria de novo.

- E então, o que vocês vão fazer agora? - Afrodite perguntou.

- Bom, eu e Saga vamos voltar para a sala dos computadores para ver mais sites de sacanagem!

- Pensei que a escola tivesse filtro contra essas coisas! - Disse Miro.

- E tem! - Saga Riu. - Mas não existe um bloqueio que eu e Kanon não consigamos retirar!

- Vocês me assustam... - Kamus disse com sinceridade.

- E você, Mu? - Afrodite optou por ignorar Kanon e Saga.

- Ah, vou voltar para aula agora... ainda dá tempo de pegar o final.

- Quer que eu vá com você até a sua casa, Miro? - Kamus sorriu para o namorado.

- Ah, se não for atrapalhar... - Miro retribuiu o sorriso.

- Nada nada, vocês dois! - Afrodite colocou a mão sobre os ombros deles, olhando de um para o outro. - Desculpa, Miro, mas o Kamus aqui tem trabalho para fazer!

- Tem?

- Tenho?

- É claro, oras! - Dite deu um risinho. - Você dispensou todos os outros membros, então sobrou para nós dois todo o trabalho duro!

- Mas vocês podem fazer semana que vem, não é? - Miro fez a cara mais infantil que conseguia, tentando convencer Afrodite a liberar Kamus.

- Desculpe, Miro, mas eu não posso dispensar esse seu namorado irresponsável, senão o trabalho acumula e vai acabar sobrando paramim fazer depois!

- Me dispensar? Eu sou o seu superior!

- Então você tem que supervisionar o meu trabalho, senhor superior, portanto hoje você não vai poder ir embora com ele!

Quando ambos pararam próximo à porta que dava para o pátio da escola, Afrodite se afastou. Os dois se encararam por um tempo.

- Bem, então a gente se vê segunda, né? - Kamus. - Você vai lá na minha sala no intervalo, certo?

- É claro! - Sorriu.

- Ah... - Kamus queria abraçá-lo e beijá-lo, mas como sempre fizeram isso às escondidas, sentia-se estranho por agora terem uma pequena platéia. - Então a gente se vê segunda...

- Ahn... - Miro queria a mesma coisa, mas tinha medo que Kamus o empurrasse por vergonha das pessoas em volta. - Até segunda.

- Noooossa, mas que despedida horrível! - Afrodite fez voz de repúdio. - Cadê a emoção? O sentimento? O Beijo?

- Er... Dite, acho que eles não querem platéia para isso... - Mu sorriu sem jeito.

- E qual o problema de se beijarem na nossa frente? Os outros casais podem, por que eles não? - Ele sorriu para o casal.

- Aliás, nós somos seus amigos, já sabemos de tudo e não temos nojo disso. - Saga. - Ajam como um casal normal, oras, ao menos quando estiverem entre amigos!

Miro e Kamus olharam primeiro para os sorrisos de incentivo dos outros garotos e depois se entreolharam. As mãos envolveram os corpos, colando-os, e as bocas se encontraram, iniciando um beijo intenso e rápido. Ao final do beijo, Miro apoiou a cabeça no ombro de Kamus.

- Eu disse que eles iriam aceitar bem... - Sussurrou no ouvido dele.

- Obrigado por me obrigar a contar...

- Eu vou te ligar para marcar alguma coisa amanhã... tudo bem?

- Aham...

E se separaram. Miro despediu-se de todos e foi embora. Kanon e Saga também se separaram da turma. Afrodite e Kamus ainda acompanharam Mu até a sala de astronomia.

Voltaram para a sala do Grêmio.

- Vamos acabar logo com isso que eu quero ir embora logo! - Kamus jogou a mochila na mesa, sentou-se na cadeira e já foi pegando o estojo.

- Calma! - Afrodite encostou a porta devagar e caminhou calmamente até sua cadeira, sentando-se. - Primeiro vamos conversar um pouco...

- Nem vem, eu não queria estar aqui agora, mas já que estou eu vou terminar isso de uma vez!

- Eu sei, mas eu acho que podemos ir com calma...

- Afrodite, continua o que você estava fazendo antes! - Kamus já começou a fazer marcações no papel.

Afrodite desviou o olhar para a janela.

- O beijo de vocês foi muito lindo... - Disse com voz aérea.

Kamus ficou vermelho.

- Obrigado, agora comece a trabalhar!

Pausa.

- Eu já sabia sobre vocês... - A voz do outro não se alterou.

Kamus parou instantaneamente o que estava fazendo e ergueu o rosto, os olhos arregalados e o queixo caído.

- O quê?

- Isso mesmo. - Afrodite voltou-se para ele com um sorriso no rosto. - Eu já sabia.

Como ele descobrira? Haviam mantido total silêncio sobre aquilo, não havia como alguém ter descoberto!

- Como você descobriu...? - Foi tudo o que Kamus conseguiu falar.

- Na noite em que vocês fugiram do acampamento. Eu estava lá.

O rosto de Kamus ficou cor de tomate e ele não conseguiu dizer nada.

- Eu havia ido para lá depois de conversar com Miro e convencê-lo a te conquistar. - Afrodite brincava com a lapiseira, colocando todo o grafite para fora e empurrando-o novamente para dentro. - Não queria ser encontrado e pensei que só eu conhecesse aquele lugar. Foi quando eu ouvi dois pares de pernas correndo para lá e deduzi que era um casalzinho que queria dar uns amassos, então eu me escondi. Imagina a minha cara de espanto quando vi que o casalzinho era na verdade você e Miro? - Deu uma risadinha. - Me desculpa, mas eu não consegui ir embora, precisei ficar até o final!

Kamus queria morrer.

- Você ficou espiando, seu pervertido? - Falou entre dentes, irritado e morrendo de vergonha.

- Sim! - Afrodite deu o sorriso mais cara de pau do mundo.

- Ahhh, eu vou matar você! - Kamus subiu em cima da mesa e avançou em Afrodite, agarrando-o pelo pescoço. Fez menção de sufocá-lo, mas parou antes mesmo de começar. Sentou-se com as pernas cruzadas em frente a Dite, a cabeça baixa, o cabelo tampando o rosto totalmente vermelho.

- Não fica assim, Kamus! - Afrodite afagou os cabelos dele e disse numa voz compreensiva. - Eu não vou contar para ninguém o que vi!

- Não duvido disso, mas... - Falava num fiapo de voz. - poxa, por que você ficou espiando?

- Quer saber mesmo? - A resposta veio com um único meneio de cabeça. - Eu fiquei com... inveja.

Kamus olhou-o de esguelha.

- Inveja?

- Sim... - foi a vez de Dite encarar a mesa. - Eu queria muito estar no seu lugar... com outra pessoa, é claro... mas eu fiquei com inveja que vocês conseguiram se entender e eu... - suspirou. - e eu ainda não.

Kamus manteve o silêncio, mas ele entendia perfeitamente. E também não poderia discutir com ele. Se alguém ali tinha direito de espioná-lo fazendo qualquer coisa com Miro, esse alguém era Afrodite. Vendo agora, ele fora quem mais lhe apoiara e quem mais lhe apoiaria dali para frente. A vergonha começou a se dissipar. Apoiou o cotovelo no joelho e a cabeça na mão, erguendo a cabeça e fitando Afrodite com um meio sorriso.

- Você me perdoa? - Afrodite não levantou a cabeça, apenas levantou os olhos para poder encarar seu rosto.

- Com uma condição! - Kamus agora tinha um tom mais alegre na voz.

- Qual?

Kamus dobrou o corpo para frente e aproximou seu rosto do dele.

- Com quem você queria estar no meu lugar? - Sussurrou.

Afrodite corou.

- Bem... é...

- Conte! Pelo visto você sabia de tudo sobre mim há tempos! Agora eu também quero saber um pouco de você!

- Ok, ok! - Afrodite riu, suas faces ficando bem vermelhas. - Sabe aquele garoto da classe, o Carlo?

- Ahn? - Kamus caiu na risada. - Você gosta do Máscara da Morte, aquele psicopata?

- Ahh, se eu soubesse que você ia rir nem falava nada! - Dite fez cara de ofendido.

- Tá, tá, eu paro! - Mas só parou de rir um bom tempo depois. - Ok, agora me conta como você começou a gostar dele!

O trabalho que tinham foi logo esquecido. Fazia tempo que Kamus não conversava sério com Afrodite, então resolveu que o mais importante era por a conversa em dia. Ouviu todos os motivos que Afrodite havia achado para se apaixonar pelo psicopata da escola, riu de quase todos eles, deu dicas de conquista para o amigo, fazendo este cair na risada também. Só foram embora quando o zelador os expulsou da escola, deixando para trás pilhas de problemas para resolver. Não se preocuparam com isso, tinham coisas mais importantes a fazer.

Afrodite tinha que criar coragem para se declarar à Máscara da Morte.

Kamus tinha seu primeiro encontro no dia seguinte.

---OWARI---

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Ahh, finalmente, esse acampamento terminou! Ainda bem que deu tudo certo entre Kamus e Miro!

Mas primeiro vou comentar o capítulo anterior...

Ahhh, sim, a história da camisinha! O problema é que não tinha noção surgir do nada uma camisinha ali. As do Miro estavam dentro da mochila, que acabou ficando com o professor. Sim, ele estava decidido a convencer Kamus, mas esperava fazer isso na barraca não no meio do mato XD... Já o Kamus nem camisinha levou, ele não tinha a menor das idéias de que issopudesse acontecer. Além disso, a minha idéia com essa cena era mostrar que, mesmo eles bringando o tempo todo, já haviam adquirido confiança um no outro. Foi apenas uma forma de mostrar que eles se amavam de verdade, que confiavam um no outro, mas acho que não consegui passar isso, desculpem!

Quanto aos erros gramaticais, ohhh, eu peço desculpas XD! Eu não estava tendo tempo para escrever e acabei matando horas de sono para terminar os capítulos no tempo em que me propus. E, ainda por cima, estou sem Betadesde o capítulo2e acabei fazendo uma revisão muito por cima, sem prestar muita atenção. Quanto à falta de espaços, culpem o ff . net que sei lá porque cargas d'água sumiu com metade dos espaços que eu coloquei. Depois de separar palavra de palavra uma vez e ver que não deu resultado, desisti, desculpem.

Agora, sobre o capítulo 9...

Eu achei que não havia sentido em terminar a fic no acampamento, sendo que a comecei na escola. E também eu queria muito colocar a cena de Kamus contando aos amigos sobre o seu namoro com um garoto. Mundo de Fanfic é perfeito e estava na cara que os amigos iriam aceitar. Infelizmente, no mundo real não é assim.

Eu mudei o final que tinha pensado. Na verdade, era para os dois serem descobertos, excluídos e ridicularizados pelos outros alunos. Os amigos também meio que sairiam de perto. Mas decidi fazer um final feliz, não queria pegar tão pesado nessa parte. Tentei ao máximo mostrar o quão difícil é. De repente contar para os amigos parece ser fácil, mas na hora a gente vê que não é bem assim. Optei por não enfiar os pais na história, mais uma vez para evitar um clima pesado. Esses dois mereciam um final feliz, não é?

Quando imaginei o Shaka ensaiando para o teatro veio logo na minha cabeça uma roupa bem curta e justa, e os cabelos dourados presos numa trança desgrenhada (de tanto pular), com cabelos caídos no rosto. Precisei dar uma noção disso... sob o ponto de vista do Mu, é claro!

Bom, o Acampamento finalmente chegou ao fim! Diverti-me muito escrevendo, espero que vocês também tenham se divertido ao ler! Muitíssimo obrigada às pessoas que tiveram paciência para ler e deixar reviews, às que não deixaram reviews mas tiveram paciência de ler, às que me ameaçaram para eu terminar logo e às que me deram mil e uma idéias e garantiram minha inspiração durante toda a fanfic!

Mais uma vez, muito obrigada!

Kisu! Matta ne!